::Leia o especial sobre a História do Brasil no Himalaia desde o começo.
:: Leia a décima parte do especial Brasil no Himalaia.
Texto: Rodrigo Granzotto Peron
Capítulo 37 – EVEREST 2006 (8.850m)
Tendo Vitor Negrete feito cume no Everest no ano anterior, mas com oxigênio suplementar, retornou com Rodrigo Raineri em 2006 para tentarem chegar ao cume apenas com os pulmões, sem cilindros de oxigênio. Novamente elegeram como via de acesso a rota normal tibetana, já conhecida. Para auxiliá-los recrutaram os préstimos de Ang Dawa Sherpa e de Pechumbi Sherpa (este de apenas 17 anos de idade).
Chegaram à montanha no dia 5 de abril. Os acampamentos de altitude foram sendo montados no dia 14 (campo 1), dia 19 (campo 2) e em 11 de maio (campo 3, a 7.700m), dentro da normalidade.
Raineri atingiu o campo 3, mas devido à dor de garganta resolveu descer para o campo 1 para se recuperar. Negrete, que se sentia bem e aclimatado, resolveu no dia 17 de maio tentar o cume sozinho, partindo por volta das 10 horas da noite. À uma da tarde do dia 18 de maio chegou ao cume, sem oxigênio suplementar. Permaneceu no cimo cerca de 10 minutos, período em que fez um pequeno vídeo sobre a conquista. Começou a descer pois sentia muito frio. Às 6 horas da tarde Negrete fez contato com Ang Dawa, pedindo por socorro. O sherpa subiu e encontrou o brasileiro caído entre o Primeiro e o Segundo Escalão (mais ou menos a 8.500m). Negrete estava desorientado, com dificuldades para respirar, havia tirado as luvas, apresentava congelações nas mãos e não conseguia se locomover sozinho. Após os primeiros socorros, Ang Dawa chamou por Pechumbi e os dois sherpas conseguiram com dificuldades trazer Vitor até o campo 3, onde deram água quente e oxigênio ao brasileiro. No decorrer da noite a situação foi se deteriorando, e infelizmente parou de respirar às 2 da madrugada do dia 19 de maio de 2006, uma irreparável perda para o montanhismo brasileiro.
O mineiro Vitor Negrete, natural de Belo Horizonte, nascido em 13 de novembro de 1967, foi uma grande estrela do nosso Andinismo, tendo conquistado por 5 vezes o cimo do Aconcágua (incluindo a primeira subida solo, a primeira invernal e a primeira pela Face Sul). Além de ser o segundo brasileiro a subir 2x o Everest, e o primeiro a subir 2x pelo Flanco Tibetano, foi o primeiro montanhista do Brasil a culminar o Everest sem oxigênio suplementar (façanha que até agora não foi repetida). Apesar da fatalidade, deixa um bonito legado e será sempre lembrado como exemplo de um grande montanhista. Uma de suas frases mais célebres bem lhe serve de epitáfio: “A montanha transcende o valor do cume. É luta interna, da conquista de mim mesmo”.
Após seu passamento, Rodrigo Raineri fez um memorial de pedras de onde se avista, majestosa, a Face Norte do Everest. A vida de Vitor virou o filme Em Busca de Sonhos, de Márcio Bortolusso, lançado em 2007, e o livro Espírito Livre, de Marina Soler Jorge, lançado em 2008.
Capítulo 38 – EVEREST 2006 (8.850m)
Tendo se preparado no Cho Oyu no ano anterior, Ana Elisa Boscarioli foi em 2006 à busca de seu sonho, culminar o Everest. Novamente contratou os préstimos da empresa de turismo extremo guiado Adventure Consultants. A rota escolhida foi a via normal nepalesa e a ascensão se deu com cilindros de oxigênio.
