Frustração na reabertura do Parque do Monge

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A forma como uma das mais importantes unidades paranaenses de conservação foi reaberta ao público indignou a população da histórica cidade da Lapa, a cerca de 60 km de Curitiba.


&nbsp,Por Revista Novo Ambiente
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O Plano de Manejo do Parque Estadual do Monge deveria matar três lenhadores com uma araucária só: extrair o pinus e o eucalipto que comprometem a biodiversidade da área de proteção, reativar, com infraestrutura adequada, a área de lazer e o caminho religioso da Gruta do Monge com dinheiro arrecadado com a venda da madeira dessas árvores, e, por fim, estudar e preservar a fauna e a flora nativas restantes, protegendo-as contra um faminto avanço urbano e agrícola.

OInstituto Ambiental do Paraná (IAP) se propôs, divulgando tanto nas reuniões do Conselho Consultivo quanto na imprensa, a realizar uma retirada ordenada de espécimes exóticos que arrecadaria o dinheiro necessário para revitalizar a mais importante área de lazer do município. A data marcada para a reabertura do parque com toda sua nova infraestrutura – que contaria com receptivo turístico, local para lazer, prédios administrativos, museu, alojamento para pesquisadores, entre outras benfeitorias – era fevereiro de 2010, quando se comemorou 50 anos da criação da unidade de preservação ambiental. A bandeira foi levantada pelo então governador Roberto Requião, que garantiu o cumprimento do prazo, o que não aconteceu.

Reabertura frustrante

Durante todo esse tempo, o parque ficou fechado ao público, porém, de todos os projetos exaustivamente apresentados, o único que andou de maneira rápida foi a extração e venda de madeira da unidade. Cinco meses depois do prazo previsto, o Parque do Monge foi finalmente reaberto à visitação, mas, na região onde antes havia uma área de lazer com churrasqueiras, só existem escombros das antigas lanchonetes, dos quais brotam ferros enferrujados que remetem a uma sensação de abandono. “Primeiro o IAP atrasa todas as datas e agora não tem previsão exata de quando as obras serão entregues.

De repente, sem nenhum comunicado aos lapeanos, o parque é reaberto nessas condições. É um absurdo! Diziam que tinha que ser fechado porque a estrutura que tinha era perigosa, no entanto foi reaberto e não existe nenhuma placa de alerta quanto aos perigos”, diz Célio Guimarães, vereador lapeano do PV, apontando para as ferragens onde antes havia um mirante – lugar que, hoje, oferece risco de queda de um penhasco ao menor descuido do visitante. O vereador, membro do Conselho Consultivo do Parque do Monge, acompanhou nossa equipe de reportagem durante uma visita à unidade.

Volnei Bisognin, que assumiu a presidência do IAP em maio deste ano, recebeu uma equipe da Revista Novo Ambiente para elucidar algumas dúvidas sobre a reabertura do parque. “Foi um pedido da comunidade da Lapa. Pessoas que tinham que cumprir promessas, porque, você sabe… promessa, a gente precisa cumprir. E isso estava causando um constrangimento muito grande ao poder público, porque, quando envolve religião, as pessoas têm que ser atendidas. Foi feito uma excepcionalidade, na verdade”, explica Bisognin. O presidente do IAP destaca que “as visitas estão limitadas àqueles que têm que pagar promessas, não ao público geral, e são monitoradas e acompanhadas, mesmo porque o parque está em obras”. No entanto, no dia 17 de junho, quando nossa reportagem foi se identificar no posto da Polícia Florestal que controla o acesso ao parque, nos foi apenas comunicado que o IAP havia reabrido o parque e que podíamos entrar desacompanhados.

Venda da madeira

Segundo o IAP, cerca de R$ 3,5 milhões serão arrecadados com a venda da madeira (até agora, R$ 2,1 milhões já foram depositados na conta da instituição e foram utilizados para outro fim), e o então secretário de estado do Meio Ambiente, Rasca Rodrigues, garantiu que todo o dinheiro seria usado em benefício do parque. “O conselho gestor está decepcionado, pois muitos representantes da comunidade participaram das reuniões e acreditaram nas promessas do IAP e da Secretaria do Meio Ambiente de que o parque iria ser fechado, mas quando reaberto iria contar com toda a infraestrutura. Passada esta data, com o argumento de atraso na retirada da madeira devido às chuvas, a nova promessa era de que o processo licitatório estaria pronto em meados de abril. Até agora não foi feito nada, o que esperar das promessas?”, aponta o vereador Célio Guimarães.

