Uso de gás xenônio em expedições ao Everest volta a ser debatido na comunidade científica

0

A primavera de 2025 no Himalaia ficou marcada por uma temporada atípica no Everest, com poucos cumes alcançados. Mas um grupo chamou atenção pelo sucesso da escalada em tempo recorde. Em apenas cinco dias após deixarem suas casas em Londres, na Inglaterra, os ex-soldados britânicos Garth Miller, Anthony Stazicker, Kev Gondlington e Al Carns chegaram ao ponto mais alto do mundo.

Monte Everest visto desde o trekking ao Acampamento Base. Foto: Pedro Hauck.

Coordenada pela agência Furtenbach Adventures, eles ganharam o apelido de Equipe Xenon por ter utilizado gás xenônio como parte de um protocolo experimental de aclimatação. O feito levantou entusiasmo e curiosidade, mas também gerou desconfiança na comunidade científica.

Quatro meses após a ascensão, o tema voltou a tona com a publicação de um estudo conduzido pelos pesquisadores Giorgio Manferdelli, Marc Berger e Andrew Luks, da Universidade de Washington, com um alerta. Publicado na revista High Altitude Medicine & Biology sob o título Innoble gas: the questionable role of xenon in rapid ascents of Mount Everest, o artigo afirma que não há evidências concretas de que o xenônio ofereça benefícios significativos para o desempenho de montanhistas em grandes altitudes.

“Após fornecer informações básicas sobre o xenônio, examinamos possíveis justificativas para seu uso na montanha, avaliamos os riscos da administração de xenônio e consideramos outros aspectos do protocolo da expedição que provavelmente influenciaram as probabilidades de cume. Com base nessa análise, não há justificativa para a aplicação generalizada da inalação de xenônio neste momento”, descreve o resumo do estudo.

Os cientistas ressaltam que o sucesso da Equipe Xenon pode estar relacionado a outros fatores do protocolo da Furtenbach Adventures, como o treinamento físico intensivo, a aclimatação prévia em câmaras hipóxicas e a experiência acumulada em montanhas de menor altitude. “Muito mais pesquisas são necessárias sobre essas questões antes que mais montanhistas recorram a essa prática potencialmente arriscada”, reforçam os autores.

A União Internacional de Associações de Montanhismo (UIAA) já havia se posicionado contrária ao uso do xenônio, destacando a ausência de estudos suficientes e lembrando que a substância consta, desde 2014, na Lista de Substâncias Proibidas da Agência Mundial Antidoping (WADA).

A estratégia da Furtenbach Adventures

A Furtenbach Adventures, que coordenou a expedição, é reconhecida por desenvolver expedições rápidas ao Everest e afirma ter mais de 20 anos de experiência em projetos ligados a pesquisas científicas e tecnológicas. Em seu site oficial, a agência não menciona diretamente o uso de xenônio, mas destaca a aclimatação prévia realizada em sistemas hipóxicos. Nesse processo, os escaladores começam a aclimatação quatro a oito semanas antes, em casa e dormindo em câmaras com baixa concentração de oxigênio, simulando as condições de altitude.

Sistema hipóxicos utilizado para aclimatação prévia. Foto: Furtenbach Adventures

Além disso, a agência ressalta que chegar ao cume mais alto do mundo não é simplesmente “levantar do sofá e ir”. Os participantes de suas expedições passam por meses de preparação física, resistência e treinamentos técnicos. Também são incentivados a acumular experiência em montanhas intermediárias, como o Aconcágua (6.962 m) e o Dhaulagiri VII (7.246 m), antes de tentar o Everest.

Compartilhar

Sobre o autor

Maruza Silvério é jornalista formada na PUCPR de Curitiba. Apaixonada pela natureza, principalmente pela fauna e pelas montanhas. Montanhista e escaladora desde 2013, fez do morro do Anhangava seu principal local de constantes treinos e contato intenso com a natureza. Acumula experiências como o curso básico de escalada e curso de auto resgate e técnicas verticais, além de estar em constante aperfeiçoamento. Gosta principalmente de escaladas tradicionais e grandes paredes. Mantém o montanhismo e a escalada como processo terapêutico para a vida e sonha em continuar escalando pelo Brasil e mundo a fora até ficar velhinha.

Comments are closed.