Aproveitando então uma rara oportunidade “off-road”, curtimos o dia num assumido programa mega-sussa, isto é, em bordejar a maior represa de Salesópolis dando breves ataques a estas simpáticas quedas. E claro, esticando ao Parque Nascentes do Tietê, pertinho dali. Um “rolê pantufa” q revelou, principalmente, a triste e rara beleza duma região conhecida por sua fartura de água, numa época em q ocorre uma maiores estiagens em São Paulo.
Tomava meu desjejum tranquilamente nos quiosques postados na frente da Estação Estudantes quando o casal Ricardo & Elaine apareceu pra me buscar coisa de 9:30hrs da matina daquele belo e frio domingo de inverno. Nada de Palio ou Uno, desta vez embarcava no novo brinquedinho da Elaine, um possante Jimny 4Sport , da Suzuki, que finalmente ganhava a oportunidade de ser colocado a prova. “É o veiculo tracionado mais barato que tem..”, dizia ela. Então vamulá, né?
Embarcamos então na caranga e tocamos pelo suave asfalto da Rod. Prof. Alfredo Rolim de Moura (SP-88) em meio a abaulada morraria. Ao chegar nas proximidades de Salê (nome carinhoso pelo qual Salesópolis atende) o espelho d'água do Reservatório de Paraitinga apresentava-se bem abaixo do seu nível normal, algo de 10m, dando um breve preview do q viria pela frente. É, a região do Alto Tietê também padecia da estiagem brava q acomete a maior Metrópole da America do Sul.
Após rodar 30kms, as 10:15hrs chegamos em Salê mas ficamos apenas o suficiente pra pegar algum lanche numa padoca qualquer do centro e seguimos em frente. Mas bastou apenas deixar a cidade q o motorista, o Ricardo, abandonou o asfalto pra se enfiar numa precária estrada de terra q tocava sinuosamente morraria adentro, ganhando altitude de forma imperceptível. Sítios e chácaras pontilham este trecho, emoldurado basicamente numa bela paisagem composta por reflorestamentos, pastagens e enormes colinas cobertas de verde, sempre sentido sudeste. “São os Alpes de Salesópolis!”, brincava ele.
A trepidagem terminou quando desembocamos numa via de chão batido maior, na Estrada do Pico Agudo, no Bairro da Pedra Rajada, onde bastou seguir pro sul e um emplacamento avisou q estávamos perto da nascente do Rio Tietê. Como nunca tinha pisado naquela pouco conhecida unidade de conservação q toma emprestado o nome do rio, sugeri ao casal um breve pit-stop pra colocar as pernocas em ação, mesmo q só de passagem. Eles toparam, claro, uma vez q não pisavam lá há mais de ano. Eram apenas 11:30hrs.
Inaugurado recentemente (em 1996), o Parque Nascentes do Tietê tem 1,34 milhão de metros quadrados reservados pra preservar as nascentes do dito cujo, além da diversidade da flora e fauna do entorno. Um plano de manejo recente está sendo implantado, o q garantirá no futuro varias trilhas e travessias pelo parque, além de acesso a mirantes cênicos (como o da Tibouchina ou do Outeiro). Por enquanto, só foram liberadas 4 breves trilhas: da Nascente, da Araucária, da Pedra e do Bosque, todas fáceis, com média de 300m de extensão e, não raramente, com interligação entre si. Bem estruturado, o lugar conta com sanitários e um museu iconográfico, onde também ocorrem visitas educativas monitoradas. Só não tem lanchonete, o q demanda q se leve o rango pra não passar fome, embora o rolê completo pelo lugar não demora mais que uma hora. As visitas acontecem diariamente, de segunda a domingo e feriados, das 8 às 17 horas.
Pagamos então a modesta taxa de entrada (R$ 3) e nos pirulitamos parque adentro. Mas vamos ao q interessa: a nascente do Tietê! Acompanhando a trilha do mesmo nome, bem batida e até com escadas e corrimão ancorados, não deu nem 5min q nos deparamos com um bucólico remanso q mais parecia uma poçona cercada de varias pedras. Pois é, se não fosse uma placa ali fincada ("Aqui nasce o Rio Tietê, Sociedade Geográfica Brasileira – 1554 – 1954"), câmeras de vigilância e um totem explicativo eu nunca saberia q aquele lugar figurava como maior vedete do parque. Prestando atenção, é possível ver o precioso liquido brotando de três pontos entre as rochas! Um olho d'água cristalino e ‘bebível”, conforme explicava com muito didatismo um entusiasmado guia q recebe os visitantes ali.
