Família de escaladores pela América do Sul – Final

0

Acordei no dia 13 sentindo dor no ombro direito e achei que o dia de escalada estaria prejudicado, mas eu não podia desanimar, não no meu provável último dia de climbing na gringa. Com o sol e o calor logo o Léo e o Luca se levantaram também, preparamos nosso café da manhã na mesa mais próxima e enquanto comíamos iam chegando pessoas. Percebemos que o dono do camping não estava de brincadeira quando disse que todos os espaços estavam reservados, como em Cajón del Maipo haviam famílias interas, de avós a netos ou até mesmo grupos de “melhor” idade, e todos se divertiam.

 
Como ainda era cedo decidimos oferecer uma manhã de lazer para o Luca, que não fosse a escalada, e ele aproveitou a piscina se entrosando com a molecada local. Ao meio dia vencia nossa diária, deixamos o camping e seguimos para Sierra de Los Padres.
 
Por causa do reconhecimento do dia anterior, já tínhamos uma idéia do que iríamos fazer neste dia, mas nossos planos falharam assim que chegamos… Havia uma destas famílias de 3 gerações fazendo pic nic na sombra embaixo do negativo do bloco que queríamos escalar, mas tudo bem haviam muuuitos outros blocos ANIMAIS, mais tarde voltaríamos neste.
 
Escolhemos um lugarzinho para almoçar um lanche enquanto discutíamos onde iríamos escalar primeiro, como todos os boulders eram de muuuita qualidade, não foi difícil encontrar algum bloco que agradasse a todos. Eu e o Léo passamos a tarde nos divertindo muitos nos negativos com tetos mais variados, enquanto o Luca brincava à nossa volta com tudo o que aparecia na mão dele.  A dor no ombro me limitou um pouco, mas não deixei de aproveitar cada momento. Como no dia anterior, os negativos com teto e domínio foram prioridade, começamos com alguns agarrões. Depois disso o Léo encontrou o boulder eleito por ele como um dos MELHORES de toda a viagem, para poupar meu ombro eu não entrei neste, não sei de sua qualidade, mas com certeza foi a formação mais estranha que eu encontrei na vida. Um negativo com um teto que parecia ter uma meia dúzia de gordas estalactites, não foi fácil desvendar esta complexa “matemática” boulderística.
 
Em meio às tentativas do Léo eu acabei indo para o bloco onde ainda estava a família fazendo pic nic e acabei tentando uma travessia na lateral do bloco, mas meu ombro deu sinal de vida e eu abandonei a cadena. O Léo também entrou no mesmo bloco em um outro boulder que saia quase em um teto finalizando com o domínio, depois disso voltamos no boulder das estalactites para a cadena do Léo. Já estava começando a escurecer, o Léo ficou com dó de mim pelo ombro zoado e então decidimos terminar nosso climbing entrando em uns verticais. Enquanto escalávamos chegou na praça um grupo com uma Brasileira que, depois de alguma conversa, insistia que tínhamos que conhecer as praias de Mar Del Plata, achei engraçado ela ficar inconformada com o nosso desinteresse por este ponto turístico.
 
Boulders finalizados fomos em uma outra churrascaria ao lado da que havíamos almoçado no dia anterior, a decoração medieval nos chamou muito a atenção, mas apesar de serem 6h, eles ainda não estavam servindo e tivemos que sair para procurar outro lugar para comer, estávamos com fome.
 
Descendo a estradinha da Sierra não encontramos restaurantes abertos, só quando já estava perto das 7h um dos restaurantes nos deixou esperar sentados em uma de suas mesas enquanto não abria. Pedimos uma pajilha novamente, mas desta vez ela veio cheio de miúdos e o Léo não gostou, mas era a janta que tínhamos, era hora de tocar viagem. Saindo de Sierra de Los Padres pegamos estrada para Buenos Aires com o êxtase de tudo o que tínhamos vivido nestas nossas férias, mas ainda assim o cansaço não nos deixou ir muito longe, depois de 200Km rodados paramos na cidade de Dolores para dormir.
 
A cidade era cheia de motoqueiros, não os malucos de São Paulo, eram apenas adolescentes na madrugada, e na procura por hotéis acabamos nos deparando com uma cena engraçada… na frente de um posto de combustível dois motoqueiros brigavam enquanto os frentistas observavam, e quando chegamos mais perto eles simplesmente se separaram, foram para suas motos e saíram cada um para um lado. Paramos no posto, pegamos algumas indicações de “hotéis” e depois de rodar um pouco encontramos acomodações das mais variadas. Acabamos decidindo por um hotel em uma praça central que tinha um bom custo x benefício. Já era madrugada quando tomamos banho e fomos dormir.
 
