A travessia do Putim

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Guararema é uma simpática cidadezinha vizinha de Mogi das Cruzes q se caracteriza por preservar seus tesouros coloniais e antigas tradições. Situada as margens do grande e esverdeado Rio Paraíba do Sul, Guararema tb tem alguns encantos naturebas q podem ser conhecidos numa breve e tradicional travessia local. Uma pernada de menos de 18km q visita os 50m de queda da imponente Cachoeira do Putim, pra depois atravessar a serra em direção dos monumentos megalíticos do Pq Mun. da Pedra Montada, passando pela pitoresca Pedra do Tubarão. Uma caminhada tão curta qto fácil q revela uma faceta pouco visada desta região do Alto Tietê.

O sol brilhava forte no alto de nossas cacholas qdo chegamos em Guararema, por volta das 9:30hrs, após 75km rodados desde a capital paulistana. Havia a possibilidade de ter vindo através da demorada dobradinha  trem/bus mas achamos melhor otimizar o dia e viemos motorizados. Encostamos então o veículo numa travessa da simpática e movimentada Praça Central e Igreja Matriz Nove de Julho, percebendo q a cidade acordara  faz tempo. Do carro – de onde saíram as curiosas Débora, Lore, Carol e um deslocado Ricardo – apenas eu conhecia a cidade, pto final doutra pernada bacana de anos atrás, no caso, o ferro-trekking “Mogi-Guararema”. Com tempo de sobra devido a pernada da vez ser algo breve resolvemos dar um rolê pela cidadezinha, cujo nome em tupi-guarani significa “pau-d’alho”.
 
Logo ao sair do veículo nos deparamos com uma ponte bem decorada ao lado do enorme Rio Paraíba do Sul, q exibia um tom lindamente esverdeado. Uma placa avisava q ela dava acesso a uma tal de “Ilha Grande”, q depois se revelou uma espécie de “mini-pracinha” bem arborizadas, com boa infra, playground, núcleo de educação ambiental, aparelhos p/ ginástica, mirante, etc.. só q situada numa ilhota bem no meio do majestoso rio. O destaque mesmo ficou por conta da bicharada local dando as caras despudoradamente e fazendo até pose pra fotos, como capivaras, sabiás e até uma cigarra. O rio merece um destaque a parte e foi algo q nos chamou muito a atenção, pois além do tom esmeralda q reluzia nos surpreendeu a qtidade de enormes peixes (bagres, no caso) nadando próximo das margens. “Ahh, aqui é um charme! Acho q vou ficar por aqui mesmo!”, ameaçava uma preguiçosa Lore.
 
Na sequencia cortamos a cidade de cabo a rabo, sentido leste, sempre acompanhando a sinalização “Pque Pedra Montada”, indo em direção ao sopé do Morro do Gervásio, coroado por enormes antenas. Ao cruzar a linha férrea, esticamos rapidamente pra alguns cliques tanto da charmosa Estação Guararema como do belo pontilhão ao norte, com belo visual tanto do rio como da bela morraria ao redor. Mas por ser mesmo já quase 11hrs resolvemos iniciar a pernada dali mesmo. Pois bem, da Estação Guararema basta tocar pela via principal sentido leste, ladeando o tal Morro do Gervásio e tendo como cia constante o Rio Paraíba do Sul, a nossa esquerda. A pernada é tranqüila, com pouco desnível, e num piscar de olhos as casas vão ficando pra trás pra dar lugar a presença cada vez maior de mato e verde. No caminho, uma simpática igrejinha desperta a atenção reluzindo suas paredes alvas de  taipa (e pau-a-pique) ao sol do quase meio-dia. É a Igreja Nossa Sra da Escada, típico exemplo de construção jesuíta datada do século 16.
 
