Leia a segunda parte desta aventura
PARTE 3: SALTA – SAN ANTONIO DE LOS COBRES (170K) – SUSQUES (176K)
Continuando a viagem o clima começou a ficar mais instável, mas não dava para desistir, conforme começamos a ganhar altitude, os “Gigantes” foram surgindo de forma impressionante em todos os sentidos, belos e realmente ENORMES, nos fazendo enxergar nossa “pequenez”. Encontramos rios quase secos com animais andando por eles e uma pontezinha de ferro estreito passando por cima. Fiquei imaginando se estes grandes sulcos na terra sejam resultado não só de chuva como também de degelo, comecei a bater fotos e não consegui mais parar. A 2.100mts encontramos uma lanchonete com duas lhamas que me chamaram a atenção, paramos para tirar fotos e comer um alfajor delicioso. Conforme íamos subindo a flora foi mudando suas características, a mata ficou mais rala e começaram a surgir cactos enormes.
A aproximadamente 3.000m paramos em uma trilha chamada Vale Encantado, já dava para se ter idéia da razão deste nome, mas não pudemos conferir de perto, a densa neblina não nos deixava enxergar muita coisa. Por inexperiência, saímos de Salta com um tempo quente e sem nuvens no céu, estávamos despreparados para o tempo ruim e enfrentamos a trilha com agasalhos improvisados. Voltando para o carro haviam momentos que o vento abria caminho entre na neblina, parecia até que os “Gigantes” estavam soprando a neblina para nos mostrar a beleza de suas silhuetas mais de perto. Com o tempo mais aberto subimos de carro até uma capela, onde descemos do carro novamente para fotos. O Léo “apostou” uma corrida como Luca de uns 30m e quando o Luca chegou na capela, ele simplesmente se agachou no chão e disse: “Ai mamãe, meu coração está na minha garganta.” Tadinho, tem um pai sem noção. Mais uma vez no carro continuamos pela estrada, foi impressionante ver gado e burros pastando tranquilamente em um lugar tão GELADO para quem está “sem roupas”. Paramos ao lado de umas pequenas elevações e fomos “escalá-las” e, claro, tirar mais fotos, desta vez fomos todos em um ritmo mais lento. O tempo abria e fechava o tempo todo e entre uma coisa e outra pudemos conferir um pouco das maravilhas que estavam nos cercando. Depois disso resolvemos voltar para Salta e não prestei mais atenção em muita coisa, jantamos e fomos dormir, fiquei com os Andes na cabeça. Impressionante como o Luca encarou tudo com muita naturalidade.
Dia 16/12 depois do café da manhã nos despedimos do Hostel e fomos ao shopping como todo bom paulista… precisávamos comprar comida para os próximos dias, já que pretendíamos acampar. Acabamos comprando uns acessórios a mais para a viagem. Almoçamos por lá mesmo e fomos “turistar” no teleférico da cidade, são mais de 1.000m de bondinho com um desnível de 285m. A altura impressiona, à medida que o bondinho ia subindo a cidade de Salta ia se mostrando e as montanhas de fundo completavam a beleza da paisagem. De lá de cima podemos ver toda a cidade de Salta e ainda a cadeia de montanhas que a cerca, uma vista realmente LINDA.
No topo da montanha descemos do bondinho e encontramos muitas coisas interessantes como uma lanchonete, um museu, um relógio de sol, dois parques infantis que o Luca adorou e, é claro, lojinhas de artesanato local, o lugar é muito agradável para pessoas de todas as idades. Andamos um pouco por lá e descemos para pegar estrada, desta vez o destino era San Antonio de Los Cobres, cidadezinha encravada no alto dos Andes. Em uma estrada estreita mas boa a vista era de tirar o fôlego, no meio do caminho nos deparamos com uma placa com a altitude em que estávamos, chegamos a voltar para conferir, mas era real… estávamos a 4.080mts de altitude. Logo que chegamos em San Antonio de Los Cobres encontramos um hotel que parecia bem legal, mais confortável do que eu imaginava poder encontrar em uma pequena cidadezinha àquela altitude, mas quando perguntamos pelos valores descobrimos que não era só mais confortável, mas era mais caro do que esperávamos também. Ficamos com um pouco de receio de não encontrar outra coisa, por causa da localização e população da cidade, mas encontramos outros lugares mais baratos e acabamos ficando em um bem simples e bem aconchegante chamado Hotel Esperanza. Depois de acomodados ficamos no quarto e o Luca começou a reclamar de dor de barriga, dei uma dipirona para ele e fiz um pouco de massagem em sua barriga, torcendo para que não fosse nada de mais. À noite àquela altitude fez bastante frio, mas o quarto tinha aquecedor. Ainda assim esta foi a primeira vez que o Luca dormiu com cobertores, cinco, logo ele que não para coberto à noite, se revirando na cama. A 3 anos em Natal e indo para São Paulo só nas férias de verão ele mais parece filho de índios, passa o dia descalço e de bermuda, para ir à escola é tênis, bermuda e regata, dorme de cueca box e regata, não usa nem lençol para se cobrir. Por isso passei a noite dando umas pequenas acordadas para ver se ele havia se descoberto, com medo dele passar frio, mas eu acho que ele não chegou nem a se mexer.
