Cerro Arequita. Minas, Lavalleja-Uruguay

0

Conhecemos o Cerro Arequita, através do periódico Mountain Voices nº108, pelo relato do escalador Pedro Hauck que por lá esteve e deixou-nos a vontade de ir. Já nesta matéria Pedro falava de um lugar de ótimas escaladas, com muitos tetos e diversas possibilidades. Também relatava uma gritante falta de conhecimento técnico em termos de equipagem das rutas.


Por Gustavo T. Netto

Organizamos e fomos conhecer El Arequita, uma semana foi o tempo determinado. Na mochila ia certo o equipo de conquista! Na cabeça vontade de abrir uma bela via dentro do melhor estilo da escalada em livre e limpa.

A equipe: Gabriel Netto, Andréa Espiga e eu. A viagem foi perfeita, estrada boa, sem movimento, bem sinalizada. Chegamos ao Cerro Arequita à tardinha, com uma cena de por do sol chocante. Tudo como sempre é descobrir um pico alucinante de escalada. Muitas pedras! Muita via pra se aberta! Muitas FENDAS! Muitos TETOS! E sabendo que a rocha é riolito, estávamos eufóricos, já havíamos escalado riolito em Apiúna-SC, e é perfeita para escalar. Chegamos ao camping, perfeito. Bom local, luz elétrica, mesas, pequenas árvores, silêncio, banheiro bom e um banho quente surpreendente.

Primeiro dia saímos para conhecer, caminhamos em toda face de rocha que podíamos entrar, sim, que nos autorizavam. Pois quando começamos a perguntar como seria para escalar… Aí começaram os problemas. A princípio: No se puede escalar! Nos respondiam. Uns argumentavam que não queriam escaladas em suas propriedades, pois todas rochas estão em propriedade privada, outros diziam ser uma área de preservação, controlada pelo Ministério del Ganado, Caça y Pesca (MGAP) o que é verdade.

Descobrimos um fiscal del Ministério, que vive ali perto, fomos falar com ele, longa e agradável conversa com um senhor simpático e muito educado, que prontamente entrou em contato com os superiores responsáveis para autorizar-nos a escalar. Tal autorização veio 24 horas depois, junto com o tempo ruim, bem ruim! Frio e chuva intensa, quase abandonamos e voltamos. Mas ficamos para abrir uma via naquele lugar. Sobre a preservação do lugar, é imprescindível tal consciência. Há espécies endêmicas na superfície rochosa, há bosques de Ombues (Umbú) Phitolacca dioica, margeando as rochas. Um lugar para ser preservado mesmo! Mas, como todo povo de terceiro mundo, não possuem esta consciência, tiramos sacolas cheias de lixo, de todo tipo, de toda parte.

Dois dias de baixo de vento gelado e chuva, amanhecemos com 3 graus negativos, mas maravilhosa visão do céu azul! Pra rocha! Direto para onde anteriormente havíamos mirado.

Segundo problema: devido ao frio, as baterias da furadeira não funcionaram, descarregaram-se. Bastante irritante. Mas fomos aliviar as tensões escalando en el ”Cerro de los cuervos”, onde estão as tais vias ultra equipadas e que está em frente ao camping. Foi a salvação!

Escalamos pegando sol, olhávamos o brilho quente refletido nos campos cheios dágua, pois choveu muito mesmo, e realinhamos o astral. Sobre as vias: total aberração! Mal feitas, com paradas perigosas, até mesmo com correntes equalizadas a uns 150° de tração!!! Vimos vias com (acreditem!) 4 paradas uma em cima da outra. Ainda paradas com 4, 5, 6 chapeletas todas interligadas com correntes, malhas. Costuras a um metro uma da outra. Bolts e spits abandonados por todo lado.

O que menos pensaram ao fazerem estas vias foi em ética, segurança e preservação ambiental, notava-se um pouco de escalada. A pedra toda furada, pensamos que poderia ser pela rocha não muito segura naquele cerro, que apresentava superfície bastante intemperizada, mas nada demais, portanto queriam reduzir o tamanho das quedas, ou ainda, como vimos no site dos hermanos que abriram as vias, que eles trabalham com crianças portadoras de síndrome de down, por estes motivos entendemos a super equipagem e poluição da rocha, mas ainda haviam traços de total falta de conhecimento. Bom, concluímos: O Uruguay não tem rocha, não tem montanha, não há tradição de escalada, é aceitável eles não terem acesso a informação, quererem escalar e fazer qualquer coisa! E começamos a perceber que realmente tem de se proibir a escalada mesmo naquele lugar! Pois com essa visão de “escalada” não resta dúvida que escalada é muito impactante.

