Por quê? Após ter ido à Bolívia, o Peru, ter tido a oportunidade de estar acima dos 5000m, e sobretudo não sentir os tais efeitos da alta altitude, estimulou-me a pôr em prática a desejada viagem ao Aconcágua ou quem sabe ao Himalaia.
A preparação foi basicamente psicologicamente e financeira. Naturalmente já pratico natação e faço trilhas pela cidade do Rio de Janeiro (floresta da tijuca), Petrópolis – Teresópolis, e parque nacional de Itatiaia. A partir de junho inicei a compra das roupas e demais utensílios. Com o aumento de 50% no ingresso (para 450 dólares)o sonho quase se tornou impraticável. Aliás, se paga 1500 pesos para a ASCENSION, implicando um câmbio de 1 dólar = 3,33 pesos, e este não é o câmbio nas lojas de câmbio em MENDOZA.
No dia 25 de dezembro, parti de avião do Galeão para Santiago, chegando à capital chilena às 14h30min horário local. Para minha surpresa, no desembarque, após a passagem pela polícia internacional do Chile (PDI), encontrei na esteira sobre minhas mochilas cães farejadores. Logo, veio à cabeça o filme EXPRESSO da MEIA-NOITE. (… Será que colocaram drogas em minhas mochilas ???? …. ) Isto me deixou tenso.
Perguntei ao funcionário com os cães o que se tratava. Este explicou que era uma norma para coibir a entrada de alimentos de origem animal e vegetal no território chileno. Assim fiquei tranqüilo, pois havia muito alimento nesta relação. Meus pacotes de banana-passa, chás, biscoitos, chocolates, frutas como manga, atum, sardinha foram diretos para as cestinhas verdes. Ai, ai, ai ! E agora? Onde vou comprar? Não conheço os mercados de cá nem de Mendoza!!
Peguei um ônibus em frente ao aeropuerto (CENTROPUERTO) com destino ao centro para parar no terminal de bus BERNARDO O´HIggins . Paguei 1400 pesos e em 30 min cheguei ao terminal do lado direito do bus. (Detalhe: o câmbio pode ser feito no aeropuerto, no térreo, e o terminal de bus tem endereço AV Libertador Bernardo O´HIGGINS 3850).
Procurei um hotel na ruas ao lado do terminal (10.000 pesos com banheiro incluso). Voltei ao terminal a procura de passagem de ônibus para Mendoza. A empresa que escolhi foi a ANDESMAR, com E e não I, pois há ANDISMAR. Gostei do serviço e do conforto. 16500 pesos chilenos e 90 pesos argentinos. No dia seguinte, antes da viagem, fui a uma loja ANDESGEAR ( www.andesgear.cl ) para comprar a bota plástica, os grampones e os botijões para o fogareiro. Tudo pronto, faltava somente a alimentação.
O ônibus sobe a cordilheira numa pista ziguezagueando, porém tranqüila e uma beleza estonteante. Para aqueles que fazem este trecho, a altitude atingida fica em torno dos 3200m, mas seguro.
Passei, pela aduana, e neste ponto deve-se ter paciência. (Na volta, Mendoza-Santiago, ao sair às 23h de Mendoza, SAÍ DA ADUANA com o dia claro perdurando 12 horas para pouco de 380 km. Tenha muita paciência, mp3 ou mp4).
A chegada em Mendoza foi noite. Por volta das 21 horas. No próprio terminal há caixas eletrônicos para saques com cartões internacionais. Entrei numa residência-hotel bem próxima do terminal. Paguei 30 pesos pelo quarto a diária. Fiquei da noite de 26 às 5h da manhã de 29. Um informação importante: nestes dias que fiquei em Mendoza não encontrei macarrão instantâneo, as sopas instantâneas estavam reduzidas e absolutamente nada da tal alimentação liofilizada. Clorin não existe. Nas lojas de escalada eles vendem um tubinho com 15 comprimidos de purificador de água ao custo de 15 pesos.
