As Sete Quedas de Mairiporã

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Durante minha primeira visita a Mairiporã, município paulista distante 30km da capital, uma placa com um interessante “ícone de cachu” indicando uma tal Sete Quedas instigou minha curiosidade a ponto de saber do q se tratava. Contudo, a escassez de tempo naquele bate-volta impediu minha ida à cachu e portanto deixei proutra ocasião. Pois bem, estes dias estando à toa (e sem idéia melhor) resolvi fugir um pouco do pólo Mogi-Paranapiacaba e fui lá conferir a dita cuja – tb conhecida como “Cascatinha” – às cegas, ou seja, sem qq informação. Pois bem, antes tivesse pesquisado mais no Google a respeito daquele atrativo local, pois o bate-volta resultou num programa urbanóide demais – e frustrante, por assim dizer – onde a viagem e os detalhes da mesma foram mto mais interessantes q o destino em si.

O busão pra Mairiporã é o “Linha 042 – Divisa São Paulo” e é facilmente tomado no Terminal Tietê, do lado de fora, e circula de meia em meia hr. Lá, eu e a Lau (em visita à Sampa) encaramos uma looonga viagem onde até deu pra cochilar, diga-se de passagem. Emoldurado pela janela do latão, nos poucos momentos de vigília acompanhamos a mudança gradual da paisagem a nossa volta, pontilhada pelos tons acizentados da Zona Norte, pra depois da Fernão Dias os mesmos tenderem pro esmeralda escuro dominante da Serra da Cantareira. O dia amanhecera nublado-claro mas sem perspectiva de chuva, condição q perduraria até o comecinho da noite.

Saltamos, enfim, na rodoviária de Mairiporã as 11:45hrs, horário até q tardio porém suficiente pro programa proposto. Imediatamente fomos em direção à Fernão Dias (BR-381), onde uma placa laconicamente indicava nosso destino, ainda 8km distante dali. Não tem erro, basta acompanhar a sinalização.

Após a rotatória – marcada por um enorme totem vertical com o nome da cidade apontando pro céu – tomamos uma via paralela à Fernão Dias, conhecida por Estrada do Rio Acima, e q acompanha o tempo td o manso Rio Juqueri, sentido nordeste. A partir dali é so tocar reto apreciando o panorama em volta, na segurança do acostamento do asfalto ou por eventuais “trilhas” no gramado do mesmo. E claro, sempre sendo observados pelo respeitável Pico Olho Dágua – tb conhecido como Morro do Juquery –  q ladeamos a distancia.

Pois bem, o inicio é relativamente entediante, passando pelo último comercio, residências da cidade, pra enfim colocar literalmente o pé-na-estrada, mas não sem antes atentar pros atrativos de uma casa forrozeira (“Toni Davi & Adriana”). Eventualmente surgem bifurcações ou cruzamentos mas basta sempre se manter na principal, acompanhando o rio pela margem direita. Em caso de dúvida – se é q ela existe –  há sempre alguém circulando de bike, mas q pode fornecer informações desencontradas no quesito distancia, q foi nosso caso. Perguntei, impaciente, pra três pessoas no caminho o qto faltava pra tal “Cascatinha”, sempre recebendo respostas inflacionadas ou superfaturadas, q variavam desde 10 a 20km, sendo q na carta não era nada disso. Mas como a idéia era caminhar e tínhamos o dia td, q assim fosse.

Em menos de meia hora de pernada o verde exuberante, enfim, dá as caras à nossa volta. Uma rústica ponte de concreto é cruzada sobre um pequeno afluente do Rio Juquery, onde alguns locais arriscam a sorte em pescar alguma coisa, seja la o q for q deva perambular submerso naquelas águas calmas e meio turvas. Mas a caminhada prossegue tranqüila e desimpedida, apenas atentando aos veículos em alta velocidade q passam quase arrancando tinta da gente, sentido contrário, justificando a enorme presença de cruzes na beirada do acostamento ao longo de td percurso.
 
