Quarenta anos depois de sua conquista, a rota aberta por Cesare Maestri no Cerro Torre, segue sendo tão polêmica quanto no ato de sua primeira ascensão. Há poucos dias, o americano Hayden Kennedy e o canadense Jason Kruk repetiram o itinerário “com meios justos”, ou seja, sem utilizar os grampos deixados por Maestri, somente duas paradas e cinco outros grampos deixados por outros escaladores que tentaram aquela rota. Na descida, a dupla arrancou mais de cem grampos da via original, exatamente no local onda a rota é mais inclinada.
Em 2007, os protagonistas de outra tentativa similar, Josh Wharton e Zack Smith, informaram que caso conseguissem fazer a via sem tocar nos grampos de Maestri, os arrancaria da parede. Isso provocou um grande debate, no qual participaram mais de 40 pessoas, entre argentinos e estrangeiros. Na votação ganhou a manutenção dos grampos na parede.
Jason e Hayden desrespeitaram a decisão, e no regresso à El Chaltén foram hostilizados e levados à delegacia, onde tiveram que devolver as proteções fixas.
Na internet montou-se uma grande polêmica, com argumentos válidos de ambos os lados. Os favoráveis defendem a pureza na montanha e também o fato de que o próprio Maestri, conquistador da rota, era favorável à remoção dos grampos. Os contrários defendem na manutenção dos artifícios como um patrimônio cultural e histórico. Não faltaram brigas nacionalistas e ideológicas.
Quando o debate estava no ponto mais aquecido, o mundo recebe a notícia de que David Lama, que há dois anos se envolveu em mais uma polêmica no Torre, ao instalar 60 chapas na parede para sua equipe cinematográfica filmar sua tentativa de escalar a montanha, finalmente conseguiu um feito histórico: Liberou a rota do compressor sem os grampos de Maestri!
Em pouco tempo, escalar o Torre com “meios justos”, se tornou antiquado e rapidamente escalar a montanha na maneira mais limpa se tornou fazê-la em livre, com lances de até 9c! Confira o depoimento dado por David Lama, em sua página no Facebook, onde ele comenta sua escalada:
Meu companheiro Peter Ortner e eu saímos no dia 19 de Janeiro de Chaltén e caminhamos rumo a Nipo Nino, nosso primeiro acampamento. Na manhã seguinte, escalamos até o colo da paciência, descansamos ali umas horas e então iniciamos nossa tentativa perto da uma da tarde.
Escalamos até o começo da travessia dos grampos, mas ao invés de virar à direita, fomos direto para cima, numa difícil aresta, alguns metros à esquerda da fissura do Salvaterra. Tive várias quedas, até que pude perceber uma seqüência correta e então fui capaz de mandar a enfiada em minha segunda tentativa desde a reunião. Algumas enfiadas mais pra cima alcançamos as torrres de gelo, onde escolhermos um pequeno platô, em um campo de gelo, para bivacar.
Na manhã seguinte, escalamos até o inicio do Headwall. O trecho que Hayden e Jason cortaram os grampos de Maestri, alguns dias atrás, converteu meu esforço em algo ainda mais desafiante, sobretudo psicologicamente, já que a proteção era pobre e tive que abrir trechos expostos. Escalando lacas ocas e meio soltas, seguimos a rota do compressor original durante três enfiadas.
Uns 20 metros abaixo do compressor fizemos uma travessia à direita e então alcançamos um sistema de fissuras que nos levou até o cume. Escalar a via em estilo alpino nos custou 24 horas deste o colo.
Para mim, esta primeira ascensão da face sudeste do Torre é o final do que é seguramente a maior aventura que eu experimentei em minha vida até agora. Estou especialmente orgulhoso de ter realizado esta escalada sem adicionar nenhuma chapa. Aprendi muito durante os anos anteriores e escalar esta cordilheira incrível foi algo muito grande. Levar a cabo nossos sonhos, não existe nada melhor que isso!