A pernada prossegue modorrenta e enfadonha, pois parece q o tempo não passa e sempre pela Estrada Mun. Dr. Hercules Campagnoli, q depois de um tempo se afasta do gde rio. O sol castiga sem dó este trecho bem exposto e aberto. Cruzamos algumas construções isoladas e bordeja o enorme espelho dágua q abriga o Condomínio Alpes de Guararema, ate q finalmente vem um trecho relativamente sombreado onde a caminhada arrefece. Mas qdo a estrada emparelha novamente com o rio é preciso já prestar atenção, já q aparecerá uma bifurcação pro sul indo pro Pq Pedra Montada e Lagoa Nova, q ignoramos, mas q será nossa via de retorno mais tarde.
 
Nos mantemos então sempre na via principal, ao lado do rio e sentido Sta Branca, atentando agora pras entradas de terra pela direita. E assim, na segunda delas e marcada por um portão metálico amarelo, enfim, deixamos o asfalto ao meio-dia e pouquinho. Palmilhando então sinuosamente uma área de reflorestamento da Suzano, basta tocar sempre pela via principal sentido sudeste ignorando qq saída lateral. A caminhada prossegue agradável e relativamente bem sombreada pela profusão de eucaliptos perfilados a nossa volta, mas após cruzar um aceiro de gasodutos da Petrobrás é preciso atentar pruma discreta picada nascendo pela esquerda, numa área mais descampada.
 
Entrando por essa vereda logo os horizontes do quadrante oeste se ampliam, revelando nosso primeiro destino a sudeste, a Cachu do Putim. Um enorme véu dágua derramando-se através de 50m de enormes lajotas de pedra ligeiramente inclinado destoa da paisagem , em meio a baixas colinas, e intuitivamente o caminho a seguir é mais q óbvio. Descemos então a suave encosta de capim em sua direção, passando pelas ruínas do q sobrou duma construção ate q quase dar no sopé da belíssima cachu. Saltando de pedra em pedra, desviando de corredeiras e banheiras naturebas, estacionamos então na sombra dum baixo arvoredo na base da queda, as 12:30hrs. Logicamente q naquele calor desgraçado eu, Ricardo e Débora fizemos questão dum banho tão bem-vindo qto refrescante, enqto a Carol e a Lore apenas lagarteavam a sombra dos lajedos. Enfim, éramos donos  absolutos daquele belo recanto.
 
Mas td q é bom dura pouco, ou quase. Após descansar, beliscar e até ensaiar um cochilo, resolvemos dar continuidade a pernada um pouco antes das 14hrs. E assim começamos a subir tranquilamente pelas aderências rochosas do lado esquerdo da queda, sem maior dificuldade. A declividade de quase 30 graus seria de fácil transposição, não fosse o sol martelando forte o alto da cuca. Mas como não havia pressa fomos ganhando altitude numa boa, ate chegar no alto do primeiro patamar da queda.  La havia uma vista bem bonita de td a baixada percorrida e das colinas em volta. Daqui havia q passar pro outro lado, coisa q só foi conseguida através duma picada q nascia discretamente na margem palmilhada, adentrando num foco de mata e dava no alto dos rochedos q represavam o rio numa pequena e bela cachu dourada.
 
Saltando as pedras com cuidado caímos então na outra margem do rio, onde havia alguns gato pingados tomando sol e até uma macumbinha básica, sinal q estávamos próximos dalguma muvuca. O som relativamente alto dum pancadão abafado pelo vale tb era indicio disso. Pois bem, da margem direita da cachu foi só tocar pelo q parecia ser uma veredinha no capinzal q cruzava em diagonal mas se perdia na encosta. Mas não havia problema, pelo mato não ser tão agreste assim e o sentido ser mais obvio, bastou apenas tocar rumo a origem daquele maledito som, misto de funk-pagode-sertanejo. Deixamos o capim, cruzamos o q pareceu ser um aqueduto seco até emergir numa voçoroca de bambuzinhos q finalmente nos deixou no patamar superior e definitivo da cachu, onde infelizmente não havia a mesma privacidade e silencio la de baixo. A profusão de carros estacionados, duas enormes caixas de som bombando um som infernal e uma farofada desmedida finalmente corroboravam a idéia q ali era o balneário da galera local. O lugar ate q era bonito, com dois gdes escorregas q culminavam num pocinho relativamente cheio, mas era a multidão ali presente q maculava td aquela beleza natureba.
 
