A intenção era o Pico Ciririca, mas…

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A previsão era de um dilúvio, mas já que o climatempo e o simepar não quiseram satisfazer as vontades desse pobre montanhista carioca e do Pedro Hauck, resolvemos apertar aquele velho botão e ir assim mesmo!


Eu e Pedro nos conhecemos alguns meses atrás pelo orkut, mas nunca havíamos nos conhecido pessoalmente, subindo montanha de fato seria a melhor maneira.

Pedro Hauck dispensa apresentações. Grande nome do montanhismo e andinismo nacional, sócio da Soul Outdoor e colunista do Alta Montanha (www.altamontanha.com) , além de ser diretor de escalada do CPM.

Peguei o ônibus na Tietê após um pequeno problema…Depois de 15 minutos de atraso foi comunicado aos passageiros do carro de 23:40h para Curitiba que a saída iria atrasar mais ainda. Olhei feio pro cara da plataforma, funcionário da cometa, que no olhar de volta compreendeu que eu fiquei “descontente” com o fato, por isso me chamou, pegou minha passagem e nela fez algumas anotações, e me mandou pra outro carro com vagas sobrando. Era um carro de leito! Pelo menos nisso a sorte valeu…

Então assim sendo, fui eu rumo ao Paraná. A última vez que pisei em solo paranaense foi ha uns 11 anos atrás mais ou menos, quando fui dar uma mochilada por lá rumo a Foz do Iguaçú. Cheguei na rodoviária exatamente 05:45am. Logo mandei um sms pro Pedro, e ele me disse que já chegaria. Demorou um pouco até ele chegar, acho que estava dormindo quando mandei o sms (risos).

Assim que chegou fomos pro carro dele e seguimos pra serra. Ninguém iria conosco então ele decidiu por tentarmos o Ciririca apesar do mau tempo.

Chegamos na fazenda, deixamos o carro, nos preparamos e entramos na trilha. Nem meio minuto depois de começarmos a chuva voltou a cair. Mesmo assim fomos embora…

O rio que ele disse que é somente um filetinho de água estava bastante forte, dificultando até a travessia. A chuva ficou mais e mais forte e em meia hora estávamos bem molhados. Não há roupa impermeável que segure tanta água! Quantos mm de chuva? Sei lá, todos eles! ahahahahah

Quando chegamos na divisa da trilha onde a direita segue para o Ciririca, resolvemos não tentar a montanha por causa do mau tempo. Ficaríamos no Camapuan e no Tucum mesmo e se o tempo ajudasse, Cerro Verde pela manhã seguinte. Seguimos em frente pela trilha.

O solo completamente encharcado dificultava bastante o caminho, e escorregar era muito fácil, por isso os bastões de caminhada foram essenciais. Não dava pra selecionar onde pisar, não dava pra pensar “hum, vou pisar ali que sujo menos a bota”, isso não existia nesse dia. Depois de algum tempo simplesmente desisti de evitar as poças e córregos formados pela água descendo pela trilha e deixei rolar rsrsrs…

Depois de 2h30min chegamos ao cume do Camapuan, completamente molhados e com frio.
Pedro chegou antes de eu chegar uns 5 minutos e já começou a montar acampamento. Cheguei, larguei a mochila, me hidratei e o ajudei a montar a barraca. Depois de tudo pronto entramos na barraca e preparamos o almoço: Talharim com molho branco enriquecido de linguiça paio, e pra beber complemento energético de frutas tropicais!
Daí pra frente a rotina foi ficar dentro da barraca, secar roupas e equipamentos com fogareiro e esperar. Conversamos bastante, rimos um bocado da situação, mas como subir montanha geralmente é sinônimo de perrengue, eu não esquento a cabeça e Pedro tampouco, ali ficamos rindo da situação…

Bem, o acampamento estava montado, almoçamos e descansamos depois do trabalho de “secagem geral” era cerca de 14:00h quando paramos de fato e tentei dormir. Pedro ainda conseguiu dormir um pouco mas eu não. Quando deu 15h a chuva parou! Alguém fechou o registro e decidimos ir pro Tucum de ataque. Fomos.

Acho que levamos uns 10 minutos pra ir e uns 20 minutos pra voltar, pois na volta torci o tornozelo direito. Não foi grave mas ele insistia “estou aqui hein, não abuse!”. Mais e mais acho que a minha escolha de bota foi muito boa, pois o cano alto com objetivo anti-torção provavelmente amenizou a pisada em falso. Se eu estivesse com um tênis ou uma bota de cano curto, acho que o estrago seria bem, bem pior!

