Waldemar Niclevicz escala o vulcão Puntiagudo no Chile

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Montanha técnica requer atenção especial devido à queda constantes de rocha. Foi a primeira ascensão brasileira. Montanhista paranaense comemorou 20 de sua realização do Projeto 7 Cumes.

Waldemar Niclevicz acaba de retornar do Chile, onde ele escalou o Puntiagudo, um belo vulcão no Sul do país com forma espetacular.
A expedição fez parte de seu Projeto Mundo Andino e de quebra o montanhista paranaense ainda comemorou no cume 20 anos desde que finalizou o Projeto 7 cumes.
A ascensão foi bastante complicada. Isso porque o Puntiagudo é uma montanha rochosa que é bastante frágil. Lá é muito dificil escalar na melhor temporada, que é no verão, devido as avalanches de pedra. Por isso a estratégia é escalar no inverno, quando as rochas estão congeladas. Leia abaixo o relato de Waldemar na íntegra:
Foi a primeira vez que a bandeira brasileira tremulou no alto deste imponente vulcão – cuja última erupção foi em abril de 1930 – situado na Patagônia Chilena, caracterizado por um torreão vertical de 400 metros de altura que lhe dá a sua característica pontiaguda. 
Este torreão é formado por uma rocha decomposta, impossível de ser escalada no verão, quando o tempo é bom. Já no inverno a rocha fica coberta de gelo, o que torna a escalada viável, embora bem difícil, pois é um gelo tipo “escarcha”, formado por fortes ventos carregados de umidade. De fato não existe um parede uniforme, mas sim gigantescos chapiscos de gelo esculpidos pelo vento que são bastante frágeis.
O inverno na Patagônia é bastante hostil, as chuvas são constantes, sempre acompanhadas de muito vento. Dias de sol são raros, podem demorar várias semanas e até meses para aparecerem.
Escalei o Puntiagudo com meu querido amigo chileno Raul Enrique Barros Pardo, que conheci em 2012 no Annapurna. Junto com ele já havia tentado a mesma escalada em 2015, mas a chuva gelada não nos deu trégua. Agora parecia que seria a mesma coisa. 
Quando cheguei no aeroporto de Santiago, dia 8 de setembro, o tempo estava espetacular, fomos direto rumo ao sul. No dia seguinte completamos de carro os 1.100Km que nos deixaram na margem sul do Lago Rupanco. Ao final do dia 10 o tempo mudou drasticamente e começou a chover, enquanto caminhávamos com pesadas mochilas entre um emaranhado de trilhas deixadas pela exploração de madeira – que segue ilegalmente até os dias de hoje. O uso do GPS foi fundamental para encontrar o caminho certo.
A trilha encharcada pela chuva, e mais tarde completamente obstruída pela neve, só foi superada com grande dificuldade. Ao entardecer nossa progressão era lenta, pois nos afundávamos na neve até os joelhos, tivemos então que improvisar um acampamento a 970m, bem abaixo do local que havíamos utilizado em 2015, que estava a 1.300m.
A chuva continuou desabando e de noite se transformou em uma neve espessa, bastante úmida. Nevou pelo menos uns 20cm.
O dia 11 amanheceu cinza, temperatura entre 2ºC e 4ºC graus, alta demais, assim hora nevava, hora chovia. Ficamos o dia inteiro trancados dentro da barraca. Veio a noite e a chuva continuava, mesmo assim me preparei para a escalada. À meia noite acordei, vi que o céu estava estrelado, embora ainda não estivesse suficientemente frio, apenas 1oC. Deixei o Raul dormindo e segui sozinho até alcançar as primeiras encostas mais inclinadas do Puntiagudo. Lá fora do bosque o clima era outro, a temperatura estava abaixo de zero, o vento havia varrido o excesso de neve, a superfície do glaciar não estava totalmente dura, mas não me afundava tanto.
Voltei correndo para a barraca e acordei o Raul, que não acreditava muito que a escalada daria certo – apenas 5% de chances segundo ele. Começamos o ataque ao cume às 3 da madrugada, eu com 100% de confiança que a escalada seria um sucesso.
Quanto mais alto subíamos, mais duro ficava a neve sobre o glaciar. Céu estrelado, lua minguante despontando entre as montanhas, que maravilha! 
Às 8h contemplamos um lindo amanhecer, estávamos a 2.100m, abandonamos os bastões de esqui, pegamos os piolets e nos equipamos para a escalada técnica do torreão. Até o cume teríamos um total de 8 esticões de 60m cada um.
“Coliflores” (couves-flores) gigantescos de gelo, lances com até 90º de inclinação, muita neve na base das paredes, travessias aéreas! 
Guiei todos os esticões com rapidez e apreensão, temendo que fossemos surpreendidos por uma nova tempestade. Mas deu tudo certo! Às 14h10 do dia 12 de setembro, colocamos os pés no topo do Vulcão Puntiagudo (2.493m). 
O vento gelado não permitiu grandes celebrações, depois de tirar algumas fotos e organizar o equipamento, começamos a descida entre rapeis e desescaladas. Às 19h encontramos nossos bastões de esquis e nos desequipamos, contemplando o torreão do Puntiagudo dourado ao entardecer, já açoitado por violentos ventos úmidos.
Quando retornamos a nossa barraca, às 22h30, já estava chovendo! Felizes nos recolhemos, comemos e dormimos, para no dia seguinte regressar pela trilha nevada e encharcada, até uma cabana na beira da estrada, a 200m de altitude, que nos serviu de refugio, aonde chegamos molhados, gelados e totalmente embarrados, mas com o coração fervendo, transbordando de satisfação!
Escalar o Puntiagudo, um sonho antigo, além de dar continuidade ao Projeto Mundo Andino, foi a forma que eu encontrei para comemorar o aniversário dos 20 anos da conquista brasileira dos Sete Cumes do Mundo (a escalada da maior montanha de cada um dos continentes), que completei no dia 21 de setembro de 1997 com a escalada do Carstensz na Oceania, após já ter escalado o Aconcágua na América do Sul, o McKinley na América do Norte, o Elbrus na Europa, o Kilimanjaro na África, o Vinson na Antártida e o Everest na Ásia. 
Naquela mesma semana de comemorações, estive dia 20 em São José do Rio Preto SP, realizando uma palestra a convite do SESC para alunos e profissionais de Educação Física, realçando a importância do prazer como mola propulsora da superação.
Em qualquer modalidade esportiva ou na vida profissional, é preciso sentir o prazer no que se faz para se manter feliz e realizado. Durante o esforço a persistência e a determinação devem estar aliadas a satisfação, para naturalmente obtermos grandes resultados.
Ninguém deveria escalar uma montanha por obrigação ou em busca de recompensa. O que nos move deve ser o prazer durante a própria escalada, além do inegável êxtase de se chegar ao topo.
Que cada uma das suas conquistas lhe traga o prazer necessário para que você siga adiante, realizando os seus sonhos e acreditando que é possível tornar o mundo um lugar melhor para todos!
Ninguém deveria escalar uma montanha por obrigação ou em busca de recompensa. O que nos move deve ser o prazer durante a própria escalada, além do inegável êxtase de se chegar ao topo.
Que cada uma das suas conquistas lhe traga o prazer necessário para que você siga adiante, realizando os seus sonhos e acreditando que é possível tornar o mundo um lugar melhor para todos!


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Sobre o autor

Texto publicado pela própria redação do Portal.

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