Dia 17/12, acordamos todos bem e tomamos nosso primeiro café da manhã nas alturas (aproximadamente 3.700m de altitude), planejávamos apenas conhecer o point de escalada (Quebrada Tuzgle), já que precisávamos nos aclimatar… mas nossos planos deram errado…
O caminho continuava impressionando e pela primeira vez vi uma montanha nevada, patos selvagens, lhamas e alpacas. A chegada a Tuzgle (aproximadamente 4.200m altitude) é anunciada pelo lindo vulcão que dá nome à quebrada. Passando o vulcão, os blocos começam a surgir de todos os lados da estrada, ficamos empolgados com a quantidade de pedras, blocos para todos os lados por, sei lá, talvez uns 3k. Eu nunca tinha estado em um lugar como este, blocos de pedra para onde quer que você olhe, é ALUCINANTE. 4k a frente da Quebrada Tuzgle fica a comunidade aborígene Puesto Sey, como nosso croqui mapeava à partir do povoado, fomos até lá e fizemos o caminho voltando para identificar os boulders. Quando descemos do carro e tocamos a rocha percebemos que não só a quantidade como também a qualidade dos boulders eram impressionantes, arenito de altíssima qualidade, então… conhecemos, reconhecemos os blocos do guia que tínhamos e chegamos perto demais para resistir a uma escaladinha.
Já era hora do almoço e estávamos em uma cavezinha bem agradável, melhor abrigada do vento e que oferecia uma boa sombra no sol de rachar. Cozinhamos um macarrão com queijo na espiriteira, comemos e começamos com uma exploração por boulders por ali mesmo, no meio dos boulders encontrei uma minúscula vegetação bem interessante com flores tão pequeninas que cabiam umas cinco na ponta de meus dedos. Os blocos eram um pouco baixos, mas queríamos pegar leve para dar uma aquecida e nos aclimatar com a altitude e o clima. Nosso primeiro boulder não estava no croqui e ficava em um dos dois blocos que formavam a cave. Pegamos leve, mas o leve era HARD, respirar era complicado, andar mais que 10 metros por vez era beeem difícil, por mais que a gente puxasse o ar parecia que o oxigênio não era suficiente, que mal chegava nos pulmões. Andando entre os blocos o Luca andava uns 30 metros e ficava uns 2 minutos agachadinho para se recuperar e voltar a andar mais 30. A escalada foi precária, acho que escalamos uns V0/V1 (não tenho certeza da graduação dos boulders, para confirmar só trazendo para o nível do mar, lá o esforço era grande) de 2mts que pareciam um sprint e depois de cada entrada a recuperação era lenta. O sol estava quente e como ventava bastante o tempo ficava agradável, mas precisávamos tomar cuidado para não nos queimar sem perceber. Na sombra a história era outra… agasalho e touca para proteger as orelhas. Estávamos muito empolgados com a quantidade e a qualidade da rocha apesar da dificuldade para andar de um lado para o outro. Conhecemos outro V1 bem legal, em outro bloco, tudo muito devagar.
No final do dia havíamos escalado apenas 3 boulders, e terminamos com uma sensação de cansaço estranha que eu nunca havia sentido antes, era um cansaço sem cansaço se é que dá para entender, muito louco. O Luca ficou bem tranqüilo entre brincadeiras de paus, pedras, jogos de celular e tablet.
Na janta cozinhamos macarrão novamente, mas desta vez com atum enlatado, o pior foi lavar a louça na água “fresquinha” que formigava as mãos logo no primeiro contato, o Léo foi o sorteado para esta tarefa. Louça lavada encontramos um lugar próximo a um riozinho para acampar, tentando proteger a barraca do vento com um pequeno bloco de um lado e o carro do outro. Para dormir… roupas quentes, sleeping e chá e ainda assim a noite não foi das mais agradáveis. Começamos a assistir ao filme Piratas do Caribe 4 para relaxar mas comecei a ter uma dor de cabeça ANIMAL, tomei uma dipirona e resolvemos desligar o tablet eu precisava dormir.