Zarpamos dali meia hora depois, onde o Jimny prosseguiu pela supracitada via ate dar noutra maior, a famosérrima “Estrada da Petrobrás” onde chacoalhou forte por alguns bons “kaemes”. Os primeiros são acessíveis a qualquer veiculo de passeio, mas depois é onde o bicho pega mesmo onde não é qualquer veiculo q aguente a buraqueira e o cascalho derrapante do caminho. E tome solavanco aqui e ali, mas felizmente o carrinho da Elaine tava mais q calejado praquele terreno, ainda mais com um motora pra lá de entusiasmado com um veiculo q nem pertencia a ele. Pra compensar todo aquele remelexo, a paisagem alternava muito reflorestamento com mata secundária exuberante.
Na sequencia tocamos pela não menos precária “Estrada do Barro Amarelo”, agora tomando a direção sudoeste, como q fazendo a volta. Esta via serpenteia o sertão rural desta região erma, passando pelos bairro do mesmo nome, o Ribeirão dos Pintos e Ribeirão do Pote. A paisagem maravilhosa se resumia basicamente a extensas escarpas serranas recortando vales, contrastando com as largas baixadas, geralmente áreas de várzea dos rios Tietê e Claro. Muitos pontilhões rústicos de madeira são vencidos, aparentemente fáceis de transpor, mas demanda cautela por serem meio instáveis, terem buracos ou suas tábuas estarem podres mesmo.
Mas eis q o bravo veiculo se depara com seu primeiro desafio real: um extenso e fundo lamaçal q intimida até o mais bravo motorista. “Vou ou não?”, pergunta o Ricardo. “Claro, porra! Não comprei este trem pra dar meia-volta num ´barrinho´ qualquer, né?”, esbravejou Elaine, inconformada com a pergunta ingênua do seu consorte. “É q como o carro não é meu..” tentou ele sair pela tangente, sem sucesso. E assim ele entrou com tudo naquela areia movediça tamanho-família, que fez o intrépido Jimny sacolejar violentamente, pra depois emergir vitorioso do seu primeiro teste de fogo.
Depois de tanto sacolejo e passar por uma simplória capelinha, um breve descanso numa simpática e minúscula queda a beira da estrada, por volta das 12:20hrs. Na verdade era mais uma corredeira q cachu, embora os locais insistam em chamar qualquer coisa de cachoeira. Uma breve picada acompanha um belo córrego q se despeja numa sucessão de rochedos levemente inclinados pra depois se somar aos vários outros cursos d'água q deságuam na Represa Ponte Nova. No entanto o lugar é agradável e inspirador, não tanto pelo porte mas pelo contexto de puro mato e isolamento. Lixo? Nenhum, e isso estando ao lado da estrada!
A jornada prossegue pela esburacada via, agora sentido noroeste, indo de encontro a represa propriamente dita. E ela não tarda a surgir, as 13hrs, com seu enorme espelho d'água refletindo o azul do céu. Era finalmente a Represa Ponte Nova! Resumidamente, ela é um dos reservatórios de água do Sistema Produtor do Alto Tietê, formada pelos rios Claro e Tietê, criada pra conter as enchentes na região metropolitana. Atualmente é utilizada também pra lazer e esportes náuticos. E assim fomos ladeando aquele gigantesco lagão q deixava boa parte de suas margens expostas, evidenciando também a seca q assola boa parte de Sampa.
Após passar batido por uma placa inscrito “Usina Parque”, temos mais uma breve parada sobre um pontilhão de concreto, onde bastou descer um suave barranco ate dar numa espécie de mirante improvisado. Dali era possível, por entre o arvoredo e a distância, avistar a Cachu da Usina, ou melhor, o filete q restava dela por conta da estiagem. Esta queda ta situada exatamente dentro da tal “Usina Parque”, q nada mais é a Usina Hidrelétrica de Salesópolis ou Barragem da Usina Parque, onde se represam as águas do rio Tietê num local conhecido como Cachu da Usina (ou dos Freires) com intuito de abastecer a cidades de Salê, Mogi, Jambeiro e Caçapava. Foi desativada e reativada novamente em 2007, onde também recebe turistas em seu “Museu da Energia” pra atividades educativas e culturais. Sua infra ainda agrega uma casa de máquinas e a vila residencial.
A “Usina Parque” é aberta a visitação, mas como estávamos meio curtos de tempo nos limitamos a avistar a bela queda de longe mesmo. Fica a dica. Maiores infos no ([email protected]). No entanto, mesmo daquele mirante a beira de estrada era possível apreciar a queda, assim como acompanhar o sinuoso trajeto das águas do Tietê serem sendo despejadas furiosamente numa pequena lagoa cercada de mato, pra depois irem descansar na mansa Represa Ponte Nova.
