Chegamos até mais rápido q o previsto na pacata Pirapora do Bom Jesus, importante centro de peregrinação religiosa de São Paulo (“A cidade com a fé viva”, conforme divulgação local). A facilidade de acesso e ausência de trânsito tanto na Castelo Branco (SP-280) como na Estrada dos Romeiros (SP-312) fez com q pisássemos no famoso centro peregrino por volta das 9hrs. O clima interiorano de cidade “pé-verméia” se faz sentir logo na entrada, onde não custa nada tropeçar com algum cavaleiro ou charrete no emaranhado de estreitas vielas da cidade. Já o clima meteorológico parecia conspirar contra, por conta das insistentes chuvas do feriado prolongado, algo recorrente no finados.
Sem pressa alguma eu, Ricardo, Carol e a irrequieta Chiara nos demos o luxo de tomar um delicioso desjejum numa padoca, onde completamos o lanche a tiracolo nas
mochilas. Ajeita aqui e ali finalmente começamos a pernada, primeiro subindo a rua ao lado da Igreja Matriz pra depois tomar qq outra q fosse na direção à via principal que dá acesso á cidade. Serpenteando as ruas locais, num piscar de olhos caímos outra vez no asfalto da Estrada dos Romeiros, um nível acima, na qual tocamos sentido sudeste. Qdo as casas e estabelecimentos de Pirapora ficam pra trás, no cruzamento sgte basta acompanhar a sinalização “Araçariguama – Via Pedagiada”, sem problemas. Vale mencionar neste trecho, feito na segurança do acostamento, da presença maciça de cruzes fincadas a margem da via. Boa parte delas é pagação de promessa, embora tb algumas sejam de gente vitimada na estrada.
Após subir um tanto pela rodovia e ignorar a entrada pro Morro do Capuava, abandonamos o asfalto na saída sgte, a nossa direita, q por sua vez se pirulita em direção ao pé da serra, isto é, pro sul. A esta altura a Serra do Voturuna exibe suas corcovas abauladas levemente encobertas e seu cume principal se vê totalmente tomado por brumas. Chuviscos tão esparsos qto finos fustigam brevemente o rosto, num processo q se repetiu de forma intermitente pelo resto do dia. Mas nada q interrompesse de todo a pernada em si. Que o diga a Chiara, pois a elétrica pulguenta disparava na frente à td momento a procura dos novos odores e cheiros q seu espichado focinho apontava.
Uma vez nesta via de chão bastou seguir por ela de forma descompassada e tranquila, serpenteando as baixas encostas das colinas q antecedem o sopé serrano. No caminho, um terreno descampado pra ser futuro condomínio empresarial, uma linha de torres de alta tensão e apenas duas pequenas chácaras destoam neste panorama inicialmente rural. Mas após cruzar um foco de mata e pouco antes do caminho principal fazer uma curva ascendente na encosta sgte, é possível avistar duas picadas nascendo na margem esquerda da via. Aqui é só tomar a vereda q ramifica perpendicularmente à via principal, uma vez q é visível já de longe q é através dela q se ganha o ombro da próxima colina e toca pra cima em definitivo. Além disso, o terreno é descampado o q garante até aqui pura navegação visual.
Uma vez nesta trilha não tem mais segredo. Inicialmente ganha o pasto da colina supracitada pra depois da primeira colina palmilhar seu cume na direção sudoeste, em meio a enormes cupinzeiros, caraguatás e vegetação predominantemente arbustiva. A suave descida dum colo serrano vem na sequencia, onde mata mais exuberante e úmida nos envolve brevemente, mas q não deixa de ser secundária a td momento. Subindo suavemente a encosta na lombada sgte em meio a um baixo eucaliptal, parcialmente queimado, segue-se um extenso em nível e aberto na direção oeste, e onde já se avista Pirapora pequenina, ao norte.
No final deste trecho em nível (e bastante cascalhado) a via tende a nos levar na beirada duma pedreira, tocando outra vez pro norte ou profundo de vale sgte, o q não confere com minha rota traçada, q devia ser agora ascendente. Caminho errado. Retrocedemos pelo trecho em nível algumas dezenas de metros apenas pra encontrar a picada almejada bem escondida no meio da mata, agora ganhando a encosta ascendente em curtos zigue-zagues. Agora sim, uma vez nesta rota não tem mais erro mesmo, pois inicialmente percebe-se q a vereda já fora uma estrada de extração (pelo corte vertical na encosta) a muito desativada.
