2013: O ano mais trágico da História do Himalaismo

0

O alpinismo é, por definição, uma atividade de risco. O montanhista de alta altitude tem que desviar de rochas e seracs em queda, evitar avalanches, contornar gretas e crevasses, enfrentar ventanias, nevascas e proteger-se de relâmpagos e raios. Não bastasse isso, tem que prestar atenção aos sinais de seu próprio organismo, para se precaver contra o mal de altitude, hipotermia, congelações, edema pulmonar e edema cerebral. E essas são apenas algumas das potenciais causas de fatalidade, há inúmeras outras mais.

Nesse quesito, as montanhas de 8000 metros da Ásia têm demonstrado, ao longo dos tempos, uma incrível capacidade de ceifar vidas.
 
Para piorar, segundo os números têm revelado, o grau de mortalidade disparou nos últimos dois anos, e chegou a níveis assustadores em 2013, que é, desde já, o mais trágico da história do himalaísmo.
 
Número de mortos no período 2003-2011:
 
2003 – 13
2004 – 21
2005 – 12
2006 – 24
2007 – 19
2008 – 24
2009 – 21
2010 – 20
2011 – 12
 
Número de mortos no período 2012-2013:
 
2012 – 31
2013 – 39
 
Portanto, no período anterior, tivemos uma média de 18 fatalidades/ano. Já nos últimos dois anos, o grau de mortalidade saltou para uma média de 35 mortes/ano. Logo, a periculosidade aumentou 94% neste biênio.
 
Lista dos mortos em 2013:
 
01 – Joel Wischnewski (FRA) [Nanga Parbat]
02 – Maciej Berbeka (POL) [Broad Peak]
03 – Tomasz Kowalski (POL) [Broad Peak]
04 – Mingmar Sherpa (NEP) [Everest]
05 – Liu Xiang-Yang (CHIN) [Makalu]
06 – Serguey Ponomarev (RUS) [Everest]
07 – Da Rita Sherpa (NEP) [Everest]
08 – Lobsang Sherpa (NEP) [Everest]
09 – nome não divulgado (ALE) [Shishapangma]
10 – Alexey Bolotov (RUS) [Everest]
11 – Namgyal Sherpa (NEP) [Everest]
12 – Lee Hsiao-Shih (CHIN) [Lhotse]
13 – Seo Sung-Ho (C-S) [Everest]
14 – Mohammad Hossain (BANG) [Everest]
15 – Zsolt Eross (HUN) [Kangchenjunga]
16 – Peter Kiss (HUN) [Kangchenjunga]
17 – Park Nam-Soo (C-S) [Kangchenjunga]
18 – Phurba Dorji Sherpa (NEP) [Kangchenjunga]
19 – Bibas Gurung (NEP) [Kangchenjunga]
20 – Igor Svergun (UCR) [Nanga Parbat]
21 – Kashaev Badawi (UCR) [Nanga Parbat]
22 – Konyav Sergeyevich (UCR) [Nanga Parbat]
23 – Rao Jian-Feng (CHIN) [Nanga Parbat]
24 – Yang Chun-Feng (CHIN) [Nanga Parbat]
25 – Chen Hong-Lu (CHIN) [Nanga Parbat]
26 – Ernestas Marksaitis (LIT) [Nanga Parbat]
27 – Peter Sperka (SLK) [Nanga Parbat]
28 – Anton Dobes (SLK) [Nanga Parbat]
29 – Sonam Sherpa (NEP) [Nanga Parbat]
30 – Artur Hajzer (POL) [Gasherbrum I]
31 – Dana Heide (ALE) [Broad Peak]
32 – Aidin Bozorgi (IRÃ) [Broad Peak]
33 – Pouya Keivan (IRÃ) [Broad Peak]
34 – Mojtaba Jarahi (IRÃ) [Broad Peak]
35 – Xevi Gomez (ESP) [Gasherbrum I]
36 – Alvaro Paredes (ESP) [Gasherbrum I]
37 – Abel Alonso Gomez (ESP) [Gasherbrum I]
38 – Marty Schmidt (N-Z) [K2]
39 – Denali Schmidt (N-Z) [K2]
 
O ano já começou tenebroso, com a morte de Joel Wischnewski, jovem promessa francesa que tentava a primeira ascensão invernal do Nanga Parbat. Um mês após, quando desciam do cume, após a primeira ascensão invernal do Broad Peak, vieram a óbito os renomados polacos Maciej Berbeka e Tomasz Kowalski (em tempo, os corpos foram recuperados na temporada de verão do Karakoram, em expedição específica para este fim).
 
