Maldita cachaça! Levantei bastante indisposto naquela manhã pro rolê já previsto durante a semana, mas ainda assim não ia deixar na mão o Nando, q aquela altura já devia estar me esperando no local combinado. A mistura Heineken + vodka com energético da noite anterior fizera maravilhas na hora “hagá”, mas deixara sequelas no dia sgte neste q vos agora escreve. O q era previsível, aliás. Com a cabeça a pto de explodir e o gosto de cabo de guarda chuva na boca, respirei fundo e la me mandei, na esperança q a caminhada de 3km da minha casa até o pto de encontro me trouxesse algum alivio. Qta pretensão a minha.
Encontrei o Nando bem depois das 8:30hrs no km17 da Rod. Raposo Tavares (SP-270), mais precisamente no pto de ônibus logo á frente do Carrefour. A dor de cabeça continuava. O trânsito na Raposo estava totalmente congestionado por conta de dois acidentes em ambos sentidos, motivo pelo qual o busão demorou pra passar. Finalmente, qdo chegou, embarcamos no “506 – Jd Sandra” e lá fomos nós em direção aos cafundós de Cotia. Logicamente q bastou a lentidão na rodovia e o ritmado solavanco do latão pra literalmente me colocar a nocaute e, encostado na janela, perdi boa parte da paisagem q a mesma exibiu durante td trajeto. Só dei por mim qdo o Nando me chamou a atenção, já após ter passado pela Granja Viana e o centrão de Cotia, bem depois.
Saltamos no pto final do buso, as 10:30hrs, já no tal Jd Sandra. Pedimos informações num mercadinho local e tocamos aa Rua Corinthians até a Rua 15 de Piracicaba, sempre sentido oeste. Cruzamos um pequeno pontilhão de concreto por onde abaixo marulhava um manso e poluído córrego, q depois a carta topográfica indicou ser o Rio Cotia. Ao interceptar a Estrada do Morro Grande tocamos pra esquerda e por ela permanecemos durante um tempão, agora sentido sudoeste. A farta vegetação de ambos os lados deixava a paisagem recorrente se assemelhando a um “túnel verde”, q eventualmente mostrava por suas frestas q acompanhávamos extensos banhados do Rio Cotia a nossa esquerda.
Ao cruzar mais um pontilhão sobre um afluente do Rio Cotia é q a paisagem se abriu momentaneamente e pudemos observar, a esquerda ao fundo (oeste), uma enorme serra forrada de verde q se elevava sobre a horizontalidade daquela região de ares tipicamente interioranos. Na verdade era pra la q nos dirigíamos, mais precisamente numa das dobras serranas avistadas q coincidia com um pequeno vale, onde o maior afluente do Cotia descia encachoeirado através de muitas pedras. Mas ate lá ainda havia um chão, por isso nos mantivemos sempre pelo asfalto da Estrada do Morro Grande.
Mas não por muito tempo pq logo surgiu uma bifurcação, onde o bom senso nos obrigou a manter na via da direita, q ia na direção desejada, ou seja, sudoeste. Subindo suavemente ainda pela Estrada do Morro Grande, logo adiante nos deparamos com nova bifurcação, mas aqui o sentido a tomar é mais q obvio pois uma placa com os dizeres “Sitio Cachoeira da Graça” facilita nossa tomada de decisões. Abandonando então o asfalto em prol duma poeirenta estrada de chão, a suave subida prossegue ininterruptamente ate nivelar noutra bifurcação. Mas aqui nossa única opção parece ser a via da direita pois um enorme portão barra á da esquerda, por sua vez a entrada duma Estação de Tratamento da Sabesp, no caso, da Barragem de Morro Grande.
Ate aqui já subimos um bocado e a pernada de fato nivela, sentido oeste, tocando sinuosamente pelo alto deste serrote doméstico, onde frestas na vegetação permitem avistar a geometria acinzentada do Jd Sandra, ao longe, contrastando com os contrafortes verdejantes da serra palmilhada. Depois soubemos q a poeirenta estrada em q estamos é chamada de Estrada da Barragem ou Estrada das Mulatas. Mas qdo passamos a bordejar a área da Sabesp e acompanhar gdes dutos de concreto pela esquerda é q nossa atenção deve redobrar e atentar pra margem da estrada, a nossa direita. As 11:15hrs uma estreita picada em meio a mata é avistada numa curva, a nossa direita, tocando fundo encosta baixo. Como referencia desta picada, alem da adutora e duma construção quadrada pixada, tb há um poste quase bem na frente da picada. Não tem erro.
Uma vez na vereda basta tocar por ela encosta abaixo, mergulhando finalmente na mata, onde a forte declividade é suavizada tanto por eventuais degraus e sulcos na terra como pelo arvoredo em volta. A trilha é obvia, bem batida e, pasme, sem lixo algum. Uma enorme arvore tombada – e q trouxe meia floresta abaixo – é facilmente contornada pela esquerda e mostra ser o único gde obstáculo no caminho. Emergimos então da floresta e a picada tende a descer forte tendendo pra esquerda pelo capinzal, em meio a um gde descampado. É aqui q nossos ouvidos denunciam q estamos indo de encontro a um gde curso d’água no fundo do vale.