Uma fonte qualificada no assunto, que pede para não ser identificada para não sofrer represálias, trabalha em um setor ligado à área ambiental no município e conversou conosco. Ela questiona o valor pago pela madeira (segundo a fonte, a madeira retirada pode valer três vezes mais do que foi pago) e diz que caminhões carregados são vistos saindo do parque durante a noite. O que – pode não ser ilegal – é estranho, já que toda saída de madeira deve ser acompanhada por um funcionário do IAP (o Instituto não informou se tem funcionários trabalhando durante à noite na fiscalização).
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Há muita fé que o dinheiro volte, porque a Lapa é uma terra de fé, mas a sensação geral é de engodo, afinal, o parque é de gestão compartilhada entre o município e o estado – este, o único que recebeu o dinheiro da madeira vendida até agora e não cumpriu nenhuma das metas nos prazos estabelecidos, a não ser a retirada das árvores. A população está há mais de um ano sem poder acessar o parque. Os romeiros que vêm de todas as partes do Brasil podem pagar suas promessas só agora, e sem nenhuma infraestrutura. “Estamos com todas as verbas liberadas no orçamento. Vamos investir mais de R$ 3,5 milhões só com as desapropriações. No total, será quase o dobro deste valor”, aponta o presidente do IAP, Volnei Bisognin, que garante: “Houve um atraso no orçamento, mas dá para dizer que em oito meses, no máximo, tudo estará concluído.” Como diz o próprio Volnei: “Promessa, a gente precisa cumprir.”

Infraestrutura

Os restaurantes e banheiros do Parque do Monge foram derrubados. O famoso mirante foi retirado, e as áreas de lazer que antigamente ficavam ali, com churrasqueiras, também foram abaixo. “Aquele espaço era utilizado de forma muito ruim, com esgotamento irregular. Queremos transformar o parque em uma área legal, mas é um processo demorado onde existem muitas instituições envolvidas”, informa Odete Maria Carpenezzi, coordenadora do Programa de Espécies Exóticas do IAP. Já Maria do Rocio Lacerda Rocha, engenheira florestal do IAP que conduziu o processo de manejo do Parque há até poucos meses, avalia: “A comunidade não tem a percepção desta unidade. Eles queriam ir lá para fazer churrasco, tomar cerveja, que são atividades interessantes, mas não ali.”

É necessário extrair as invasoras?
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Sim. As espécies invasoras exóticas são indivíduos não nativos e que geralmente comprometem a biodiversidade de um local, precisando ser extraídas. Afinal, fauna e flora devem estar em equilíbrio. Em 2008, o IAP iniciou três frentes determinadas pelo Plano de Manejo do Parque do Monge: uma para extrair as exóticas, outra para construir infraestrutura para visitantes e seguidores do Monge e uma terceira para recuperar o raro bioma altomontano.
Registramos em fotos muitas árvores derrubadas, de tamanhos variados, que não eram exóticas. Dezenas de xaxins, espécie que está na lista de extinção do Ibama, foram arrancados pelas rodas dos tratores, cujos sulcos chegam a meio metro na terra arenosa. Curiosamente, o IAP avaliou como preocupante o impacto dos pneus das mountain bikes que utilizavam algumas trilhas e estradas do parque antes do manejo.

A rebrota, que evidentemente deveria ter sido calculada, parece uma surpresa para o Instituto: ao lado de cada tronco de pinus arrancado, dezenas de outros pés brotam, alguns já atingem quase dois metros. Foram beneficiados pelo sol abundante e a falta de concorrência das maiores que foram arrancadas. Se uma ação rápida não for tomada para contê-los, o plano de erradicação terá servido para desencadear uma explosão populacional de invasoras no Parque do Monge, exatamente o contrário de seu objetivo.

Mas o alerta para este tipo de desastre ambiental já foi apontado no próprio texto do Programa Estadual de Erradicação de Espécies Exóticas Invasoras: “É importante reconhecer que o controle físico por si não funciona com espécies que rebrotam e que os esforços para manter o controle físico em médio prazo são em geral insustentáveis porque são caros e requerem persistência de muitos anos. Para evitar fracassos e maus exemplos, não se recomenda iniciar o controle de invasoras sem adotar métodos adequados que tragam viabilidade de sucesso seja para contenção, controle ou erradicação”, aparece escrito no documento elaborado pelo IAP.

Na ata número 10 do Conselho Consultivo do Monge, de 4 de fevereiro de 2010, é apontada a postura do Instituto Ambiental do Paraná sobre a rebrota: “Foi levantado a questão da reinfestação do pinus na área de conservação e no entorno. Deve-se observar por um ano para ver a regeneração e a descontaminação do pinus e se a regeneração nativa deve ser feita e sendo assim já está reservado 30 mil mudas do Programa Mata Ciliar para ajudar nesta regeneração”. Diante do óbvio, espera-se um ano assistindo ao pinus crescer.

A fuga dos bichos

Capivaras, veados, preás e bugios costumavam ser abundantes no parque. Suçuaranas já foram avistadas bem próximas de áreas frequentadas por visitantes. Mas ali onde as árvores exóticas e nativas menores foram arrancadas, naqueles clarões onde a terra ressequida e arenosa estorrica sob o sol, um silêncio mortal que talvez nunca tenha sido ouvido naqueles pedaços de terra: a falta do canto dos pássaros, que, junto com os outros animais, fugiram.

