A região onde fica esta magnífica montanha é considerada a meca de escalada de aventura do Brasil, Salinas, um nome que veio de um vale próximo à montanha e que causa muita confusão, pois o nome verdadeiro do local é Três Picos e hoje é um Parque Estadual do Rio de Janeiro.
A Face Leste é uma das escaladas mais tradicionais dos Três Picos, a via foi aberta em 1974, um grande feito para a época e apesar do jeitão tradicional, a Leste é ainda uma via moderna, mas com toques de escalada de antigamente, com lances de chaminé e A0 em 700 metros de parede, o grau da via é: 5 V (6sup A0) E3.
Há muito tempo queria escalar a Leste, mas nunca tinha tido a oportunidade de ir para Nova Friburgo, pois escalar lá não é para qualquer um, apesar de ser uma via técnicamente fácil, ela é mais fácil ainda de se perder e é preciso ter experiência para não se incomodar com a exposição. Por causa destas caracteristicas, muita gente acaba pernoitando, sem planejar na montanha, que com seus 2365 metros de altitude costuma ser bem fria à noite.
Eu fui para Salinas com Tacio Phillip de São Paulo, estávamos vindo de outra escalada tradicional, que foi a Obra do Acaso no Pico do Baiano na Serra do Caraça em Minas, achei que estaria pronto para encarar uma escalada em Salinas então fui direto na via mais clássica de todas.
Como a gente estava sem informações, passamos no refúgio do Sergio Tartari onde compramos o guia recentemente reeditado, aproveitando para conhecer o local e a lenda, um cara muito tranquilo que mora na região há 17 anos!
Depois de pegar uns “betas” fomos para a parede, onde bivacamos na base para começar a escalar cedinho no outro dia. Só havia um problema, havíamos esquecido de comprar algo salgado para comer e tudo o que tínhamos de jantar era bolacha, “Goiabinha” de chocolate e água, foi comer e passar uma noite tranquilo, muito estrelada, à espera dos primeiros raios de sol.
Ao amanhecer, tomamos um café da manhã com Goiabinha de Chocolate, bolacha e água e às 6:30 estávamos começando a escalada.
A primeira e segunda enfiada são bem fáceis e positiva. Entre a terceira e a quarta senti o que é escalar em Salinas, interpretei mal o croquis e errei a via, estiquei a corda e acabei parando num lugar onde fica uma parada de rapel, fora da via. Tive que desescalar para voltar para a via e puxar um baita dum arrasto para depois dar segurança para o Tacio que vinha de segundo.
Corrigindo o problema, voltamos para a escalada. Dá para sentir como a via reflete a época que ela foi conquistada. Em vários trechos há aderências que poderiam ser escaladas sem problemas, mas a via desvia destes lugares por causa disso, a via tem enfiadas curtas, pois estes desvios fazem que a corda fique com muito arrasto, sendo difícil de escalar assim.
Há também vários trechos onde esses desvios não são sinalizados, ou seja, não há grampo nenhum e vc acaba indo reto, por isso que para fazer esta via é preciso estar com o croquis na mão e saber ler ele direito.
As chaminés são outros lances à parte. São duas, sendo que a primeira tem uma saidinha que pode deixar muita gente na perrengue, não dá pra cair nestas chaminés, pois elas só tem grampos no começo e na saída, um tombo ali é pra deixar o neguinho todo ralado. isso se ele tiver sorte.
No final da última chaminé há uma enfiada em A0, protegida com grampos caseiros. Passamos este lance usando estribos, o que facilitou muito. Há um outro lance em artificial, mas é muito fácil livrá-lo, pois lá é um 5 grau!
Fizemos a Leste em 17 enfiadas, pois há muitos lugares onde é preciso parar no meio por causa do arrasto, nem por isso demoramos muito, fizemos a via em 8 horas, chegando no cume às 14:30 e depois, rapelando pela Sylvio Mendes, chegamos na base às 17 horas! Nada mal para quem nunca tinha ido à Salinas, terra das longas noites!
Para comemorar nossa escalada: “Goiabinhas de chocolate”, bolachas e água.