A quantidade de água era enorme, inacabável…Muita chuva mesmo!
O tédio bateu e reconhecemos que fomos derrotados pelo Ciririca (ahahahahah) e chegamos ao comum acordo de descer imediatamente aproveitando a reduzida momentânea da chuva, e ficar no abrigo 5.13 do CPM. Desmontamos tudo, nos preparamos e às 16:30h começamos a descer bem acelerado.

Na descida foi vez do Pedro passar por um “rala bunda”, mas nada grave, só serviu pra darmos outra risada! Não existia nesse dia “não escorregar”!

À medida que avançávamos, íamos ficando mais e mais impressionados com o volume de água. A trilha que estava bem molhada na subida, tinha virado riacho na descida. Pior ainda porque fica mais escorregadio do que já estava.
O córrego subiu, transbordou e alagou várias partes da trilha. Só pra se ter uma idéia, o rio é um só. Mas na ida, algumas partes já estavam altas e literalmente atravessamos “4 rios” grosseiramente falando (juntando o mesmo rio em curva, e trechos de trilha alagada), mas na volta esse número subiu pra “7 rios”! Incrível, escolher pedra para pisar era arriscado, por isso resolvemos literalmente ir por água abaixo.

Pisando no fundo do rio, com água até a coxa em alguns momentos, mas na maioria até os joelhos. A única vez que escolhi pedra, confiei no pé direito e foi meu erro. Escorreguei mas dei sorte de ainda ficar de pé, mas se não me segurasse na pedra a frente a queda poderia ser consideravelmente mais séria. Depois de atravessarmos todo esse problema, e continuarmos por mais e mais trilha alagada chegamos de volta a fazenda com 1h30min de descida. Voltamos pro carro e fomos pro 5.13.

Lá a aventura mudou de cara, chegamos tão encharcados que viramos alvo de foto pra registrar a situação dos dois aventureiros! A lareira serviu pra secar os sacos de dormir, calça impermeável (até quando? rs) e roupas. Rachamos com o pessoal cinco pizzas maravilhosas, e ficamos batendo papo até umas 22h, ouvindo sobre as aventuras do Pedro, o chá de fezes de rato, a calça costurada a mão do Máximo, a noite gelada no Lanin, o leite de raposa cleptomaníaca (ahahahaha), e mais contos sobre gnomos de olhos verdes brilhantes e observações de ovnis em São T. das Letras, com muitas risadas…

Fomos dormir, secos diga-se de passagem, após esse dia memorável.

Quando acordamos o tempo ensaiava uma melhora. Tomamos café da manhã, e o grupo decidiu subir o Morro do Anhangava, mas não daria pra mim, pois o meu pé reclamava um pouco…Resolvemos ficar no abrigo arrumando as mochilas pra partir, eu pra rodoviária de carona com o Pedro, e ele pra casa pra lavar os equipos e tentar secar o que desse no ap dele.

Pedro me deixou na rodoviária onde nos despedimos, ficando marcado para sabe-se lá quando uma vingança contra a Ciririca! Consegui trocar minha passagem de volta que era de 22:30h para 12:40h! Muita sorte. Só deu tempo de comprar um bolinho de carne e uma coca-cola e entrar no ônibus.

A aventura foi divertida, molhada ao extremo mas valeu cada minuto! Nas palavras do Pedro: “Fazer montanha nestas condições não é nada legal, mas vejo que todo mundo precisa de uma experiência dessas, controlada, para aprender como é e o que fazer em casos de pegar uma chuva dessas sem controle”.

Conheci um pessoal bastante animado do CPM. Pena que moro tão longe, e não sei quando irei rever o pessoal novamente mas, espero que os reveja nas montanhas!

Custo total da viagem: R$ 144,70

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Sobre o autor

Parofes, Paulo Roberto Felipe Schmidt (In Memorian) era nascido no Rio, mas morava em São Paulo desde 2007, Historiador por formação. Praticava montanhismo há 8 anos e sua predileção é por montanhas nacionais e montanhas de altitude pouco visitadas, remotas e de difícil acesso. A maior experiência é em montanhas de 5000 metros a 6000 metros nos andes atacameños, norte do Chile, cuja ascensão é realizada por trekking de altitude. Dentre as conquistas pessoais se destaca a primeira escalada brasileira ao vulcão Aucanquilcha de 6.176 metros e a primeira escalada brasileira em solitário do vulcão ativo San Pedro de 6.145 metros, próximo a vila de Ollague. Também se destaca a escalada do vulcão Licancabur de 5.920 metros e vulcão Sairecabur de 6000 metros. Parofes nos deixou no dia 10 de maio de 2014.

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