Ricardo Baltazar abre a temporada de Chaltén com escalada no Poincenot

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Após ter escalado o Fitz Roy e outras Agulhas graníticas de El Chaltén, na Patagônia no começo deste ano, o escalador gaúcho Ricardo “Rato” Baltazar retorna à Argentina e já manda notícias de mais uma ascensão, desta vez na Agulha Poincenot.

Por Eduardo Prestes

O escalador Ricardo Baltazar (mais conhecido como 'Rato'), de Torres/RS, manda notícias da Patagônia, onde se encontra para uma segunda temporada nas montanhas da região. Uma conversa no ônibus, a caminho de El Chaltén, e mais um dia de escalada esportiva nas imediações da cidade, renderam um convite para escalar a Agulha Poincenot (3002 m) juntamente com dois experientes e respeitados escaladores, os austríacos Toni Ponholzer e Lui Krenn, veteranos de várias temporadas no local.

O trio chegou ao cume da Agulha Poincenot no dia 07/11, pela via Whillans-Cochrane. Para os austríacos, a escalada foi um aquecimento para o objetivo desta temporada, que é realizar a primeira ascensão integral da face norte do Cerro Torre. Já para Ricardo, foi uma oportunidade de alcançar mais um cume importante na Patagônia e de aperfeiçoar suas técnicas alpinas, escalando com quem conhece o ofício. Ele mesmo dá mais detalhes da escalada e do início da temporada, em mensagem enviada aos amigos, alguns dias depois da ascensão.         

Fala Cabeçada ! Trepei na Poincenot !!! Já era !!! Iririri !

Não escrevi antes porque andei me medicando uns dias, após chegar aqui. Ontem fiz um trabalho perto de Calafate, fui arrumar uma antena de internet aqui de Chaltén. Graças a mim, Chaltén tem internet de novo !!! Um señor (que se chama Ricardo também) passou pelo camping e me contratou para escalar uma repetidora e arrumar uma das antenas que o vento havia derrubado. Fica numa montanha próximo de Calafate, chamada Cerro Meseta. Foi fácil, era só subir e parafusar de novo, mas levamos o dia todo porque
é longe. A rapaziada aqui do camping se abriu para mim. Um dia antes, havia escalado uma das agulhas mais emblemáticas daqui e no outro já estava trepado numa antena, arrumando a internet de Chaltén !!! Pode isso?

Cheguei aqui só com 100 pesos no bolso! Maluco, cheguei pela bola oito, me deixaram ficar no camping sem pagar. Também, eles não tinham outra opção. Paguei excesso de bagagem no Brasil, mas consegui passar por Buenos Aires sem pagar de novo, menos mal. Encontrei quase toda a galera do ano passado, trabalhando. O tempo estava bem aberto, vocês tinham que ver o Torre com uma capa branca de gelo e céu azul ! Reloco! O Fitzroy & Cia, branquitos. Era uma janela, mas eu tinha que me organizar antes.

Depois destes primeiros dias, o tempo não foi dos melhores, mas assim é a Patagônia. Deu uma janela de uns dias no primeiro final de semana, mas ventava muito e a montanhas estão ainda meio carregadas, com degelo do inverno. Andei escalando com 2 austríacos que chegaram junto comigo no vôo e no ônibus, eles estão no camping também. Um se chama Toni e o outro é o Lui. O Toni já abriu e repetiu uma pá de vias por aqui, ele tem uns 50 anos e o Lui um pouco menos, uns 45 anos. Eles vieram tentar repetir a
Maestri-Egger, na face norte do Cerro Torre. Nos anos de 93 e 99, o Toni esteve quase no cume (faltaram uns 200 m), e agora eles vieram patrocinados, com este projeto. Os caras escalam muito, fui com eles para um setor esportivo aqui de Chaltén e escalamos um dia inteiro, sem parar. Os veios mandam como mínimo um 7b à vista, escalam mais do que eu.

Mas vamos ao que interessa… Acertei na mosca por ter vindo mais cedo, foi boa a abertura da temporada.

Acabou que fui com os austríacos para a Poincenot, aqueles caras são uns mutantes !!! Escalar com esses monstros é quase a mesma coisa que ganhar uma passagem para o cume. A janela não foi das melhores, mas esses tipos escalam com qualquer tempo. Mas não desgrudei dos garrão !!! Segui parelho com eles, acompanhando. Acho que foi a banda mais pegada que já fiz, mais do que a escalada do Fitzroy. Arrancamos no sábado à tarde, para o Passo Superior. Chegamos quase de noite, com vento e neve. Cavamos uma cova de gelo e nos metemos dentro. Domingo, amanheceu melhor e terminamos a cova, que ficou boa, de gabarito, para três ou quatro pessoas, com armário na parede e tudo, até porta ! Descansamos o resto do dia e às 6 tarde fomos dormir. Acordamos para escalar às 2 da manhã de segunda, bem como havíamos planejado. Às 4 hs, o Lui já estava trepando na rimaia. Subimos pela Rampa Whillans, escalada mixta com cerca de 70 graus de inclinação e 6º grau em rocha. Uns 700 metros de extensão, eu acho. Aí foi que foi. Gelo, neve, rocha, nos tocou um bom dia, com sol e sem vento, um pouco frio só. Lá pelas 4 da tarde, dia 7/11, estávamos no cume. Mal deu tempo de tirar umas fotos e já estávamos rapelando, para poder descer a rampa de dia, porque os rapéis são todos em travessia e meio perigosos. Tivemos que fazer uns dead men (hombre muerto), com pedras enterradas na neve e cordino, para poder rapelar alguns trechos da rampa que estavam com meio metro de neve fofa. Os rapéis da Rampa são meio sinistros, tem que ir muito na diagonal, para escapar do glaciar e voltar ao pé da via. Chegamos na cova de gelo lá pelas 10 da noite de segunda. Daí foi só bater queixo mais uma noite na cova e na terça já estávamos descendo para Rio Blanco e para o sol. De noite, tomamos tudo o que encontramos pela frente. Os austríacos são viciados em “ginebra” e cerveja. Os caras parecem ter saído daqueles desenhos tipo Heman, são uns brutamontes, tudo guia de montanha na Áustria e gente fina para caramba.

Pues loco!!!!  Acho que começamos com o pé direito essa temporada !!! Cume da Poincenot, bom sinal.

Fiz altos vídeos com uma câmera Go Pro. Só que no cume, ela congelou um pouco e não deu para filmar. Mas tenho fotos. Os austríacos estavam com 2 câmeras, assim tiramos muitas fotos, já estão no meu pen drive. Salvei os vídeos também, para editar depois.

Pois é, vem nova ventana na semana que vem. Vou focar agora no Cerro Torre, tentar canalizar toda energia e tempo para lá e ver no que dá. Talvez eu já comece a carregar minhas coisas para o bivaque niponino esta semana, para dar uma olhada mais de perto no 'carozo'!

Para falar a verdade, escalar tem sido a parte mais fácil da gauchada. Difícil foi chegar até as montanhas e depois conseguir sobreviver no melhor estilo pêlo-duro !  É nóis ! Por enquanto, é isso, agora vou tomar um vinho e rasgar umas gringa que estão aqui no camping! Iiririrrii !

Dale no meio! Baamooooo!!!

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Texto publicado pela própria redação do Portal.

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