Uma trilha pensada para concluir as atividades de montanha na temporada 2025 da Equipe Arcanjos com a transição para a temporada de praias e cachoeiras. Inicialmente uma quilometragem de caminhada mais extensa, com cerca de 40 quilômetros, iniciando no camping do Salto das Orquídeas e concluindo com o ataque ao Pico Agudo de Sapopema.
No final de semana seguinte à travessia da Farinha Seca, para esticar as pernas e encerrar de forma grandiosa as atividades de montanhismo. A proposta congregava cerca de 5 km de aquatrekking pelo cânion do rio Lajeado Liso com caminhada em estrada rural e ataque para contemplar o pôr do sol no imponente pico Agudo, com vista espetacular para o cânion do rio Tibagi.
Partimos de SP às 22h20, sob a direção segura do Édson da Silveira da BIROTOUR com duas paradas estratégicas para esticar as pernas e lanchar. A primeira transcorreu sem novidades, mas a segunda, na PANUTRI (Avenida Manoel Ribas, 732) da modesta cidade de Sapopema exigiu mais trabalho. Chegamos na pequena cidade pouco antes das 6h, que ainda dormitava tranquila. Após algumas interações com os raros moradores que estavam nas ruas aquele horário, conseguimos encontrar uma única padaria, que abriria pouco após as 6h. Nela, diligentes funcionárias se desdobravam para anotar pedidos, atender ao balcão, preparar os quitutes e, receber os pagamentos. Àquela hora, nosso grupo com 20 famintos montanhistas era uma excepcionalidade na rotina. O quadro de funcionários fez o possível para atender aos precavidos comensais.
Ariscos por já terem trilhado com os estômagos vazios, todos queriam colocar alguma sustância no corpo antes de iniciarmos a pernada. Com diligência e paciência, tudo se resolveu a contento e retomamos a viagem para chegar, às 6:47 no camping do Salto das Orquídeas.

Com o devido registro de entrada no camping e identificamos comas filipetas amarelas nos pulsos, optamos por montar o acampamento antes de começarmos a travessia pelo cânion do rio Lajeado Liso. Dessa forma, ao voltarmos ao camping à noite não teríamos que nos preocupar com as acomodações. Optei por me alojar em um antigo microônibus escolar convertido em chalé. Ao final, um abrigo pouco menos espartano que as barracas a que me acostumei, mas o aspecto insólito (e o aparelho de ar condicionado potente) me fizeram decidir por esse luxo.
Montar acampamento antes de iniciar o aquatrekking contribuía para que o iniciássemos a travessia com a temperatura algo mais elevada, com o sol já vencendo os abruptos e verticais paredões de rocha e incidindo sobre alguns trechos do rio, tornando os banhos mais aprazíveis. Após uma rápida e prudente preleção por parte da equipe que loca e gere o atrativo, às 8h50 iniciamos a descida até o rio por uma curta e algo íngreme trilha, percorrida em 10 minutos. Após acessar o rio, nosso caminhar passou a ocorrer pelas lajes rochosas do leito, com alguns cuidando de molhar os pés ao mínimo. Eu segui buscando manter os pés na água o tempo possível, valorizando a pernada curta, mas bela.
O salto das orquídeas é uma cascata com cerca de 30 metros de altura, pela qual a descida é vencida com facilidade por escadas quebra-peito/marinheiro de ferro fixadas na margem esquerda. São necessários três lances sucessivos para acessar a base da queda. Na lateral esquerda, um traçado de arame farpada obsta a passagem pelo “caminho antigo”, que já observou pelo menos uma queda mais séria, pelo que a equipe do atrativo nos reportou quando voltamos. Para tornar a descida de todos mais segura, procuramos manter apenas um em cada lance, reduzindo a carga simultânea na estrutura e eliminando o risco de que ocorresse queda de um trekker sobre outro.
Na base do Salto, fizemos uma rápida parada para banho que poucos aproveitaram, pois àquela hora o poço estava sombreado. Continuamos a descer, aproveitado os poços ensolarados para banhos ao gosto de cada um. Havíamos recebido a informação de que haveria uma trilha na margem direita e a procuramos por precaução. Encontramos rastros batidos de passagem à direita, mas ainda dentro do curso d’água. O progresso foi bastante tranquilo e não me preocupei em pegar a frente do grupo, ficando mais próximo dos que fechavam o destemido cortejo. Não foi necessário o emprego do tracklog, bastando seguir os rastros nas ilhotas de vegetação emergente ou o molhado nas rochas deixado pela passagem do pelotão de vanguarda.
