Um Dia Qualquer na Serra

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A idéia era descobrir uma picada q me foi soprada a um tempo e emendar algum outro programa junto pra tornar o feriado produtivo. A “Trilha dos Grampos” era uma vereda q apenas ouvira comentar de leve, mas agora com alguma info mais concreta decidi tentar encontrá-la. Ah, sim. A picada em questão supostamente interligaria o asfalto (q ruma sentido Paranapiacaba) diretamente à Cachu dos Grampos, situada no Rio Vermelho, sem necessidade de percorrer td leito pedregoso (como costumo fazer) deste sinuoso e simpático regato, localizado na borda de planalto da Serra do Meio. Por se tratar de uma busca até relativamente breve e simples, decidi estica-la indo até o Poção da Garganta, pra depois subir o rio até a Cachu dos Grampos e então retornar pela suposta misteriosa picada.

6hrs: A quarta-feira mal clareou e cá estou, tomando um pingado na frente da Estação da Luz, mais precisamente na barraca de um ambulante cercado de fregueses pitorescos e boêmios. Entre eles, o “Bin Laden”, um velho mendigo bem conhecido q apoiado em sua muleta conta causos dos “nóias” da região. Encontro por coincidência o Carlos, parceiro de antigas roubadas, q igualmente estava indo fazer uma trilha em Mogi das Cruzes. Trocamos algumas palavras e prometemos marcar algo em breve.

6:30hrs: Encontro a Clarissa na catraca da estação e imediatamente embarcamos na lotada composição, da qual ainda faríamos uma baldeação da Estação Brás. Estava decidido a ir sozinho na empreitada, qdo de última hora ela surgiu igualmente ressoluta a me acompanhar. A viagem transcorre de forma imperceptível, mais rápido q o normal, quiçá devido a nossa animada conversa repleta da causos de viagens, e regada principalmente pela peripécias da minha amiga pela Amazônia.

7:40hrs: Após saltar em Rio Gde na Serra, mastigamos o delicioso pão-na-chapa da padoca Barcelona enqto presenciamos o estabelecimento lotar de trilheiros q tal qual a gente, tb se dirige pra Serra do Mar q circunda Paranapiacaba. Boa parte deles conheço apenas de vista; alguns aceno cordialmente, enqto outros não. “Rambos” de praxe com faca na cintura e inconfundiveis calças camufladas estufam o peito afirmando q vão pro… Lago Cristal! Caramba, o Stallone deve estar bastante orgulhoso com suas crias.

8:30hrs: Saltamos no asfalto e imediatamente nos pusemos em marcha pela conhecida “Trilha dos Tenis”, buscando nos afastar o máximo possível da horda de moleques q desceu junto, certamente indo pra Cachu da Fumaça. A esperança de manter os pés secos é logo diluída qdo nos deparamos não com uma trilha e sim um pequeno rio, pelo qual chapinhamos com água até a canela durante um bom tempo.

8:45hrs: A água cede lugar à lama, na qual chafurdamos através de misto de brejo, capim, terra preta e clara até o tornozelo. O terreno so fica firme e mais compacto mais tarde, qdo a picada enfim mergulha na floresta.

9:00hrs: Alcançamos as margens do manso Rio das Areias, q lavam provisoriamente nossos pés, e por ele seguimos na tradicional picada q o acompanha até a borda da serra. Imponho um ritmo mais forte à pernada e a Clarissa responde a altura, sem reclamar.

9:40hrs: Primeiros a chegar naquele dia na Cachu da Fumaça, nos presenteamos com um breve pit-stop pra descanso e vislumbre da fantástica paisagem q se abre diante da gente. O dia está competamente claro e limpo, e é possível avistar td baixada santista além do horizonte.

10:00hrs: No metade da descida da Cachu da Fumaça, paramos varias vezes pra clicar a paisagem das trocentas quedas formadas tanto pelo Rio das Areias como o Rio da Solvay. A desescalaminhada constante e continua prossegue num ritmo mais ágil e forte, sem percalços, e não tarda pro suor começar a escorrer farto pela ponta do nariz.

10:15hrs: O “Portal” – confluência dos três rios –  é transposto sem nenhuma dificuldade. O volume daas águas dos regatos permite a passagem pelas ardilosas rochas q dão acesso a este q é o prelúdio do “Vale da Morte”, cavado pelo sinuoso Rio da Onça. A atmosfera transparente no firmamento nos garante q não teremos problemas na volta.

11:00hrs: Após cuidadosa descida de vale costurando ambas margens de rio, chegamos na famosérrima “Garganta do Diabo”, mas estacionamos mesmo nos lajedos q a antecedem, no belo e convidativo “Poço da Garganta”. O sol está de fritar os miolos e não pensamos duas vezes em nos refrescar nas águas geladas do Rio da Onça. Na sequencia, mastigamos barras de cerais e sanduíches q forram devidamente o estômago. Um breve cochilo completa a pausa merecida naquele belo lugar.

13:00hrs: Retomamos a pernada rio acima revigorados, em ritmo mais ágil e rápido q na ida. Nuvens começam a se formar timidamente no céu. É bem provável q no final do dia o mundo desabe. Reparo q meu tenis comeca a se esfarelar na sola e torco pra q pelo menos guente ate o final da trip.