Os registros na violenta alteração do ecossistema apontam animais avançando sobre as casas e, inevitavelmente, causando muitas baixas à biodiversidade do local. “De cima é que se vê o tamanho do estrago causado pela extração, muitos pedaços da mata viraram pequenas ilhas”, diz Robson Franini, o “Pikeno”, que alça voos de parapente no parque quase diariamente, há dez anos. O Monge, por seu cenário paradisíaco, é um raro local de contemplação, com um pôr do sol frontal magnífico, porém os animais sumiram dessa fotografia. “O fluxo de aves, que antes cortavam essas escarpas, de diversas espécies, desapareceu por completo. Não se vê mais a dança colorida dos insetos polinizadores”, lamenta Robson.

Durante uma reunião do Conselho Consultivo, uma moradora da vizinhança do parque relatou que um bugio teria fugido para sua casa em função do barulho das máquinas pesadas e queda de árvores. O animal, em pânico, foi atacado pelos cães da moradora. Morcegos das grutas que rasgam o maravilhoso paredão saíram de suas casas milenares e foram parar no teto das casas vizinhas. O IAP, inclusive, ministrou oficinas para a comunidade para ensiná-la a lidar com o caso. O mesmo IAP disse, na ocasião, que não havia necessidade de acompanhamento veterinário durante a extração de centenas de toneladas de madeira de árvores, onde sabidamente alguns pássaros possuem ninhos, como os exóticos e barulhentos guaxos. “Antes eu via muito bugio, veado, capivara. Sumiu tudo!”, conta Creusa Faria, moradora de uma chácara em área limítrofe ao parque. “Existem implicações como barulho, arraste, serras. Toda extração florestal tem um nível de poluição. É natural que os animais venham a procurar abrigos em outros lugares. Isso é normal em qualquer exploração florestal. Mas o objetivo é justamente criar um ambiente para que os animais voltem e ali permaneçam”, explica o presidente do IAP.

Um alto preço à biodiversidade

As coordenadoras do projeto dizem que não existiu um estudo razoável em que se pudesse prever para onde os animais fugidios iriam, nem qual será o impacto que isso trará para um dos últimos remanescentes da rara floresta ombrófila mista altomontana. O parque tem cerca de 300 hectares, sendo que 89 deles estão em processo de extração. “A biodiversidade do Parque do Monge foi estudada, mas não profundamente. É realmente uma região altomontana muito frágil, mas identificamos que os pinus, além de estarem comprometendo a biodiversidade, estão em fase de declínio, pois já têm mais de 50 anos”, diz Maria do Rocio, justificando a pressa na erradicação das espécies exóticas invasoras. No entanto, o vereador Célio Guimarães, que desde o início acompanha e trabalha pelo sucesso do manejo, questiona: “Por que não extrair em trechos menores e ir acompanhando a regeneração mais de perto? Será necessário um impacto tão grande para eliminar outro?”

Maria do Rocio explica que os efeitos dos impactos perdurarão nos próximos quinze anos e aponta que R$ 500 mil serão investidos em reflorestamento. “No dia 17 de julho, a licitação será aberta para este e outros projetos para o Monge”, completa.

Embora autoridades e representantes da Lapa tenham presenciado, durante a reunião do Conselho, relatos de moradores que tiveram suas casas invadidas por animais (inclusive insetos como formigas) – relatos esses feitos às próprias representantes do IAP –, eles não reconhecem que existe uma situação grave de perda de biodiversidade pela fuga dos animais.

Prática de escalada Esportiva no Parque

O Parque da Gruta do Monge apresenta uma das mais extraordinárias paredes de arenito do Estado do Paraná, mas a escalada é absolutamente proibida no local há cerca de 10 anos.

A medida foi tomada de maneira unilateral, sem consultar os praticantes de escalada na cidade. A desculpa foi a ausência de um plano de manejo que contemplasse a atividade e um estudo técnico que afirmou que o arenito não é uma rocha apropriada para esta atividade esportiva. A escalada em arenito, no entanto, é uma atividade já tradicional no Paraná e nunca houve um caso de acidente envolvendo a fragilidade dos arenitos.

O IAP, no entanto, não levou em consideração a demanda dos escaladores e para barrar a atividade no parque, eles arrancaram e entortaram as chapeletas e grampos das vias e quem for pego escalando no interior do parque será acusado de crime ambiental.

Veja mais:

Parque Estadual do Monge ficará fechado por um ano – AltaMontanha.com

Parque da Gruta do Monge continua fechado – AltaMontanha.com

Revista Novo Ambiente

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Texto publicado pela própria redação do Portal.

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