Fizemos duas paradas mais longas para banho e lanches, procurando não chegarmos por demais cedo ao ponto de resgate. O sol intenso convidava ao banho na água fresca e ficamos algum tempo apenas apreciando a tranquilidade daquele começo de tarde.
Pouco antes das 13h já estávamos no ponto de resgate com o Édson chegando em seguida para retornarmos ao camping, onde chegamos 13h20. Aproveitei um breve intervalo nas atividades, para almoçar antes de partirmos para a base do Pico Agudo de Sapopema.
O pessoal aproveitou para se distrair em uma tranquila partida de vôlei de praia, e eu adiantei um pouco da leitura. Levei dois livros para esse rolê, pois seria mais contemplativo e de descanso.
Chegamos na recepção do atrativo, pouco antes do horário limite de entrada (16h) fizemos o devido registro de entrada, aproveitamos dos banheiros e coletamos água para a subida.
Iniciei a subida no passo forte de quem precisa esticar os músculos, depois de uma caminhada de pura contemplação. A trilha é ampla e bem sinalizada, com cordas, correntes e ferragens nos lances mais íngremes. A ancoragem das correntes é, em certo grau, delicada. Como são poucos os pontos em que as longas correntes foram fixadas, os lances são mais longos que o ideal. Dessa forma, o tracionar desatento abaixo pode desequilibrar a pessoa que esteja na mesma corrente, mas em um lance mais elevado. Tomando os necessários cuidados não tivemos problemas, mas é um ponto de necessária atenção, pois ainda que em quase todo os lances esses apoios adicionais tragam maior segurança, em dois lances de exposição mais intensa, o risco cresce sensivelmente. Nesses lances, seria bastante conveniente alterar o arranjo das correntes, minimizando a possibilidade de acidentes.
Atrativos turísticos demandam que sejam “à prova de tolos” ou melhor, que leigos e aventureiros, sem conhecimentos técnico, não se exponham a riscos desnecessários.
Prosseguimos encosta acima, ganhando altitude com celeridade até alcançarmos às 16:50 o primeiro mirante. Uma pausa para fotos e retomamos o caminhar, agora com pequena inclinação, em direção ao cume. Entradas na mata do cume à direita franqueavam o acesso a sucessivos mirantes com vista para o vale do Tibagi. À esquerda, mirantes para o mar de morros e plantações por onde havíamos chegado.
Chegamos cedo ao cume, com bastante margem para o pôr do sol e tratamos de nos espalhar pelos mirantes, cada qual buscando sua calma, seu momento de conexão com a deidade da natureza em seu esplendor.
Aproveitei para conferir o livro de cume, um caderno universitário, de espiral, que já viu dias melhores. O volume exagerado e a deficiente gestão tornavam o mesmo imprestável. Os registros iniciavam em maio/2025 e apesar de não haver mais lugares nas páginas para registro, não fora trocado. Adesivei o interior do tubo de cume e recoloquei o melhor possível o caderno. Ainda que seja um atrativo turístico, a oportunidade de educar quanto à importância dos livros de cume para registros e resgates permanece válida. Cadernos brochura, de capa mole e trocados com maior frequência agregariam bastante à experiência. @Agudo Sapopema e guias credenciados ficam as sugestões de reduzir o espaçamento das ancoragens nas correntes e de gerir melhor o caderno de cume.
Enquanto aguardava o pôr do sol, aproveitei para preparar um miojo de brócolis enriquecido com içás. Deixei as lanternas de prontidão, uma já vestida no pescoço e as outras duas nos bolsos de barrigueira. Após apreciarmos o por do sol iniciamos a descida, rapidamente alcançando um pequeno grupo, guia e clientes que descia lentamente, inseguros no caminhar no lusco-fusco do entardecer e, logo, no escuro da mata. Nao portavam lanternas de cabeça, se fiando na luminosidade que os celulares conseguiam propiciar… isso, apesar de que que a gestão do atrativo conta com lanternas para locação. As fotos que fizeram certamente ficaram espetaculares, pois a beleza cênica que o pico descortina é imensa, mas um adicional de cautela traria mais segurança à experiência.