Novamente a bordo do bravo Jimny pra continuar bordejando a represa, a poeirenta via atravessa inúmeros bosques de pinnus, motivo mais q suficiente pra q ganhe também o nome de “Estrada do Pinheirinho”, como frisa o motorista. Durante todo trajeto é possível avistar inúmeros remansos onde é possível acampar a beira d'água, numa boa. Mas não tarda pra termos a penúltima parada do dia, as 13:50hrs. Encostamos a caranga numa margem gramada da estrada e tocamos na direção contraria a represa numa trilha q basicamente ladeava uma extensa baixada tomada de pasto, onde alguns boizinhos ruminavam naquele horário. “Aqui já foi uma enorme lagoa onde já tomei muito banho”, revelou Ricardo. Era difícil de acreditar q todo aquele belo lugar fora um enorme lago cheio dágua. “Aqui onde estamos agora só se chegava de barco ou a nado!”, entrega nosso guia improvisado.
Visivelmente íamos de encontro um paredão rochoso no final daquela vasta região de várzea. Pula aqui e salta acolá, não deu nem 1km de pernada q damos de cara com uma bela queda dágua, q o Ricardo disse ser a Cachu da Pedra Branca. Ela consistia num enorme paredão inclinado de onde escorria o pouco da água naquela ocasião, pra depois se depositar num poço raso e dali seguir seu curso sinuoso rumo a represa. Uma cachu q me lembrou muito a Cachu do Putim, em Guararema. Mas era subindo (facilmente) as aderências da rocha q do alto da queda se tinha uma vista privilegiada de td conjunto, assim do trajeto feito ate ali. Era maravilhoso ver o pequeno córrego cristalino cavar o verdejante pasto, mas era mais incrível ainda imaginar aquele panorama td coberto de água. Pausa pra muitos cliques, claro.
Dando continuidade ao rolê, não rodamos nem 3 ou 4km q tivemos nova parada a beira de estrada, desta vez pra dar um pulo na Cachu do Escorrega, as 14:20hrs. Tb chamada de Cachu do Repiado, a esta queda se chega por uma picada q não dá nem 100m e nos leva ao topo da queda, q basicamente consiste num enorme rochedo inclinado por onde escorria algo de água. O escorrega do nome se deve a q normalmente se desliza pela pedra pra cair no lago da represa, o q desta vez não é possivel devido a seca. Ao invés dum lago ao sopé da queda há apenas um raso poço cercado das margens assoreadas de areia e terra! Uma paisagem meio desoladora até! Nesta queda foi possivel atentar melhor pros efeitos da estiagem, pois o nível aqui estava quase 20m abaixo do normal. Tanto q a represa trouxe a tona uma antiga ponte de concreto q nem o Ricardo, conhecedor da represa como ninguém, conhecia! “Meu, essa ponte ai leva o nada á lugar algum, pelo visto!”, dizia ele, observando atônito aquela ruína remanescente provavelmente datada da construção da represa.
Após descansar um pouco e beliscar um lanche na cachu, resolvemos zarpar pois o tempo já se fazia tarde pra demais compromissos no restante daquele dia. Embarcamos no veiculo e prosseguimos ladeando o q restava da represa pra depois, dando adeus ao seu raso espelho dágua, tocamos pela precária “Estrada da Servidão” q rasgou o miolo do bairro do Repiado, pra depois seguir pela “Estrada do Carapicó”, aquela q atravessa Casa Grande. Uma vez em Biritiba-Mirim e dando tchauzinho as poeirentas estrada de chão, tocamos o restante de asfalto até dar em Mogi, as 16hrs, onde me despedi do simpático casal e dali zarpei pra Sampa.
Salesópolis esta repleta de outras quedas além das mencionadas neste relato, umas de facil acesso e outras q demandam afinco maior, q podem ser visitadas de carro, bike ou até a pé mesmo. Contudo, diante da atual seca q se debruça impiedosamente sobre o estado de São Paulo é difícil avaliar quais realmente vale a pena conferir, embora a estiagem em si tb revele um novo olhar sobre paisagens conhecidas e traga a tona segredos a muito submersos. De qqualquer forma, é de se esperar que São Pedro dê uma forcinha o mais logo possivel, pra dar fim á triste ironia q se abate sobre Salesópolis, uma vez q o nome de sua maior atração, o “Tietê”, em tupi, significa “caudal volumoso”.
Jorge Soto
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