Mas não pra vereda findar numa clareira a beira do enorme vale sgte, mas a continuidade da nossa rota é logo encontrada, discretamente na encosta na forma duma estreita trilha q prossegue a ascensão morro acima. A trilha e a paisagem a partir daqui mudam completamente. A vereda é composta de cascalhos e seixos (q dificultam os pequenos passos da Chiara) e a nossa volta a vegetação se reduz a arbustos de galhos retorcidos, numa visão q relembra os belos cenários da Serra do Cipó ou o cerrado da Canastra. Uma vista q encanta e contrasta com o acesso sul do morro (aquele de Santana do Parnaíba), predominantemente de verdejante e exuberante mata primária. O destaque tb deste trecho são os vários mirantes a beira do gigantesco vale bordejado a oeste, agora com feições dum largo desfiladeiro q acentuam os abruptos contrafortes dos principais cumes da Serra do Voturuna.
A subida prossegue de forma pausada, porém ininterrupta, sempre em suave aclive, muda pra lombada esquerda da encosta do ombro serrano, onde se tem uma noção duma enorme cratera de extração. Tb é possível avistar as residências do Pque Payol e Refugio dos Bandeirantes despontam ao sopé do ultimo espigão do Voturuna, a extremo oeste, assim como os espelhos d’água das Represas de Pirapora e do Rasgão, além do próprio Rio Tiete dividindo a agora pequenina cidade de vocação peregrinatoria. Ao lado dela, o próprio Morro do Capuava destoa como única elevação local, agora enrubescida pela presença do Voturuna, bem maior.
A caminhada volta novamente pra beirada do desfiladeiro anterior, isto é, pra encosta direita. Mas por pouco tempo, pois o próprio dorso serrano se alarga denunciando já a proximidade da crista principal do Voturuna. Os campos se expandem em arbustos e capim, com vários lances coloridos da flora local pipocando aqui e ali. Uma vez no espigão principal, apesar de parcialmente encoberto por nuvens esparsas, a direção muda intuitiva e naturalmente de sul pra oeste. Basta se deixar pela vereda q vá nesta direção, pra cair subitamente numa estreita crista q ladeia um trecho de bosque, mais precisamente no vértice do enorme e fundo desfiladeiro supracitado! O “V” formado pelas abruptas encostas q o cercam emolduram, ao fundo, uma pequenina Pirapora ao lado do espelho d’água das represas q a cercam! Após muitos cliques nos vários mirantes deste trajeto bastou ladear a beirada do cânion sentido oeste, sem erro, uma vez q a trilha ta bem firme e consolidada!
Ao deixar o canionzão pra atrás, ganhamos a larga e ampla crista formada por mata rasteira e ressequida, sempre subindo suavemente. Aqui a picada some e surge novamente logo adiante, mas não tem problema pq o sentido é um só: pra cima, ou seja, oeste! Olhando pro lado podíamos avistar espigões serranos menores (não mto íngremes) q derivavam do principal, caindo em tds às direções e q podem tb bem servir de acesso ao alto da serra. Já havia estado neste trecho anteriormente e apesar da presença constante de brumas esparsas imperando ao redor, o visual me surpreendeu magicamente com belezas cênicas diferentes das planejadas.
E assim, pouco antes das 13hrs pisamos no pto culminante da Serra do Voturuna, os 1217m do alto do Morro Negro indicados certeiramente pelo GPS do Ricardo. O topo é largo, mas o marco de concreto q havia aqui antes não existe mais e é bem exposto. Nestas horas dei graças a Deus pelo tempo não nos castigar com sol fritando nossas cacholas uma vez q foi isto o maior perrengue da ultima vez q ali pisei. Ao invés disso, brumas iam e vinham descortinando de forma efêmera a paisagem em volta em muitos flashes. Enqto o pessoal descansava eu identificava os acidentes a nossa volta: a oeste, o estreito espigão em declive pelo qual descemos na vez anterior e onde finda (ou termina) a serra, os contornos da pequena Araçariguama e a verdejante Serra do Ribeirão; ao norte prevalecem os contornos escarpados e esmeraldas da Serra do Japi, Serra do Piraí e da pacata Cabreúva, logo atrás; ao sul a paisagem é comprometida pelo nevoeiro mais espesso, mas entre uma e outra janela naquele véu opaco era possível ter flashes urbanoides de Osasco, Sampa e Santana do Parnaíba; e finalmente a leste temos a continuidade da Serra do Voturuna até o Mirante (o outro Morro do Voturuna, pela carta), com o Jd Payol ao pé da mesma.
