A culpa é do Ricardo, cujas intenções de se enfiar nas nascentes além da “Curva da Onça” coincidiram (e couberam como luva) com minhas pretensões. Contudo, o voto final pra trip foi a deixa dada pelo folclórico Seu Geraldo sobre a existência duma picada bem batida q tocava na direção pretendida. “Só não sei as condições em q se encontra pq já faz tempo q não vou lá. Mas q ela existe, existe!” , garantiu ele. Esta vereda, segundo o astuto ex-mateiro e atual pau-pra-td-obra, atende pelo nome de “Barraco da Santa” em virtude dum altar rústico q foi erguido pelos mateiros-pioneiros q se enfiaram naquele obscuro e distante setor serrano. Pronto, imediatamente mudamos nosso objetivo: se queríamos alcançar nascentes encachoeiradas além do Guacá primeiramente deveríamos encontrar esta vereda. E assim foi. Fechado!
Chegamos então eu e o Ricardo na Balança (km 77 da SP-98) as 9:10hrs, naquela manhã de sexta-feira q se insinuava ensolarada e com bom tempo. Lá encontramos os demais integrantes da empreitada, resumidos à Vivi e o Fabio, q já nos aguardavam devidamente preparados pra trip exploratoria de feriadão. Em tempo: a pernada fora programada pra dois dias apenas, uma vez q a previsão meteorológica desaconselhava td e qq incursão pro domingo.
Após ajeitar as enxutas cargueiras e beliscar troços de panettone como desjejum (cortesia da Vivi), iniciamos a pernada pelo asfalto por volta das 9:30hrs. Caminhada sacal e entediante por uma movimentada SP-98, q por conta do feriado tava apinhada de veículos descendo pro litoral (boa parte com pranchas no teto) e nalguns trechos o transito ate se mostrava lento. Entretanto, a medida q avançávamos íamos colocando a conversa em dia na mesma proporção em q nossa vontade de nos embrenhar no desconhecido aumentava gradativamente.
As 11hrs chegamos finalmente na famosa “Curva da Onça”, isto é, na ponte sobre o Rio Guacá, q por sua vez se encontra por volta do km 85 da Rodovia Mogi-Bertioga. Abandonamos o asfalto e num piscar de olhos nos pirulitamos sob o decrépito pontilhão concretado, o qual ainda nunca vi sinal dalgum gde felino ou vestigios da pintada por ali. “Curva dos Despachos” ou “das Garrafas e Vasilhames” seria um nome bem mais apropriado atualmente, por conta dos trabalhos e entulhos deixados por algum mendigo na supracitada curva.
Descemos então pra baixo da ponte e bem antes de chegar no leito do rio nos embrenhamos num discreto rabicho de trilha subindo a encosta. Esta picada eu já conhecia doutras duas ocasiões (da trip do “Poço das Antas” e da descida do “Alto Guacá”) e seria nosso referencial de acesso à crista serrana inicial. Sabia q no decorrer haveriam trocentas bifurcações no trajeto e a partir dali teríamos q navegar atraves da bússola, carta e alguns ptos previamentes plotados pelo GPS do Fabio. Em tese tínhamos um dia pra ir e outro pra retornar. E como era minha primeira vez na regiao de cargueira sabe-se lá onde daríamos naquelas condições. Isto é, seja o qDeus quiser..
Pois bem, a caminada já começou na vertical pois a vereda nos obrigou logo de cara a escalaminhar piramba acima, o q nos deixou imediatamente com suor escorrendo pelo rosto.Após 15minutos verticalizados q exigiram fôlego, pernas e braços de td mundo, alcançamos um ombro serrano onde a pernada aparentou nivelar. O som dos veículos foi deixado pra trás mas foi substituído pelo rugido do furioso Rio Guacá logo abaixo, a nossa esquerda, e dos vários pequenos tributários q são cruzados no caminho. Ou seja, água em fartura. E la fomos nos avançando em ritmo até compassado e ágil ganhando altitude imperceptivelmente a serra, na mesma medida em q bordejávamos aquela encosta de declividade acentuada. No caminho, os obstáculos se traduziam entre varias bifurcações, onde tomávamos a principal ou q se dirigisse no sentido leste; mas principalmente em muita mata tombada, q nos obrigava não somente a vários desvios como a farejar constatemente a continuidade da picada.
