Escalando em El Chalten

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Fazia alguns anos em que eu ouvia falar do tão famoso pueblo de El Chaltén. suas histórias de grandes conquistas e perrengues maiores ainda sempre me cativaram de um modo que seria impossivel não fazer uma visita a este lugar mágico para nós montanhistas subtropicais.

Seu clima hostil e grandes agulhas de um granito “puro sangre” motivam inúmeras equipes de diferentes nacionalidades estejam até 30 dias sem poder escalar absolutamente nada e tornam as tão esperadas “ventanas” como corridas para alcançar objetivos pré estabelecidos dentro de barracas durante os longos dias de chuva, vento e neve.

No meu caso não foi diferente, cheguei a El Chaltén no dia 5 de fevereiro, bem no final de uma “ventana” de quatro dias. Fiquei preocupado por não poder encontrar parceiros (afinal estavam todos na montanha) e no dia seguinte consegui me enganchar em uma galera que tambem havia chego tarde.

Nosso destino? Optamos por subir pelo vale elétrico, acampar no bivaque Piedras Negras para fazer uma tentativa na Agulha Guillamet.

Dois dias de tempo ruim em barracas molhadas consumiu toda a nossa comida e no ultimo dia decidimos fazer uma tentativa, chegamos até a 6 cordada da via Founruge sendo que devido a fortes ventos e muitas nuvens, resolvemos retornar a El Chálten.

Durante os 18-20 dias de espera en El Chálten, muitos amigos resolveram abortar a missão de escalar por ali, alguns voltaram para casa, outros decidiram ir para algum lugar onde o tempo fosse mais estável e a escalada mais fluida.

Nesses dias de mal tempo fiquei amigo de dois Bascos e passamos os 20 dias de mal tempo fazendo planos e decidindo o que iríamos escalar. Optamos pelo vale do Cerro Torre porque se aparecesse alguma brecha superior às 24h iríamos tentar a agulha Saint Exupery (via Claro de Luna) e se por acaso as condições não fossem das melhoras daria para quem sabe escalar outras agulhas menores no local. As duas agulhas escolhidas para ser a segunda opção, que mesmo assim possibilitariam incriveis escaladas, foram a Agulha El mocho e a Media Luna.

Com o tempo correndo solto e nossos dias contados em El Chaltén chegando ao final, vimos na previsão do tempo em que talvez poderia aparecer duas “ventanitas” entre os dias 22-27. Fizemos as mochilas e tocamos para o vale do Cerro Torre.

As condições das ultimas semanas carregaram tanto de neve as agulhas da face oeste que impossibilitou nosso primeiro objetivo, então ficamos de olho nas duas outras agulhas que tínhamos planos de escalar.

Um dia após chegar a Niponinos, durante a noite, os ventos acalmaram e vimos que seria no dia seguinte que iríamos escalar. Acordamos às 5 da manhã e fizemos a nossa aproximação para El Mocho. A escalada ocorreu tudo bem, granito de alta qualidade, inúmeras fendas que só imaginava existir em revistas gringas de escalada e um visual “que te cagas!” de tão bonito.

Após chegarmos ao cume, veio atrás de nós uma cordada onde um dos integrantes se jogou de base jump do cume do mocho! Incrível, achei que não seria possível devido aos ventos que começavam a soprar e as nuvens que já entravam no vale. Decidimos descer o mais rápido possível e ao chegar à terra firme (mais ou menos) o vento já soprava com uma intensidade muito superior ao famoso vento sul daqui de Florianópolis (nunca tinha visto um vento tão forte).

Ficamos aliviados quando vimos da roubada que havíamos escapado e olhamos com pena a cordada anterior que estava pelo menos há uns 10-12 rapeis do chão. Chegamos ao acampamento com o vento e neve cuspindo nas nossas costas e bem felizes em estarmos na barraca seguros, quentes e fazendo a nossa janta. A janela de tempo bom durou aproxima demente 10h e pegou essa cordada no El Mocho e outra cordada na Agulha da Media Luna.

Na media luna os estadosunidenses perderam uma corda de 70 metros que ficou presa nos blocos e outra corda de 70 metros que conseguiram cortar um pedaço dela, e assim descer fazendo rapeis de 15 metros, abandonando quase todo o equipo na parede e chegaram ao acampamento base às 4 da manhã, felizes por não terem ficado na parede durante a noite. No El Mocho não foi muito diferente, outros estadosunidenses perderam as coradas e abandonaram equipo para poder baixar da agulha.

Outro dia de tempo ruim se precedeu e na noite seguinte os ventos acalmaram outra vez, então pensamos em ir escalar a Agulha da Media Luna, saímos mais cedo que da outra vez, e conseguimos escalar a via com um tempo lindo. Como no dia da escalda do El Mocho, ao chegar ao cume vimos que o tempo se “podria” e novamente conseguimos sair da parede bem a tempo da tempestade no alcançar.

Ao chegarmos ao acampamento base Niponinos, tivemos que desfazer o acampamento e voltar pra El Chálten, porque no dia seguinte às 7 horas da manhã eu tinha que pegar o meu ônibus para não perder o avião no aeroporto de Calafate.

Foi uma madrugada bem dura, caminhamos aproximadamente 8 horas com todo o acampamento nas costas e debaixo de uma chuva torrencial, as mochilas e roupas molhadas faziam com que o peso quase insuportável da mochila tornasse para nós o retorno a casa uma experiência quase inesquecível.

No final deu tudo certo, cheguei a tempo de arrumar minhas coisas, pegar o ônibus e voltar para casa, muito cansado, mas com um sorriso que dava duas voltas na cabeça por finalmente ter conseguido escalar neste lugar mágico.

por João Cassol

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