Logicamente q não ficamos ali nem um minuto e nos pirulitamos imediatamente daquele inferno de Dante, prosseguindo então pela estrada principal (onde ao menos havia uma perua onde adquiri uma bem-vinda lata de breja), q agora bordeja os reflorestamentos pela esquerda. Dali tb parte uma breve picada q leva ao alto da parede concretada da Barragem Putim, onde fomos dar uma rápida bisbilhotada. Olhando pro lado oposto á farofa, observávamos claramente os efeitos da estiagem dos últimos meses pois era pra represa  estar muito mais cheia, mas no caso ela apenas ostentava um razoável curso dagua cercado de alto capinzal. Td isso emoldurado pela morraria de reflorestamentos da Suzano.
 
Pois bem, dando continuidade a breve travessia é preciso abandonar a tal estrada principal, pular a cerca e passar pro outro lado, onde outra precária estradinha parece acompanhar a principal, sentido sudeste. Logo é possível avistar, nesta outra via, outra q deriva transversalmente e mergulha em linha reta pro interior dos reflorestamentos, sentido sudoeste. E é por ela q seguimos um bom tempo, e sempre em franca ascensão. Subida esta feita a passo de tartaruga-manca em virtude do calor abafado daquele horário da tarde. E olha q estávamos na sombra.. Uma vez no alto do morro tropecamos com uma encruzilhada, onde tive q consultar a infalível dupla carta/bussola. Em tese, daqui teríamos q tocar sempre pra sudoeste e não fugir disso. Logo, tomamos a via da esquerda q ia no sentido desejado. 
 
Não tardou e após palmilhar um tanto de crista a picada desembocou noutra via, onde tomamos o ramo da direita q aparentava ir na direção certa. Errado, pois além de descer um tanto a rota começou a marcar norte, ou seja, estávamos voltando. Meia volta. Subimos td novamente e tomamos a via da esquerda, mas foi ai q percebi uma outra trilha acompanhando a principal e, discreta, ia no sentido desejado perfeitamente. Bingo. A picada descia pro vale sgte, mas ia na direção correta. Uffa. Aqui já abandonávamos os reflorestamentos da Suzano e o cenário em volta passava a ser de abundante Mata Secundaria, salpicada de muitas e muitas pedras arredondadas, os chamados “matacões”, típicos da serra de Biritiba-Mirim.
 
Mas depois duma longa descida veio uma íngreme e árdua subida, q nos separou uns dos outros. A picada erodida visivelmente denunciava transito de bikes e motos. No alto, ofegantes,  fizemos um breve pit-stop pra retomada de fôlego e prosseguimos a pernada, agora pelo alto da morraria, felizmente sempre com sombra. Foi ai q desembocamos num trecho aberto, q nada mais era q o tal aceiro dos gasodutos da Petrobras, onde havia uma bela vista da baixada e representava metade da travessia percorrida. Eram 15:20hrs qdo a picada então mergulhou novamente na mata fechada, sempre sentido sudoeste, percorrendo tranquilamente o alto da abaulada morraria sgte. Dali em diante a navegação apenas ficou mais fácil e obvia pois a picada visivelmente era uma via principal e, ignorando qq ramificação lateral, bastou tocar sempre por ela. 
 
Percebi  q estávamos no alto do Morro da Pedra Montada as 15:40hrs, qdo tropeçamos com um enorme rochedo de formato pitoresco q guardava semelhanças com um certo peixe. Era a tal Pedra do Tubarão, da qual já tinha ouvido falar e q realmente faz jus ao nome pois se parece mesmo com o bicho. Desde q se olhe do ângulo certo, claro. Ali tb havia uma palco de madeira armado, sinal q de q deve haver algum tipo de apresentação por ali. Daqui em diante foi td passeio no bosque, pois logo adiante a picada deu lugar a calçamento e desceu um bom tempo a encosta do morro, acompanhada por um cercado delimitando propriedade.
 
