A Baleia de Jundiaí

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“Pedra da Baleia” é o nome pelo qual atende o simpático morrote q bordeja o extremo sul de Jundiaí (SP). Espigão desgarrado da Serra do Japi e situado entre as rodovias Anhanguera (SP-330) e Bandeirantes (SP-348), a “Pedra da Baleia” é um serrote doméstico com as mesmas características da Pedra Grande (Atibaia), q descortina visus similares a Pedra dos Estudantes (Suzano) e é tão fácil de aceder qto a Pedra do Elefante (Ribeirão Pires) ou Pedra do Lagarto (Mogi). E esta primeira e despretensiosa incursão a Jundiaí serviu pra matar duas pendências bem claras: me familiarizar com esta bela região e estudar rotas alternativas pro guardião de Jundiaí, a “proibidona” Serra do Japi.

Tendo subitamente a tarde livre num dia qq resolvi dar um pulo rápido em Jundiaí, situada a 70km da Metrópole, apenas pra conhecê-la, aliás, pendência minha a mto tempo. Pra aproveitar meio período decidi subir a sussa Pedra da Baleia, situada do lado da cidade e com vista bacana do entorno. Dessa forma, após farto almoço  zarpei até a última estação da linha rubi da CPTM, saltando em Jundiaí as 13hrs sob forte sol. Situada na cota dos 710m, a estação é bem charmosa e não se furta em transpirar a história da cidade nos detalhes e até na própria arquitetura. Em tempo, “rio dos peixes jundiá” (em tupi), Jundiaí tem sua história ligada ás ferrovias e ao café. Importante centro produtor do passado, é a única cidade por onde passaram as 5 maiores ferrovias durante a expansão ao interior, numa corrida similar à do ouro no velho oeste norte-americano.

Da estação bastou pedir infos e simplesmente ir tocando pro sul, cortando pelas ruas e avenidas no caminho. Deve haver algum coletivo q leve à Vila Maringá ou Jd Sta Clara, mas ir até lá a pé foi opção minha mesmo, pq assim conheceria melhor as quebradas da cidade. Assim percorri td a Av. Dr Odil Campos de Saes, a Rua Suíça e a Rua Bom Jesus de Pirapora até dar as margens da Rodovia Anhanguera (SP-330). Dali já é possível avistar parte do serrote da Pedra da Baleia se espichando no sentido noroeste, salpicado de enormes pedras igual confete de brigadeiro, e forrado por eucaliptos perfilados em seu contraforte norte.

Uma vez no outro lado da marginal basta tocar sentido São Paulo até chegar num Posto Ipiranga, onde uma lacônica placa aponta pro Bairro Sta. Clara. Aqui tomo a Avenida Clemente Rosa, q me leva cada vez mais próximo do serrote, mais precisamente em seu extremo sul. Escadarias transversais abreviam o caminho e me levam pra Rua Jataí, um nível acima, onde há a referência da Drogaria Ibiporã. Do lado está a Rua Jair Linhaci q é a via q nos leva efetivamente ao pé da serra, e antes de chegar ao seu final (em frente a Rua Opaiá) atento pruma picada q se esgueira entre uma par de residências e desemboca num enorme descampado (ou aterro, sei lá) onde escavadeiras removem algum material pra terraplanagem.

Do descampado agora o sentido é obvio, pois dali observam-se várias picadas subindo a serra, mas prefiro tomar a principal e maior, q galga a encosta aos ziguezagues. A picada é de terra e encontra-se bem erodida. É tão cheia de grãos de areia q se pisar em falso derrapa-se com facilidade, tal qual as veredas q acedem a Pedra Grande de Atibaia ou o Saboó, em São Roque. Algumas enormes pedras surgem no caminho tal qual portais rochosos, me dando as boas vindas aquele guardião pré-serrano de Jundiaí.

A subida é rápida e num piscar de olhos me vejo no dorso da serra, subindo o restante da crista suavemente. O terreno ameniza, mas a ausência de sombra é sentida naquele início de tarde quente e ensolarada. O capim q bordeja a trilha roça a perna, e qdo não deixa picão ou carrapichos grudados na meia deixa ao menos muita coceira na parte exposta da canela. Mas o sufoco é compensado provisoriamente por uma brisa fresca q sopra do leste, ao mesmo tempo em q os horizontes se ampliam a nordeste, exibindo td a geometria alva de Jundiaí a meus pés, reluzindo sua civilidade a nordeste.

