Cachu dos Perdidos: O Cachoeirão do Anhangabaú

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Foram necessárias duas trips anteriores ao Vale do Anhangabaú pra traçar a derradeira investida à cobiçada queda d água q atende pelo nome de Cachoeirão, situada na região serrana de Paranapiacaba. Tb conhecida como &ldquo,Cachu dos Perdidos&ldquo, pelo fato do seu enorme véu dágua de 80m se esconder dos olhares leigos nas entranhas da Serra do Mar, este atrativo menos conhecido da ilustre vila inglesa é acessível mediante árdua caminhada de 4hrs por picada pouco nítida e bastante confusa. Bem, não q fossem necessárias tds essas investidas, mas qdo não se sabe nada a respeito ou se depende dos serviços de algum guia local, o acumulo de experiências torna uma simplória empreitada numa saborosa expedição digna de nota.


A primeira faz “tcham”, a segunda faz “tchum” e… “tcham”, “tcham”, “tcham”, “tchaaaam”! Foi essa a sensação nessa terceira empreitada q moveu o quarteto formado por este q vos agora escreve, Angelo, Clayton e Wagner pra Paranapiacaba neste ultimo sábado. Afinal o Cachoeirão não é um atrativo pra qq um, pois foi necessário persistência e fôlego pra chegar ate ele. Lembro bem da primeira incursão (com a Laure) onde fui apresentado ao Vale do Anhangabaú, e da segunda (agora com Nando e Thunder), q nos levou ao “Alto Quilombo”, já um meio-termo da trip.

Saltamos então em Paranapiacaba por volta das 9:20 sob um céu coberto duma nebulosidade clara, com promessas de abrir no decorrer do período. Nem mesmo meu atraso por conta da noitada anterior comprometia o entusiasmo da empreitada, afinal nosso quarteto além de movido pela determinação de atingir o objetivo era ágil o suficiente pra compensar qq espécie de demora. Dessa forma atravessamos a vila inglesa e o pátio ferroviário num piscar de olhos e qdo demos conta já nos vimos envoltos pelo frescor matinal e o cheiro de mata da Estrada do Taquarussu.

Às 10:10 deixamos a estrada em favor da tradicional picada q deriva da direita e é a espinha dorsal das picadas q levam tanto pra Comunidade e pros Vales do Quilombo e o do Anhangabaú. A passos rápidos rasgamos a trilha, q nessa altura se encontra relativamente úmida e lamacenta em virtude tanto do orvalho como das ultimas chuvas, até q em 20min ignoramos a primeira bifurcação q deriva pra direita e q nos levaria à “Machu Pichu de Paranapiacaba”, a Comunidade. A pernada prossegue no mesmo compasso, sempre bordejando a encosta serrana da direita, ganhando altitude de forma imperceptível em meio à densa vegetação, atravessando dois gdes aceiros de manutenção e prestando atenção nalgumas bifurcações q surgem no trajeto. Como os detalhes deste trecho já foram relatados em varias ocasiões passo direto ao diferencial desta trip.

Por volta das 11:15 alcançamos a significativa “bifurcação das bananeiras” onde ignoramos o ramo da direita, já q não pretendemos dar a tradicional “volta na serra”. Ao invés disso seguimos pela esquerda, chapinhando a picada ate atravessar uma pequena área de acampamento e um riozinho, de onde a pernada inicia uma forte subida ate ganharmos o alto de uma crista obvia e 15min depois desembocarmos na famosa “trifurcação”.

Tal qual minha primeira incursão, tomamos então o ramo da esquerda, e assim começamos a descer primeiro suavemente pra depois a encosta ficar deveras bastante íngreme. Ignorando na seqüência uma bifurcação à esquerda (q supostamente leva ao “Rancho 5 Estrelas”, um antigo acampamento), tomamos a “Trilha 180 graus” q em largos ziguezagues nos faz perder altitude rapidamente, onde já podemos ouvir em alto e bom tom o rugido de um gde rio no vale ao fundo. Nesse mesmo instante uma neblina nos surpreende descendo a encosta serrana, impedindo o visu do Cachoeirão (do outro lado do vale) nas raras frestas q surgem na vegetação. Mas logo surgem obstáculos naturebas neste trecho aparentemente obvio, traduzidos em varias bifurcações traiçoeiras, nas quais tomamos sempre a mais batida e q vá no sentido desejado, alem de muita mata tombada na trilha (principalmente bambus!) q nos obriga tanto a desviar das voçorocas como a farejar a picada mais adiante.

