Com previsão meteorológica nada animadora, eu, a Pri, o Claudio e a Olivia saímos de Sampa resolutos a cair numa pernada q se não nos brindasse com largos e amplos horizontes, pelo menos nos reservasse um bom mergulho. E esta condição só seria encontrada no fundo dum vale, onde o mau tempo não prejudica em nada o rolê. Ao invés do tradicional deslocamento de trem e bus, desta vez resolvemos ir no conforto dum veículo particular pra assim otimizar tempo tanto de deslocamento como do rolê em questão.
Num piscar de olhos caímos na parte alta da vila, mais precisamente no estacionamento em frente ao Cemitério do Bom Jesus, local datado dos primórdios de Paranapiacaba e onde descansam, em sua gde maioria, trabalhadores da São Paulo Railway q faleceram em serviço. Eram exatas 8hrs e a previsão medonha infelizmente se confirmava ao cruzar a vila inglesa, onde uma fina garoa fustigava nossos rostos enqto brumas ameaçavam se debruçar de vez sobre a pequena e simpática vila inglesa. Mas decididos e devidamente munidos de anorakes, prosseguimos a pernada firmes e fortes apenas pra constatar q naquele domingão o lugar não teria seu habitual fuzuê de turistas.
Respingos finos ainda caiam no rosto assim q atravessamos o vilarejo e sua arquitetura habitual, mas logo desapareceram qdo colocamos pé na bucólica “Estrada do Taquarussu”. Mal sabíamos q os anorakes seriam deixados pra bem depois. Enfim, até agora o tempo estava colaborando. Foi aqui q reparei q o portal de madeira do “Parque das Nascentes” (aquele q tinha uma simpática oncinha desenhada logo ao lado) não existe mais. Em seu lugar há uma pequena placa sinalizando o trecho do “Caminho do Sal”. É, essa seria a primeira de muitas observações q faria ao longo de td trajeto, pois basta sumir por uns tempos q muita coisa acontece.
Conversa vai e conversa vem embalaram os quase 3km de chão, as 8:45hrs deixamos a estrada pra finalmente mergulhar na trilha q nos levaria a nosso destino, o Vale do Quilombo. Pra variar, um cachorrinho da vila q chamamos de “Totó” nos acompanhou td trajeto. E lá fomos nós chapinhando a picada comumente chamada por “Trilha dos Carvoeiros” ao mesmo tempo em q enxugávamos a mata por conta da umidade depositada nela. Claro q ficamos ensopados num piscar de olhos. Um tímido sol ameaçava surgir por entre o céu acinzentado lançando breves fachos de luz por entre a densa e espessa mata, animando o astral da galera.
Prosseguimos então contornando as encostas do flanco norte da Serra do Comunidade, q transcorreu sem nenhuma outra novidade. Vale salientar aqui a gde qtidade de deslizamentos e mata caída no caminho por conta dos temporais do último verão, q além de descaracterizar a picada oficial demanda desvios constantes de rota. Mas nada q alguma cautela e farejo de trilha não dê conta. Enqto isso, o canto metálico das arapongas e o chiado de susto dos jacús serviam de trilha sonora embalando nossa jornada. Vale mencionar q a recente estiagem do estado de SP tb afetou estas bandas, q secou uma boa parte dos pequenos córreguinho do caminho. Contudo, ainda é possível encontrar o precioso líquido em um ou dois ptos, onde ele escorre pela encosta em volume menor.
As 9:50hrs tomamos a esquerda na famosa bifurcação das bananeiras, saltamos as pedras de um dos principais afluentes do rio principal (o Rio Quilombinho, onde o Totó matou sua sede) pra então subir suavemente o resto até ganhar a enorme clareira q domina o topo da serra. Ali encontramos dois senhores q passeavam pela mata q, pelas vestimentas e apetrechos q portavam, deram a entender q eram caseiros de fazendas próximas. A ausência de arma de fogo diluiu a suspeita de serem caçadores, algo comum de encontrar por aqui. Perguntei a condição das veredas a partir dali e disseram q eram bem precárias por conta do óbvio, ou seja, mata caída e deslizamentos.
