Texto: Rodrigo Granzotto Peron
Introdução
O nacionalismo argentino impulsionou o início das explorações sulamericanas no Himalaya, fazendo com que sucessivas excursões capitaneadas pelo seu exército desbravassem a cordilheira em 1954 e 1956, quando chegaram a 8.000m no Dhaulagiri, em 1971 no Everest (desistência a 8.300m), e em 1979, no Manaslu (tentativa abandonada a 7.600m).
Mais tarde os chilenos lançaram expedição pioneira ao Gasherbrum II, com Gastón Oyarzún e Claudio Lucero no cume em 1979 (primeiros sulamericanos a fazer um cume 8.000).
Apesar de ter inúmeros grandes alpinistas, a América do Sul teve apenas raras expedições ao Himalaya, um pouco por acomodação de alguns escaladores, muito pela distância até as grandes cordilheiras, e principalmente pela falta de recursos e de incentivo a este maravilhoso esporte.
Apesar dessas dificuldades todas, o Brasil foi o terceiro país da América do Sul a desbravar o Himalaya, história cujo princípio foi…
Capítulo 1 – Makalu 1982 (8.485m)
Os pioneiros montanhistas brasileiros se aventurando nos cumes de mais de 8.000m foram ao Himalaya em 1982, como membros de expedição polonesa rumo ao Makalu (8.485m), quinta montanha mais elevada do planeta, primeira vez conquistada em 1955. O nome da expedição já denotava a participação brasileira: “Polish-Brazilian Himalaya Expedition to Makalu”. O grupo, liderado por Adam Bilczewski e Tadeusz Kozubek, se compunha de 17 polacos, um nepalês (o sirdar Ang Kami Sherpa) e os brasileiros Michel Bogdanovicz, Alexandre Bruno Ventre e Max Luiz Haim.
Tentaram no outono a difícil e até então virgem Face Oeste do Makalu, por meio do Esporão Esquerdo (Aresta Noroeste), uma rota bastante direta ao cume. Foram estabelecidos 5 acampamentos (o base a 30 de agosto) e a subida foi épica e difícil, com passagens complexas em rocha e constantes quedas de pedras e avalanches.
O escalador polonês mais experiente – Andrzej Czok – mencionou posteriormente que a parte mais complicada se situava logo acima do acampamento 2, com um paredão de gelo bem íngreme e com 100m de desnível. Um dos poloneses (Tadeusz Szulc) morreu de ataque cardíaco e outro (Janusz Skorek) teve frostbites severas nas mãos.
Apesar disso, Andrzej Czok conseguiu atingir o cume em 10 de outubro ao meio-dia, sem oxigênio suplementar. As posteriores investidas foram canceladas devido ao constante mau tempo e a problemas com o equipamento. Os brasileiros atingiram apenas o acampamento II (a 6.600m).
Essa participação brasileira foi sumamente importante e, conquanto não tenham culminado, abriram as portas do himalaísmo para nós.
Capítulo 2 – Kangchenjunga 1985 (8.586m)
Três anos se passaram e, por intermédio de Michel Bogdanovicz (membro do Clube Alpino Paulista – CAP), o montanhista José Luiz Pauletto conseguiu ser incluído em outra expedição polonesa ao Himalaya, liderada por Andrzej Machnik, desta vez com destino ao imponente Kangchenjunga (8.586m), terceira montanha mais elevada do mundo, na fronteira entre o Nepal e a porção oriental da Índia (Sikkim), e que foi desvirginada em 1955.
A este desafio foi adicionado tempero extra: a subida ocorreu no inverno, quando as condições climáticas e de escalada são exponencialmente complicadas e perigosas.
Junto com Pauletto estavam algumas das maiores lendas do alpinismo mundial: Jerzy Kukuczka (segundo a escalar todos os 14 picos com mais de 8.000m), Krzysztof Wielicki (quinto a escalar todos e mestre em subidas invernais) e Przemyslaw Piasecki (que fez cume no K2 pela temível “Magic Line”).
O acampamento-base foi estabelecido em 10 de dezembro de 1985. Durante um mês lutaram contra o clima inclemente e, no dia 11 de janeiro de 1986, Wielicki e Kukuczka fizeram cume, realizando a primeira subida invernal do Kangchenjunga.
Apesar de bem aclimatado e tecnicamente preparado, Pauletto não teve oportunidade de tentar o cume. O líder da expedição a deu por encerrada precocemente devido ao falecimento de um dos membros (Andrzej Czok) por edema pulmonar.
Contudo, foi uma vitória para o brasileiro. Chegou a 7.400m, além de ter participado ativamente da primeira invernal desta montanha, em condições extremas (ventanias, nevascas, inúmeras avalanches, temperaturas de até -40ºC, sem sherpas e nem oxigênio engarrafado). Um enorme feito.
:: Leia a segunda parte da História do Himalaísmo brasileiro
Texto: Rodrigo Granzotto Peron
Fotos: SummitPost.org