Supermercados são CARREFOUR (2), ÁTOMO(2) -um em frente ao hospital central, e VEA. Este último no lado oposto à região movimentada de Mendoza, lado leste, atrás do terminal rua centro-esquerda comprida. Bem pertinho do terminal na calçada esquerda. Foi neste mercado que comprei os alimentos: um pacote de macarrão (não havia macarrão instantâneo), vários pacotes de sopa instantânea, dois caldos de carne, 3 latas de atum, um pacote de biscoito, cream cracker, chá de camomila, Nescau (esqueci do leite), duas barras médias de chocolate, vários sucos TANG,e deixei as outras coisas para comprar nos acampamentos de confluência, e das mulas. Esqueci de tanta coisa, pois estava ansioso em começar logo. Fósforos, papel higiênico, pão, leite, maior quantidade de proteínas como carnes, doces e bananas deixei para comprar nos tais acampamentos. Outro grande erro: levei somente 1020 pesos para o parque.
Aqui começaram os meus erros. Nos dias 26, 27, 28 e 29 minha alimentação se resumiu a: uma hamburguesa, duas bananas dágua, 4 litros de água por dia, sanduíches de queijo e presunto, 2 litros de suco de laranja, duas barrinhas de chocolate e um almoço com arroz, batatas e um bife duro à milanesa. Vale salientar que no dia 29, a partida para o parque não comi absolutamente nada. Somente bebi água.
O ônibus da empresa USPALLATA ( 15,60 pesos) me deixou em Horcones. Ele passa por todas as entradas e por Puente del Inca( local turístico e recomendado para uma primeira aclimatação). Neeste trajeto, não sentia absolutamente nada, somente ansiedade de entrar no parque e deixar meu permisso. Passei por Puente del Inca, desci do ônibus no intuito de comprar e comer algo. Porém não foi possível. Voltei ao ônibus, e minutos depois estávamos na entrada do parque em Los Horcones ( ~4km de P. del Inca, às 10:30 e pouco). Fui para o centro de visitante, cumprimentei a todos, mas fiquei apreciando a paisagem. Linda mesmo!! O dia estava claro com sol e prometia uma grande caminhada. Aqui no centro de visitantes era possível pagar o ingresso dos trekkings, permissos de ascension. Se você tiver tudo , não precisa ir `a Mendoza, basta ir no máximo à Puente del Inca.
Pus as duas mochilas em meu corpo. A maior nas costas e a menor com a bota plástica, e as máquinas fotográficas, livros e lentes na frente. Estava muito pesado. Acredito que era de uns 30 quilos ( na volta, sem os alimentos e as duas garrafas de 2 litros de água, no aeropuerto a balança indicou 26,7 kg ).
Fui caminhando com calma e me apoiando no único bastão de trekking que sobrou( o outro sumiu). Cheguei ao guarda parque, assinei o papel do permisso, recebi a sacola do lixo. Conheci alguns brasileiros e uma guia de mendoza que voltavam de um treking. Esta ouviu de mim minhas dificuldades de alimento e peso, indicando os serviços das empresas nos acampamentos. Fiquei pensando na necessidade da alimentação e utilizar alguma barraca nos pontos acima da Plaza de Mulas, principalmente o refúgio Berlim.
Iniciei a caminhada, após os cumprimentos de feliz 2009 a todos. Até a passagem pela ponte, segundo ouvi dizer, foi nela onde se rodou uma cena do filme 7 anos no Tibet, eu suportei bem o peso nas costas e no tórax. Ao atravessar, descansei para não sobrecarregar minha coluna por uns 5 minutos. Bebi água, tirei umas fotos e me encantei com a paisagem. Tudo posto no lombo continuei a caminhar.
