A represinha do Galo

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São incontáveis os caminhos e descaminhos q levam a remansos refrescantes na Serra do Mar paulistana. Remansos como a simpática Cachu e Represa do Galo, uma das inúmeras antigas barragens particulares existentes ao largo da planície litorânea de Bertioga (SP). Situada ao sopé da Serra de Guaratuba e descoberta acidentalmente em meio a exuberante Mata Atlântica, eis um programa breve, refrescante e ideal prum dia quente de verão q pode ser emendado com qq outro numa visita descompromissada ao litoral.

“É aqui!”, dizia um. “Não! Deve ser no outro condomínio!”, rebatia outro. No carro, uma autêntica babilônia étnica se espremia ansiosa por um banho refrescante, independente de onde fosse. O mezzo-luso Nando resolvera levar naquela manhã quente e abafada dois amigos gringos (de passagem por aqui) pralgum lugar da nossa “brazilian rainforest”: o Peter, americano é piloto da American Airlines; e meu xará, o terapeuta alternativo argentino Jorge. Além deles, completava o quinteto este chileno q aqui vos escreve e o técnico de informática Akley, único representante legitimamente tupiniquim do veículo. A idéia era, diante da forte onda de calor, dar um tchibum num local de fácil acesso e c/ trilha breve.

Pois bem, por ter deixado Sampa já relativamente tarde, quase 11hrs e com tempo mais q apertado, o Nando decidira irmos prum poço próximo q conhecia mas q não visitava já a muito tempo, gerando duvidas qto sua precisa localização. Dessa forma rodávamos pela Rodovia Mario Covas (SP-55) com lentidão, atentando a qq sinalização e emplacamento q estivesse escancarado na margem esquerda da via. Foi ai q as 13hrs adentramos no Residencial Jurubatuba, e começamos a rodar por seu emaranhado de ruas de terra q mais lembra o interior duma colméia. Apoiado unicamente pela memória, o motorista então terminou nos levando ao extremo norte do condomínio, onde chegamos na entrada duma picada cujo acesso era barrado por uma corrente. “Acho q é aqui!”, disse ele. De fato, situado na rua JK e indo em direção ao pé da serra, td indicava q realmente fosse ali mesmo.

Apesar da placa “Proibida Entrada” e da corrente (q bastou levantar), adentramos no largo picadão com carro e tudo e lá fomos nós, avançando o qto desse pra ganhar quilometragem motorizados. Mas não demorou pro mato tomar conta da trilha e a precariedade da mesma cunhar a decisão de encostar o veículo sob a sombra em qq canto dali. Bem, finalmente íamos começar a andar e como havíamos ganho um bom chão no carro, a esperança era chegar o mais rápido possível na cachu ou poço almejado. Eram apenas 13:30hrs e o calor infernal estava no auge.

E assim, com mochilas as costas, seguimos na sola o restante daquela longa trilha em linha praticamente reta até o pé da serra, onde a cada passo dado a eterna “Muralha” preenchia mais e mais td paisagem ao norte. A vereda nada mais era q uma antiga estrada, uma vez q palmilhávamos visivelmente um par de vias paralelas q nada mais era o espaço reservado aos pneus. Aliás, havia marcas de moto por td trajeto. E assim andamos, andamos e andamos, sempre cercados de verdejante mata a nossa volta e com sol castigando forte nossas cacholas.

A proximidade com o pé da serra aumentou a vegetação a nossa volta e, eventualmente, na trilha tb. Mas foi após cruzar uma decrépita pinguelinha sobre um manso correguinho q o caminho piorou. Não bastasse o mato alto o pior foi mesmo o brejo, charco e lama, q seguravam nosso pé e não raramente provocava tombos. O argentino, coitado, q foi de sandália q o diga. Mas logo adiante o caminho melhorou, a picada alargou na sombra e o terreno ficou mais firme e seco. Curiosidade foi ver aqui material de pesquisa de alunos de pós-graduação da Usp e, pelo q tava escrito neles, era pra ver nível do aquecimento global.

Pois bem, finalmente as 14:10hrs abandonamos a picada principal em favor de outra bem obvia q derivava pela esquerda, e foi essa q tomamos. Mergulhamos então na mata densa e espessa, sentido oeste, ainda no plano, onde cruzamos alguns correguinhos q serviram pra molhar a goela. Desnecessário dizer q àquela altura estávamos tds ensopados pois o calor abafado da floresta fazia com q suássemos em bicas, mesmo na sombra. O Peter encantou-se com pegadas de anta na areia a margem do córrego, q por sinal devia ser bem grandinha tendo em vista a profundidade das mesmas. “Tapir?”, dizia ele.

