As Amazonas

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Foi na Era do Descobrimento que o aventureiro espanhol Francisco de Orellana percorreu pela primeira vez o Rio Amazonas. Levou dois anos para cruzar os Andes e atravessar seus afluentes. Finalmente alcançou o grande rio, que navegou até a foz, depois de 5 mil km de travessia. Seus companheiros espanhóis tinham morrido ou retornado e só sobrara um quarto do seu exército indígena.

O escrivão da expedição foi quem relatou sobre as índias chamadas de Amazonas que encontraram – elas deram nome ao rio, à floresta e ao Estado. Frei Gaspar de Carvajal conta que foram atacados e vencidos por um grupo de índias nuas, claras, altas e fortes. Elas levavam os cabelos negros trançados e enrolados na cabeça e manejavam com ferocidade seus arcos e flechas.

Pintadas de verde para se camuflarem na floresta, arrancavam o seio direito para que não interferisse no lançamento das flechas. Eram localmente chamadas de Icamiabas, nome que se referia á falta do seio – exatamente como as Amazonas da lenda grega da Ásia Menor, assim chamadas por serem exímias cavaleiras.

O mito grego das Amazonas

Essa história não tem nada a ver com nossas icamiabas. Sem seio são as amazonas asiáticas, não as brasileiras. É pouco provável que as índias inutilizassem um seio porque amavam como mulheres, defendiam-se como guerreiras e multiplicavam-se como mães, conta o indigenista João Américo Peret. Ele ouviu vários relatos  sobre elas e continua até hoje a procurá-las.

Embora não tivessem maridos, elas geravam filhas. Segundo a lenda, capturavam índios grandes e fortes e com eles procriavam, dando à luz no Lago Espelho da Lua. Devolviam os meninos porém criavam as meninas. Presenteavam os pais com amuletos, feitos do barro do fundo do lago. Chamados de muiraquitãs, tinham a forma de sapos ou peixes e podem até hoje ser encontrados no Norte.

Suas aldeias eram construídas de pedras, ligadas entre si por caminhos cercados, onde costumavam cobrar pedágio aos que atravessavam essas estradas. Elas eram lideradas por uma índia virgem, sem contato com o sexo masculino. É curioso que os pesquisadores dizem existir indícios de grandes cidades de pedra no Amazonas, de dezenas de milhares de habitantes.

As guerreiras Icamiabas.

A historiadora Rosane Volpatto refere-se ao ritual das Amazonas das índias do Xingu: É a rebelião coletiva contra o desprezo e a humilhação de permanecerem como simples espectadoras, assistindo a demonstrações machistas. Reagindo, as índias batem nos maridos, apropriam-se dos seus artesanatos e das flautas sagradas, cantam, dançam, lutam e promovem uma festa tão grande e vigorosa como qualquer outra masculina. Essa é a forma de mostrarem que a qualquer momento podem repetir o episódio das amazonas guerreiras e viver isoladamente. Então, a lenda das amazonas continua viva.

Se nunca foram até hoje encontradas, conta-se que estas guerreiras invencíveis foram uma vez derrotadas. Venceu-as Jurupari – o pesadelo, o mau sonho, e também aquele que exige silêncio e segredo em seus rituais – que os jesuítas associavam aos demônios invocados pelos curandeiros. Jurupari revelou aos índios vários preceitos que são até hoje praticados na Amazônia.

Jurupari à busca das Amazonas.

Para os índios, Jurupari era filho e enviado do Sol. Sua missão era encontrar a mulher perfeita com quem o Sol pudesse casar. Ela devia ter paciência, ser capaz de guardar segredo e não ser curiosa. Conta-se que Jurupari nunca a encontrou, nem junto às Amazonas, mas continua até hoje a sua busca. Só poderá retornar ao céu quando cumprir a missão.

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Sobre o autor

Nasci no Rio, vivo em São Paulo, mas meu lugar é em Minas. Fui casado algumas vezes e quase nunca fiquei solteiro. Meus três filhos vieram do primeiro casamento. Estudei engenharia e depois administração, e percebi que nenhuma delas seria o meu destino. Mas esta segunda carreira trouxe boa recompensa, então não a abandonei. Até que um dia, resultado do acaso e da curiosidade, encontrei na natureza a minha vocação. E, nela, de início principalmente as montanhas. Hoje, elas são acompanhadas por um grande interesse pelos ambientes naturais. Então, acho que me transformei naquela figura antiga e genérica do naturalista.

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