Aos poucos fui sentindo o incômodo do peso no meu ombro e o que a mochila frontal, no tórax provocava. Ela estava limitando minha movimentação, postura e respiração. Após transpor uma “manta” de neve compacta, o esforço foi grande, pois minha bota de inúmeras caminhadas, trilhas e subidas em pedras, estava deslizando sobre este gelo. Fui mais acima pelas pedras soltas. O esforço foi necessário, pois o equilíbrio estava comprometido em função do terreno e peso em meu corpo. Superei este obstáculo, bebendo um bom gole de água.
Fui subindo com calma até fazer uma segunda parada sobre uma pedra onde apoiei as mochilas nesta. Ali percebi que teria que ter muita tranqüilidade para levar todo aquele peso ( minha barraca estava nela e não poderia descartá-la).
Um grupo de 6 alemães passou por mim e me cumprimentaram educadamente: ” Hola! Hi!, Hola! Hi!” Foi bom este contato. Logo a seguir um outro grupo de umas 10 pessoas. Dei um espaço bom entre nós e, pus tudo de volta às costas e peito e …ARRIBA Wagner !!  ,
Fui caminhando para cima até um ponto onde a trilha é cortada por um riacho onde encontrei todos eles. Ali acho que entendi que eles comentaram sobre o meu peso nas costas e peito. Neste momento bebi muita água , fiz muitos alongamentos para as costas. A coluna já doía bastante e comecei a achar que teria sérios problemas com aquele peso e teria que mudar a posição da mochila no tórax. Me pus a caminhar daquele ponto com esta preocupação. Algumas mulas passavam freneticamente, seguindo com exatidão sozinhas a trilha. Achei graça da cena. Algumas fotos ainda tirei, e fui seguindo na caminhada numa trilha larga onde percorria uma camada de água com umas mulas ao seu lado descendo.
O incômodo muscular nos ombros já era latente. Não via a hora de chegar à Confluência. Para minha satisfação e alívio avistei a bandeira argentina e a casinha dos guarda parque. Cheguei ao primeiro acampamento base. Apresentei-me ao guarda parque Diego com meu permisso, e dele ouvi todas as recomendações sobre uso de banheiro, água, localização da barraca , seqüência da trilha para Plaza de Mulas, enfim tudo pertinente a aventura. Por último me perguntou se eu estava bem e caso necessitasse havia o posto médico para os atendimentos. Falei que nada sentia, a não ser as dores nas costas, pois tenho escoliose em função de um trabalho físico que fazia quando jovem.
Levei aproximadamente 3h 30min da estrada até Confluência. Comecei a montagem da barraca. Para minha surpresa ( outra), as varetas metálicas da barraca estavam envergadas!! Aiaiaiaia!! Montei assim mesmo! Ficou estranha, mas foi o jeito. Depois tratei de preparar uma comida. Aha! Outra! O fogareiro não acendia! O clique dele não faiscava. “.. E agora, o que eu vou fazer? Não tenho fósforos, isqueiro. Será que alguém pode me emprestar algum? Ali percebi que a demanda estava comprometida, pois o almoço cobrado era de 15 dólares no CAMPO BASE (empresa)e 28 dólares por outra.
Além disso, o câmbio era 1 dólar igual a 3 pesos, depois foi a 3,50 e por último 3,10 pesos. Tudo começava a ficar estranho!! … Acho que não vou chegar lá!!!! Este era o pensamento que dominava neste momento. Por fim, consegui um isqueiro com o guarda parque. Preparei um macarrão sem sal, molho, mas acrescentei uma lata de sardinha. Para sobremesa, suco de laranja e um pedaço de chocolate e um chazinho de camomila. Esperei a noite chegar e tratei de dormir bem agasalhado. Aliás, a noite surgia mesmo por volta das 21:40 horas.
Amanheceu o dia 30 e fiz um desjejum soberbo – chá de camomila e biscoitos, mas esperei pelo almoço no CAMPO BASE. Lá fiz a primeira refeição decente desde que sai de casa no dia 25 de dezembro, sopa, arroz, carnes com saladas, suco de morango, pão, um robusto pedaço de melão. Preço: 15 dólares = 45 pesos. Arrotei com muita satisfação.