A estrada sinuosa prossegue serpenteando pequenos morrotes reflorestados, e a pernada prossegue tranqüila no mesmo compasso anterior, felizmente sem desnível algum. A vida animal aqui se reflete escancaradamente, seja beijando o asfalto na forma de várias cobras atropeladas, como num enorme calangão fugidio se embrenhando colericamente no capinzal, provavelmente amaldiçoando os intrusos q interromperam seu banho de sol. Pontilhões surgem perpendicularmente ao rio durante td jornada, permitindo trânsito de uma margem a outra; uns largos e de concreto pra pasagem de veículos, e outros estreitos e metálicos, unicamente pra pedestres. O som reinante é um misto único dos veículos rasgando a estrada, do vento soprando no arvoredo em volta, das corredeiras mais agitadas e eventualmente de crianças brincando animadamente no leito raso do rio, aproveitando o calor daquele inicio de tarde.

No caminho tropeçamos com duas barragens de porte médio, onde o manso e calmo rio ganhava um pouco mais de vigor e alguma vivacidade com altos rugidos de suas águas turbulentas. A segunda, por sinal, era generosamente beneficiada por uma bonita, agradável e oportuna área gramada em volta, cercada de amplo verde, q deve lotar de banhistas (e pq não campistas?) ávidos pelos bucólicos remansos q aqui o Juquery apresenta. O único porém fica por conta de um aviso lembrando do risco de afogamento e das macumbas deixadas aos montes descansando ao sopé das árvores, algumas até bem bonitas e q por pouco ficaram sem suas coloridas goiabas, reluzentes uvas e suculentos melões. Se batesse uma sede, tinha até uma garrafa de vinho q olhei com certa cobiça e q certamente iria  pro “santo gogó”.

Passamos por baixo de torres de alta tensão, cruzamos alguns sítios e chácaras perdidos e dispersos no meio da estrada, alem de vistosas placas assinalando pesqueiros aos montes pelas vias vicinais. Hora e meia de pernada transcorrida – e já com os calçados repletos de “carrapitchos” –  percebemos já não haver mais estrada alguma do outro lado do rio e sim uma bela e gde área reflorestada de pinnus e eucaliptos forrando as enormes colinas q aqui se elevam graciosamente a noroeste, tornando a paisagem algo mais interessante.

Logo adiante surge o primeiro gde desnível da jornada e, disfarçando um latente desanimo, observo demoradamente a estrada subir em linha reta um tantão. Ao sopé desta elevação percebo a minha direita um quiosque aparentemente desativado; e a esquerda uma ampla e agradavel área gramada pontilhada de árvores, porém cercada, onde uma placa nos avisa ser propriedade da Sabesp. Ao fundo dela, o véu alvo de uma pequena queda despencando suas águas revoltas do q claramente parecia ser outra represa chama minha atenção. Por mera curiosidade, pergunto pro guardinha o qto ainda faltava pra Sete Quedas e qual minha surpresa ele dizer ser ali mesmo! “O quê? Ali?”, pensei comigo mesmo, “Aquilo ali é Sete Quedas? A ´Cascatinha`, gde atrativo local, é essa cachu mixuruca com alguns patamares de concreto?”. Aff!

Pois é, Sete Quedas era uma barragem e não uma gde cachu, conforme imaginei. Na verdade era sim uma cachu, porém artificial. Didaticamente e com boa disposição, o guardinha contou q a barragem foi construída pra represar as águas do Juquery, escoadouro das águas que saem da barragem Atibainha, situada em Nazaré Paulista. O objetivo das Sete Quedas é puramente servir de degrau para q as águas possam vencer o desnível do terreno e por isso não dispõe de comportas nem outro sistema de controle de águas, tal qual como as outras duas pequenas (e simplórias) represas avistadas no caminho.