As 14:30hrs alcanço o alto dos 940m daquele morrote doméstico, coroado de enormes monólitos arredondados. Pela proximidade da urbe boa parte deles ostenta “inscrições burrestres”, mas incrivelmente o sinal de lixo é bem escasso. Sinais de acampamento e fogueira sugerem q animados luaus regados a vinho. Um mirante gramado descortina td a cidade embaixo, assim como a encosta serrana repleta de matacões salpicando o verde de capim e arbustos. Da horizontalidade da paisagem destaca-se somente a topografia elevada da Serra do Mursa, a sudeste. O zunido eletrostático das torres de alta tensão me levam pro outro lado do morro através de variantes bem óbvias da vereda , onde destoa a Torre da Cultura apontando por céu azul, no alto da cumieira verdejante da Serra do Japi recortando o horizonte. Observo tb dois espigões principais paralelos no Japi e vários acessos nascendo de diversos pontos, locais pra estudo futuro, claro. Algumas sobreposições com a carta á tiracolo, avaliações e algumas analises. Pronto. Pausa pra descanso, fotos e uma maçã, lógico.

Pois bem, é hora de voltar. Mas resolvo prosseguir pelo alto da cumieira daquele serrote. Prossigo pelos últimos vestígios de picada, onde encontro rampas rústicas de mountain bike ao largo do trajeto, e qdo adentro num pequeno bosque a picada some por completo. Mas não tem erro, dali resolvo varar-mato me mantendo sempre pelo alto, sem desviar pra nenhum lado de ambas encostas. Apesar de algum mato lanhento, grudento e espinhento, o avanço não é em nenhum momento perrengoso. Alguns lances de pedras são facilmente escalaminhados e vencidos, pra logo depois me deixarem bem mais a frente daquela espichada crista, agora florestada.

Meu palpite se materializa ao desembocar numa vereda bem batida, mais adiante, q passa a acompanhar uma cerca (arame farpado!) q deve limitar propriedades no alto da serra. O pouco uso ou frequência de pisadas me força constantemente a “costurar” a cerca de ambos lados, conforme maior ou menor dificuldade, mas mesmo assim o avanço é ágil e rápido. Eucaliptos perfilados me brindam com a sombra necessária naquele dia de calor escaldante, mas é preciso atentar bem onde se pisa, embora o chão alterne capim e terra batida. Digo isto pq quase piso numa cobra, só não me pergunte se era peçonhenta ou não pq não fiz questão de pedir o RG dela.

Me mantendo sempre na crista e agora abandonando o eucaliptal, o rastro de trilha aparenta sumir, mas o sentido é obvio. Venço o trecho saltando rochedos de modo a evitar arbustos espinhentos até dar num descampado de capinzal onde reencontro a picada. Aliás, várias e indo em tds as direções, mas me mantenho na q permanece ainda na crista, já começando a perder altitude, agora em definitivo. Um simpático grupo de rochedos orna o último cocuruto serrano e lembra muito, guardadas as devidas proporções, os monólitos de Stonenhenge. Daqui o visual é igualmente interessante, onde traço minha rota de descida rumo a Anhanguera. Olhando pra trás tenho uma nova perspectiva dos demais espigões da Serra do Japi, sugerindo rotas de acesso de perder a vista.

Mas cansado e doido pra mandar ver uma gelada, dou por encerrada minha despretensiosa caminhada de crista e começo a descer o restante de encosta. Alternando pasto e trilha, não demoro a cair numa via asfaltada deserta pra depois uma discreta picada (vista lá de cima) me deixar as margens da Rodovia Anhanguera, exatamente as 15:30hrs. Dureza mesmo foi cruzar esta rodovia, uma vez q tive q andar um tanto ate encontrar uma passarela pra passar pro outro lado. E perguntando aqui e ali, cheguei novamente na frente da Estação Jundiaí da CPTM, as 16:30hrs, onde antes de embarcar encostei num boteco afim de molhar a goela quase as margens do Rio Guapeva, espécie de Tamanduateí local.

Dando efetivamente as costas à Pedra da Baleia, me despido de Jundiaí prometendo breve retorno, sem dúvida, já q nesta primeira e despretensiosa incursão a cidade já deu para ter uma boa ideia da (melhor) acessibilidade ao Japi e da logística necessária pra qq incursão mais ousada (ou duradoura) a região. Ou se preferir, venha aqui apenas pra passear ao alto da Pedra da Baleia sem nenhum compromisso de cunho exploratório. Afinal, o “Everest” de cada um é algo unicamente pessoal e intransferível. E ai até um simplório morrote urbano serve pra matar meio período num dia perdido qq, com seu quinhão devido e merecido de mato.

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

7 Comentários

  1. Salvo erros poucos erros ortográfico e as girias, a descrição é soberba. Quase deu pra sentir suas sensações e prazeres ao desfrutar dessa natureza exuberante. Obrigada por compartilhar!

  2. excelente texto, conheço bem o local por ser ciclista local e você descreveu exatamente o local, sentimentos e etc.

    parabéns

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