Com o grupo todo reunido, voltamos para o camping, consumindo pouco mais de uma hora pra vencer a vintena de quilômetros que separa os dois pontos. O restaurante do camping ofertava apenas pizzas para o jantar, de forma que escolhi uma meia abobrinha e meia quatro queijos. Apesar das dificuldades e da demora para servir, contornadas com muita boa vontade e alguma paciência de ambas as partes, minha pizza chegou, quente e saborosa. Jantei, aproveitei os chuveiros vazios para um bom e demorado banho e me recolhi. Consegui terminar a leitura de “Everest: Diário de uma conquista” e tentei retomar a leitura da Historia da Sexualidade – volume 4 de Focault, mas a densidade da obra me nocauteou rapidamente e decidi deixar para o dia seguinte. No meio da madrugada, um gato rajado (do mato?) me acordou ao tentar furtar a sobra da pizza. Aproveitei para deixar do lado de fora e, pela manha, os pedaços restantes haviam desaparecido.
Como de costume em viagens, levantei cedo e, como a proposta era de relaxar, tratei de escolher um bom local para dar sequência à leitura, enquanto aguardava o café da manhã. Apesar de simples e relativamente frugal, o suco de laranja realmente estava ótimo e me servi de sucessivos copos enquanto apreciava o dia que nascia. A promessa de um dia ensolarado rapidamente se desfez em um sol primaveril, tímido por entre as nuvens. Processei algumas (poucas) paginas até o pessoal aparecer e passarmos a trocar impressões sobre as últimas trilhas. Notei um senhor passar com um martelo de geólogo (à falta de melhor definição) e quando tive oportunidade questionei sobre a atividade que fariam, pois a parte de geomorfologia sempre me encanta nessas viagens e pernadas.
Soube então, que se tratava do Professor Dr. Edson Fortes, da Universidade Estadual de Maringá que com seus orientados faria uma avaliação da geomorfologia do atrativo que se encaixa na fronteira entre o segundo e terceiro planalto do Paraná. Aprendemos, de forma muito superficial que o paredão de rocha à direita, que apresenta linhas praticamente paralelas e verticais surge dos derrames basálticos do período cretáceo. Os minerais ali, durante o processo de gênese das rochas se configuraram com uma disjunção prismática (ou colunar) e o processo erosivo, favorecido nessas interfaces, proporciona fendas de variadas larguras, com registros de vias de escaladas clássicas, como a “Na Dúvida, Mais Bacon”.
Os sucessivos e volumosos derrames basálticos dessa região se estenderam por pouco menos que 400 milhões de anos, testemunhando a fragmentação do supercontinente Gondwana. As camadas chegam a somar 1500 m de espessura e originaram um dos solos de maior fertilidade para a agricultura, a famosa “terra roxa”.
Os estudos sobre a geomorfologia apresentam a chave para o entendimento da configuração atual do relevo do nosso país e, a partir desse conhecimento, propiciam que a sociedade interaja melhor com o ambiente em intensa modificação, seja em desastres naturais, seja na gestão dos recursos naturais, finitos e não renováveis para a promoção de um desenvolvimento sustentável.
Na longa viagem de retorno à São Paulo, soube que as apresentações no Karaokê se estenderam até pouco após a 1h de domingo, com performances memoráveis da Letícia cantando Queen e da Fernanda trabalhando o cancioneiro de Maria Rita. A Isa respondeu pela base de percursão aos talentosos vocais. O sexto dito “forte” rompeu corações e afrontou a sociedade na voz de tenor do Celso. A noitada foi de imenso sucesso e até as mariposas enlevaram-se na madrugada animada.
Os amigos que me acompanharam nessa tranquila excursão: Josenilson (Capitão), Carol, Arthur, Bruna, Bruna Duarte, Caio, Celso, Denis, Gabriel, Isa, Juliana, Michel, Paulo Capote, Rafael, Ricardo, Sebastião, Fernanda Sparta e Leticia Dutra.




























