O Poço Preto de Casa Grande

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Ele é maior q o “Poço das Moças”, o mais famosa piscina natural de Paranapiacaba (SP), mas está situado tb na Serra do Mar. Mas são outros diferenciais q tornam o desconhecido Poço Preto um lugar especial. Situado no miolo serrano de Casa Grande, divisa municipal de Biritiba-Mirim e Salesópolis, o Poço Preto é uma enorme piscina natural, abastecida pelas corredeiras mansas do Ribeirão Claro. Totalmente selvagem, o lugar é pra poucos. Sem trilha (conhecida) de acesso, demanda árdua pernada de 7km em meio a espessa mata ciliar, cruzando vários riachos do trajeto. Este é mais um relato q dá continuidade a sequência de bate-voltas ideais de verão próximos a urbe, com direito a refrescantes tchibuns p/ amenizar o forte calor deste verão.

A manhã começara incerta, mas foi no decorrer daquele início de domingo q as brumas se dissiparam revelando o firmamento estupidamente isento de vestígios de nebulosidade, qdo nos juntamos em frente à Estação Estudantes, em Mogi das Cruzes. Eram quase 8:30hrs e num veículo estávamos eu, Debora, Gibson e Roberta. No outro, o Ricardo, Elaine e Simone se espremiam pra dar lugar ao André, q encontramos por lá e optou melhor por nos acompanhar, deixando seu programa original (a farofada Cachu do Elefante) pra outra ocasião. Ainda mais qdo seus demais companheiros sequer tinham dado as caras ali, na frente dos quiosques e trailers da estação, onde reforçamos o desjejum com salgados e um bem-vindo pingado.

Após as devidas apresentações e forrar o bucho, imediatamente tomamos a SP-88 sentido Biritiba-Mirim, afim de otimizar ao máximo aquele domingo q prometia muito sol e calor, uma vez q a meteorologia previa pancadas de chuva pro final da tarde. É, o verão começara com força total com uma forte onda de calor nestas últimas semanas. Logo, a idéia daquele dia era dum refrescante rolê ao Poço Preto a mto programado, mas cancelado por 3 ocasiões pelos mais diversos motivos: a primeira incursão foi abortada por errar o local de acesso a vereda; a segunda por começar a caminhar tarde; e na terceira nem pisamos na trilha devido ao mau tempo. Mas hj td conjurava pra q finalmente desencantasse o tal do Poço Preto. 

Muita conversa furada embalou a viagem, enqto as janelas do veículo emolduravam plantações e baixa morraria, paisagens recorrentes do “Cinturão Verde” mogiano. Mas foi qdo o asfalto deu lugar a uma precária estrada de chão q a aventura dava sinais de, enfim, ter começado. Cercada de verdejante mata de ambos os lados, a SP-92, a “Estrada de Casa Grande” (ou “Estrada do Carapicó”) não prima muito pelas boas condições, de onde deduzimos inexistência de transporte público. Mas entre uma chacoalhada e outra, havia raros momentos em q a esburacada via parecia amansar em trechos largos e planos, nos quais era possível apreciar melhor a paisagem q se descortinava a cada curva da via.

Mas após serpentear a morraria florestada, passar pela Faz. Itapanhaú, o pacato Bairro da Terceira e pela Represa da Estação de Tratamento Rio Claro, os veículos tocam pela variante da via principal, mais precisamente a estrada q interliga Casa Grande a Salesópolis. Tocando sinuosamente então pela morraria sgte percebemos começar a adentrar nos domínios de fazendas de reflorestamento da Suzano, onde reflorestamentos de eucaliptos salpicado de focos de mata secundaria são paisagem recorrente pelo caminho.

Após cruzar a ponte concretada sobre o Ribeirão do Campo (q depois a carta confirmou ser o Rio Grande), passar por um improvável e minúsculo povoado no meio de nada e lugar nenhum, e ignorar a Estrada do Repiado, nos enfiamos num emaranhado de estradas secundarias de reflorestamento, sempre sentido sul, q se não tiver conhecimento prévio do lugar é pedir decerto pra se perder. Bem q tentamos adentrar numa das muitas porteiras amarelas q facilitavam o acesso ao início da trip, mas fomos barrados por um redondo “vcs não sabem q é proibido entrar ai?”. Pelo visto, nosso rolê proposto era dentro de propriedade particular. Só não sei precisar se é da Sabesp ou da Suzano Celulose, pois aqui os limites de ambas propriedades se confundem.

