Pusemos pé no asfalto da SP-98 depois das 9hrs da matina eu, Ricardo e Priscila, sob um céu coberto por opaca nebulosidade e ainda por cima fustigados no rosto por um véu de fina garoa, q só deu trégua meia hora depois. Ainda assim, a temperatura estava amena mas a ausência de promessa de bom tempo justificava o trânsito fluido normalmente sentido litoral, o q nos deixou sob alerta no decorrer da caminhada pela rodovia até a entrada da trilha, coisa de 3,5km adiante.
Abandonamos o barulho dos veículos no asfalto por volta das 9:45hrs, no km 80, e mergulhamos no frescor silencioso da mata fechada. Uma vez lá, a caminhada transcorreu sem nenhuma intercedência, principalmente pelo fato da vereda encontrar-se em boas condições e mto bem pisada. E o melhor, a recente estiagem na região deixou o chão bem firme e compacto, fácil de pisar, nos costumeiros trechos de brejo, lama e charco onde geralmente nenhuma bota saia ilesa! Enqto isso, as brumas conferiam um ar místico a mata, fato corroborado pelo canto metálico duma araponga.
Tocando então em frente, num piscar de olhos passamos a acompanhar um simpático córrego q logo é atravessado, e tomando o ramo da direita nas duas bifurcações q se seguem logo nos vemos palmilhando a vereda oficial q leva a Cachu Furada. Agora descendo suavemente um vale transversal, chegamos por volta das 10:25hrs no atrativo, mais precisamente às margens do belo poço situado na parte superior da queda. É sempre bom retornar a esta singular cachoeira pra poder apreciar o manso Rio Sertãozinho ser represado pelas rochas e, logo em seguida, ser literalmente “cuspido” pelas entranhas da pedra. A profusão de buquês de lírios vermelhos ornando ambas margens apenas tingem ainda mais aquele panorama já idílico pela presença da queda, ainda por cima emoldurado por brumas esparsas. E após desescalaminhar com cautela umas raízes até a base da queda, uma pausa pra um breve descanso e algumas fotos, claro.
Vazamos dali coisa de 10min depois, quando começou a chegar o segundo contingente de “agências ecoturistas” daquele domingo quente e ao mesmo tempo nublado. Como desejávamos tranquilidade e nenhuma farofa a nossa volta, prosseguimos nossa jornada tomando um atalho q dispensa voltar pela mesma picada. Subimos inicialmente o rio, cruzamos uma imperceptível clareira em sua margem e começamos a galgar a íngreme encosta com a ajuda das mãos, q ganharam a mesma importância dos pés. Fôlego redobrado, deixávamos na Cachu Furada a leve sensação de “até breve”.
Uma vez na vereda principal outra vez bastou simplesmente tocar pela mesma, indefinidamente. Daqui em diante a picada, menos pisada, se estreita e mostra menos sinal de uso. Uso humano, claro, pois as pegadas de antas enormes antas foram recorrentes o dia td. Ainda assim a vereda é bem obvia pro olhar mais atento, e acompanha (a distância) o Rio Sertãozinho, q rumoreja nalgum canto a nossa direita. O caminho sobe e desce continuamente em meio a um emaranhado de raízes e muitas bromélias, mas a caminhada no geral é agradável e sussa. No caminho é possível encontrar vestígios duma pequena muretinha e até alguns tijolos no chão, datados da época da construção da Represa Andes e, consequentemente, da Rodovia Mogi-Bertioga.
Foi após andar pouco mais de meia hora nesse compasso q nos deparamos com uma óbvia encruzilhada, onde tocamos pra direita, pois ia na direção do rio. A medida q avançávamos o som inconfundível do rugido duma queda foi se tornando mais claro. E ela se materializou mais adiante, depois Eram 11:40hr qdo desembocamos na clareira ao lado da muretinha de contenção da Represa Light, q segura as águas calmas do Sertãozinho pra depois serem despejadas furiosamente rio abaixo pela maravilhosa Cachoeira Light. Um enorme poço ao sopé da cachu convida prum refrescante mergulho.
Diferentemente da Cachu Furada, tínhamos aquela dali totalmente pra nós, o q deixou a Priscila encantada! A ausência total de lixo denuncia a pouca visitação do lugar. Assim como a Represa Andes, esta bela queda é freqüentada apenas por poucos aventureiros e, claro, por caçadores. Tanto q havia o pequeno acampamento de um deles perto do rio. Pausa pra banho na represa, descanso, lanche e tchibum, claro! Devido ao baixo nível do rio, desta vez pude atravessar pelas pedras desimpedidamente e alcançar a pequena ilhota fluvial no meio do rio, conseguindo uma rara foto frontal da cachu. Só por essa nova perspectiva duma cachu q visitava pela 4ª vez o rolê já valia a pena.
Após quase uma hora de descanso lagarteando no alto da queda, retomamos a pernada, agora voltando pela mesmo caminho até a encruzilhada supracitada. Agora nossa tendência era fuxicar novas picadas (pois havia muitas mesmo) e buscar interceptar o tradicional “Picadão do Geraldo”, ao norte. Na encruzilhada então tocamos reto, pois sabíamos q o ramo da direita fatalmente ia de encontro nas sinuosas margens do Sertãozinho e passaria a acompanhá-lo o resto do tempo. Não era pra onde íamos.
