O salto da Fonte de Faxinal

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Distante cerca de 100km de Londrina e conhecida como a “Capital do Tomate”, a pacata Faxinal surpreende tb por ser repleto de belas cachoeiras, acessíveis por trilhas bastante fáceis. Com mais de 40 quedas catalogadas, todas com diferentes características mas q possuem a mesma beleza natural. Algumas (as menores) se encontram dentro do perímetro urbano e são de facílimo acesso. Já outras, as mais bonitas, estão mais distantes e se situam dentro de fazendas ou propriedades particulares. Ou quase todas. Como o Salto da Fonte, imponente queda de quase 70m com a qual tropeçamos quase q sem querer nesta breve e descompromissada visita à cidade.

“Arruma as coisas que vamos pra Faxinal! Já já a Josy vem nos buscar!”, dizia a Lau enqto me entregava a cargueira e ia jogando isto ou aquilo na minha direção. Sim, foi td decidido as pressas, em cima da hora mesmo naquele inicio de sábado. A ideia era curtir o fds nalguma cachoeira de Faxinal. Informação? Nenhuma. “A gente vai perguntando lá!”, ela disse. De qq forma a idéia me agradava e não ao mesmo tempo. Agradava por entrar numa roubada sem necessidade de organizar nada, indo simplesmente no vácuo dos outros. Mas me deixava com o pé atrás por sair na “porralouquice”, sem planejar ou colher info alguma previamente, algo q sempre me deu garantias de otimização da trip. Bem, de qq forma abracei o convite das meninas e me joguei no rolê, caindo totalmente de paraquedas no mesmo! E seja o que Deus quiser.
Não demorou nem coisa de hora e meia pra Josy e a Cacau nos pegar em casa, e assim rasgar o asfalto da PR-445 sempre pro sul, até deixar Londrina pra trás. Após Tamarana fizemos um pit-stop pra almoçar num simpático restaurante a beira de estrada, o “Mapy”, por volta das 13hr. Aquele dia começara meio incerto, mas no decorrer do período a nebulosidade dispersou-se exibindo brechas do céu azul pairando sobre a horizontalidade dos onipresentes campos de soja, trigo, milho e café a nossa volta.
Pois bem, de bucho cheio continuamos nossa jornada, agora tomando o entroncamento de acesso a PRT-272 e, sentido sudoeste, num piscar de olhos caímos na entrada da pacata Faxinal. Uma placa avisando da “Festa do Tomate” lembra aos incautos visitantes a vocação da cidade q, pequena e simpática, vive atualmente da agricultura e do comércio de varejo. Logo de cara paramos num posto de gasolina e perguntamos das famosas cachoeiras, pra ter como resposta: “Pergunta pra outra pessoa q eu não sou daqui tb!”. Mas logo adiante um senhor bem humilde nos mandou tomar uma via à esquerda e tocar sempre até o final, q lá haveria sinalização devida. Só esquecemos de perguntar pra qual cachoeira estávamos indo.
Enfim, e foi o q fizemos. Entramos numa empoeirada via de terra, chamada de “Estrada do Barreirinho” e tocamos pra leste, deixando a cidade pra trás. Passada uma antena de telefonia os campos novamente de abriram a nossa volta, exibindo as onipresentes estufas de tomate pipocando de ambos lados da precária via. Só depois percebi q nosso objetivo seria uma tal Cachu da Fonte, situada na fazenda do mesmo nome (por sua vez localizada no bairro rural da Bufadeira), e assim fomos avançando ao mesmo tempo q perguntávamos aos locais qdo surgiam dúvidas. Claro q sobrou pra este q vos agora escreve memorizar (e interpretar) cada palavra dita assim como guardar na cachola a descrição do caminho fornecida pelos locais, informação q às vezes se confrontava. Sinalização das cachus? Nenhuma.
Tocando sempre pro leste, começamos então a descer forte na direção dum vale bem fundo. A precária estrada levantou dúvidas se o carro daria conta do recado, mas a brava Josy mandou ver mesmo assim, pisando fundo nos trechos cascalhados onde o modesto veiculo sambou mais de uma vez. O fato é q uma vez chegando no q nos pareceu ser o local indicado, encostamos o carro a beira da estrada, do lado duma plantação recém-colhida. Enfim, era o fim de sacolejo no veiculo. Arruma isto e aquilo, mochilas nas costas e pronto.
Começamos a andar propriamente dito por volta das 16hr e, com pouco tempo de luz, teríamos q agilizar de modo a chegar nalgum pto decente pra acampar. Já logo de cara tomamos a direção errada prosseguindo pela precária estrada de terra, onde logo adiante um morador frisou nosso erro. Claro q tomei a dianteira das meninas, q tagarelavam disto ou aquilo, a procura de informações mais precisas. E pelas dicas do tiozinho nossa rota começava perpendicularmente de onde tínhamos deixado o veiculo. Ou seja, a tal Fazenda da Fonte eram umas casinhas q estavam a nossa esquerda do veiculo.