13:20hrs: No “Portal”, uma breve pausa pra retomada de fôlego antes de inicar a perrengosa subida do Rio Vermelho. Esta, inicialmente se dá por meio de uma íngreme picada pela margem direita pela mata. Mas logo deixamos a encosta palmilhada pra passar pra outra margem, na base de uma imponente cachu, onde começa praticametne uma escalada vertical de encosta onde td mato serve de apoio, inclusive os espinehntos. O chão úmido se esfarela com facilidade e não raramente patinamos varias vezes até as botas conseguirem algum apoio pra dar o impulso necessário á ascensão seguinte.

13:45hrs: Após varar mato atraves de uma crista florestada durante um bom tempo, retornamos ao leito pedregoso do rio escalaminhando pedras consecutivas, agora pela margem direita. Aos poucos, a paisagem se abre outra vez e temos descortinado no horizonte as torres de granito q espetam os céu e guardam o “Portal”, assim como o Morro do Careca elevando-se imponente e dominado td quadrante sudoeste.

14:00hrs: Uma pequena cachu e um paredão rochoso intransponivel nos obrigam novamente a passar á margem esquerda, onde só é possível alcançar o patamar sgte varando um mato terrivelmente espinhento. Como gentil cavalheiro, vou na dianteira abrindo passagem pra Clarissa, q ate agora me surpreende por não dar um pio sequer, já q conheço mto marmanjo q a esta altura do compeonato estaria clamando pela mamãezinha.

14:20hrs: Novamente no rio, nos brindamos com um breve pit-stop na base da Cachu dos Grampos, mais precisamente no belo poção de cor acobreada a seus pés. Além de mais um tchibum pra remover o mato e sujeira espalhada pelo corpo, o momento é pra descanso e retomar o fôlego antes de subir a cachoeira. O olhar embasbacado da Clarissa ao ouvir meu comentário de q vamos escalar a cachu é impagável. Mas claro q não vamos fazer isso; alem do volume de água desaconselhar a escalada na rocha molhada, é necessário estar seguro pra fazer isso, e nem eu nem a Clarissa queremos correr risco algum. Vamos pela encosta.

14:50hrs: Depois de escalar mato pela íngreme encosta forrada de vegetação do lado direito da cachu – no q parecia ser uma picada improvisada pouco sutil – ganhamos o alto da Cachu dos Grampos onde respiramos aliviados. Vale salientar q durante a subida encontrei um marco de concreto q não faço idéia q deve significar. O céu se enche cada vez mais de nuvens negras.

15:00hrs: Chapinhamos Rio Vermelho acima, agora quase q completamente na vertical, á diferença do acidentado trecho anterior. O material em suspensão na agua faz jus ao nome do regato e é facilmente distinguível. É agora q devo prestar atenção nas indicações da tal “Trilha dos Grampos”, q supostamente sai de um pequeno afluente, à direita.

15:10hrs: Na quarta curva do rio, finalmente encontro a tal “Trilha dos Grampos”,  bem discreta ao lado de um pequeno afluente à direita do rio principal. O picada  – bem batida – se afasta do Rio Vermelho em nível, costurando o já mencionado córrego por ambas margens, até abandoná-lo de vez logo depois. Existe mata tombada no caminho, mas nada q uma boa desviada de rota não resolva. A vereda se alterna entre chão batido de terra, brejo e lama. No caminho, reconheço uma bifurcação (a direita) já palmilhada noutra ocasião, e q vai dar no Rio das Tartaruguinhas. Agora já estou em casa e sei me virar.

15:40hrs: Após emergir da floresta e começar a ouvir veículos ao longe, desembocamos na conhecida “Trilha da Lago Cristal”. Ao invés de seguir então pro asfalto (direita) e tomar bus, eu e a Clarissa decidimos voltar a pé, tomando então a ramificação da esquerda, já percorrida vezes sem conta. O calor e mormaço são quase palpáveis, assim como a abundância de indesejáveis varejeiras orbitando nossas cabeças com seu zunido irritante. Alertado pela Clarissa, quase piso na única (e elétrica) cobra avistada na trip, q num piscar de olhos se pirulita no mato.

16:10hrs: Pisamos no asfalto e seguimos rumo Rio Grande da Serra, distante algo de 4km dali. No caminho, como benção dos deuses o mundo desaba sob a forma de um aguaceiro q deixaria Noé orgulhoso. Nunca uma refrescante chuvarada foi tão bem recebida pela gente.

17:00hrs: Na padoca Barcelona trocamos nossas vestes por outras secas e mais aconchegantes, além de estacionar numa mesa do lado de fora. A bebedeira pra comemorar estava apenas começando, regada a deliciosas coxinhas, salgados e mistos. Começam a aparecer as mesmas pessoas e grupos vistos pela manha, tds igualmente ensopados. Enqto isso, a chuva parece não ter fim e se estende ate o inicio da noite. Um bocejo ja começa a se desenhar em nossos rostos combalidos, mas guentamos firmes e fortes de vigília ate onde der.

19:30hrs: Com a chuva diminuindo, tomamos o trem de volta pra fazer o caminho rumo á metrópole desfalecidos no banco do primeiro vagão da composição, pra cada um chegar em sua respectiva residência apenas duas horas depois.

Com a adrenalina em baixa e o sangue já esfriando, o corpo começa a manifestar o saldo da trip sob a forma de dores musculares localizadas, mãos reclamando de espinhos cravados e a pele gritando de ardor devido ao sol. A Clarissa está de parabéns por chegar até o final. Eu estou de parabéns por finalmente encontrar a dita picada mencionada no primeiro parágrafo. Enfim, o dia foi mais uma vez bastante produtivo com exploração, ralação e diversão. Foi apenas mais um dia comum e qualquer pela nossa maravilhosa Serra do Mar.

Texto e fotos de Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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