No final, as águas do Juqueri terminam desembocando na barragem Paulo de Paiva Castro e, juntamente com Atibainha, fornecem agua potável pra São Paulo, pertencendo assim ao Sistema Cantareira. Além disso, contou q o bucólico lugar em volta de Sete Quedas foi cercado e vetado ao público depois q uns “manés” morreram de forma irresponsável se aventurando subir nos patamares de concreto da queda. Pena, pois o lugar tem td pra ser explorado turisticamente ao menos como pto de contemplação ou de piquenique, uma vez q a área é pública, em tese. Nem isso agora pode e mto menos banhistas (q se concentram na margem esquerda, rio abaixo), tornando o sentimento de frustração e desapontamento em relação a pernada ate ali ainda maior.

Pois bem, pra não ficar chupando dedo apreciando a tal Sete Quedas de longe bem q tentei convencer o guardinha a nos deixar passar pra chegar mais perto, sem sucesso, claro. No entanto, nos deu a dica de seguir pela estrada, piramba acima, e tomar a primeira a esquerda, sentido Pque Jussara, q logo daríamos no alto da barragem. Dito e feito, foi o q fizemos, mas não sem antes nos despedir do simpático senhor, q não fazia questão de esconder o tédio de permanecer prostado ali naquela guarita erma, sozinho e sem ninguém pra conversar.

Uma vez no alto da represa tivemos somente outra perspectiva geral do lugar, tanto das águas revoltas e furiosas despencando Juqueri abaixo, contrastando com as do enorme espelho d´água, calmas e silenciosas, represadas num gde e belo lago artificial cercado de vegetação. Enfim, Sete Quedas era apenas isso aí, nada mais. Bandos de andorinhas tb freqüentam o lugar, cortando os céus a td momento, eventualmente dando rasantes no lago, completando o panorama ate então apenas bonitinho.

Não eram nem as 15hrs qdo decidimos retornar da nossa “grande e ousada trip”, desta vez tomando um coletivo (o circular “Rio Acima”) e não a pé, claro. De horários bem definidos, a espera do latão ainda nos deu o luxo de tomar uma cerveja no Bar do Erci, q ajudou tanto a tornar um pouco mais prazerosa e agradável aquela morrenta pernada, como pra aplacar (e afogar) o sentimento de  malogro daquela gde expectativa infelizmente não atendida.

De volta a Mairiporã fomos comer alguma coisa mas principalmente dar continuidade a bebedeira, desta vez num boteco próximo da rodoviária. Era o único q restava a fazer pra matar o tempo antes de retornar à Sampa, não? Ao menos lá nos divertimos mto com os causos do dono do muquifo, repleto de badulaques da Lusa, q disparava alfinetadas pra tds seus clientes, principalmente aqueles não-pagantes e aqueles q “pulavam a cerca”. O retorno no busão, logicamente, foi embalado no mundo dos sonhos. Era o melhor a fazer após aquele dia apenas razoável.

Pra quem tá habituado a programas selvagens na Serra do Mar – com farta vegetação, rios caudalosos e cachoeiras gigantes – , as Sete Quedas francamente deixam muito a desejar. Quiçá o turista comum e nada familiarizado com ambientes naturais possa se encantar com uma cachu artificial. Na verdade a trip pode ser melhor aproveitada na condição de “última opção”, e mesmo assim de carro. Ou melhor, de bike, pois a região está repleta de belos circuitos pelas estradas de chão q rasgam os reflorestamentos no entorno do Rio Juqueri, onde tb se pratica bóiacross. Próximo dali destacam-se ainda como ptos de algum interesse como a “Trilha da Ponte Amarela” e os pesqueiros Vale de Santo Ari e do Japonês, q podem ser emendados, uma vez q somente Sete Quedas nao justifica td o deslocamento até lá.

Mas enfim, lição aprendida. Da próxima vez devo conter mais meus impulsos e pesquisar mais sobre região a visitar. Mas se servir de consolo o dia não foi do td perdido, pois se não supriu nossas expectativas ao menos nos tirou da zona de conforto da cidade grande e cinzenta. Mesmo q com algum conforto, reiterando um velho e antigo ditado q diz: “O importante não é o destino e sim a viagem até ele”.

Texto e fotos de Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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