Nos despedimos deles e continuamos a pernada, tomando a direta na bifurcação q se segue. Já de cara nos deparamos com mato bem alto cobrindo a trilha, mas nada q braços vigorosos colocados em ação não dessem conta, afastando a vegetação pros lados, q foi logo substituído pelo som de bambus quebrando ao nosso avanço. Mas foi numa curva q finalmente adentramos no Vale do Quilombo, descendo uma piramba vertiginosamente, alternando ziguezague de encosta e largos ombros serranos descendentes. Frestas na mata revelam o véu alvo do Cachoeirão do Anhangabaú cortando o verdejante contraforte oposto, em meio a um espesso brumado.
Desnecessário mencionar q este trecho está bem mais confuso q da última vez q estive. O mato caído e a pouca visitação da vereda principal fazem com q esta descida ao vale se torne bem confusa até pra mim, principalmente nas discretas bifurcações q surgem. Mas me fiando da memória, do bom senso e principalmente das marcações de plástico q vou deixando no caminho, nosso avanço prossegue de forma ininterrupta e sem perda de ritmo. E a medida q se perde rapidamente altitude, podíamos ouvir claramente o rugido apavorante do turbilhão d´água despencando pelas corredeiras do Rio Quilombo, cada vez mais próximo.
Após um descidão interminável e após passar por enormes raízes de árvores centenárias q mais pareciam patas do Godzilla, eis q damos na clareira do “Rancho 71”, um antigo acampamento de caçadores a mto desativado, já quase as margens do Rio Quilombo. Daqui bastou acompanhar a vereda q, sempre seguindo paralela ao rio principal, desembocou nas margens do seu afluente, isto é, o riozinho q havíamos cruzado suas nascentes no alto da serra, o Quilombinho. Saltando de pedra em pedra passamos pro outro lado, apenas pra nos deparar com uma cascavelzinha q se mimetizava no meio duma moita. Após o susto, pausa pra clicks a distância da assustada peçonhenta, q não arredou de sua posição habitual de bote.
Uma vez do outro lado, num piscar de olhos caímos na foz do Quilombinho com o Quilombo, onde bastou descer o rio principal mais um pouco. Aqui eu havia esquecido q havia uma discreta trilha q acompanhava o rio, a distância, obrigando a td trupe a rasgar mato e escalaminhar pedras desnecessariamente. Mas e daí? Qual sentido de fazer td de forma fácil e sem algo de adrenalina ou esforço? Dito e feito, após tropeçar com a tal vereda q me passara desapercebida não arredamos pé dela desta vez e num piscar de olhos nos levou as margens do Piscinão do Quilombo, ao exato meio dia.
Piscinão do Quilombo, um enorme espelho d´água clara-esverdeada q faz realmente jus ao nome, q rivaliza com o Poço das Moças (embora seja um tiquim menor) no quesito beleza natureba. Como por encanto, o sol resolveu dar as caras mesmo q brevemente por entre as frestas de nuvens, apenas pra realçar a beleza daquele lugar espetacularmente selvagem. Com direito até a pequena banheira com mini-cachu, ideal pra hidromassagem! Assim, donos absolutos daquele paraíso particular nos presenteamos com um merecido e refrescante banho, um delicioso lanche e prolongado descanso nas lajotas q ornam a beirada do poção. O Totó, exausto até a medula, não se fez de rogado e após beliscar algum lanche (nosso) desabou nas pedras, onde tirou até uma soneca. Deu tempo até pra este q vos aqui escreve, enqto o povo e empoleirava nas pedras, passar por outro lado do rio afim de ter outra visão do bucólico poço. Nunca tinha feito isso antes por conta do volume elevado d’água do rio, mas naquele dia o Quilombo estava baixo o suficiente pra atravessar com segurança (com água até a cintura) à outra margem. Só por causa daqueles cliques exclusivos julguei o rolê já ter valido a pena.
Por volta das 13:45hrs um aparente negrume tomou conta do firmamento lançando alguns respingos finos sobre td o vale, dando sinal q era hora de partir. E assim foi, retomamos o caminho de volta, agora pela comodidade e conforto da trilha, até o cruzamento do Quilombinho, onde a serelepe cascavelzinha ainda se encontrava entocada no mesmo lugar da ida. Pausa pra mais fotos, pra infelicidade e sossego da peçonhenta. Na picada outra vez, cruzamos pelas lonas e madeiras remanescentes (e hj tomada parcialmente pelo mato) do “Rancho 71” pra dali em diante começar a árdua, penosa e interminável subida de volta.