Como o som de água cada vez mais próximo, logo nos vemos descendo uma suave crista com mato caindo de ambos lados onde a pernada arrefece, agora deixando a neblina para trás. Mas a picada desaparece em mais de uma ocasião ou se perde na mata, nos obrigando a farejá-la auxiliados por precárias marcações na vegetação, embora o sentido a seguir fosse obvio. Atravessando enormes bambuzais, passando por arvores enormes e vencendo um ultimo trecho na (des)escalaminhada, caímos finalmente nas margens do caudaloso e borbulhante Rio Quilombo, as 12:16!

Pausa básica pra descanso e conferencia da rota, auxiliados pela carta topográfica de Santos e de duas bussolas disponíveis.

GPS? De jeito nenhum, pois navegamos à moda antiga! Marcando bem o local onde caímos no rio, começamos a acompanhar sua margem ate encontrar um local razoável pra atravessa-lo, sempre deixando fitas plásticas na vegetacao q nos auxiliem na volta. Mas nem mesmo saltando pedras evitam q tenhamos q enfiar a canela na água gelada durante a travessia, pra desgosto daqueles q detestam andar com calçado molhado. Na outra margem começamos a subir o rio em meio à mata sem gde dificuldade, sem trilha alguma. As vezes surge algo parecido com uma picada mas logo desaparece, mas não deu nem 10min de pernada e, após passar pelos vestígios do q pareceu ser restos de um acampamento de palmiteiros, caímos na foz do Rio Anhangabaú, ou seja, o local onde ele despeja suas águas calmas no Rio Quilombo!

São exatas 12:54 qdo chapinhamos pela água afim de cruzar à margem esquerda do Rio Anhangabaú, pra dali simplesmente subi-lo em meio à densa vegetação e enormes rochedos tombados, ora pelo q parecia ser uma suposta picada ora rasgando mato mesmo, sem gde dificuldade. Mas o suave terreno inicial logo aumenta em declividade, e o manso rio q acompanhamos num piscar de olhos se torna furiosamente encachoeirado, ao mesmo tempo em q o aroma inconfundível de carbureto invade nossas narinas. Do mesmo jeito, a pernada engrossa e as mãos tornam-se tão úteis qto os pés, sendo bastante utilizadas pra nos agarrar na firme vegetação da íngreme e escorregadia encosta da margem esquerda do rio, mas sempre buscando evitar a abundante mata espinhenta no caminho.

A subida aperta bem em certo instante já q naquela altura estávamos quase subindo na vertical, mas é ai q percebemos q dali em diante so seguiríamos adiante auxiliados por corda e rapel. E agora? Logo nos demos conta q já estávamos bem do lado da cachu q almejávamos porem q na metade dela!!!&nbsp, Espiando pela mata vimos um gigantesco véu d água despencando do nosso lado e buscamos um jeito de descer ao patamar rochoso no meio dela. E tome novamente desescalaminhada hard, sempre nos segurando na mata à disposição.

E assim as 13:20 finalmente alcançamos nosso objetivo, chegar ao Cachoeirão do Anhangabaú ou Cachu dos Perdidos!! A cachu realmente impressiona pelo porte e volume d água q despenca dela de seus dois níveis consecutivos de quase 40m cada um. Nos estávamos bem na metade, num largo (e escorregadio) patamar rochoso marcado por um gde poção na base da primeira cachu. Donos absolutos do pedaço, nos prostramos ali naquele mirante privilegiado de onde víamos de camarote tanto a primeira queda despencando rio abaixo, como td o vale ao fundo aos pés da serra q havíamos percorrido ate então.

