Travessia Ciririca – Rio Bonito

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O retorno do Ciririca pelo leito do Rio Bonito, apesar de não ser inédito, há muito andava esquecido até que o grupo composto pelo Serginho, Vinicius, Fabiano, Maurício e Ângela, depois de muitos desencontros acabaram por enfrentá-lo em quatro dias de penosa caminhada.


A Partida – Eu (Serginho), Vinicius, Fabiano, Maurício e Ângela partimos da Chácara da Bolinha às 07h38 da quinta-feira, 22 de maio de 2008, em direção ao Ciririca e encontramos o Natan com sua esposa, Michele, que nos deram umas dicas muito importantes sobre a travessia até a Graciosa. Chegamos ao cume do Ciririca muito atrasados, por volta das 16:00 horas, e montamos o primeiro acampamento com um tempo excelente. Apreciamos então um pôr-do-sol super especial seguido de um luar maravilhoso que iluminava a baia de Antonina e toda a região.

Os três montanhistas – Na manhã seguinte, sexta-feira 23, resolvemos fazer um ataque ao Agudo da Cotia descendo a escabrosa face sul do Ciririca de onde fotografamos os destroços do avião espatifado contra as paredes do Agudo do Lontra. Nas colinas do planalto abaixo encontramos os montanhistas Julio, Moisés e Paulo que também nos orientaram sobre a travessia. Essas informações adicionais nos encorajaram ainda mais a seguir em frente, decidimos então subir novamente o Ciririca e transferir nosso acampamento para as proximidades do Agudo da Cotia. O tempo se tornava escasso e o Vinicius prosseguiu juntamente com os três montanhistas até o Rio Forquilha para reconhecer o trajeto retornando, mais tarde, todo arranhado pelas quiçaças e caraguatás que vegetam nos campos que cercam o acesso ao rio.

Início das incertezas
– Eram 07h38m de sábado quando seguimos rio abaixo. Um visual de tirar o fôlego, pedras enormes, piscinas de águas límpidas que davam vontade de ficar por ali mesmo, mas precisávamos seguir adiante. Depois de muito caminhar encontramos um totem de pedras e sacolas plásticas amarradas nas árvores que os três montanhistas deixaram para nos orientar. Dentro do mato, uma trilha de fitas amarelas.

Paramos para devorar aquele rango esperto antes de continuar trilha acima. Prosseguimos nos orientando pelas fitas amarelas e percebemos que estávamos subindo uma montanha, talvez o Tangará, mas para nossa surpresa, acabaram-se as fitas amarelas. Apreensivos, tentamos fazer ligações pelos celulares com o objetivo de pedir por ajuda, mas nada foi possível pela falta de sinal. Procuramos ainda por um bom tempo os rastros das tais fitas amarelas que nos guiaram até ali e não encontramos mais nada. Ficamos completamente desnorteados, sem saber o que fazer. Decidimos então voltar ao rio e descendo encontramos mais uma fita amarela na saída de um corregozinho.

Sem conhecimento da região, na dúvida em relação à localização da garganta, o tempo esvaindo-se rapidamente e nem um pouco dispostos a retornar para enfrentar as encostas do Ciririca resolvemos acompanhar o leito do rio. Sem sucesso tentamos novamente encontrar resgate pelo telefone celular, mas no fundo do vale nunca haveria sinal. Anoiteceu e precisamos bivacar nas pedras, dentro do rio. Amarrei minhas pernas com elástico para não cair dentro d’água e amanheceu sem ao menos saber onde estávamos. A cena foi tão curiosa que chegou a ser até engraçada e acordamos com as costas muito doloridas.

Caminhando dentro d’água – No domingo, lá pela 8:00h, depois de um cafezinho retomamos nossa caminhada rio abaixo. Em muitos trechos não havia outra opção senão caminhar por dentro do rio com água batendo no peito, mesmo sob os protestos daqueles que não queriam se molhar. Precisávamos erguer as mochilas acima das cabeças para preservá-las da água profunda. Estávamos tão ansiosos por encontrar uma saída do rio, que o Mauricio em certo momento confundiu o barulho de avião com um trem, e seguro de que estávamos próximos aos trilhos ameaçou iniciar a abertura de uma picada no facão para sairmos dali.

Imediatamente protestei, dizendo que ele estava enganado e que estávamos muito longe dos trilhos. Minha intuição e experiência em caminhadas na Serra do Mar garantiam que estávamos nos deslocando em direção à BR 116, então precisei explicar a todos que seguíamos rumo a oeste e Morretes já havia ficado muito para trás. Foram momentos de angústia e até mesmo desespero em que não mais suportávamos caminhar dentro do rio.

Cachorro leão, o melhor amigo do homem
– Ás 11h10 escutei um latido e comentei com o pessoal. O Fabiano zoou com minha cara e afirmou ser a batida da araponga, andamos mais um pouco e ouvi outro latido. Deduzi que poderiam ser dois cachorros ali por perto. Ficamos mais tranqüilos imaginando ter encontrado uma saída daquela mata fechada, de repente nos deparamos com cinco cachorros. Foi um alívio acreditar que havia alguma casa por perto. Saímos do rio de encontro aos cães, mas eles saíram em disparada e ficaram nos observando de longe. Abrimos uma picada na mata e seguimos em sua direção. Gritei na esperança de ouvir alguma resposta. E houve, enfim apareceu alguém para nos tirar daquela roubada.

O Sr. Antoninho, caseiro da Fazenda Taquari, nos guiou por mais uma hora e meia de caminhada até sua casa. Tivemos uma sorte danada por encontrá-lo, o homem estava na mata a procura de búfalos desgarrados que se tornam presas fáceis para ladrões e caçadores que os matam para retirar o melhor da carne e a seguir jogam no rio as carcaças. Dali foi mais 10 minutos de Toyota Bandeirantes até a casa de seu filho onde fomos recebidos por 15 cães ferozes que fizeram o maior estardalhaço para nos pegar.

Na porteira da Fazenda Taquari fizemos um almoço muito bacana enquanto esperávamos o amigo Sergão nos resgatar com sua Rural nervosa. Foi realmente uma experiência inesquecível e logicamente teríamos preferido que as coisas tivessem acontecido conforme o planejado, mas muitas vezes a sorte opera mudanças e a gente passa a ter que lidar com tais imprevistos, daí é preciso ter calma, fé e um pouco de sorte. Abraços a todos que fizeram parte dessa aventura: Serginho, Vinicius, Ângela, Fabiano, Mauricio e também ao Julio Fiori, Moisés e o Paulo.

Viver é enfrentar um problema atrás do outro, o modo como você os encara é que faz a diferença.

Texto do Serginho (Equipe Malária)

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