A estreita picada logo desemboca noutra maior, larga e gramada, vinda do norte, provavelmente das dependências do tal Sitio da Graça, e passa a adentrar pela encosta íngreme e florestada do vale. O rugido de água despencando aumenta conforme nos aproximamos e o sentido a seguir aqui passa a ser norteado pelos sentidos. Num piscar de olhos damos nas margens do enorme poção duma evidente pequena represa q aparenta conter as águas cristalinas deste gde afluente, senão o maior, do Rio Cotia. Represa esta ao sopé de duas gdes quedas, onde a água despenca dois patamares rochosos, formando um belo conjunto natureba como um todo. As 11:30hrs estávamos enfim na Cachu da Graça!
Uma estreita e sinuosa picada pela íngreme encosta da direita leva respectivamente ao primeiro e segundo níveis, onde ai sim há vestígios de algum lixinho, como de uma ou outra macumbinha. Porém, ignorando estes detalhes, o local surpreende pela beleza e proximidade á urbe. Enqto o Nando encosta o esqueleto nos lajedos do primeiro nível, eu me pirulito pro segundo pela já supracitada vereda, me valendo de raízes e troncos como degraus. Alem duma bela vista de td o vale e das quedas caindo sequencialmente, ate culminarem no enorme poço represado, o lugar tb tem uma clareira razoável com sinais de acampamento recente.
Ao retornar no primeiro nível encontro o Nando tomando uma bela e gelada chuveirada sob a queda. “Cola junto! A ressaca vai passar rapidinho!”, gritou pra mim. Q nada, nem precisou. Estar ali naquele lugar tão belo, sereno e ermo já havia melhorado horrores minha desagradável condição pós-etilica ate ali. O bucólico contexto em q me situava já funcionava como autêntico “Engov natureba”. Fora isso, beliscamos nossos pertences e bebericamos alguma coisa. O Nando me ofereceu um vinho q tinha trazido, q recusei inquestionavelmente. A verdade é q não podia ver álcool na minha frente. Bem, não pelo menos naquela hora.
Mal deu uma hora ali naquele lugar paradisíaco q resolvemos voltar. Pra não retornar pelo mesmo caminho, resolvemos acompanhar uma trilha q acompanhava o curso rio acima. Saltando de pedra em pedra a picada nos levou a margem esquerda do rio, onde o terreno suavizou e aparentou manter assim pelo resto da pernada. Aqui o rio serpenteava o contraforte mansamente, a diferença de sua furiosa queda anterior. A picada, por sua vez, singrava um simpático bosque, onde eventualmente havia q desviar algum desbarrancado ou gigante da floresta tombado pela própria encosta, pra logo depois cair outra vez em terreno nivelado. Td sem maiores dificuldades.
Percebemos a proximidade de “civilização” outra vez qdo tropeçamos com os primeiros vestígios de macumbas (imagem de santos, comida pros santos e sujeira propriamente dito) q a picada de repente abandonou a cia do rio pra embicar de vez piramba acima. Uma vez no alto, caímos num estradão de terra q logo se revelou a Estrada das Mulatas, so q bem mais adiante de onde tínhamos adentrado na trilha rumo á cachu. Cientes já disso, tocamos pela esquerda da via q fatalmente retornaríamos ao inicio, ou seja, havíamos realizado um circuito em formato de “U” pelo vale da cachoeira.
E assim foi, voltamos td novamente dividindo o asfalto com uma “gangue” de cavalinhos tomando conta da via, e as 14hrs já nos encontrávamos bebemorando o rolê num boteco do Jd Sandra. Enqto aguardávamos o mesmo buso da ida, o Nando mandava ver uma breja e eu, extraordinariamente, beberiquei um guaraná; apesar de a ressaca ter praticamente ido embora, o paladar ainda rejeitava qq ingestão de álcool. Este sinal verde por parte do mesmo so viria mais tarde, a noite, já no conforto casa. Ai sim bebemorei outra vez, agora a minha tradicional maneira.
Cotia nasceu a partir de antigo pouso pros tropeiros q iam pro sul e interior do pais, e seu nome tem origem indígena e faz alusão aos sinuosos caminhos feitos pelos pequenos animais q lhe emprestam o nome, as cutias. Sim, o município tem um histórico corrido de andarilhadas desde longa data. E se até o famoso marujo alemão Hans Standen palmilhou por aqui pq paulistanos sedentos por aventuras urbanas não poderiam fazer o mesmo? A enorme mancha verde q a carta de Osasco ostenta no quadrante inferior esquerdo é prova de q há muito o q percorrer. E a Cachu da Graça é apenas uma pequena mostra do q a Reserva Florestal do Morro Grande tem a oferecer, dispondo provavelmente de mais belas e surreais paisagens ainda pra serem descortinadas nas proximidades da área metropolitana da capital. Natureza semi-selvagem, é verdade. Porém aventurinhas ideiais prum rolê semi-urbanóide temperado com um pouco de verde, a apenas 30 minutos de São Paulo.
Jorge Soto
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