Mas bastou mastigar um lanche (sob o olhar pidão da Chiara) e descansar um pouco q o sangue e a temperatura do corpo baixaram rapidamente. A necessidade de esquentar e a proximidade duma nuvem já respingando fino o rosto foram à deixa pra colocar-nos a andar prontamente.
Mochila nas costas, diferente da vez anterior não continuamos pelo espigão oeste até a estrada. Ao invés disso, começamos a descer através dos sucessivos (e íngremes) ombros serranos q nasciam do próprio cume na direção norte. E lá fomos nós perdendo altitude rapidamente, inicialmente por vestígios de vereda q rapidamente sumiram. Não tinha problema, a navegação visual e o terreno não mto agreste possibilitavam que o caminho fosse feito na hora por meio de desescalaminhada não mto acentuada entre arbustos e pedras. Aqui a Chiara teve a ajuda do Ricardo q, vendo a dificuldade da bichinha com suas perninhas curtas em descer, dava uma mão pra pulguenta nos trechos de maior desnível.
A descida transcorreu tranquila até que enfim desembocamos numa precária estrada de extração, parcialmente tomada de mato baixo. Ali já estávamos em casa praticamente. Como havíamos estudado o trajeto lá do alto, bastou ziguezaguear a supracitada via pela encosta, de modo a avançar pelo meio de duas enormes crateras de mineração. Sim, aquela face da serra já teve mineração agressiva desde tempos imemoráveis, inicialmente atrás do ouro q depois deu lugar ao ferro e quartzito q jaziam nas entranhas da montanha. Atualmente a mineração parece ter estagnado pelos vários processos de tombamento da serra, mas o estrago ficou lá, como vestígio da intromissão humana em seu estado bruto, no lugar.
Na sequencia caímos num estradão de terra q, sempre na direção norte, passou por uma antiga vila de mineração pra finalmente nos largar a beira da Estrada Municipal Ubaldo Lulli, a q interliga Pirapora com Araçariguama. Dali bastou chinelar coisa de 4 km pelo asfalto até a pacata cidade romeira, aonde chegamos por volta das 15hr. Como que se tivessemos programado tudo, chegávamos bem na hora em que o céu desabou num aguaceiro q deixaria Noé orgulhoso. E, dando uma ultima olhadela por sobre o ombro á serra, damos adeus àquela bela serra q agora novamente mergulhava num mar de nuvens negras e carregadas. Como sempre, antes da volta pra Sampa encostamos num boteco onde mandei ver meu sagrado “Gatorade”, a Carol se fartou com um pastel e o Ricardo degustou um sorvete das antigas, aqueles de garrafa colorida invertida. A Chiara, claro, tascou de td mundo um pouco e mandou ver no “saco sem fundo” do seu suposto micro-estômago.
Situado a apenas 40 km da maior metrópole da America do Sul, o Voturuna é um serrote domestico pouco conhecido q reúne trilha, escalaminhada, cachoeiras e picos pra ninguém botar defeito. Noutras, um lugar que reúne os pré-requisitos essenciais pra se tornar Parque, embora nem tudo sejam boas noticias. A presença de queimadas, vestígios de caça predatória e até de cavalos (e muito carrapatos) são sinais de descaso do Poder Público. O tombamento da serra pelo Condephaat não basta, pois falta fiscalização. Logo, se espera que a divulgação insistente desta bela região chacoalhe as autoridades no sentido de preservação oficial desta preciosidade natureba. E claro, torcer pra que estas duas Voturunas – a de florestas de encosta verdejantes vista de Santana do Parnaíba e outra mais agredida do lado de Pirapora – se torne um legitimo Parque que orgulhe não apenas todos os municípios que o circundam; restaure e mantenha preservada esta grata surpresa da região do Alto Tietê.
3 Comentários
Bom dia, é tranquilo para acampar?
é.mas ta cheio de carrapato
Para fazer com crianças, percorrendo no máximo 5km, da para chegar de carro até onde?