A liderança era do neo-zelandês Guy Cotter e o time contava com alguns guias extremamente experientes como Victor Saunders (4 cumes no Everest), Chuldim Ang Dorje (12 cumes no Everest) e Lhakpa Dorje Sherpa (recordista mundial no Makalu, com 3 cumes). De resto, também compunham a equipe dois neo-zelandeses, cinco ingleses, dois americanos, um irlandês e sete outros escaladores sherpas.
Nossa montanhista cumpriu todas as etapas da aclimatação e partiu rumo ao cimo no dia 18 de maio às 23:30h, tocando no ponto mais alto do planeta no dia 19 por volta das 10 horas da manhã. Ana Elisa é a primeira mulher brasileira a fazer cume numa montanha 8.000, também a primeira a culminar o Everest, e a quarta sulamericana a pisar no ponto mais alto da Terra. Ela é herdeira das sementes plantadas por Helena Coelho e Helena Artmann e um excelente exemplo para todas as mulheres do Brasil de que não importa o sexo, bastando força de vontade e determinação.
Capítulo 39 – EVEREST 2006 (8.850m)
A terceira expedição brasileira ao Everest foi a do casal montanhista mais famoso do Brasil, Paulo Coelho e Helena Coelho, que aportaram no campo-base da rota tibetana no dia 17 de abril. Pelas contagens oficiais, esta é a 10ª ida deles ao Everest, com toda certeza os dois montanhistas sulamericanos mais experientes na Grande Montanha.
Os Coelho fizeram duas tentativas de chegar ao cimo.
A primeira iniciou no dia 16 de maio. Durante a subida encontraram por volta dos 7.500m o alpinista malaio Ravi Chandran, que descia em dificuldades, com frostbites severas nas mãos. Paulo e Helena abortaram o intento e acompanharam Ravi até o campo 1, ajudando o malaio a sair da montanha.
A segunda teve início no dia 25 de maio mas foi abruptamente interrompida quando infelizmente viram que a barraca do acampamento 2 estava destruída e todos os equipamentos haviam desaparecido. Tiveram que retroceder para o campo 1, chegando às 5 da tarde em meio a uma nevasca. Então descidiram desistir de fazer novas tentativas. O ponto máximo atingido foi 7.800m.
Capítulo 40 – CHO OYU 2006 (8.188m)
Este capítulo do himalaísmo brasileiro é desconhecido do público em geral. A carioca Ivanilde Souza Silva, maratonista e cabeleireira, chamada por todos de Ivone Silva, foi tentar o Cho Oyu.
Ivone não era nenhuma novata em termos de altitude, tendo culminado o Aconcágua em 2001 e participado da Maratona do Everest (que tem percurso de 42 quilômetros, largando do acampamento-base do Chomolungma, a 5.200m, e indo até Namche Bazaar, a 3.440m), conquistando o segundo lugar feminino.
Para escalar o Cho Oyu contratou a empresa de aventuras Patagonian Brothers, sob a liderança de Damian Benegas (argentino naturalizado americano e irmão do famosíssimo Willie Benegas, 8 cumes no Everest). A rota utilizada foi a normal, na face noroeste – Rota Tichy, no outono de 2006 (segundo semestre). Além da brasileira também integravam o time um argentino, um americano e um sherpa.
A chegada deu-se em 9 de setembro, com a montagem do último campo de altitude no dia 30. Dos dias 17 a 27 de setembro só nevou, então ficaram todos presos no campo-base. Os demais membros da expedição foram dispersando devido a problemas de saúde, restando apenas a brasileira, o sherpa e o guia Damian. No dia 1º outubro iniciou o ataque ao cume. Mas no acampamento 2, a 7.300m de altitude, a brasileira teve uma crise de asma, devido ao ar rarefeito, e passou a apresentar dificuldades de respiração, tendo de descer emergencialmente.
Após 27 dias na montanha nossa maratonista abriu mão do cume mas deixou seu legado. Foi a quarta mulher brasileira a escalar as encostas do Cho Oyu.