Retrocedemos e tomamos a via certa, indo de encontro ao vale q se afunilava a nossa frente no meio da abaulada morraria. Logo cruzamos uma porteira sem nenhuma sinalização, onde logo percebi estarmos invadindo propriedade particular. Outra vez fui na dianteira em busca de infos no casario principal. Um incrédulo rapaz confirmou ali ser de fato a Fazenda da Fonte mas q o acesso á queda se dava pelo outro lado do rio. Ótemo. E assim td ficou mais claro, ao menos pra mim. Ali fora construído um hotel fazenda q acabou não vingando, deixando em pé algumas estruturas ainda visíveis no caminho.
“Sigam-me!”, falei pras meninas, agora tomando a total liderança do rolê com mais convicção e segurança do nosso destino. Retrocedemos até a entrada da fazenda, onde tomamos outra via de terra q nascia dela, cruzava um pontilhão de madeira e acompanhava o supracitado rio pela esquerda. Depois, consultando a carta em casa, vi q aquele era o Córrego da Bufadeira (e q os locais daqui chamam de Córrego da Fonte,) isto é, aquele ali era o rio da queda. E sabendo disso a cachu deveria se encontrar apenas subindo o curso d’água. Pelas minhas estimativas a queda deveria se encontrar bem no final do vale, mais precisamente no vértice do fundo do desfiladeiro cavado pelo rio.
Acompanhamos a estrada até o final, onde a mata ciliar se misturava num reflorestamento de eucaliptos. Ali, discretamente havia uma trilha no meio do mato, e foi ela q tomamos até o final. A vereda acompanhava a rio ao largo de td sua extensão, ora próximo ora afastado, mas perfeitamente visível, óbvia e bem batida. No trecho inicial havia até uns banquinhos e uma escadinha de madeira td detonadas, provavelmente feitos pela fazenda, pois era intenção deles tornar aquela  “trilha-ecológica” atrativo pago. E assim fomos palmilhando aquela agradável vereda em meio a mata até desembocar num trecho descampado, onde duas imponentes araucárias guardavam a relva. “Será q é por aqui mesmo? Será que não tem q descer o rio?”, perguntou a Cacau, ainda não botando fé no meu farejo de trilha. “É sim!”, respondi, curto e grosso, encerrando o impasse. Simples assim.
A picada tinha continuidade logo adiante, numa outra entrada na mata, mas pelo horário avançado e do sol logo indo repousar atrás dos morros decidi encerrar ali nossa pernada daquele dia. Além disso, andar na mata no escuro tava fora de cogitação e aquele descampado servia perfeitamente pra montar acampamento. Dito e feito, as 17:30hr montamos nossas barracas naquele amplo capinzal de chão meio irregular, mas q vinha de encontro as nossas necessidades. Dureza foi encarar os sanguessugas alados, q endoideceram naquela penumbra. Como o rio tava próximo, aproveitei de dar um tchibum na hora q fui buscar água pra janta. Eita banho em boa hora!
Qdo a noite se debruçou naquele úmido vale e as estrelas coalharam o firmamento pusemos os fogareiros pra funcionar, e logo da panela brotou uma deliciosa macarronada a bolognhesa servida pra td mundo. O vinho argentino da Cacau e uma cerveja deste q vos fala  complementaram aquele banquete a luz das estrelas daquele bucólico rincão norte paranaense. Um par de pulguentos nos seguira da fazenda e seus olhinhos faiscavam na noite, na esperança de q teriam alguma coisa nossa pra forrar o estômago. Ledo engano, estávamos mais famintos q eles e não sobrou nada nem nas panelas. Na sequência, após muito blábláblá desabamos nas barracas e caímos no mundo dos sonhos, loucos pra encontrar a queda no dia sgte. A noite transcorreu fria porém serena, imersa num misto dos sons da mata e do hipnótico marulhar do rio bem do lado.
O domingo irrompeu limpo e promissor conforme previsto, e prontamente levantamos assim q os primeiros raios do Astro-Rei tocaram a barraca. O farto desjejum daquele dia foi  bem apreciado, com direito até café com chocolate e fatias de pão integral com Nutella. Sem pressa alguma, arrumamos as mochilas de ataque e deixamos as barracas nos aguardando. Afinal, aparentemente a queda não deveria estar muito distante e um bate-volta era mais q suficiente pra conhecê-la.