E toma piramba pra cima! Já logo de cara, após uma improvável bica de captação, erramos o caminho e se não fossem as marcações deixadas estaríamos no mato até hj. E tome subida, lenta e árdua q fez nossas camisas encharcarem de transpiração instantaneamente. O calor abafado da mata apenas contribuía pro suor escorrer pela ponta do nariz com mais abundância. Mas foi qdo um espesso nevoeiro se debruçou sobre o vale q respingos acumulados na mata trouxeram algum alivio refrescante, caindo sobre nosso corpo combalido e cansado. Logicamente q essa água na cachola era mto mais q bem-vinda naquela altura do campeonato e serviu pra refrescar nossos corpos novamente suados pela árdua ascensão. Ascensão esta, diga-se de passagem, feita no passo de tartaruga-manca, claro, com direito a mtas paradas pra retomada de fôlego no caminho. E quem mais sentiu o tranco da subida foi a Olivia, q foi quem comandou o ritmo da ascensão.
Mas devagar e sempre atingimos o alto da serra, onde fizemos mais uma pausa nas nascentes do Quilombinho, antes da bifurcação das bananeiras, as 16hrs. A névoa vinha e ia embora, e assim sucessivamente, mas até ali isso pouco importava pq já estávamos ensopados não por causa dela e sim de tanto enxugar a vegetação úmida no caminho. E desse jeito, devagar e quase parando, enfim emergimos da mata pra colocar outra vez o pé na Estrada do Taquarussu as 17:30hrs, pra ai sim o céu desabar de vez nos obrigando a trajar capas e anorakes, embora ate ali já estivéssemos ensopados até a medula. Nem a cueca (ou calcinha) haviam saído incólumes. Naquela altura a Olivia ia se arrastando, como q sendo carregada pelo Claudi, mas firme e forte seguiu bravamente até o final.
De alma literalmente lavada chegamos em Paranapiacaba pouco depois das18hrs, abraçados tanto por uma chuva fina como por um espesso nevoeiro. Estávamos literalmente na “Silent Hill tupiniquim”. Mudamos nossas vestes umedecidas no Lgo dos Padeiros por outras mais secas e aconchegantes, e nos prostramos nos bancos pra descansar (e bebemorar) a empreitada enqto um temporal literalmente desabava a nossa volta. Pois é, havíamos chegado na vila na hora certa. Só zarpamos hora depois, qdo a neblina permitiu algo de visibilidade decente pra encarar o asfalto novamente. E o Totó? Pois bem, o pulguento simplesmente desabou abaixo da mesa em q bebemorávamos nosso rolê e sequer se despediu da gente, alheio totalmente ao mundo..
Como dito anteriormente, o “Piscinão do Quilombo” guarda muitas semelhanças com o notório “Poço das Moças”, tanto no formato como no quesito beleza natureba, embora seja ligeiramente menor. Contudo, se diferencia por ser pouco (ou nada) visitado e não ter td aquela muvuca q ferve no ilustre “Poço das Moças”, oriunda principalmente da baixada santista, da qual está bem mais próxima. Sem contar q o “Piscinão” está isento de qq restrição de acesso, em comparação à tradicional trilha oficial q desce de Paranapiacaba (via “Mirante”) até a piscina mais ilustre do Rio Quilombo. Logicamente q esta filtragem de visitação ao Quilombo tem um preço: trilha mais extensa, exigente e confusa num lugar onde nem os guias/monitores de Paranapiacaba se atrevem a meter as caras, e onde não raramente se tropeça com algum caçador. Eu deixei no caminho algumas marcações de plástico q podem ser úteis (como o foram pra mim), mas sabe-se até qdo vão perdurar pelo trajeto td. Vá e valha-se delas. Mas pela própria definição de aventura esse deve ser mesmo o preço p/ curtir uma das mtas belezas da nossa vizinha Serra do Mar. Paraísos estes realmente reservados apenas pra poucos e determinados andarilhos, q pouco ligam se depois voltam pra casa com as mãos repletas de espinhos, ensopados de chuva, sujos de lama, cobertos de mato ou com os joelhos reclamando por dias a fio.