À tarde conheci um grande grupo de brasileiros que vieram da serra gaúcha para um trekking à Plaza Francia. Além destes, havia um grupo de 5 brasileiros também do sul, que estavam preparando-se à ascensão ao cume do Aconcágua. Um deles estivera por duas vezes ao cume. Pedi umas dicas e comentei sobre a situação da comida. Ele foi direto : ” Você está com pouca comida e pouco dinheiro para depender das empresas nos acampamentos. ” Ali, então fiquei frustrado, pois nada sentia relacionado aos efeitos da altitude de alta montanha . Dor de cabeça, enjôos, vômitos, falta de ar, cansaço, edemas, nada ! O meu mal era coluna, alimento, dinheiro e peso na mochila!! Fiquei a perambular desolado pelo acampamento, a olhar para tudo , para o céu, para todos e a pensar.. Tenho que voltar !!! Que droga!!! A frustração era imensa, mas vinha uma “voz” à cabeça – VAI, VAI TENTAR! VAI! E foi esta força que me fez arriscar. Pensei : vou para PLAZA de MULAS fico por lá uns dois dias, se der , tiver um meio que eu possa me alimentar por lá e nos campos acima eu vou.
Então foi assim, tratei com a senhora do CAMPO BASE um café da manhã ( 8 dólares = 24 pesos ) às 7 da manhã. Era cedo, ficou para às 8h. Dormi e no dia seguinte estava a espera do café – leite com chocolate, pão com marmelada, chá, torradas e alfajores. Peguei alguns alfajores e pus em meu bolso. Bebi quase dois litros de água. Tratei de desmontar a barraca, embrulhei tudo numa única mochila. Amarrei a mochila menor à maior. A princípio ficou melhor, mas a sensação de maior peso às costas foi sensível, pois antes, o peso era dividido no tórax e na coluna. Então parti a Plaza de Mulas no dia 31 por volta das 11 horas. A médica, antes me assistiu informando que tudo estava perfeito – volume de oxigênio, batimento cardíaco e etc. Só que eu estava saindo um pouco tarde. Parti então muito disposto e contente. Estava levando 2 litros de água, 1 litro de suco de laranja, alguns , biscoitinhos no bolso.
A trilha a PLAZA de MULAS a partir de Confluência se seguiu tranqüila. Desci o desfiladeiro que leva a Plaza Francia e aos rios Horcones inferior e superior. As pedras e a terra solta, demandam atenção e os bastões de trekking são necessários ao equilíbrio. Atravessei a ponte e iniciou a subida. Fiz lentamente, mas notei que o peso em minhas costas seria um outro entrave. Terminei a subida e avistei pela última vez Confluência ( já se passara uns 45 min). Daí em diante a paisagem era deslumbrante, soberba de magnífica. Um ARTISTA esculpiu um visual épico, típico de cenários de filmes de ficção como Marte. A sensação era estar na superfície de outro planeta. O sol castigava minha pele, mas o vento a refrescava. Estava em PLAYA ANCHA ! Indescritível por palavras, porém por imagens.
Após certo tempo de caminhada comecei a sentir o incômodo em minha coluna causado pelo peso da carga que conduzia. A mochila menor corria pela outra. Ora ia para esquerda, ora à direita. Eram as pedras maiores que eu encontrava pela trilha que serviam de “banco ou apoio” com o propósito se corrigir o alinhamento da mochila. Amarrei ao ponto dela não se deslocar nem para a direita ou esquerda, mas não percebi que ela foi para trás. Fiquei parecido com a ´TARTARUGA NINJA”. Só percebi isto lá no refúgio Ibañez. Toda pedra que encontrava no caminho parava e descansava as costas.
