A selvagem cascuda praia de Itaquitanduva.

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Inserida no Parque Estadual Xixová-Japuí (PEXJ), a Praia de Itaquitanduva é daquelas raras praias desertas e isoladas, próximas a urbe de São Vicente e próximo ao Porto de Santos, na Baixada Santista. Preferida pelos surfistas tanto pela sua beleza natural como pela incidência constante de ondas, seu acesso é limitado e se dá mediante trilha de meia hora pela mata. Pois bem, sempre acreditei q uma praia situada numa APA e num PE as leis q resguardam o lugar vigorassem de forma plena. Mas a prática é outra, infelizmente. E assim, um lugar paradisíaco q tinha td pra ser um Saco das Bananas, Prainha Branca ou até um novo Cedro, apresenta-se como uma das faixas de areia mais imundas q já tive oportunidade de pisar.

Tudo aconteceu num daqueles impulsos pós-boteco de meados de tarde dum dia útil de tempo limpo e sol brilhando. “Vamos dar um pulinho lá em Itaquitanduva?”, alguém sugeriu entre um gole de cerveja e um petisco na calabresa. A principio pensei q fosse brincadeira mas logo vi q meus colegas realmente falavam sério, mesmo já estando na quarta rodada etílica naquela mesa, num bar qq na perifa de São Bernardo (ABC). Muitos desconhecem, mas São Vicente possui, além das suas três praias (Itararé, Gonzaguinha e Milionários), a Praia de Itaquitanduva, reserva natural pouco explorada pela população devido tanto a sua localização como seu acesso “dificultado” por trilha. Já tinha ouvido falar dessa praia e por não conhecê-la acabei topando a proposta, q nada mais era uma desculpa dos meus parceiros de manguaça  pra “relaxar” a beira-mar.

Tomamos então a estrada e, sem transito algum, imediatamente nos vimos na Baixada Santista, mais precisamente em São Vicente. A muvuca balneária de Praia Grande era bem menor pelo fato de ser dia de semana, e cruzar a famosa “Long Beach” não foi problema algum. Passada a Ponte Pênsil, na Av Tupiniquins bastou acompanhar a sinalização até q finalmente caímos no Bairro de Itaquitanduva, relativamente 3km afastado do centrão, uma vez q é a praia mais afastada de São Vicente. Adentrando á esquerda na Rua Caetano Cardamone, logo nos vemos rodando no meio dum pacato bairro ate q enfim estacionamos o veiculo próximo dum enorme morro forrado de verdejante mata, o Japui, q por sua vez esta ao lado do Morro Xixová.

A partir dali é meio q instintiva a rota a tomar. A exatas 16:30hrs e o sol tingindo aos poucos a paisagem de tons avermelhados, deixamos as casas pra trás e adentramos num terreno baldio de encontro o sopé do Morro Japui, onde uma construção abandonada ganha alguma vivacidade pelas criativas pixações ornando suas paredes. Somos então recebidos por duas enormes placas nos dando as boas-vindas ao “PEXJ”, unidade de conservação no qual a praia esta inserida. Pque Estadual? Sim, na década de 90 a praia sofreu uma especulação imobiliária, porém, com a união de surfistas e ambientalistas, a região passou a servir para estudos científicos das espécies de aves que migram ao local, à flora e à bicharada que lá habita. Com essa ação movida pelos frequentadores da praia, o possível desmatamento foi evitado e foi promulgado um decreto estadual, nomeando o lugar de “Parque Estadual Xixová Japuí”.

Logo na entrada é possivel observar a precária infra disponibilizada já caindo aos pedaços. No caso, uma decrépita bica azulejada do lado de dois banheiros nas mesmas condições. Jovens retornando da praia com suas pranchas automaticamente sinalizam a rota a tomar. Mergulhamos então no frescor daquela Mata Atlântica remanescente atraves duma picada bem erodida, q sobe o morro suavemente, sem gde gde declividade. A caminhada é agradavel embora no caminho já seja possivel avistar algum “pequeno lixo” durante o trajeto.Nao demora pra estar no alto e, olhando por sobre o ombro, é possivel avistar a horizontalidade da Baixada Sabtista bem atrás.