Dia seguinte, conquista. Agora sim, conquistamos uma bela linha de 15 metros 7º, batizamos de “La Diplomacia”, pela intensa atividade diplomática, para conseguir escalar naquele lugar, principalmente da Andréa que habla fluentemente o espanhol. Linda via mesmo 5 costuras e parada, sem quebrar nem um cristalzinho, rocha perfeita na linha da via! Já estávamos em plena faceirisse. Mas, ainda há muita pedra.

Alvo número dois: Um pico isolado,que só se pode subir escalando, e é claro virgem! Esta sim fez a cabeça, dois dias de conquista numa rocha alucinante, agarras duras e distintas, quanto mais alto mais buracos, bidedos, tridedos e pinças perfeitas. A escalada foi só realização. E chegamos àquele pico virgem num dia completamente limpo. Abrimos então a “Que Cosa Bárbara” 30 metros 8a, 8 costuras.

Felicidade total! Vimos que o Arequita possui rocha perfeita para escalar, propicia vias de alto nível! Salvo em alguns pontos que facilmente percebe-se rocha ruim. E o Cerro de los cuervos, onde estão as vias da galera de lá, é a pior rocha, que já é boa! Arequita é um pico alucinante para vias esportivas e clássicas. Ficamos muito satisfeitos, mesmo com estes dois problemas que enfrentamos: proibição para escalar e tempo ruim, que tomou muito tempo.

Mesmo assim fomos embora querendo voltar lá para abrir outras linhas que já planejamos. Também na saideira conhecemos o uruguaio que abriu grande parte das vias lá, cara muito legal bem educado. Confirmados os motivos das vias porcalhentas: Trabalho com crianças e falta de experiência. Também ele não demonstrou muito interesse em aprender coisas novas, pois viajou bastante pelo mundo para escalar! Inclusive reclamou da reportagem que ele mesmo leu no Mountain Voices, falando que as vias eram super equipadas. Bueno! Tratamos de agradecer, elogiar, trocar e-mails e nos prontificamos a mandar os croquis das duas vias que abrimos lá, por cordialidade, respeito aos locais e querer incentivar as escaladas.

Um mês depois, em casa, recebemos e-mail, do cara esse que abre via lá. Problema número 3: O cara foi repetir nossa via, a “La Diplomacia” e resolveu bater mais uma parada! Segundo ele porque ficou melhor posicionada. Houle!! Parece que o cara não sabe escalar sem uma furadeira. Mandou fotos para mostrar que havia aberto uma “variante” e que a parada ficou melhor pra rapelar. Pelas fotos vimos que não se trata de variante alguma, mexeu na via mesmo. E ainda deu nome pra isso, batizou a “variante” de “Diplomacia Rioplatense”! É incrível mais os caras lá vivem noutro planeta, um mundo isolado baseado em suas vontades e nada mais, não importando o lugar onde passam nem o trabalho alheio.

Bom quem quiser ir lá! E enfrentar essa treta toda… Estamos dispostos a dar informações, pois acreditamos que assim poderá haver uma troca de informações e que o esporte entre na linha por lá. Não esqueçam que é permitido escalar apenas nos cerro de los cuervos, onde estão as vias quase ferratas. No Arequita é proibido! E precisa autorização verbal do Senhor Ruben Perera. Depois disso, se autorizado, abram lindas e limpas vias! Por favor! Pois contribuirão para uma formação ética local, algo mais lógico, coerente, preservacionista e moderno.

Há uma espécie de cravos da rocha, endêmico. Atenção neste caso! Fácil perceber crescem em pequenos grupos, agregados. Desenvolvem um talo, ficando pendurados no vazio. Há linhas onde não há estes cravos, como as duas que abrimos.

Gustavo T. Netto, escalador do Rio Grande do Sul escreve o Blog: Escaladas en Sur

Compartilhar

Deixe seu comentário