Um dos grandes símbolos do montanhismo andino, a cruz que demarcava o ponto mais alto do continente americano, não está mais em seu lugar, onde durante décadas testemunhou o sofrimento, felicidades, vida e morte e muitas vitórias de centenas, senão milhares, de montanhistas.
A cruz, construída em alumínio, desapareceu misteriosamente,há cerca de um mês atrás. As dúvidas dos montanhistas e guias de montanha sobre seu sumiço são de furto ou vandalismo, mas não esta descartada a possibilidade de um mal tempo a ter atirado penhasco abaixo, porém não se acredita nessa hipótese.
Os guarda parques e o pessoal das patrulhas e resgate prometeram realizar uma busca incessante durante toda a temporada nas proximidades do cume da montanha. Segundo eles, caso não encontrem a cruz, outra similar será construída e colocada no mesmo lugar.
Antonio Ibaceta, do grupamento de resgate do Aconcagua, comentou ao Jornal Los Andes, da Argentina, que a cruz não está no local “desde os primeiros dias de dezembro de 2009. Desapareceu entre os dias 1 e 5 de dezembro, e acredita-se que pode ter sido furtada, pois tem aproximadamente 50 centímetros e entraria facilmente numa mochila, porém nossa suspeita seja de que alguma pessoa que não seja adepta da fé cristã a tenha atirado montanha abaixo”.
O resgatista ainda prometeu que serão marcadas buscas específicas pela cruz: “Teremos que ir com tempo, e percorrer toda a região do cume. Se não a encontrarmos, logo colocaremos outra em seu lugar. Quase todos os cumes argentinos possuem uma cruz que os identificam, e o Aconcagua não poderá ficar sem a sua“.
Conforme as informações do Parque Aconcagua, há alguns anos, a cruz também já havia desaparecido do topo. Porém foi encontrada alguns dias depois, sobre o extremo norte da montanha.
Conforme os dados históricos da montanha, a cruz foi levado ao topo do Aconcagua por militares, por volta dos anos 60. “Foi construída por eles, em alumínio retirado de restos de um avião acidentado“, recorda Ibaceta.
Rudy Parra, um dos guias mais influentes no Aconcagua, se mostrou muito triste com a notícia. “Para nós, essa cruz significava um monte de coisas. Tomara que a encontrem logo.”
Caso não é exclusividade da Argentina
No estado do Paraná, a montanha mais almejada do conjunto do Marumbi também possuía uma cruz. A primeira cruz do Marumbi, conforme os escritos pelo montanhista e historiador Nelson “Farofa”, fora fixada na montanha em 1902. Tratava-se de uma pequena cruz no alto de um poste de madeira, que hoje se encontra no acervo do museu, as bases do conjunto.
Com o decorrer dos anos, mais de 60, a cruz sempre era alvo de reformas e consertos, que devido ao implacável clima úmido do alto daquela montanha, pouco tempo resistia, até que em 1993, Rubens Seidel, então presidente do Clube da Montanha, resolveu construir uma nova e duradoura cruz, que substituiu sua antecessora.
Tal cruz, que media aproximadamente 4 metros de altura, deveria resistir ao menos 10 anos, sem nenhuma manutenção. Porém, graças a um grupo de montanhistas, a cruz foi quebrada e posteriormente retirada, tratada como lixo, numa atitude que não levou em consideração o significado histórico daquele símbolo, não como religião, mas como parte da memória dos pioneiros do montanhismo do Marumbi.
Copiaremos o que o Nelson Farofa escreveu em seu livro:
“Talvez um dia um outro grupo tome a iniciativa de repor no topo do Olimpo uma nova cruz, mantendo uma tradição mundial. Que seja forte o suficiente para resistir à tentação da grande fraqueza humana, de ditar normas. Ou ainda: Destruir o que não lhes convém.”
O mau exemplO que veio do Paraná serve para ilustrar os sentimentos unilaterais que acometem as montanhas na destruição de seu patrimônio histórico e montanhístico.
Por Hilton Benke, com informações do jornal Los Andes, e do livro As Montanhas do Marumbi, de Nelson Farofa.
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