O tempo tava ligeiramente frio, mas isso não intimidou um tchibum por parte do Wagner. Já o resto limitou-se a cautelosas explorações próximas das escorregadias pedras como apenas descansar, clicar a bela paisagem e apenas beliscar alguma coisa. Enfim, a pernada e perrengue ate ali haviam valido a pena. É bastante reconfortante estar num local q não vai ninguém, de sentir esse raro privilegio. Por incrível q possa parecer a maioria dos turistas q frequenta Paranapiacaba se limita ao arroz-e-feijao manjado das picadas proximas (ou simplesmente se entope de cambuci ou de maconha no Festival de Inverno) e desconhece aquele fantástico lugar tão isolado qto paradisíaco, mas igualmente “viajante”. Pensando bem, melhor q permaneça assim mesmo, isolado. Tanto q ate os guias de lá pensam duas vezes antes de vir aqui, e olha q boa parte deles nunca pisou ali.

As 14:10 iniciamos o retorno, decisão mais do q sensata principalmente qdo vimos as brumas começarem a tomar conta do vale. E geralmente qdo isso ocorre a escuridão chega mais cedo, e andar à noite naquelas bandas (e sem trilha) estava fora de cogitação. Sendo assim, voltamos pelo mesmo caminho a passos largos sempre auxiliados tanto pela nossa boa memória como pelas marcações deixadas no caminho, q mostraram-se extremamente úteis. Claro q houve alguns perdidos, principalmente na procura da picada após o Rio Quilombo, mas nenhum q nos fizesse perder tempo considerável.

Dessa forma a volta foi bem mais rápida q a ida, já q após cruzar o Quilombo e subir a árdua e interminável piramba q se seguiu, desembocamos na trifurcação às 15:30 e nas “bananeiras” 15min depois. Dali em diante foi só alegria ate q finalmente caímos na Estrada do Taquarussu as 16:50, doidos pra conseguir uma carona q nos poupasse esse trecho sacal de tediosa estrada, sem sucesso. Mas a conversa furada estava pra la de animada q o tempo passou voando, e assim chegamos numa Paranapiacaba envolta em seu tradicional denso (e frio) nevoeiro, q nos obrigou a vestir agasalhos. E após uma pausa básica pra beber e comer algo nos quiosques próximos da Zilda, refizemos a via-sacra da volta pra Sampa nas sucessivas baldeações bus-trem-bus, viagem esta feita embalada nos braços de Morpheus. Só dei conta q estava em casa por volta das 21hrs daquele sabadão bastante proveitoso.

Cabe aqui uma consideração importante referente a um possível erro do IBGE na carta topográfica de Santos, fato q já havia reparado pela incoerência dos dados “in loco” se comparados com a carta nas duas investidas anteriores. Conversando posteriormente com o Angelo, q analisou detalhadamente td pelo Google Earth, chegamos à provavel conclusão q o Cachoeirão, q em tese fica no Rio Anhangabaú (afluente do Quilombo), na carta do IBGE situa-se num rio-sem-nome, por sua vez afluente do Anhangabaú (!?), o q não condiz pelo conjunto fluvial do qual o vale é conhecido, tradicionalmente como Quilombo. E como td afluente tem volume d água menor q o rio principal, é de se supor q td o conjunto seja marcado pelo Rio Quilombo, mas a carta mostra isso como sendo Anhangabaú. Sendo assim nas duas primeiras incursões nem sequer chegamos no Anhangabaú.. estávamos o tempo todo no Rio Quilombo! E somente desta vez q chegamos de fato no Vale do Anhangabaú!&nbsp, Confuso, não?

Independentemente de qq debate a respeito da nomenclatura ou possível equivoco cartográfico, o Cachoeirão ou Cachu dos Perdidos esta ai à disposição de andarilhos mais ousados e dispostos a bate-voltas mais exigentes, em tds os sentidos. E seja num rio-sem-nome ou no Rio Anhangabaú, esta fantástica queda ainda guarda vários atrativos a explorar. Por exemplo, o q haverá no alto da cachu e além? Sendo assim, a Cachu dos Perdidos não poderia ter nome mais apropriado, pois pra andarilho q se preze não há perdição maior q as possibilidades exploratórias q a Serra do Mar q circunda Paranapiacaba oferece. E dessa forma sempre será motivo não só de uma ou duas incursões, mas de inúmeras delas. Pois cada dia em suas entranhas verdejantes é uma aventura diferenciada digna de nota.

Texto e Fotos: Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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