Por volta do meio-dia alcançamos uma bifurcação importante (e relativamente imperceptível) ao mesmo tempo em q o som duma cachu proxima toma conta do silencio da mata. Pois bem, na tal bifurcação (em formado de “Y”) o ramo da esquerda tende a se manter acompanhando o Guacá, apos cruzar um pequeno corrego q parece ser detentor de uma cachu se for acompanhado encosta acima. Mas a gente se mantem pela direita q vai no sentido desejado, afastando-se do Guacá e indo de fato pro alto daquela serra divisora de vales. Uma piramba forte é vencida e logo nos deparamos com um simpático riachinho q nada mais é o mesmo mencionado no inicio deste parágrafo. Ali, no alto dos rochedos podemos observar uma bela cachoeira q faz as águas se afunilarem em direção dum belo e vertiginoso cânion rochoso.
A partir daqui a trilha acompanha a margem direita do riachinho em meio a muito brejo e charco. Lirios do brejo e voçorocas de belas bromélias ornam este trecho alagado q na verdade é um largo colo serrano. Mas não demora pra trilha cruzar o riachinho logo adiante, onde aparentemetne a picada se bifurca outra vez. Aqui tivemos um breve perdido tocando pelo ramo da esquerda e q não levou a lugar nenhum a não ser o leito arenoso de um vale de altitude, sinal q o sentido correto era tocar pelo ramo da direita. Inicialmente bordejamos a encosta seguinte pra depois alcançar definitivamente o almejado topo serrano, q pelas indicações do Fabio estavamos na cota dos 770m.
E assim prosseguimos pelo alto da serra, palmilhando seu abaulado topo montanhoso e florestado rumo leste. Frestas na vegetação apresentavam flashes dos vales a nossa volta, mas bacana mesmo foi ter o primeiro vislumbre do litoral, numa dessas janelas. Por volta das 12:50hrs chegamos num cruzamento (q apelidamos de “bifurcação da muriçoca” por motivos óbvios) onde tocamos pra direita e, em tese, ia onde desejávamos. Mal sabíamos q se tivéssemos permanecido na principal (esquerda) teria dado na mesma e seria até melhor. Pois bem, ao atingir o alto dos 813m dum morro, tocamos por uma discreta picada q tocava pro sul, descendo suavemente a crista naquela direção, supostamente rumo algum vale. No entanto td q é bom dura pouco pois a picada ficou confusa e não tão óbvia assim, mas nos levou a um simpático córrego onde tivemos nosso merecido pit-stop pra lanche e descanso, as 14hrs.
A pernada prosseguiu na dúvida: eu desejava descer o tal rio; mas o resto aparentemente desejava achar a continuidade da picada. Enfim, eu descobri a dita cuja, mas q não ia no sentido desejado e sim tocava pro norte. E la fomos nos acompanhando a suposta trilha, varando algum mato e vendo aparentemente onde ela daria. Decididametne aquela picada não era a principal e sim uma variante daquela q havíamos abandonado. Mas foi ai q após um tanto terminamos desembocando numa larga e gde trilha percorrendo a crista serrana q conferia em tds sentidos com a descrição do Geraldo. Estavamos enfim no “Barraco da Santa” e agora tocaríamos por ela indefinidamente pra ver onde nos levaria. Era um tiro no escuro, mas esse era o espírito da coisa. Ricardo já tomou a dianteira, faconando trechos onde a vegetação insistia em tomar conta de td, enqto eu e o Fabio conferíamos a direção; a moda antiga e com recursos modernos, respectivamente.
