Colin Haley realiza a primeira ascensão em solitário invernal do Cerro Torre

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Este inverno está rendendo bons frutos para os escaladores que decidiram desafiar o frio da Patagônia, mais especificamente os que realizaram projetos na região de El Chaltén. No mesmo dia em que os italianos Matteo Della Bordella e Marco Majori conseguiram realizar a primeira repetição da via Casarotto no Fitz Roy durante o inverno, Colin Haley fez a primeira ascensão em solitário durante o inverno no Cerro Torre da história.

Cerro Torre. Foto: Alex Proimos / Wikimédia Commons

Essa é a décima vez que Colin escala o Cerro Torre, montanha que ocupa seu coração desde a infância, conforme revelou em seu blog. E, após horas de escalada extremamente desafiadoras, mesclando trechos totalmente em solo e outros em solitário (fazendo sua auto segurança) essa se tornou a mais especial de todas para ele. O alpinista chegou ao cume em 07/09, pela Rota Ragni, em um projeto que surgiu há 18 anos, quando seu parceiro de escalada desistiu e ele ficou sozinho acampando no glaciar.

Colin contou em seu blog que já havia escalado essa via e queria repeti-la sozinho. Na época, chegou a separar equipamentos e se dirigir para a base da rota, mas antes de chegar percebeu que nunca havia feito nada sozinho naquele maciço de montanhas, o que o fez ponderar e voltar.

No ano seguinte, Walter Hungerbuhler, inspirado por uma conversa com Colin, conseguiu realizar a primeira escalada solo do Cerro Torre durante o verão. “Tenho certeza de que essa ideia não havia ocorrido a Walter antes, mas alguns dias depois ele fez a primeira ascensão solo da rota. Nunca fiquei nem um pouco chateado por Walter ter “pegado” minha ideia, mas foi uma lição precoce para talvez não compartilhar todas as ideias que tenho”, escreveu Colin.

Esse acontecimento fez com que Colin adaptasse sua ideia para algo ainda mais exclusivo: escalar a rota durante o inverno. Em agosto de 2013, Colin fez sua primeira tentativa, mas as paredes que no verão pareciam fáceis se tornaram extremamente desafiadoras devido ao gelo quebradiço que as cobria. Além disso, a aproximação foi exaustiva e fez com que o escalador encerrasse a tentativa logo acima do Col de la Esperanza.

Dez anos depois, Colin passou cerca de dois meses na Patagônia tentando novamente. Foi impedido por nevascas e temperaturas extremas, que mais uma vez o afastaram do cume. Na época, chegou a desistir do projeto, mas em 2025, após uma temporada difícil e malsucedida no Karakoram, decidiu retornar a El Chaltén.

A retomada de um velho projeto

Enquanto aguardava uma boa janela de tempo, armazenou equipamentos perto da base da Rota Ragni, contando com ajuda de um carregador na primeira parte da aproximação. Quando o tempo melhorou, saiu da pequena cidade de El Chalten acompanhado pelo fotógrafo Ty Lekki. Após chegar à base da montanha, Colin se separou de Lekki, que ficou acompanhando-o com um drone. Então se preparou para o início da escalada que começou em 06/09, às 5h da manhã.

Colin escalando com procedimentos de auto-segurança. Foto: Colin Haley

Após percorrer as paredes congelantes durante todo o dia e dedicar muito tempo à auto-segurança, montou seu acampamento para passar a noite. “Só à 1h da manhã finalmente montei minha barraca e comecei a derreter neve. A vantagem foi que, desse acampamento, restavam apenas 3 trechos entre mim e o cume do Cerro Torre”, relatou.

Acampamento montado em meio a parede do Cerro Torre. Foto: Colin Haley

No segundo dia de escalada, Colin teve grandes dificuldades na segunda cordada, onde precisou escavar um túnel em meio ao gelo, uma tarefa que exige muito tempo e energia. No terceiro e último trecho, sabia que deveria escolher um dos túneis de gelo formados naturalmente pelo vento e optou por aquele que lhe parecia mais seguro. Após uma hora de esforço para chegar à base desse túnel, veio a decepção: “Não era um túnel de vento, mas sim uma fenda no gelo glacial do cume do Cerro Torre. O problema era que essa fenda era extremamente estreita por dentro, e suas paredes eram de gelo glacial duro, então parecia extremamente improvável que eu conseguisse passar”, explicou.

Exausto e com o sol se pondo, pensou que recalcular a rota e voltar um trecho para tentar outro caminho acabaria esgotando suas energias. Então, a apenas 30 metros do cume, decidiu enfrentar a fenda estreita. “Aceitei que provavelmente não chegaria ao cume do Cerro Torre, mas decidi que não desistiria até que estivesse 100% claro que eu não conseguiria. Então, com essa determinação, comecei o episódio mais insano de exploração de gelo que já experimentei”, relatou.

Ele passou 2h45 abrindo caminho pela fenda, removendo neve e gelo. “Remover o gelo em posições contorcionistas foi extremamente difícil, e fiquei com hematomas terríveis, especialmente nos cotovelos. A passagem era tão estreita que tive que deixar para trás o máximo de equipamento possível”, contou.

Quando estava prestes a desistir, conseguiu sair da fenda e avançar por uma seção mais fácil até o cume. Às 22h, sob a luz da lua cheia e com pouco vento, Colin chegou ao cume quase apenas com a roupa do corpo e a lanterna.
“Foi surreal chegar ao topo da subida, depois de tanto tempo pessimista de que não conseguiria. Eu também estava um tanto incrédulo com toda a experiência, que foi certamente a chegada mais bizarra e insana de qualquer escalada que já fiz”, contou. “Naquele momento, eu me sentia extremamente ansioso para descer a montanha em segurança, mas era a conclusão de uma meta que eu havia estabelecido há mais de uma década”, revelou.

Após poucos minutos e algumas fotos, iniciou a descida, enfrentando dificuldades tão grandes quanto as da subida. Ele chegou ao acampamento, na base da montanha, às 6h15 do dia 08/09, cerca de 48 horas após o inicio da escalada.

Confira o relato completo dessa e outras escaladas de Colin aqui!

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Sobre o autor

Maruza Silvério é jornalista formada na PUCPR de Curitiba. Apaixonada pela natureza, principalmente pela fauna e pelas montanhas. Montanhista e escaladora desde 2013, fez do morro do Anhangava seu principal local de constantes treinos e contato intenso com a natureza. Acumula experiências como o curso básico de escalada e curso de auto resgate e técnicas verticais, além de estar em constante aperfeiçoamento. Gosta principalmente de escaladas tradicionais e grandes paredes. Mantém o montanhismo e a escalada como processo terapêutico para a vida e sonha em continuar escalando pelo Brasil e mundo a fora até ficar velhinha.

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