Já passaram-se 3 horas de caminhada as dores minavam minhas forças e sempre buscava uma posição ou pedra para aliviar as dores. Contornei o rio e algumas vezes cheguei a passar sobre as suas margens, sobre pedras soltas, pisando na água por duas vezes. Por diversas vezes encontrei caminhantes no sentido contrário, mas nada no meu. Até que próximo do refúgio Ibañez um jovem mendocino ( guia talvez )chamado de VICTOR me alcança. Conversamos um pouco e ele perguntou se tudo estava bem. Tirando a coluna dissera que sim. Novamente ele perguntou o meu nome e se nos encontraríamos em PLAZA de MULAS. Disse que sim. Ele seguiu e voltamos a nos encontrar no Refúgio Ibañez. Lá bebi água, o suco que ainda sobrara e um pedaço de chocolate.
Conversamos mais um pouco, falei sobre PACHAMAMAMA, do império e espíritos incas. Crise financeira mundial, diminuição no número de turistas. Por fim ele me pediu para escrever meu nome. Reclamei muito das dores nas costas. Lá no Refúgio estava escrito PLAZA de Mulas 4 horas. E eu já andara 5h e estava pensando na tal CUESTA BRAVA! A partir dali comecei a desejar estar logo em PLAZA.
Após uns 25 minutos de Victor partir, eu reinicio a demanda. É uma sucessão de sobe e desce. O meu foco tornou-se os blocos de pedras afim de apoiar a mochila e descansar minha coluna. Traçava assim – agora descanso, mirava de longe outra pedra para outro apoio e foi assim por umas duas horas. Cheguei a encontrar um porteador com suas mulas e perguntei a ele sobre Plaza quanto tempo mais ou menos – 2 horas foi sua resposta.
Já atravessara um pequeno resto de glaciar e já estava sobre a trilha com pedras maiores, já perto do refúgio em ruínas ( cerca de 15 min), já avistando a subida de CUESTA BRAVA, quando decidi: ” VOU PARAR, ESTOU EXAUSTO, SEM FORÇAS PARA CONTINUAR, ESTOU COM FOME E MINHA COLUNA DÓI MUITO! JÁ FIQUEI NOITES E NOITES EM TRILHAS E NUNCA TIVE PROBLEMAS COM ISSO! VOU ME COBRIR AQUI DIREITINHO, SECAR MEU CORPO E COMER O QUE TENHO AQUI!
Tirei tudo da mochila e comecei a improvisar um sinalizador com minha toalha laranja amarrada no bastão, pus o isolante térmico no chão e iniciei a montagem de uma parede de pedras com as mochilas e pedras. Já era 20 horas, quando surgem 3 jovens logo depois. Falei a um deles que estava com muito dor nas colunas e que ficaria ali. Eles me convenceram em primeiro lugar para ir para o tal refúgio, logo ali na frente. Depois foi Plaza de Mulas, meia hora a mais.
O problema é que eu estava extremamente exausto, sem forças para andar e levar minhas mochilas e fortes dores na coluna. Eles se ofereceram para levá-las. Agradeci e fui seduzido em ir à PLAZA de MULAS. Como eu estava muito cansado, foi um drama chegar até lá. Cheguei ao ponto de deitar no chão para descansar. Não tinha energia para fazer mais nada. Eu achei que estava hipoglicêmico. E fui nesta condição deplorável até o guarda parque.
Lá chegando cumprimentei a todos, e expliquei o que senti à médica. Das dores na coluna, da pouca comida, da subida com os 3 chicos (gato, fefe e rústico , assim se chamavam) um pouco acelerada que piorou meu estado. Eu parecia que estava “agitado”. Falava português, espanhol, , inglês tudo misturado, mas consciente. Tudo que a médica me perguntava eu respondia. Sem enjôo, dor de cabeça, sem falta de ar, mas que estava com muita fome, sede, fraco e as dores na coluna.
Eu fiquei muito ansioso com esta situação. Bebi um chá que ela me ofereceu, mais uma pílula para a hipo e uns biscoitos. Se eu tivesse ficado no abrigo, teria comido meu macarrão, meu atum e, sobretudo descansado melhor. Pois na PLAZA de MULAS fiquei num canto em minha barraca, montada gentilmente por MARCOS do CAMPO BASE, mas somente comi uma sopa, uma fatia de pizza no CAMPO BASE e o suco que eles me deram era ácido puro. Atacou meu estômago uma acidez forte.