O café da manhã do dia 14 foi na companhia de um cavaleiro medieval. Agora a viagem estava de fato chegando ao fim, o objetivo agora era voltar ao mais rápido possível para dar tempo de ver a família antes de voltar para Natal (no dia 19/01/2013),  apesar disso eu só conseguia pensar em tudo o que tinha vivido, a conversa no carro girou em torno dos Andes, das paisagens e dos boulders.
 
Na estrada para Buenos Aires encontramos um lugar convidativo para um pic nic, saímos da estrada e logo estávamos cercados de árvores com formatos dos mais variados e grama por todo o chão. Apesar de agradável e bonito, achamos o lugar um pouco sujo, decidimos não parar para comer por ali e acabamos almoçando pelo carro mesmo.  Passando por Buenos Aires a cidade me impressionou, grande e bonita parecia muito agradável também, mas não tivemos tempo de parar para conhecer. Procuramos pelo porto de onde saia a balsa para o Uruguai, era o dia do aniversário do Léo e tínhamos pensado em aproveitar a data em um passeio diferente, mas a travessia custava aproximadamente R$500,00 no total (carro e mais 3 pessoas) e não estávamos dispostos a gastar essa grana na travessia.
 
Depois de rodar uns 400Km a mais, chegamos em Concórdia, na província Entre Rios, já era hora de janta e resolvemos comemorar o aniversário do Léo. Tivemos alguma dificuldade de encontrar um lugar para comer, mas por fim encontramos uma simpática pizzaria que servia a pizza não apenas dentro do estabelecimento como também do outro lado da rua, em uma agradável praça. E enquanto esperávamos a pizza, nenhuma surpresa… mais uma apresentação teatral do Luca.
 
Saindo de Concórdia nossos cartões já estavam sem fundo, estávamos com o dinheiro contado para chegar ao Brasil sem precisar fazer muita troca de moedas, quando poderíamos voltar a usar nossos cartões de débito. Alguns quilômetros a frente de Concórdia precisamos abastecer o carro e paramos em um posto de combustível. Paramos na bomba e ficamos no carro enquanto o frentista colocava gasolina no carro. Com o carro já abastecido nos lembramos que estávamos com pouca água e ligamos o carro apenas para tirar da bomba e estacionar na conveniência do mesmo posto. Para nossa surpresa o ponteiro do combustível não saiu… chamamos o frentista e… conversamos, gritamos, xingamos, fizemos de tudo, enquanto o frentista garantia que havia colocado o combustível. Foi a maior confusão, não tínhamos mais dinheiro e não havia combustível suficiente para chegarmos muito longe, talvez nem ao próximo posto.
 
Depois de muuuita discussão o frentista chegou a propor para aguardarmos no posto até amanhecer, quando chegaria uma pessoa que poderia medir a quantidade de combustível no tanque.  Pensamos muito e, depois de mais ou menos uma hora, decidimos arriscar chegar na próxima cidade e ver o que fazer mas… depois de alguns poucos quilômetros o ponteiro do combustível começou a subir. Voltamos ao posto e com uma PUTA vergonha pedimos mil desculpas para o frentista, o carro tinha nos pregado uma peça. Chegamos a Uruguaiana às 3:30hs da madrugada, paramos em um hotel qualquer e fomos dormir com a depressiva cultura hoteleira Brasileria, colchões podres em hotéis baratos.
 
15/01 – Uruguaiana – SP
 
Dia 15/01 acordamos tarde em Uruguaiana e saímos para comer alguma coisa e procurar uma Chevrolet, estávamos no Brasil , agora tudo seria mais fácil, nosso quintal, nossa cultura. Ligando para a Porto Seguro pegamos o endereço de uma autorizada e fomos direto para lá, no caminho passamos por uma gigante praça com um grande parque infantil, a loja estava fechada mas estava para abrir e esperamos almoçando em um posto de gasolina do outro lado da rua.
 
Enquanto comíamos a loja abriu e logo fomos para lá, depois de tudo explicado (carro da minha sogra com vidro quebrado na Argentina) e a documentação conferida, deixamos o carro para a troca do vidro. Como íamos ter que esperar fomos dar uma voltinha e conferir o parque infantil que ficava bem perto, o carro levaria 3h para ficar pronto.
 