Na preparação do Everest, o nepalês Mingmar Sherpa, especialista em organizar a travessia da traiçoeira Cascata de Gelo do Khumbu acabou caindo em uma greta e morreu. Apelidado gentilmente de "Doctor Ice", Mingmar preparou a rota por mais de 20 anos, e era extremamente respeitado no meio.
 
Um mês depois, nos preparativos para tentar uma nova rota na majestosa Face Sudoeste do Everest, o top climber Alexey Bolotov também caiu em uma greta e faleceu. Entre outras façanhas no currículo, o russo abriu novas rotas no Makalu (1997) e no K2 (2007), além de realizar travessia entre todos os Annapurna em 2008. Detinha 11 cumes 8000 e realizou a primeira ascensão ao Lhotse Middle (2001). Ademais, subiu uma nova rota no Thalay Sagar e participou da primeira ascensão da rota direta na Face Norte do Jannu. Ganhara o Piolet d'Or por duas vezes.
 
O top climber sul-coreano Seo Sung-Ho, com 12 montanhas 8000, fez cume sem oxigênio suplementar no Everest após 120 km de caiaque e 563 km pedalando, em um dificílimo triatlon. Na descida da montanha, ele passou mal e faleceu, vitimado por edema cerebral.
 
No Kangchenjunga, vários alpinistas culminaram coletivamente. Mas a subida, que foi extremamente difícil, devido ao excesso de neve nas encostas superiores, exigiu demais deles e, no descenso, por exaustão ou queda diversos alpinistas perderam a vida. Entre eles, Zsolt Eross foi a morte mais sentida, pois o húngaro era bem conhecido no circuito, com dez cumes 8000 angariados.
 
A temporada do Karakoram iniciou ainda mais funesta. Extremistas islâmicos ligados ao Taleban invadiram o campo-base do Nanga Parbat e promoveram uma terrível chacina, assassinando a sangue-frio onze pessoas. No meio dos mortos, Igor Svergun, renomado montanhista ucraniano, e os ace climbers chineses Rao Jian-Feng (nove 8000) e Yang Chun-Feng (onze 8000). O massacre só não foi pior porque mais de vinte alpinistas estavam nas encostas superiores da montanha, em fase de aclimatação, e escaparam da carnificina. 
 
Na sequência da temporada do Paquistão, o lendário Artur Hajzer caiu para a morte. O polonês abrira novas rotas no Manaslu (1986) e Shishapangma (1987). Realizou a primeira ascensão invernal ao Annapurna. Um dos artífices do montanhismo invernal, que é a marca registrada da Polônia, Hajzer participou de incursões invernais ao Nanga Parbat (2007), Broad Peak (2008 e 2012), K2 (2010) e Gashebrum I (2011).
 
Ainda, mais três tragédias assolaram esse ano negro. Três iranianos que haviam culminado o Broad Peak por uma nova – e impressionante – rota acabaram se perdendo na descida e, exaustos, não conseguiram sair vivos da montanha. Poucos dias após, no Gasherbrum I, três espanhóis que haviam feito os primeiros cumes da temporada, também se perderam na descida, em meio à nevasca, e foram dados por desaparecidos. Em uma sequência tenebrosas de revezes, o guia de montanhismo Marty Schmidt e seu filho Denali Schmidt foram tragados por uma avalanche no K2.
 
Tendo em vista esses infortúnios, até a data do presente artigo 889 pessoas vieram a óbito nas 14 montanhas de 8000 metros desde o início da exploração das grandes cordilheiras asiáticas. Infelizmente, é um número que, como visto, só tende a crescer…
 
 
por Rodrigo Granzotto Peron
data de finalização do artigo: 29-7-2013
 
Compartilhar

Sobre o autor

Texto publicado pela própria redação do Portal.

Deixe seu comentário