No alto a pernada se mantem em nível, afinal estamos no selado de ligação do Morro Jacui e Xixová. Uma placa escancarando “Arrebente as ondas, não a praia”  volta pra relembrar os banhistas da manutenção e conservação daquele ecossistema isolado. Uma fresta na mata emoldura uma linda praia ao sopé do morro Xixová e nos força a apressar o passo. Aceno cordialmente prumas periguetes de bikini retornando do bate-volta na praia, gracejo q não é correspondido apenas pelo mal-encarado surfistinha q as acompanhava.
Mas não tarda pra picada embicar pra baixo, perdendo outra vez altitude suavemente. Um trecho, porém, é bem íngreme devido a erosão da encosta  e requer o auxilio duma “corda” estrategicamente ali colocada pra esse propósito, mas nada assim do outro mundo. E após saltar um pequeno correguinho emergimos da mata pra palmilhar no aberto, agora com capinzal de restinga a nosas volta e, após menos de 1km de trilha, pisamos finalmente nas areias douradas de Itaquitanduva, q tem 300m de extensão e é delimitada em suas duas extremidades por costões rochosos. Apesar de pequena, se divide naturalmente em três trechos por meio de formações de pedras. O primeiro é ideal a prática do surfe, o segundo atrai os praticantes da pesca e o terceiro é propício aos banhistas que amam a natureza selvagem. Sendo uma praia deserta e isolada, possui (em tese) um ecossistema preservado e animais silvestres que se refugiam na mata. Não possui bares e nem ambulantes, apenas uma bica natural de água potável que vem da nascente do morro.

Enqto meus amigos sentavam na areia afim de “apreciar” a paisagem, eu fiz questão de andar de cabo a rabo pela praia afim de conhece-la melhor, sendo q a cada passo fui me desanimando cada vez mais. Foi ai q a decisão de não retirar o tênis ou não sentar na areia mostrou-se acertada. Uma praia selvagem encravada entre dois morros, com cenário maravilhoso da natureza em volta e com vislumbre privilegiado da Ilha de Sto Amaro estava totalmente imunda, onde quer q se direcionasse o olhar! Uma área com amendoeiras, inclusive, ideal pra acampar ou ficar meramente a toa na sombra, desencorajava até de passar perto diante do mau cheio onipresente, restos de fogueira, enlatados e embalagens vazias em volta.

Td tipo de residuo pude constatar ao largo de td faixa de areia, desde plásticos, vidro, papel, metal, etc.. e td em gdes qtidades!  Num local especificamente parecia haver não areia e sim um tapete formado exclusivamente por tampinhas, pets e hastes de cotonete e pirulito! Mas de onde vem td isso?? A maioria do material visivelmente é proveniente do interior do estuário de São Vicente (oriundo de favelas s/ serviços básicos) e vem se depositar  ali ao sabor das correntes, ventos e marés. Isso reforça a ideia de que somos responsáveis pelo que fazemos com o lixo produzido, uma vez que as consequências do descarte inadequado se refletem não apenas no local onde vivemos, mas em locais bem distantes de nossos lares. Grande parte do lixo ali encontrado foi gerado por gente q quiçá nunca pisou na praia e, não vendo (e sentindo) as conseqüências de seus atos, dificulta qq esforço de conscientização. Problema municipal ou estadual? Eis a questão.

Não bastasse o lixo “externo”, freqüentadores pouco conscientes e até mesmo suínos fazem questão de emporcalhar o q resta, complementando assim a imundície deixando resíduos de farofa tanto na areia como no mato, onde não raramente se encontram sacolas plásticas repletas do lixo resultante do bate-volta, como q a espera de alguem q as leve dali. Meu, já q levou custa trazer de volta? Além do mais, a ausência de fiscalização, de qq espécie de recipiente (latão de lixo) pra comportar residuos e de não haver limpeza em praia publica apenas agrava o problema, o q denota tb a parcela de responsabilidade do problema por parte da prefeitura.

Francamente, fiquei mto desapontado com td aquele panorama q não via a hora de ir embora dali, daquela praia encardida. Meus colegas ate ensaiaram entrar na água, convite q declinei redondamente com receio de ser carregado por algum “macróbio” ou coliforme fecal mais avantajado. E assim, após quase uma hora de total desencanto naquele lugar, retomamos nossa caminhada de volta ao veiculo pelo mesmo trajeto, já quase escurecendo. No caminho pude ver uma picada derivando pro mato, onde supostamente mora um eremita em seu rancho particular, q diz a lenda não ser bem-vindo pelos surfistas, q acham q a praia deve ser exclusivamente deles.

Conversando posteriormente com antigos moradores da regiao, tds (sem exceção) se queixam q os antigos protetores da praia (pescadores de caniço) já não são bem-vindos e até proibidos de pisar na areia, e q a situação apenas piorou com a exclusividade de uso por parte de banhistas e surfistas. Noutras, com a criação do Parque Estadual, q na verdade parece ser de “mentirinha”. Enqto isso, seja pelo descaso do Estado ou pela falta de conscientização de freqüentadores ocasionais, Itaquitanduva perde a gde oportunidade de servir de exemplo de preservação ambiental. Mas o pior de td é q perde a gde chance de ser um dos gdes atrativos naturebas da região, proximo duma das cidades costeiras mais urbanizadas do Estado. So resta então lamentar do q poderia ter sido e não foi. Ou melhor, do q pode ser e não é.

Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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