O Luca se divertiu um pouco no parque mas logo ficou com vontade de fazer xixi, como a rodoviária ficava perto eu fui levá-lo no banheiro enquanto o Léo tirava um cochilo no banco da praça. Depois do banheiro fomos ao comércio local ver se encontrávamos um presentinho qualquer para o Luca dar ao Léo, havia sido aniversário dele no dia anterior e a comemoração tinha sido fraca, na idade do Luca estas coisas são importantes. Rodamos um pouco, mas não encontramos nada que pudesse agradar ao aniversariante, aproveitei para trocar nossos últimos pesos e voltamos para a praça.
 
Na volta o Léo já estava preocupado com a gente e chegou a ligar antes de o encontrarmos. Voltamos à loja e… não ia rolar trocar o vidro do carro por lá, eles só tinham um modelo de vidro menor que o nosso. Só fiquei irritada pelo fato de eles não terem se preocupado em ligar para avisar, era mais um atraso em nossa viagem. Saímos de Uruguaiana às 4h da tarde com a idéia de parar em Laguna, perto de Florianópolis, e dar uma descansada antes de terminar nossa trip.
 
Agora era voltar “correndo” e para passar o tempo conforme nos afastamos da fronteira lançamos uma brincadeira, contar a quantidade de carros “gringos x Brasileiros” que encontrávamos em estradas Brasileiras, quando um deles chegava a 10 zerávamos o “placar” e recomeçávamos a contagem. O dia passou com a gente admirando as “nossas” paisagens, um pouco diferente, mas o Brasil também tem suas belas paisagens, a estrada agora não tinha acostamento, mas o gramado ao lado da estrada era do mesmo verde das estradas gringas, as “montanhas” eram bem mais modestas mas também belas e o pôr do sol continuava dando seu espetáculo em meio à natureza.
 
Não conseguimos chegar a Porto Alegre para a janta e acabamos comendo em um posto de estrada uns 150Km antes, entrando no restaurante pudemos conferir que  ainda haviam muitos gringos por lá. O Léo pediu uma picanha e se deliciando com cada pequeno pedaço de Picanha que colocava na boca, enquanto eu comida um frango e o Luca aproveitava das duas carnes, sem se importar muito com nada, sem nem perceber as diferenças culinárias locais.
Saímos do restaurante e… pegamos estrada novamente.
 
O dia 16/01 chegou com o Léo no volante, chegamos perto de Laguna por volta das 4h da manhã e depois de conversarmos, resolvemos tocar direto para São Paulo, assim eu e o Luca teríamos 2 dias inteiros para tentar ver família e amigos antes de voltar para Natal, o Léo ainda ficaria mais uma semana por lá. 
 
O Léo me passou o volante e enquanto a galera dormia no carro eu ouvia uma música pensando nas excelentes férias que tivemos, cheguei a me perguntar se a Nisha (minha pacata filha) não teria preferido ir com a gente nessa viagem, mesmo passando por todo o perrengue que ela tanto odeia. 
 
Um pouco antes de Curitiba, lá pelas 7h da manhã o tempo virou e o Léo acordou em meio a uma forte neblina, a excitação da viagem foi baixando e, aos poucos, foi dando lugar à nostalgia. A alimentação ficou por conta de lanches no carro e uma parada às 10h em um Graal pelo meio do caminho e… dá-lhe estrada.
 
A volta foi saudosa e nostálgica, mas a chegada a São Paulo foi dicotômica, ao mesmo tempo que eu estava feliz em poder ver família e amigos, fiquei também melancólica, conforme São Paulo se aproximava eu tinha a sensação de que ia perdendo partes minhas pelo caminho.
 
Na chegada a São Paulo, lá pelas 4h da tarde, estávamos EXAUSTOS, mas ainda tivemos forças para passar e comprar um pastelzinho para comer de lanche com minha querida sogra que, emprestando seu carro para a gente “destruir”, nos deu a oportunidade de realizar esta viagem que vai ficar marcada para sempre em nossas vidas. 
 
O melhor destas férias foi abrir os nossos olhos à coisas que nos passavam invisíveis pela cultura e rotina instalada em nossas vidas. O jardim do vizinho é muito lindo sim, mas seu gramado não é mais verde, sua cultura abre nossas mentes para enxergar além de nossa própria cultura, mas o contrário também é verdadeiro.
 
De volta à vida cotidiana, mesmo de olhos mais abertos, já estamos sonhando com a nossa próxima climbing trip, repleta de grandes experiências culturais. Até lá… vamos tendo nossas conquistas por aqui mesmo.
 
 
Compartilhar

Sobre o autor

Deixe seu comentário