Dormi bem agasalhado, mas com os tremores da hipoglicemia e era 31 de dezembro para 1 de janeiro. Pela madrugada ela apareceu junto com alguém perguntando como eu estava. Eu dissera que minha coluna parecia estar envergada e que doía ainda. Voltei a deitar e dormir. Levantei pela manhã, estava muito frio mas com sol. A face noroeste do Aconcágua estava bem a minha frente – majestoso e atraente.
Caminhei até a base dos guarda parque, e fui perguntado como eu estava : SEM FORÇAS fora minha resposta. O guarda parque determinou que devia voltar. Relutei um pouco, pois estava sem forças para fazer a mesma caminhada e sem comer nada. O que eu sentia somente era dor nas costas, fraqueza pela pouca comida que ingerira. Continuo achando, se tivesse tido o descanso necessário, uma mochila mais leve, e fundamentalmente alimentado corretamente, eu teria atingido o cume do ACONCÁGUA. Eu não vi ninguém carregando o peso que eu transportava, a não ser as mulas.
Minha volta foi um sentimento fúnebre e triste. Paguei o que devia do alimento e do local que fiquei com minha barraca, mais o transporte das mulas com minhas duas mochilas – 217 pesos : 2 dólares para cada quilo transportado, sendo que 1 dólar = 3,50 pesos. Voltei muito decepcionado comigo, com o fracasso me acompanhando em corpo e em mente. Detalhe : meus óculos de astigmatismo e fotofobia foi “tragado” pelas mãos do chico que me “ajudou” nas mochilas em PLAZA de MULAS. Nombre ou apelido GATO!
Caminhei tudo de novo, sem comer novamente nada, somente bebendo água-suco. Cheguei em Confluência cerca de 4 horas e meia depois. Claro sem nada no corpo, só a roupa, o saco de lixo ( 100 dólares ô pá ! se você perder !!! ) e uma garrafa com quase nada de água. O outro guarda perguntou se eu estava bem, e eu disse : NÃO ! Estou fraco sem comer nada e andar mais 40 km até aqui ! Eu sei que a outra médica fez um comentário de pasmada. Tem 3 helicópteros e mandam de volta! Ela fez em exame rápido em mim e verificou que eu estava bem em tudo, exceto fraco com fome e com dores nas costas.
Fui para a outra base do CAMPO BASE , e novamente ali é que comi bem. Uma bela sopa, uma bela macarronada com belos pedaços de carne, suco de limão e uma fatia de bolo. Dali fui deitar e descansar em seus beliches. No dia seguinte falei muito, reclamei dos critérios de socorro, do custo do ingresso, do não uso do helicóptero ( só serve para morto eu acho !), do meu óculos, pois o chico sumiu com ele, enfim saí aborrecido e frustrado com tudo.
Levei 1 hora e 30 até o último guarda parque – Horcones. Entreguei o saco de lixo, o permisso e fiz as reclamações do poder de decisão que um guarda parque tem em determinar que sobe ou não, isso claro não atenua meu erro de planejamento e logística. Descia sempre olhando para trás, lá estava ele, formoso, magnífico e dizendo volta, volta.
A saída foi uma caminha de 6 km até a casa do porteador para pegar minhas mochilas. Voltei para Mendoza, e às 23 horas do dia 2 parti para Santiago.
Eu sei que cometi inúmeros erros nesta demanda, entretanto estou a pensar nesta burocracia e mercantilismo que assola as montanhas de diversos países. E no poder que terceiros tem em determinar quem sobe ou não uma montanha. Imagine se fizéssemos isto nas praias?
Estou triste em não subir até ao cume, e não sei se e quando voltarei!!
Obrigado pela oportunidade deste espaço!
Wagner – W.C.C.