Ao ganhar os amplos e largos descampados q compõem o alto da Serra do Cadeado, largamos as mochilas no q eles chama de “abrigo do Terreirão”, uma rústica cabana de madeira onde a galera costuma pernoitar, as 13:30. Protegida no interior de um pequeno bosque de pinheiros, a cabana tem um riozinho (Córrego Pereira, segundo a carta) correndo do lado q a abastece de água e dispõe de infra básica suficiente a quem tiver acampando pela região. Em tempo, tds aquelas terras (algo de 12km) pertencem à Fazenda , Peráu Vermelho, uma propriedade particular cujo casarão principal esta relativamente próximo, algo de 500m à esquerda do”abrigo”. Felizmente o Marcio conhece bem o caseiro local, o Claudio, q não permite mais o acesso devido á irresponsabilidade de alguns farofeiros, q agora recebe com espingarda em punho. Pois é, é sempre assim, por causa de uns poucos manés a maioria consciente paga o pato.
Pois bem, após deixar as cargueiras na cabana ganhamos outra vez a campina rumo sudeste, indo de encontro ao limite sul da Serra do Cadeado, mais precisamente no Mirante. O alto da serra é largo, amplo e forrado de pasto, onde eventualmente pipoca aqui e ali algum foco de mata, pinheiros, eucaliptos, ipês amarelos ou araucárias. Mas o visual recorrente principal é de descampados, pra nosso sufoco já q o calor da tarde ta de fritar miolos.
Após andar sem gde dificuldade topamos com arbustos barrando nossa passagem, mas uma abertura numa cerca indica a continuidade da trilha em meio a um espesso samambaial, sem gdes dificuldades de orientação. Serpenteando a mata desembocamos na beirada da serra ate dar finalmente no tal Mirante, as 14hrs, um patamar de lajedos com varias pequenas “mesas” e blocos rochosos, ideais pra descansar. Donos do pedaço, nos acomodamos em nossas “poltronas” rochosas afim de apreciar a paisagem q se descortina a nossa frente, na cota aproximada dos 1300m. Aqui a mesma paisagem do Mirantinho é agregada de largos vislumbres do quadrante sul, com planícies verdejantes esparramando-se ate perder a vista.
Na seqüência retornamos sem pressa à cabana afim de buscar as cargueiras e dar continuidade à travessia. Após o “abrigo”, passamos pela casa da fazenda onde alem de abastecer tds nossas garrafas com água tivemos uma animada prosa com o Claudio, q tb nos ofereceu alguns goles de chimarrão q deixaram os olhinhos da gaúcha Cacau repletos de alegria. Nos despedimos do simpático caseiro e prosseguimos agora pela estrada de chão q dá acesso à fazenda, as 15:15, q agora desviava num ângulo de 90 graus rumo leste. Sentido noroeste víamos perfeitamente os íngremes paredões escarlates do cânion q nomina a fazenda, o tal Peráu Vermelho, mas a exploração de suas encostas assim como o setor norte da Serra do Cadeado fica pruma próxima ocasião.
Indo então pela estrada e após arrematar vistosos limões prum futuro refresco, ganhamos novamente a campina qdo a estrada vira novamente pra noroeste, agora descendo rumo o asfalto. Entretanto, nos mantemos no alto indo de encontro á borda serrana, atravessando uma enorme campina ressequida ate dar em voçorocas de samambaias. Aqui há uma certa dificuldade em achar a beirada da serra, mas bastou acompanhar os vários trilhos de vaca q tds convergiam onde desejávamos ir. Não demorou a emergir do samambaial e tropeçamos com um visual deslumbrante q surgiu de forma súbita, assim como o chão a nossos pés tb sumiu dando lugar a penhascos verticais vertiginosos! Estávamos, as 16:20, no q o pessoal daqui chama de “Segundo Setor”, um local onde a galera costuma escalar os enormes abismos rochosos.