Dia 18/12/2012 depois de sair da barraca constatei o óbvio, o carro estava coberto por uma fina camada de gelo, mas com o sol pudemos vestir roupas mais confortáveis. Agora quem estava com dor de cabeça era o Léo, ele tomou a PRECIOSA dipirona e depois disso comemos e escalamos o dia inteiro… BEEEEM devagar. Tudo era difícil não era o corpo, mas o corpo não respondia muito bem, apesar disso elegemos outro bloco e nos divertimos muuuito. O Luca alternava escalada, brincadeira com areia e pedras, jogos no celular ou ainda jogo ou seriado no tablet, o desenho da vez era “Avatar – A lenda de Ang”, Santa Tecnologia. No final do dia mais dois boulders para o caderninho (V1/V2). Conforme a noite foi avançando a dor de cabeça foi aumentando, tomei dipirona novamente mas eu só conseguia prestar a tenção na dor, por isso resolvemos voltar a San Antonio de Los Cobres para jantar e dormir bem.
Elegemos um restaurante para comermos e não tínhamos nem idéia do que iríamos conseguir, chegando no restaurante descobrimos que só tinha carne de vaca ou de lhama de mistura, como eu não gosto muito das carnes vermelhas que já experimentei resolvemos pedir o prato de Lhama e ver o que ia dar. Para nossa surpresa a comida foi muito boa e muito bem servida, descobrimos que um prato e mais uma salada alimentava nós três muito bem.
Ficamos no Hotel Esperanza novamente, o Luca ficou bem o tempo todo, não chegou nem perto de passar mal como eu e o Léo, mas ainda assim continuava reclamando de dor de barriga, então decidimos passar em um posto de saúde no dia seguinte.
19/12 hoje era dia de despedida, depois da merecida noite de sono e do café da manhã, fomos comprar água e levar o Luca ao médico. Fomos atendidos por duas enfermeiras e uma médica muito atenciosas. O Luca estava bem e a médica apenas nos deu um remédio para espasmos abdominais e fomos comprar um pouco de água. No caminho para a rocha acabamos encontrando uma feirinha local a preços muuuito baixos, o Luca estava precisando de uma calça quente, as dele já estavam BEM sujas e não iríamos lavar roupas ali, acabei comprando uma calça REALMENTE quente pelo valor equivalente a R$7,00. A caminho de Tuzgle havia uma casinha comercial que vendia artesanias e parei para comprar uma touca com orelhas para mim… e chá de Coca, ficava no meio do nada. Um pouco mais à frente passava o trilho do Trem de Las Nuvens, mas as pessoas não tinham como descer por ali e me peguei pensando em quem eram os clientes desta casa.
Em Tuzgle desta vez escolhemos 2 blocos do guia, Apnéia e Mundial. No Apnéia o filé mesmo é um V6, mas estávamos tomando pau de V2/V3 então entramos em um V3 alucinante, lindo, beeem negativo e com uma movimentação animal mas faltou crash e mais seg, ou então peito para fazer o domínio com o que tínhamos mesmo (2crashs e 1 seg), mesmo assim foi IRADOOOO. Depois do Apnéia íamos fechar o dia no Mundial, mas o tempo resolveu mudar nossos planos, entramos em um V2 também negativo e alto, ou seja, tínhamos os mesmos problemas de crash, seg ou peito. Para ajudar o psicológico, quando eu estava indo para o domínio o vento levou um dos crashs e como eu estava alta resolvi não arriscar e desci. Com o vento forte, a sombra trazendo frio e a impossibilidade de qualquer mudança a nosso favor, decidimos que estava na hora de seguir viagem. Apesar de tudo foi o dia em que mais escalamos, inclusive o Luca que escalava e dava nomes aos seus boulders.
Na saída de Puesto Sey encontramos duas imagens interessantes marcando a entrada da comunidade, paramos para fotos. Seguindo viagem a paisagem continuava a impressionar, com suas montanhas, lhamas, vicuñas, cabritos, ovelhas, rios bastante largos e com pouco volume (nesta época do ano), pôr do sol etc.
Paramos em Susques em mais um Hostel, até agora TODOS os Hostels em que paramos tinham quartos e banheiros bem simples mas os colchões eram de ÓTIMA qualidade, bem diferente do Brasil onde você só consegue hotéis mais econômicos com a penalidade de um colchão vagabundo.
Na hora da janta a garota que estava atendendo no Hostel nos indicou alguns lugares para jantar e disse que se quiséssemos também poderíamos comer no Hostel, mas ela só tinha carne de Lhama. Depois de pensar um pouco resolvemos experimentar a carne e enquanto a comida era feita fomos tomar banho, mas na hora de abrir o chuveiro do quarto a água estava GELADAAAA. Conversamos com o pessoal do Hostel e eles nos disseram que iriam resolver. Acabamos jantando esperando pela água quente que não vinha, mais uma vez a comida não decepcionou, estava uma delícia. Mas a água quente não veio, decidi dar um banho no Luca em um banheiro compartilhado, mas já estava muuuito tarde e eu e o Léo lavamos apenas os pés e deixamos o banho para o dia seguinte.