Na outra margem, não demorou pra picada ganhar altitude através duma encosta, onde o caminho se estreitava vez ou outra, mas ao menos sempre permaneceu bem obvio e evidente. Mas foi qdo passou a acompanhar outro riozinho q já era audível e seguir uns canos de captação enterrados, q o caminho embicou piramba acima, pro norte. E assim, após um último trecho de escalaminhada fácil – onde nos segurávamos no cano e nas pedras em volta – q finalmente a trilha desembocou no q pareceu ser uma pequena caixa d’água. É, a trilha nos levara não pruma cachu e sim pruma minúscula barragenzinha de captação q mais parecia uma banheira. Bem q tentei buscar continuidade dela, mas nada. Ela terminava ali mesmo e pelas frestas da vegetação podíamos avistar o azul do litoral, ao sul, e o constatar o qto havíamos subido até ali. Descansamos um pouco ali de modo a rever a carta, além de molhar a goela e o rosto suado.

Retornamos td caminho e as 14:50hrs estávamos outra vez na estrada principal, q julgamos melhor acompanhar pra ver onde daria. Decididamente não estávamos na trilha originalmente proposta, mas já q estávamos lá decidimos seguir em frente pois afinal, independente disso, sempre há um rio/cachu no pé da serra. E a presença de gdes aquedutos apenas reforçava isso. Além do mais, um tchibum era algo q naquele momento era prioritário e foi o q nos motivou a dar continuidade a pernada. Assim bastou acompanhar os dutos pela trilha principal, ora dum lado ora doutro, q não demorou a ganhar declividade e se tornar mais acidentado com o aumento de enormes pedras.

Dessa forma, após transpor uma larga rampa rochosa cercada de mato, por volta das 15:10hrs chegamos onde os dutos nasciam: uma gde barragem artificial q represava um pequeno córrego q despejava suas águas ali através duma sequência de pequenas quedas. Pelas inscrições marcadas num concreto próximo, a barragem datava de 1968 e atualmente abastecia parte do condomínio pelo qual adentráramos. Mas independente disso, veio bem a calhar naquele horário. Natural ou não, aquele piscinão era um verdadeiro oásis naquele calor infernal e serviu a contento a nossos propósitos de tchibum.

Foi q, enqto td mundo se banhava no aprazível piscinão, q resolvi fuxicar o alto da cachuzinha. Engatinhei cautelosamente nas rampas rochosas sgtes, mas qdo resolvi ficar de pé eis q meu pé esquerdo derrapa e caio de frente pra pedra. Como a pancada seria inevitável e p/ não meter o rosto c/ óculos frontalmente, desviei o olhar p/ direita recebendo o impacto do lado esquerdo da testa. Resultado: um enorme e dolorido galo, q pelo caroço q se formou tava mais pra “chifre” q qq outra coisa. Verificando q fora esse detalhe td tava em ordem, encerrei ai minhas “explorações” e me juntei aos demais na curtição, q ficaram boquiabertos com o “brinde” q acabara de ganhar.

Por volta das 16:30hrs resolvemos voltar às pressas, até pq os gringos tinham q viajar ainda naquela noite. Mas não sem antes uma passada rápida numa prainha da Riviera de São Lourenço, onde tivemos nosso quinhão de bebemoração a beira-mar. Pra mim, no caso, o enorme e gelado latão de 710ml de Germania teve dupla função: molhar tanto a goela seca c/ “liquido precioso” como servir de compressa pra desinchar meu “souvenir” na testa.

Por ironia do destino e conversando com jovens moradores do Residencial Guaratuba, descobrimos q a cachu q originalmente buscávamos não estava naquele residencial e sim no do lado. Paciência, fica pra próxima. Mas e daí? Serviu do mesmo jeito ao nosso principal propósito. Banho. Além do mais, afirmaram q a cachuzinha represada q havíamos curtido é atrativo local dos moradores, porém pouco freqüentado e conhecido por quem é de fora. Perguntei se tinha nome mas este detalhe foi algo q não souberam responder. Por causa disso e falta de denominação melhor, resolvemos em comum acordo apelidar esta simpática cachuzinha represada com o nome q encabeça este relato. Um dos tantos encantos existentes ao sopé da Serra de Guaratuba e do Juqueriquerê.
 

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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