Andando cuidadosamente do alto daqueles paredões de pura rocha, ornados por belas bromélias e rainhas-do-abismo, jogamos as mochilas no chão e acomodamos nossas barracas literalmente à beira do abismo, de preferência nos lugares planos onde a rocha misturava-se a tufos de capim fofo. A vista privilegiada q tínhamos era indescritível, desta vez tendo larga paisagem do setor leste, repleto de pequenos vales e planícies, de onde apenas destoava majestosa e altiva a Pedra Branca, uma enorme montanha coroada de uma antena apontando prum céu azul desprovido de qq vestígio de nuvem. Analisando a carta de Mauá da Serra, estávamos a quase 1100m de altitude e o enorme rochoso q estava bem do nosso lado era um tal de Mulato.
Após muita contemplação e descanso, o tempo passou rapidamente q nem demos conta qdo o sol pousou no horizonte, com as cores do fim de tarde de outono tingindo o firmamento. Mas bastou a temperatura despencar pra dar a deixa necessária pra dar andamento ao delicioso ritual da janta, onde o Marcio mostrou-se um “chef” de mão cheia, preparando uma deliciosa polenta temperada e engrossada com sardinha, refeição esta de lamber os beiços. Não bastasse isso, a Cacau levou um vinho chileno pra molhar a goela do qual não sobrou nadicas. A sobremesa ficou a cargo da Lau, q dividiu uma caixa de Bis entre a galera, racionando um pouco pro dia sgte. Já minha contribuição à farta refeição foi mesmo de fome, legitima e genuína.
Quer mais q isso? Na seqüência nos lançamos a nossas respectivas barracas pra cair imediatamente no sono dos justos, onde a noite, alem de estupidamente estrelada, mostrou-se fresca e bastante agradável. De madruga, porem, levantei pra “regar a moita” apenas pra reparar q nem precisava de headlamp pois o disco prateado da lua iluminava td alto da serra tal qual um holofote! Ainda bem, pois meu medo era mesmo levantar à noite e despencar no penhasco, bem na saída de nossa barraca.
O domingo amanheceu lindamente, e tds fizeram questão de apreciar a bela alvorada q se revelou no horizonte. O sol emergindo do leste tingindo o firmamento de td tonalidade rubra imaginável pra no final deixá-lo apenas num azul-claro intenso. O friozinho gostoso matinal logo cedeu lugar ao calor intenso, q nos chutou pra fora das barracas afim de lembrar-nos q ainda tínhamos pernada pela frente. Tomamos um café sem pressa, racionando nossas sobras do dia anterior e imediatamente levantamos acampamento, no mesmo instante em q elétricos andorinhões revoavam sobre seus ninhos por td tipo de fendas dos paredões dos penhascos.
Começamos a andar as 8:15 cruzando td o capinzal pra cair novamente na estrada de terra do dia anterior, q bastou seguir sem gde preocupação. Como pra descer td santo ajuda, acabamos dando no asfalto da PR-376, as 9hrs. Dali tivemos q tomar a estrada sentido sudeste, uma vez q desejávamos atingir o cume da Pedra Branca, aquela avistada do nosso local de pernoite. E tome estrada, agora em franca ascensão, pra penúria da Cacau q já sentia o peso do descondicionamento. Durante o caminho tínhamos uma vista interessante e geral dos imponentes paredões nos quais havíamos pernoitado, no alto.
As 9:30 esbarramos com a entrada q dá acesso à Pedra Branca, um local onde haviam algumas casas e quiosques desativados. Aqui a Lau e a Cacau decidiram não subir à Pedra Branca e ficariam nos esperando, tomando conta das nossas cargueiras. E la fomos eu e o Marcio, subindo a estradinha q logo esbarrou num portão fechado. Uma senhora (a caseira provavelmente) permitiu nosso acesso e demos continuidade á andança, agora por uma precária estrada de terra q visivelmente contornava a montanha pela esquerda (norte) ate ganhar altitude, aos poucos.
