Aponto para o Monte Crista

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Apesar das idéias que defendo não serem exatamente do agrado de parte significativa dos membros atuantes de clubes de montanhismo por colidirem frontalmente com as práticas comumente adotadas nos programas “adote uma montanha”, vou atender ao apelo expresso nos comentários na coluna “MST na Montanha”, em “Páscoa 2009 no Monte Crista” de Bárbara Pereira e no relato de Reginaldo Carvalho em “AJM promove ação de páscoa no Monte Crista”.

Em primeiro lugar há de prevalecer a lógica como fio condutor do pensamento. Fatos são teimosos e não respeitam nenhuma ideologia. Um diagnóstico correto é passo importante para a eficácia da ação. O que se deseja no Monte Crista e em todas as outras montanhas é a preservação e o respeito ao eco-sistema e à paisagem natural.


 


A ocupação maciça e desenfreada das trilhas e dos cumes é um grande problema pelo impacto ambiental que produz nestes ambientes frágeis, mas há exeções como o próprio Monte Crista e o Itupava. Falar de uso excessivo da trilha nestes dois casos é uma besteira uma vez que estes caminhos estão preparados deste há séculos para o tráfego intenso das tropas de mulas como é de conhecimento geral, assunto que já tratei no livro “Caminhos Coloniais da Serra do Mar” editado pela Natugraf em 2006 e no site “Caminho do Itupava” aqui no Alta Montanha. Neles a questão se concentra na falta de educação e no mais puro vandalismo.


 


Comparações com o Anhangava no 1º de maio são totalmente descabidas uma vez que as multidões que para lá se dirigem tem o único propósito de rezar a Deus. Isto já lhes confere muitos valores éticos e predisposição a organização. O caso das peregrinações neopentecostais mostrou-se um pouco mais complicado, mas em ambos existem líderes dispostos ao diálogo. No Marumbi se implantou um parque com alguma fiscalização, mesmo que precária, mas o grande resultado veio mesmo com o aumento astronômico das passagens de trem que desviou o problema para o Pico Paraná. Parques no Brasil acabam se transformando em mais um problema em vez de constituir soluções para os montanhistas.


 


Na subida para a Pedra do Açu, em Petrópolis, os guarda-parque podem revistar as mochilas para impedir a entrada de bebidas alcoólicas, armas e drogas ilícitas, se bem que há inúmeras formas de evitar a guarita no Bonfim. No Aconcágua a vigilância se dá em todos os acampamentos. Fiscalização não é novidade nos locais de grande concentração de pessoas, afinal o Monte Crista como toda a Serra do Mar ainda estão em território brasileiro e sujeitos as mesmas leis que deveriam reger a nação.


 


Claro que a educação é a solução final como salientou o leitor Teotônio Marques, mas isto está distante de acontecer e o Monte Crista precisa de uma ação emergencial. Diferentemente do Anhangava a multidão que o freqüenta não vai lá para rezar. Vão lá para fugir da sociedade civilizada e dos limites por ela imposta. Transformaram o local em feudo livre das leis onde se consome bebidas e drogas sem o mínimo controle. Quem não respeita o próprio corpo também não se importa com a natureza.  Que educação se pode transferir a essa gente?


 


A Associação Joinvilense de Montanhismo pediu sugestões para preservar a montanha e sua paisagem da sanha feroz desta multidão. Basta um diagnóstico preciso da situação para que a solução salte aos olhos. O relato da Bárbara Pereira, do Reginaldo Carvalho e as fotos do Elcio Douglas mostram crimes ambientais cometidos por vândalos drogados e alcoolizados num ambiente de total impunidade. É antes de tudo um caso de polícia que cabe as autoridades de Santa Catarina resolver, e o “Programa Adote uma Montanha” se tornaria realmente útil e eficaz assumindo a responsabilidade de incomodar estas mesmas autoridades para fazerem o trabalho necessário. É um bom começo.


 


Limpar trilhas, fazer escadinhas, coletar lixo e conter erosão apenas facilitam o acesso e melhoram a vida dos vândalos. Como preservação ambiental, antes de resolvido o problema principal, é o mesmo que enxugar gelo. Mas há de se ter moral para entrar numa delegacia, nas prefeituras, câmaras de vereadores e assembléias de deputados e fazer esta denúncia, e vontade férrea para que ações reais sejam implantadas.


 


“Quem tem ouvidos para ouvir que ouça, quem tem olhos para ver que veja” disse o Nosso Senhor, quem tem moral e vontade para fazer que faça, completo.

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Sobre o autor

Julio Cesar Fiori é Arquiteto e Urbanista formado pela PUC-PR em 1982 e pratica montanhismo desde 1980. Autor do livro "Caminhos Coloniais da Serra do Mar", é grande conhecedor das histórias e das montanhas do Paraná.

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