E assim após muito remelexo, encostamos o carro numa clareira nos cafundós de Casa Grande as 10hrs, na frente doutra porteira amarela, mas ainda 400m distante do início da trilha. Este trecho foi feito a pé mesmo, através da estrada de chão q dá continuidade a porteira, envolto entre muitas risadas e conversa furada. Chegamos enfim ao local em q abandonamos a estrada e tocamos mata adentro. Como referência do lugar estávamos relativamente próximos da Lagoa da Represa e haviam uns caixotes de colméia relativamente próximos. 

Pois bem, começamos a pernada tocando por uma larga vereda de reflorestamento no aberto as 10:15hrs, q foi de encontro o sopé da morraria sgte q bastou ladear pela direita. Nos cruzamentos q surgiram ignoramos as picadas laterais, dando preferências aquelas q fossem na direção desejada, ou seja, sempre sul. Não tardou pra picada findar num largo aceiro e uma encosta florestada a nossa frente. Bem, como havia q tocar pro sul assim foi, mergulhamos na tal encosta e fomos avançando como dava no q julgamos ser uma picada, e era mesmo. Uma fita azul numa árvore serve como referência.

A vereda desce então pro vale a nosso lado, onde o correguinho q era audível a um tempo é cruzado sem gde problema. Na outra margem prosseguimos galgando a encosta sgte, sempre pro sul, desviando do mato mais espesso do caminho. Em tempo, a vereda não tardou a sumir e o resto da pernada foi na raça, ou seja, no mais puro legitimo rasga-mato! A filinha q delimitou o octeto trilheiro pouco mudou, com o Ricardo e André na dianteira, as meninas no meio, e Gibson e este q vos escreve fechando o bloco. Eventualmente eu tomava a dianteira qdo havia necessidade de buscar algum acesso menos agreste.

Cruzamos então um suave selado e tocamos pro morro sgte, cuja cumieira foi difícil de transpôr por conta das voçorocas de fina taquarinha e craquejantes touceiras de bambus maiores secos. Claro q contornamos esse obstáculo pela lateral e assim passamos pro outro lado do morro, onde descemos cautelosamente uma piramba íngreme até dar no selado sgte, onde tivemos uma breve parada pra bebericar uma cristalina agüinha q vertia por uma nascente lajotada. Mas as paradas não eram demasiado demoradas pq sanguessugas alados não permitiam, e entre tapas e beijos conseguíamos tanto molhar o rosto como a goela.

A encosta sgte foi vencida desviando do monte de mata tombada no caminho, onde bastava uma gde arvore cair q trazia metade da floresta junto. Mais obstáculos, claro. Trilha q é bom, nada. Apenas alguns vestígios de dejetos de anta q logo se perdiam na mata mais espessa. De qq maneira nossa rota não devia desviar demasiado do sul, e foi assim q fizemos, tocando sempre nessa direção. Como era de se supor nosso avanço era lento, porem constante. Apenas as pirambas íngremes q demandavam algum esforço extra pruma descondicionada Roberta, q firme e forte encarou o desafio. E q desafio. Fora isso, o destaque animal foi uma elétrica cobrinha, várias pererequinhas albinas e o onipresente som de aves q preenchendo a mata, servindo de trilha sonora da caminhada.

Foi ai q o terreno palmilhado suavizou e aparentou nivelar por um bom tempo, ao acompanhar um manso e cristalino córrego, q teve de ser cruzado várias vezes.

Andando através de ambas margens arenosas, as 12:30hrs caímos no alto duma cachu de altura considerável. A mata obstruía a vista da queda, mas pelo rugido da agua despencando sabíamos q a altura era alta. De qq maneira, havia q acompanhar aquele curso dágua uma vez q ele rumava na direção desejada. Descemos então a íngreme encosta aos ziguezagues e assim caímos novamente nas pedras e lajes do supracitado riozinho, ou seja, o da cachu.

