Conforme o projeto (PLS 403/05) de autoria do senador Efraim Morais (DEM-PB), devem ser estabelecidas regras para os “esportes radicais”, onde quem comercializar equipamentos a pessoas não qualificadas para a prática dos esportes estará sujeito a multa e pena de detenção de seis meses a dois anos. Além disso, condiciona a prática dos esportes radicais à qualificação técnica de instrutores e demais profissionais responsáveis pela preparação dos locais e operação de equipamentos, o que significaria obrigatoriedade da contratação de guias.
Ao que parece então o esporte livre e autônomo passaria a ser tratado como contravenção, e os equipamentos necessários para sua prática em segurança passariam a ser considerados como um produto ilegal, conforme interpretação do projeto.
Em nenhum outro país do mundo, qualquer modalidade do montanhismo (quando citamos o termo montanhismo estamos entrando em várias subdivisões que vão desde a simples caminhada em montanhas de fácil acesso, até às escaladas de grandes paredes e de alta montanha) se encontra proibida de sua prática, ou seus praticantes são proibidos de frequentarem seus terrenos de aventura, muito menos ainda é proibida a aquisição de equipamentos de escalada certificados internacionalmente pela CE e UIAA, siglas de entidades que para muitos brasileiros ainda são desconhecidas, mesmo os que praticam “esportes radicais” como citado no projeto que está sendo discutido hoje do Senado.
Se os acidentes acontecem, é porque se necessita de um planejamento de instrução de praticantes mais acertado, e ninguém melhor que os clubes e federações para ministrarem e organizarem os seus esportes, pois são os seus integrantes que conhecem a verdadeira natureza da utilização dos equipamentos de segurança e sua correta aplicação, além de tratarem da qualificação dos esportistas. Normatizar com respeito aos direitos da prática consciente significaria um avanço, restringir simplesmente o acesso aos locais de prática ou à compra de equipamentos representaria em primeiro lugar sepultar as próximas gerações de esportistas que estariam por surgir, e abriria o espaço para as empresas de “turismo de aventura” certificadas ganhassem essa nova demanda de indivíduos ávidos por aventura e dispostos a investir determinadas quantias para poderem usufruir da prática esportiva.
Não é impedindo o praticante de comprar seu material de segurança para escalada ou para qualquer outro esporte considerado “radical” que se conseguirá reduzir o número de acidentes, muito pelo contrário, é bem possível que engrossem as estatísticas devido à ausência de material adequado, pois não acredito que, como quase tudo neste país, se consiga realizar uma fiscalização em todas as áreas de prática esportiva de aventura no Brasil. É fácil impedir o lojista de vender, mas não o praticante de se aventurar sem os seus equipamentos.
Por outro lado, também aumentariam as vendas de produtos contrabandeados, pois quando algo tem a venda proibida, logo em seguida surge o mercado negro, suprindo as necessidades de muitos que se encontrarão desprivelegiados caso se aprove uma lei como essa com todos os seus pontos polêmicos e indiscutivelmente absurdos do ponto de vista de quem pratica o esporte com responsabilidade e máxima segurança.
É mais prático e barato proibir do que conscientizar e prevenir com a educação adequada.
Acidentes acontecem, todos os dias, sejam eles no trânsito, dentro das casas, no trabalho de cada indivíduo. E não se exclui deste quadro nenhum esporte, sejam eles “radicais” ou não. O que é mais perigoso para você, dirigir em uma estrada federal ou escalar uma montanha? A resposta é bem clara, na estrada não depende só da responsabilidade pessoal, mas de inúmeras pessoas, enquanto que numa escalada depende de duas pessoas com bom entrosamento que sabem até onde arriscar, quando é perigoso ou não.
Na montanha se assume os riscos, não existe atividade em montanha de alto nível na qual não se corra um mínimo risco. O que seria dos montanhistas que representam o país lá fora nas mais altas montanhas do planeta se já existissem essas proibições antes, talvez nunca tivessem se desenvolvido de forma plena.
Com tantas outras prioridades a serem resolvidas, acabamos nos dando conta que vivemos num país de cegos, mas esperamos que ao menos não seja também o país dos surdos e que seja dada a devida importância à opinião dos presidentes das confederações esportivas que conhecem mais do que ninguém as necessidades e anseios da comunidade que representam.