Preparação Física x Alta Montanha

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A preparação física para escalar uma alta montanha depende muito mais do comprometimento do indivíduo com seu treinamento do que do condicionamento físico inicial ou de modernos equipamentos de ginástica, afinal como me disse um grande, antigo e experiente amigo, guia de alta montanha: “Qualquer moleque pode subir uma alta montanha”.

O interesse das consequências fisiológicas de atividades físicas realizadas em locais de grande altitude se tornou popular depois dos Jogos Olímpicos de 1968, no México, a 2.240 metros do nível do mar e resistência do ar 30% menor.

Na época se questionava sobre os benefícios e malefícios da menor pressão e resistência do ar em atividades físicas em grandes altitudes. Durante os Jogos houve uma piora no desempenho dos atletas em provas de endurance, além de quebra de todos os recordes mundiais nas provas de velocidade, mas o feito mais impressionante ficou por conta do atleta norte-americano Robert Beamon do salto em distância. Beamon chegou aos Jogos como favorito ao ouro, o recorde mundial atual era de 8,35m e um recorde nunca havia sido quebrado por mais de 15cm de diferença, a marca de seu último salto em 8,90m (0,55cm a mais) não só quebrou o recorde mundial como deixou até mesmo o próprio atleta incrédulo de seu feito, merecendo atenção especial em episódio de Os Simpsons (episódio 14 da 12ª série). O atleta nunca mais chegou perto de tal marca, o recorde mundial só foi quebrado em 1995, mas o olímpico permanece até hoje.

Vista panorâmica da Cidade do México com os vulcões Iztaccihuatl e Popocatépetl

Tais fatos causaram enorme excitação na mente de curiosos e cientistas e pesquisas começaram a ser desenvolvidas nesta área. Com o conhecimento das mudanças fisiológicas que acontecem em grandes altitudes muitos esportes puderam crescer e se desenvolver, minimizando, consideravelmente, os riscos de morte e a escalada de alta montanha é um destes esportes.

A exposição a altitudes crescentes geram alterações fisiológicas onde algumas são nocivas à saúde, a estratégia de aclimatação (adaptação crônica do organismo ao ambiente) é essencial para a prevenção do Mal de Altitude e o processo depende de características pessoais como hereditariedade (genética), experiência (quanto maior experiência melhor adaptação) e nível de condicionamento físico (quanto melhor condicionado menor o esforço e o gasto energético na relação tempo/percurso). Mas vou deixar os assuntos de aclimatação e Mal de Altitude para especialistas da área, para os interessados o Alta Montanha tem dois excelentes artigos que falam sobre estes temas essenciais para uma escalada de alta montanha (Aclimatação de verdade e Mal de Altitude), o objetivo deste texto é orientar a respeito da preparação física pré-montanha.

Evitando o Mal de Altitude

Como em todo esporte o treinamento é essencial na diferença do fracasso ou sucesso de alcançar seus objetivos e deve iniciar o quanto antes, quanto pior condicionado mais tempo você vai precisar para se preparar. A identificação das características que determinam o esporte (tipo de atividade e exigências físicas) torna sua preparação mais específica e este é o primeiro passo para a melhor eficiência do treinamento. Recomendações para um tempo médio de preparação física em escalada de alta montanha giram em torno de um ano.

O aspecto psicológico pode ser seu maior inimigo ou seu maior aliado, as condições de clima, alimentação e desgaste físico fazem deste um fator forte e constantemente presente neste tipo de escalada. Uma análise correta de suas condições pessoais e o controle da ansiedade são itens indispensáveis na consciência e tomada de decisão, levando a consequências na condição de saúde e, consequentemente, ao fracasso ou sucesso da escalada. O treinamento psicológico se inicia com a preparação física, mas não termina no mesmo uma vez que não conseguimos simular uma atividade muito próxima da realidade da alta montanha.

Desafios psicológicos e emocionais de uma escalada em alta montanha

Quanto mais específico for o treinamento, melhor preparado você estará para os dias de “prova final”, quase a totalidade das pessoas não tem tempo para investir em treinamentos outdoor a grandes altitudes, mas uma vez que muitas adaptações orgânicas são crônicas e podemos contar com a aclimatação, podemos nos preocupar com treinamentos diários em ambientes próximos.

Os locais de prática dependem de disponibilidade, algumas opções são espaços como academia de ginástica, praças, parques, praias e, se necessário, até mesmo a sala de sua casa etc. Os recursos podem ser equipamentos modernos ou adaptados com métodos tradicionais ou alternativos, o importante é buscar um treinamento que se aproxime o melhor possível da atividade a ser realizada.

Realizar caminhadas longas com mochilas nas costas é um treino específico muito importante para prática de alta montanha e pode ser realizado em qualquer altitude.

Durante o percurso de uma escalada de alta montanha são realizadas longas caminhadas com cargas relativamente pesadas e aclives variados, desta forma temos duas principais capacidades físicas exigidas, resistência muscular e aeróbia, onde o bom condicionamento destes faz a diferença no nível de dificuldade e desgaste da rota a ser seguida e, consequentemente, no tempo de recuperação, desta forma um bom treinamento requer exercícios que envolvam estas capacidades.

Frequência, duração da sessão e intensidades das cargas do treinamento vão depender do nível de condicionamento físico do indivíduo, o ideal é realizar uma avaliação com profissional especializado, mas de forma generalizada para aqueles com baixa aptidão física pode-se iniciar com treinamentos duas vezes na semana, duração por volta de 40 minutos e cargas de resistência tanto muscular como aeróbia de aproximadamente 65% da sua carga máxima, sempre respeitando MUITO o período de recuperação.

O treinamento deve sempre iniciar com um aquecimento, atividades dinâmicas leves, preparando o corpo para as exigências do treinamento. Os músculos, inclusive o cardíaco, são tecidos elásticos que quando estendidos de forma inesperada tem maior risco de romper fibras e se “machucar”, mas quando está preparado suporta melhor tal tensão.

Treinar de 2 a 3 vezes por semana funcional ou musculação é importante para evitar lesões e fortalecer a musculatura.

A distribuição dos exercícios pode iniciar de forma alternada por capacidade física, resistência muscular e resistência aeróbia, mas aos poucos devem se unir chegando a um treinamento único reunindo as duas capacidades em uma simulação da escalada de alta montanha. Quanto mais próximos, os exercícios realizados no treinamento, estiverem das atividades reais exigidas na escalada, mais específica e eficiente sua preparação.

Ao final do treinamento o alongamento ajuda a livrar o corpo das tensões, abaixando o ritmo da atividade imposta e aumentando a sensibilização dos benefícios alcançados na sessão de treinamento.

O planejamento é fundamental, deve-se colocar objetivos reais (alcançáveis), crescentes e periódicos durante todo o processo e segui-los da melhor maneira possível, a frequência e a intensidade devem aumentar gradualmente. Ao final do treinamento, ou seja, próximo à data de sua escalada, o indivíduo já deve conseguir realizar treinamentos com grande frequência, até 6 dias na semana, e bem mais intensos. Em todo este processo, o comprometimento do indivíduo é essencial para o sucesso da sua expedição.

Outro fator de grande importância para o sucesso de seu treinamento é a alimentação. Abaixo deixo o excelente artigo do montanhista Pedro Hauck, uma referência no montanhismo de altitude no Brasil, onde ele explica muito bom sua estratégia alimentar para encarar montanhas altas e treinar.

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Sobre o autor

Texto publicado pela própria redação do Portal.

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