Dessa forma tocamos indefinidamente pro noroeste pla vereda principal, contornando a base dum gde morro q, na carta, consta com 820m, no mesmo instante em q a neblina se debruçava naquele cafundó serrano pra depois outra vez se dissipar. A picada mostra sinais de antigo calçamento de pedras e vestígios de minúsculas pinguelinhas, q exibem pequenas paredes de sustentação semi-intactas. Assim, lentamente fomos desviando do norte e começando a retornar no sentido da rodovia, ou seja, rumo sudoeste. Como não desejávamos voltar pra SP-98, a meio caminho abandonamos a picada em favor duma perpendicular q, nascia pela direita e tocava pra oeste, sentido “Picadão do Geraldo”. Aqui eu já me situei pois já conhecia a dita cuja de mto tempo atrás, e falei pro pessoal se preparar pra travessia dum riacho. Batata, não deu nem 5min o largo córrego apareceu, e só foi vencido chapinhando os pés com água ate as canelas, sem gdes dificuldades.
Num piscar de olhos, as 13:45hrs, caímos no famoso “Picadão do Geraldo”, vereda q considero a “Avenida Paulista” do sertão de Biritiba Mirim. Daqui bastou apenas acompanhá-lo sentido nordeste, onde começaria de fato nossa exploração atrás do tal “Poço das Moças”. O brumado tornava opaco td firmamento acima de nossas cacholas, impedindo qq vislumbre das escarpas pontiagudas do Pico Peito de Moça. Se as informações procediam ou não, íamos pagar pra ver.
“No primeiro riacho toca 40m pra esquerda..”, disse o Ricardo. E foi o q fizemos ao tropeçar no pontilhão parcialmente aterrado sobre o primeiro riacho. Nos embrenhamos na mata, seguindo a risca essa precária info, e nada. Vasculhamos cada canto em ambas direções do pontilhão, e nada. Prosseguimos então até a segunda ponte e refizemos o pente-fino em ambas margens do córrego, acreditando q quiçá o riacho fosse outro. E nada. Qq remanso avistado em nada se assemelhava ao q o relato descrevia como “enorme poço de banho”. Buscamos, buscamos e nada. Não achamos piscina natureba nenhuma mas ganhamos inúmeros carrapatos pelo corpo.
Cansados, encerramos as buscas do tal poço pouco antes das 15hrs, dando início ao longo caminho de volta q de daria pela pouco conhecida da “Cachu Água Fina”. Esta vereda nos levaria ao outro lado da serra sem q precisássemos retornar tds aqueles “kaemes” de asfalto outra vez pra Balança. Antes, porém, fizemos uma breve paradinha num dos primeiros córregos q cortam esta simpática vereda, onde fizemos mais uma boquinha e pudemos abastecer os cantis com o precioso liquido. Ali, sentados sobre o q restou duma outrora ponte, confabulamos sobre a info desse hipotético poço, tão vaga qto duvidosa, e chegamos a duas conclusões: ou o poço não existe, ou fica noutro canto.
Na sequência retomamos nossa rota, subindo sem pressa os 200m de desnível serra acima, onde ignoramos a entrada pra queda da Água Fina, audível na parte alta do trajeto. A colérica araponga embalava a trilha sonora na mata enqto o firmamento alternava-se entre brumas e ceu cinza e opaco. Após o colo serrano veio a descida, onde ganhamos mais velocidade e a Priscila passou a se apoiar sobre dois pedaços de madeira q serviram feito bastões, pois queixava-se de dores no joelho. E após os trocentos matacões e grotões q pipocam pela encosta, logo a mata secundária deu lugar aos tradicionais reflorestamentos de eucaliptos, qdo desembocamos numa estradinha secundária, la pelas 16hrs.
Dali em diante td transcorreu sem percalços, pois praticamente refazia uma rota q já tinha palmilhado coisa de duas semanas a trás. A paisagem, no entanto, se diferenciava pela presença maciça de névoa e serração. Do maciço da Pedra do Sapo, nem sinal. Caímos nos fundos duma fazenda, deixando a cachorrada em polvorosa. Felizmente os pulguentos estavam amarrados, a exceção de dois minúsculos vira-latas q faziam questão de mostrar serviço pra seus donos. E assim pisamos na Estrada da Adutora, q bastou tocar até o final. Chegamos em Manoel Ferreira por volta das 17hrs, onde desabamos no tradicional “Bar do Sandro” e nos deliciamos de breja e porções de calabreja acebolada e de churrasco enqto aguardávamos condução de volta.
É verdade, não encontramos o tal “Poço das Moças de Biritiba-Mirim”, o q pode figurar como retumbante fracasso daquela “expedição dominical”. Da mesma forma q outras lendas e causos da região, como por exemplo o “Rancho do Grilo”, td pode não passar disso mesmo, isto é, de lenda. Ou, na melhor das hipóteses, deveríamos conseguir mais infos confiáveis e retornar naquele cafundó serrano, pois buscar algo incerto era o mesmo procurar uma “agulha num palheiro”. Por outro lado, aquela busca infrutífera estava longe de parecer perda de tempo. Não tropeçamos com poço algum, mas palmilhamos cerca de 20kms dum setor selvagem do “Sertãozinho do Tietê”, passando por duas lindas quedas pouco (ou nada) visadas. Só assim pra dar sentido dum famoso verso de Fernando Pessoa, ao afirmar q “td vale a pena qdo a alma não é pequena”. Pois é, viver é se arriscar. E isso se aplica pra td na vida.