E la fomos nos num ritmo compassado e continuo pela tal “Trilha do Barraco da Santa”, uma vereda realmente bem obvia e batida q percorre a crista e borda serrana sempre no sentido norte, nordeste e leste, q pela carta corresponde ao setor extremo oeste da Serra do Juqueriquerê. No caminho daquela crista abaulada e florestada, muitos marcos de concreto apenas confirmam estarmos no alto de td e todos, onde breves frestas na mata nos privilegiavam com vislumbre seja do litoral, dos vales ao norte ou dos penhascos q despencam das encostas rochosas a sudoeste. Outra coisa q nos chamou a atenção foi encontrar muito palmito cortado e , logicamente, alguns acampamentos (aparentemente desativados) quase q sequencialmente no decorrer do percurso, tds próximos de pequenos cursos dágua. No ultimo q encontramos, por volta das 15:30hrs, até plotamos sua posição pois além de água oferecia ótimo lugar plano pra acampar, caso a noite nos surpreendesse antes da hora. Ali tb um pequeno e tímido cagado foi a vedete reptiliana q foi metralhada de flashes pela galera, assim como as onipresentes pegadas de antas marcadas pela fofa areia das pequenas prainhas fluviais.
A pernada pelo alto prosseguiu sem nenhum problema e o tempo foi passando a pto ate disso passar desapercebido. Íamos sempre sentido leste, na media, sendo q não víamos bifurcação nenhuma nascer serra abaixo, a nossa direita. E assim mesmo fomos avançando por aquela larga e bem batida trilha, q naquela altura do campeonato era quase uma “highway” em plena Serra do Mar. Mas foi so o sol ir embora e um negrume tomar conta do firmamemto q nos deixou preocupados na sequencia. Trovões eram ouvidos ao longe e apesar de ser 17hrs não tardaria a escurecer ali, no meio da mata. E assim nossa prioridade deixou de ser percorrer a trilha e sim buscar um lugar decente pra encostar o esqueleto, de preferência com água. No entanto, como andávamos pelo alto da serra o precioso liquido dificilmente seria encontrado, motivo pelo qual teríamos q nos virar com o q já dispúnhamos nos cantis. Felizmente tds estavam relativamente bem munidos, mas isso não nos impediu de ter de racionar durante a noite. Eu tive q me virar com minha modesta garrafinha de 500ml.
Resumindo, pouco depois das 17hrs encostamos em definitivo num colo serrano dominado por duas enormes pedras q serviram de tocas ou lapas improvisadas. Imediatametne armamos nosso acampamento não apenas pelo cansaço do dia pegando mas principamente pela iminência de chuva se aproximando: eu e o Ricardo armamos nossa redes enqto a Vivi e Fabio acomodaram sua barraca no único local plano, ligeiramente inclinados. O rugido de muita agua correndo num fundo e íngreme vale aos sul deixou nossa boca salivando, mas infelizmente teríamos q conformar com o q dispúnhamos e, se bobear, faríamos captações pra aproveitar a água da chuva q decerto viria em breve.
Na sequencia e antes de escurecer demos iniciio ao sagrado ritual da comilança, onde mandei ver uma marmita previamente preparada de casa, enqto os demais colocavam o fogareiro a ronronar: Ricardo mandou ver seu miojão incrementado enqto Vivi e Fabio preparavam um deliciosa capelete a bolonhesa. Não demorou pra eu desabar na minha bendita rede, não apenas por conta do cansaço acumulado mas por conta dos trocentos mosquitos q parece não viam sangue fresco a muito naquelas bandas.
Foi ai q as brumas abraçaram o alto da serra, um prenuncio da chuva vindo. E ela veio com força, obrigando td mundo a se recolher a suas respectivas acomodações. Pior foi o Ricardo, q mal tinha armado direito sua rede e teve q se mocar, sentado sob a lapa, a espera da chuva parar pra armar direito seu cafofo. Eu comecei a dormir bem, mas não tardou a sentir infiltrações na minha lona. Claro q procurei abstrair, mas qdo senti o traseiro umedecer tentei remediar a situação de alguma forma. E la fora a chuva caindo com força. Claro q naquela hora não dava pra fazer nada a não ser tentar descansar naquelas condições, e assim consegui “dormir relativamente bem” com 1 /3 do corpo molhado e o saco de dormir umedecido. Isso seria fichinha não fossem os mosquitos, q realmente tornaram a noite um inferno, e me obrigavam constantemente a cobrir o rosto, pois ele já tava empolado de tanta picada q levou.