Após um breve descanso com lanche nas pedras do riozinho, prosseguimos a pernada inicialmente chapinhando pelas pedras daquele afluente do Rio Claro pra depois alternar ambas margens, evitando convidativas banheiras e poçinhos no trajeto. Mas após um tempo abandonamos o rio, pois ele começou a fugir demais da rota traçada, e nos enfiamos na espessa mata de sua encosta esquerda, desviando de belos exemplares de palmito. Foi ai q ouvi “alguém” se queixando da demora e sugeriu retornar pra noite não nos surpreender no meio da mata. Ai não me contive. Esbravejei q já q estávamos ralando ali iriamos até o fim, e q tínhamos muito tempo de luz natural ainda. É mole? Tínhamos vindo de longe pra chegar ao Poço Preto, feito 3 tentativas frustradas e não pensava em desistir àquela altura do campeonato! Ainda mais faltando algo de 200m (em linha reta), pela leitura do GPS do Ricardo..

E assim após chapinhar um extenso brejo encosta acima e ganhar o ultimo morro q nos separava do vale almejado, a pernada prosseguiu por sua crista nivelada através duma trilha bem discreta, porém discernível. Àquela altura já ouvíamos claramente o rugido furioso das corredeiras do vale almejado, e assim começamos a descer a encosta em sua direção sem dó, rasgando mato com vontade. O som de agua abundante foi aumentando conforme nos aproximávamos e assim, a exatas 14hrs e 7,5km percorridos chegamos no tal Poço Preto, pra alegria geral. Na verdade, a distância dos veículos até o Poço não chega nem a 3km, mas isso em linha reta. É, os obstáculos, morros e rios no caminho dilatam essa curta distância consideravelmente qdo não se tem trilha a percorrer.

Pois bem, uma vez ali desabamos nas lajes pedregosas pois a galera não escondia o cansaço de chegar ali. Mas tb não escondia sua alegria e satisfação em estar diante daquela quase “piscina olímpica natural” exclusiva, banhada pelas águas do Rio Claro, q despencava ali por meio duma extensa corredeira inclinada, lembrando um mini-tobogã. Do poção cercado de rochas as águas eram derramadas placidamente noutro lagão maior, pra dali seguirem seu curso sinuoso através da mata. Lixo? Nenhum. Éramos donos absolutos daquele paraíso refrescante encravado naquele miolo serrano e logicamente q ninguém se conteve prum merecido e resfrescante tchibum naquelas águas q eram mais q bem-vindas. Descanso e lanche complementaram as atividades naquele nosso balneário particular serrano-natureba.

Por volta das 15hrs julgamos prudente dar início ao retorno e assim, dando adeus aquele paraíso pra poucos, voltamos pelo mesmo caminho piramba acima. Bom era ver q nosso octeto havia praticamente deixado uma “trilha” pronta já feita, baixando mato suficiente pra q a volta fosse mais rápida q a ida. Era só seguir o rastro deixado. Apesar dos oportunos “atalhos” pelo alto da morraria sugeridos pelo hábil Ricardo afim de encurtar o trajeto, a volta resumidamente nos tomou meia hora a menos. Ainda assim o constante sobe-e-desce morro foi sentido pela maioria, q não via a hora de chegar aos veículos. A Roberta, coitada, chegou o pó. Mas chegou. O momento de susto pra galera foi qdo o Ricardo “quase perdeu” o GPS, embora o retorno tomasse a direção oposta a ida, isto é, norte. E bússolas havia duas, a minha e do André.

Conforme previsto alcançamos os veículos pouco depois das 18hrs, ainda com sol no alto de nossas cacholas. Antes de ir embora, claro, uma parada básica no botequinho do bairro da Terceira pra bebemorar a empreitada, desta vez de sucesso, onde pra mim a cerveja teve um gostinho delicioso de vitória. Entre uma conversa e outra com o Ricardo, chegamos a conclusão q empreitadas no entorno do Poço Preto demandam necessariamente pernoite de modo a otimizar o rolê. Pois é, o Rio Claro tem outros belos remansos, poços, corredeiras e cachus no trajeto q serão explorados futuramente. Dessa forma e com logística bem mais elaborada, a região de Casa Grande se firma certamente como vindouro point pra novas aventuras, a apenas 100km de SP. Ou se preferir, pra apenas um bate-volta duro e puxado pro Poço Preto.

 

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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