A montanha pode esperar?

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O Brasil vive um momento de grandes transformações, impulsionadas por novas demandas da sociedade e pela transformação acelerada da economia mundial, e para se enquadrar é preciso ser o melhor no que fazemos.


Essas mudanças são positivas, elas estão permitindo aumentar a eficiência, assegurando ganhos de produtividade essenciais para a concretização do potencial de crescimento da economia brasileira, que sabemos ser enorme. Essa mudança está levando também à modernização do Estado, que vai deixando o papel de empresário para assumir outro, de importância crescente, na regulação da economia e na promoção da igualdade de oportunidades. Finalmente, são essas as mudanças que permitirão ao Brasil alcançar uma integração com o resto do mundo que seja socialmente benéfica e economicamente saudável. Por outro lado, sabemos que são mudanças desafiadoras. Ainda não conhecemos inteiramente os efeitos da globalização, realidade inescapável deste final de século, sobre as relações econômicas e sociais. Com todas essas mudanças e olhando para nossa realidade, fica a pergunta; A montanha pode esperar?

Hoje os bons profissionais estão ficando de fora do mercado de trabalho, isso porque, quem deseja manter-se ativo em sua carreira precisa buscar sempre a excelência. Para isso é necessário desprender tempo e dinheiro em graduações, mestrados, cursos de especialização e muita dedicação a projetos e metas. Com uma carga horária diária de oito horas em media de trabalho, já se torna difícil tomar decisões quanto ao aproveitamento do tempo livre, sabendo que este deve ser dividido entre os estudos, família e lazer, onde encaixar o esporte de montanha nesta corrida linha de tempo?

A grande maioria dos esportistas de montanha não possui patrocínios, para qualquer investida a uma montanha, a viabilização do projeto sai do próprio bolso, onde conseguir o necessário para uma viagem se não trabalhando muito? Tenho grandes amigos que hoje conseguem viver do esporte, porem sempre estão no limite entre jogar a toalha e continuar pelo amor ao esporte.

O montanhismo em sua verdade infelizmente é um esporte para poucos, e mesmo em seu básico, o pouco equipamento necessário para escalar em segurança ainda é caro para realidade da maioria. Quando é quebrada a barreira da escalada em rocha tradicional e tem inicio a procura por grandes montanhas dentro e fora de nossas fronteiras, a verdade financeira começa a bater na porta do escalador. São meses planejando uma expedição para que nada saia errado, ou muito menos saia do escopo financeiro planejado. Nada pode dar errado.

Tenho a experiência de amigos que por pouco não ficaram presos em terras vizinhas por falta de planejamento. No final da viajem faltou dinheiro para pagar a taxa de embarque do aeroporto. Pode parecer bobagem, mas a vontade de escalar é tanta que no fim das contas, alguns dólares parecem não fazer diferença, mas fazem.

Passar a semana planejando a escalada do fim de semana é a realidade de muitos aqui, ou até mesmo faltar ao trabalho para passar o dia escalando (Que meu chefe não leia isto). Já perdi a conta de quantas consultas ao dentista eu já marquei e na verdade estava na Urca ou Grajaú escalando. A vontade de escalar é tanta que colocamos até nossos empregos em risco para satisfazer a vontade de estar na rocha. Será que podemos arriscar tanto?

Com o mercado de trabalho cada vez mais disputado, sobra pouco tempo para o esporte e para nossos projetos, até onde a montanha pode esperar?

Hoje muitos montanhistas conseguiram unir o trabalho e o esporte, mas trabalharam muito para isso se tornar possível. Médicos, empresários, lojistas, professores e advogados, estes entre muitas outras profissões podem dar-se o conforto de dividir uma gama maior te tempo entre sua vida profissional e o esporte, porem isso demandou muito trabalho e dedicação.

Pude acompanhar a vida de alguns amigos que deixavam de escalar fim de semana para se enterrar em pesados livros de direito ou horas dentro de um laboratório de química da universidade. Perdi a conta de quantas madrugadas eu passei trabalhando em projetos que no fim só me garantiam alguns poucos pontos na media final da matéria. Faria tudo de novo, a montanha não podia esperar.

Analisando friamente nosso meio, diria que primeiro é necessário fazer capital, gerar meios e viabilizar o projeto, ou seja, sem patrocínio, você é quem vai gerar o capital para criar os meios e chegar a sua meta. Para fazer esse capital é preciso investir em si mesmo. Estudar, se especializar e ir cada vez mais fundo no que você é melhor. Neste caso, a montanha pode esperar um pouco. É necessário sermos melhores a cada novo dia, a cada nova semana, a cada novo mês e a cada novo ano.

Continuemos planejando nossas viagens em nossos escritórios durante uma demanda e outra. Seremos sempre o centro das atenções ao comentar com alguém do trabalho sobre nossas peripécias de feriado, férias e fim de semana. Seremos chamados de loucos e irresponsáveis pelos amigos que só pensam na cerveja gelada e no futebol do fim de semana. Sempre seremos sonhadores e esquisitos por achar que diversão é esfolar o dedo na rocha e dormir mal em uma barraca com a temperatura abaixo de zero. Difícil fazer toda essa gente entender que a montanha não pode esperar.

Força sempre e boas escaladas!
Atila Barros

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Sobre o autor

Atila Barros nasceu no Rio de Janeiro, e vive em Minas Gerais, cidade que adotou como sua casa. Escalador (Montanhista) há 12 anos, é apaixonado pelo esporte outdoor. Ele mantem o portal Rocha e Gelo (www.montanha.bio.br)

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