O frescor da sombra logo deu lugar ao sol causticante na cachola, qdo atingimos uma crista aberta. Dali foi so acompanhar a abaulada crista daquele serrote, já visando as antenas de retransmissão q destoam do cume da Pedra Branca, à leste. As rochas, gravatás, capim e mata ressequida contrastam com a abundante vegetação verdejante do inicio da estrada. Mas apesar da aridez local, o visual dos paredões serranos despencando vertiginosamente ao meu lado compensam a agreste paisagem.
Após uma íngreme piramba pela estrada, q se alterna entre terra, lajotas de pedra e cimento detonado, as 10hrs e 3km após iniciada subida, atingimos o alto dos 1237m da Pedra Branca. As antenas da Telepar hj foram compradas pela Oi, mas ainda poluem de certa forma um visual q seria encantadoramente selvagem sem sua presença. Apesar disso, a panorâmica q se descortina ali do alto nos faz esquecer deste pequeno detalhe. Vales e morros de perder a vista onde quer q se olhe. À leste, ao fundo, podemos avistar claramente a silhueta da pirâmide q é o selvagem Pico Agudo, aventura pruma próxima ocasião. Mas o mais interessante é observar à sudoeste a Serra do Cadeado e analisar o trajeto percorrido no dia anterior. Avistamos de forma privilegiada td topografia serrana desde o Mirante até o Peráu Vermelho.
Retornamos satisfeitos envoltos numa animada conversa sobre futuras incursões à região ate reencontrar as meninas no asfalto, as 11hrs. Como o bus direto pra Londrina passava em torno das 14hrs, resolvemos tomar umq fosse pra Mauá da Serra, de freqüência maior e q passaria em breve. E de lá tomávamos o latão pra Londrina. Dito e feito, as 11:40 embarcamos no busão, mas não sem antes molhar a cabeça numa refrescante bica à beira da estrada. Claro q a viagem foi feita no mundo dos sonhos.
Chegamos em Mauá da Serra quase ao meio-dia, e imediatamente adquirimos as passagens pra Londrina, marcada pras 14:40hrs. Com tempo de sobra, obedecemos as dicas de uma simpática guria q tb tava no bumba e fomos almoçar num tal Restaurante Gabriel, em frente à rodoviária. A dica mostrou-se certeira. Por meros R$11 nos fartamos de generosos pratos de costela, frango á passarinho e td sorte de agregados, como macarrão, feijão, salada e arroz. Desnecessário dizer q sobrou (e muita) comida. Pra molhar a goela e sempre disposto a experimentar novidades etílicas, mandei ver uma tal breja Spoller, q nenhum dos meus companheiros de trip aprovou.
Devidamente empanturrados, aguardamos o busunga jogados no chão da rodoviária de modo a facilitar a digestão, pra espanto e curiosidade dos locais q ali transitavam. Embarcamos somente as 15hrs pra chegar em Londrina uma hora depois, envoltos ainda naquele calor intenso dos infernos q fez da viagem algo similar a um microondas ambulante. Mas entre mortos, feridos e cozidos, a travessia havia muito valido a pena. Pois somente metendo as caras constatamos q nesta região onde o Terceiro Planalto Paranaense aparentemente mostra-se totalmente horizontal, a Serra do Cadeado rompe a monotonia da paisagem de planícies de perder a vista, alem de destacar-se tb como ótima opção pra caminhadas mais radicais. E se a travessia pelo setor sul desta serra pouco conhecida apresentou surpresas ate então de domínio de poucos, imagine pelo setor norte, além do Peráu Vermelho. Enfim, fica lançada a semente de uma travessia derradeira pela crista toda. Até lá, vamos descobrir lentamente, em minúcias, os (des)
caminhos q essa bela surpresa no norte paranaense ainda insiste em guardar em segredo.
Jorge Soto
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