Nos pirulitamos trilha adentro por volta das 8:30hr, dando continuidade a caminhada do dia anterior, sempre acompanhando o rio pela margem esquerda. Bem batida, a picada não tem erro algum e sinuosamente mergulha vale adentro, em meio a verdejante mata ciliar. Eventuais cercas, túneis de bambus ou pequenos afluentes devem ser transpostos, mas nada q demande esforço sobre-humano e sim apenas uma agachada ou o chapinhar por pedras. O caminho tem pouco desnível, mas predominamente é o tempo td em nível, agradável e sossegado. A vegetação explode em exuberância, porte e tamanho, e enormes araucárias conseguem dividir o mesmo espaço de perobas e figueiras, enqto o chão se vê forrado de espécimes endêmicos de gravatás e vegetação rasteira.
A pernada se mantém nesse compasso até q um som trovejante se faz ouvir, sinal da proximidade da queda. Ao mesmo tempo o vale se afunila mais e mais, a trilha se estreita e passa a bordejar a íngreme encosta, a altura considerável do rio. O mato toma conta da vereda assim como a lama e alguns troncos, obstáculos fáceis de serem vencidos. Até q a vereda desce forte e desemboca no leito pedregoso do rio, onde temos o primeiro vislubre da queda! O caminho dali em diante é mais q intuitivo, bastando unicamente serpentear cautelosamente as pedras, desviando do barranco e dos poços. Alguns poucos trechos de escalaminhada são necessários mas são fáceis de serem vencidos, onde apenas a atenção é redobrada por conta do limo visguento da rocha, liso feito sabão.
E assim, após menos de 50min de pernada damos na base da maravilhosa Cachoeira da Fonte. Ali o Córrego da Bufadeira (ou da Fonte) despenca da altura de cerca de 70m pra formar um enorme e belo lago, pra depois seguir seu curso sinuoso vale afora. Os altos e enegrecidos paredões de basalto e arenito cercam a queda feito um enorme anfiteatro natureba, enqto a queda borrifa nossos rostos de forma prazerosa e refrescante. Local estreito, irregular e repleto de pedras, q diluiu imediatamente nossa ideia original de acampar ali, e cunhou de vez nossa (alias, minha) decisão de pernoitar no pastado hora antes. E ficamos ali um tempão descansando, clicando a queda e curtindo aquele pequeno paraiso do qual éramos os donos absolutos. Missão cumprida.
Voltamos pelo mesmo caminho, claro, sem pressa alguma e mais q satisfeitos. Ou quase. Faltava o tradicional tchibum antes de partir. Mas a bendita piscina natureba foi prontamente encontrada num belo remanso ao lado dum vistoso bambuzal. Ficamos nos regateando cerca de meia hora naquele recanto do Córrego da Fonte, além de mastigar o lanche das mochilas. Mas porque os locais chama o curso d’água de Fonte sendo q na carta aparece como Bufadeira? Pesquisando posteriormente descobri q recebe essa alcunha devido a uma igreja próxima, onde há uma nascente dentro da mesma, cujo suas águas tem poderes de curas milagrosas .Existe dentro da igreja um grande número de fotos, muletas e etc…de graças alcançadas pelos fiéis. Então tá.
Voltamos ás barracas pouco antes das 13:30hr com sol escaldante fritando nossos miolos, arrumamos as coisas e começamos o longo caminho de volta ao veiculo, q por sinal parecia um microondas de tão quente q tava. Dando as costas ao vale do Córrego da Fonte e ao bairro da Bufadeira, o veiculo subiu tropegamente a serra e uma vez em Faxinal fizemos um rápido pit-stop num boteco pra bebemorar nossa breve passagem pela cidade. Dali pra Londrina zarpamos imediatamente pois não desejávamos chegar demasiado tarde e muito menos pegar estrada a noite. De qq forma, aquela viagem “porralouca” e em cima da hora tinha mais q valido a pena. Sem dúvida.
Faxinal é uma cidadezinha cujo nome significa “campos abertos de matos curtos”, onde o relevo se mostra bem mais acidentado e abrupto q Londrina, daí a profusão de quedas e atrativos aquáticos. Contraforte oeste da Serra do Cadeado e sul do Marumbi, a cidade ainda tem o complexo de Cachus do Chicão, a Véu da Noiva e o Salto São Pedro, tds situadas em hotéis-fazenda, ideal pra “tigrada” local. Tem outras quedas menores no perímetro ao redor da cidade, além da concorrida Bufadeira do Cruzeiro, situada no cânion do mesmo nome. É possível uma visitação q contemple todos esses atrativos duma só vez, mas isso é algo q demanda disponibilidade de tempo. E claro, um planejamento prévio, embora sair na “porralouquice” tb não deixe de ter seu quinhão de imprevisibilidade e charme.
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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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