Lição aprendida: nunca arme rede sem mosquiteiro. Creio q os únicos q tiveram um sono decente foram o Fabio e a Vivi, embora sua barraca estivesse inclinada. Qdo a chuva parou veio o frio, assim como trocentos vagalumes q cintilaram durante boa parte da noite. O céu ate q abriu frestas da noite estralada, mas o bom mesmo foi qdo surgiu o enorme disco prateado da lua brilhando bem acima da gente. Pra logo depois desaparecer em meio a nuvesn e nuvens de umidade e serração.
O sábado amanheceu frio e encoberto, confirmando a previsão meteorológica. Demorei a sair do meu cafofo, principalmente tendo em vista aquela noite interminável mal dormida. Pior foi o Ricardo, q acordou com a cara inchada de picadas parecendo alguma coisa entre o ET e o Homem Eelefante. As coceiras pelo corpo abundavam mas não somente de em virtude dos pernilongos e sim dos carrapatos. Sim, onde tem anta tem carrapato. Mas e daí? Faz parte. Tomamos rapidamente café pq não demorou a voltar a chover forte, e se tem algo q é um porre é ter de desarmar acampamento tomando água na cachola, mesmo q este se resuma a uma simplória rede com lona em cima.
Zarpamos dali dando meia-volta na trilha e voltando pelo mesmo caminho, logo depois das 8hrs. Nossa trip de reconhecimento chegara apenas ate ali mesmo. Vontade de seguir em diante e ver onde aquela bendita trilha daria não faltou, mas o mau-tempo e a falta de provisões cunhava somente ate ali nossa trip exploratória. E isso já tava de bom tamanho pra gente, afinal duvido q mais alguem conheça aquela “rodovia” no alto da serra, a exceção dos palmiteiros. Felicidade foi atingir o primeiro correguinho q vimos pela frente, onde nos deliciamos com o precioso liquido, q nos fez falta durante aquele pernoite perrengueiro. E como era de se prever, a volta foi bem mais rápida q a ida, mesmo estando a trilha mais enlameada, escorregadia, repleta de charco e com abundancia de vegetação tombada por conta da chuva noturna. Tivemos alguns perdidos por conta disso, mas q foram rapidamente sanados por conta da hábil navegação (e plotagem da trilha principal) do Fabio.
Dessa forma ganhamos as encostas da Vale do Guacá por volta das 10hrs e, movidos principalmente por inconvenientes e enormes mutucas, chegamos no asfalto da Mogi-Bertioga um pouco antes do meio-dia, onde uma chuva torrencial fez questão de nos ensopar de vez. O entediante e cansativo trecho de quase 6km de asfalto serra acima foi feito a passo de tartaruga-manca, sob muita agua. Carona? Naquelas condições e nosso atual estado, impossível. Nem eu daria carona pra gente. Mas mesmo assim conseguimos finalmetne chegar na Balança por volta das 13:30hrs, onde mudamos nossas vestes e mandamos ver umas brejas e salgados pra repôr os liquidos e a energia gasta na trip, q consumiu quase q 34km percorridos, de acordo o aparelhinho do Fabio.
E essa foi nossa primeira e perrengueira incursão de reconhecimento pela “Trilha do Barraco da Santa” da qual embora não tenhamos visto sequer sinais ou vestígios das estruturas q lhe emprestam o nome, em compensação nos abriu um gde leque de possibilidades no quesito caminhadas legitimamente selvagens. A trilha, em tese, toca pra leste daquele setor serrano inipterruptamente e uma exploração de td sua extensão demandaria mais dias, como garantia. Outra constatação é q se ela é atualmente percorrida por palmiteiros certamente deve ter algum acesso ao litoral, já q o mais próximo de “civilização” dali vem da baixada e a maior parte destes extrativistas ilegais é oriunda de lá. Isso resultaria numa nova e fantastica travessia rumo a baia de Guaratuba. Isso sem mencionar em super-caminhadas sentido leste, indo, por exemplo, a cobiçada Pedra da Boracéia, o pto culminante da Serra do Mar paulistana. E por ai vai. Eis a promissora e desconhecida “Trilha do Barraco da Santa”.
Jorge Soto
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