Foi ai q finalmente demos de cara com a formação rochosa q empresta nome ao morro e ao parque, quase as 16hrs. Duas enormes pedras majestosamente equilibradas uma sobre a outra naquela íngreme encosta; a pedra de cima apresenta aproximadamente 6m de comprimento por 3m de largura e 2,5m de altura, e peso em torno de 50 ton, já a pedra de baixo e possui dimensões estimadas de 7m de comprimento por 2,7m de largura e 2,5m de altura. O conjunto realmente impressiona e, geologicamente, formou-se a 50 milhões de anos atrás, qdo o movimento das placas tectônicas formou a região do Alto Tietê. O pque abriga outras 50 gde pedras, espalhadas ao redor de td montanha. Tem até a “Pedra do ET”…
 
Ali do ladinho é possível reparar na simpática infra-estrutura do lugar, com banheiros, sinalização, playground, etc. Tem até estacionamento pra cavalo! O restaurante é um charme a parte pois foi construído sob palafitas na encosta e parece com a “casa do Tarzã”, construída numa arvore. Percebe-se perfeitamente q a prefeitura esta aproveitando o potencial turístico dali. No entanto, o lugar estava fechado p/ visitação pq estava em reformas, como soubemos depois. Na verdade, soubemos na hora de sair dali, qdo o guardinha  local – q revelou se chamar de José Wilker – nos viu e esbravejou na nossa direção: “De onde vcs vieram?? Sabiam q aqui é propriedade particular e ta fechado!”. Mas depois de esclarecido o imbróglio, além de nos dar infos do lugar, nos convidou gentilmente a sair dali pela “porta dos fundos”, de modo a não sermos flagrados pelas câmeras de vigilância e q não “sujasse” pra ele. Em tempo, o parque só reabrirá durante o verão, pelas infos passadas pelo Zé Wilker.
 
Dali não nos restou opção senão retornar, claro! Tínhamos quase 7km de longo chão ate Guararema e, ao saber q o busuca só passaria dentro de 2hrs, voltamos a pé mesmo. E tome sol escaldante na cachola (e na cara!) no caminho, onde qq sombrinha efêmera era muito bem-vinda!  Chegamos finalmente em Guararema por volta das 17:30hrs, onde desabamos num boteco e bebemoramos a simplória empreitada dominical nos arredores daquela simpática cidadezinha q já foi até uma sesmaria de Mogi das Cruzes. Bebemorando com “A Outra”, diga-se de passagem, uma breja de Socorro q nunca desceu tão gostoso gogó abaixo.
 
É possível abreviar (e muito) a caminhada deixando um veiculo de resgate no inicio ou no fim da travessia, seja na Cachu Putim ou na Pda Montada.  Mas como a gente queria andar mesmo começou a andar desde Guararema, despreocupado com qq detalhe logístico. A caminhada tb pode ser feita em ambos sentidos, sendo q partindo da Pda Montada  em direção a Cachu Putim é menos desgastante pq é totalmente em declive. Entretanto, pelo fato do Pque estar provisoriamente fechado resta, por ora, unicamente a opção “perrengueira” relatada acima, ou seja, td em subida! Se preferir, mande a caminhada pro alto e vá numa magrela, esticando pra outros atrativos locais, como a Represa de Sta Branca, programa comum da galera biker do Alto Tietê. Ou melhor, fique apenas de boa na cidade e abrace um roteiro mais sussa e mais preguiçoso, como passeios de barco pelo Paraíba do Sul ou ate visitação dos famosos alambiques dali, outra gde tradição da cidade.
 
 
Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos
 
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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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