Eis que depois de muita chuva, finalmente consegui ir ao Marumbi e pegar tempo aberto. A ideia era fazer uma escalada bem modesta, para me “aclimatar” com o estilo marumbinístico famoso pela dificuldade e comprometimento. A escalada modesta mudou me dei de cara com o Waldemar Niclevicz, que estava como eu, sedento por uma parede.
Como era tarde, acabamos por escalar a via Cristal Negro, localizada no Paredão Preto no primeiro Degrau do Abrolhos. Via linda, com aderências super técnicas e um crux numa barriga bastante exigente, um sétimo bem consolidado que foi guiado pelo Waldemar (guiei a segunda enfiada) e repetido depois por outra cordada de amigos, composta pelo Natan e o Otaviano.
Esta escalada rápida serviu de aperitivo para o que viria no dia seguinte, que amanheceu belíssimo e perfeito, um convite para uma via mais longa e exigente, que há anos eu pretendia entrar: A Caroço da Enfinge, um 6sup, com lances em A0 de 280 mts de altura.
Acabei dando um balão em meus parceiros e na Camila e fui correndo até a base da parede para começar logo a escalada, pois agora que chega a temporada, o dia fica mais seco e também mais curto. Chegamos à 11:30 na parede e já começamos a escalar.
Pedro Hauck na Caroço de Esfinge.A primeira enfiada começa fácil, mas logo tem uns lances difíceis que normalmente são passados em artificial, para depois entrar numa seqüência de platôs vegetados onde há uma corda fixa que leva até uma travessia horizontal, que é também feita em artificial em rebites fixos.
A segunda enfiada sai numa escalada em livre bastante bonita, num quinto grau sólido bem trabalhado, para novamente entrar num lance de rebites e chegar numa chaminé bem marumbinística, com bordas largas e arredondadas erodida pela água das chuvas. Definitivamente o local onde mais tive dificuldade na via toda.
A terceira enfiada é uma travessia horizontal pelo meio do mato, bastante delicado para não deixar o mato cair. No final desta travessia começa a enfiada mais bonita, que eu guiei, que começa com um sexto grau trabalhado com exposição grau 2 e vai até um diedro em móvel bem trabalhado. Ao final do diedro há um pequeno teto e enfim chega a parada.
Na outra enfiada fica um dos lances mais expostos da via. Um boulder (sim, um boulder mesmo!) graduado em quinto grau (mas muito mais difícil do que isso) seguido por um lance de aderência de pé sem mão, até a base de um teto que é feito em artificial que é o lance mais difícil da última enfiada antes do fim.
A Caroço não é uma via fácil, mas é fácil para os padrões Marumbi, onde prevalecem paredes verticais com agarras pequenas, muita aderência e chaminés quase sempre sujas e bastante erodidas. Há bastante mato, tanto que no guia escrito pelo Chiquinho Hartmann há um grau não existente no sistema brasileiro de graduação de vias, o Grau “M” de Mato, divido em M1, M2 e M3, que significa respectivamente Mato Bom, médio e ruim. A Caroço está no meio do caminho.
Meus amigos que me desculpem pela furada em deixá-los na mão na escalada do Parque do Lineu, onde ficam algumas das vias mais “tranquilas” da Serra. A Caroço era um antigo projeto e escalar com o Waldemar foi prazer em dobro.
Há mais de 13 anos atrás, o Waldemar me incentivou, através dos relatos em seu livro à fazer montanhismo de altitude. Ser iniciado no Marumbi por ele foi uma grande satisfação, tanto pelo nível da escalada, quanto pelo local, que além de ser exigente, ainda é o berço do montanhismo no Paraná, além da companhia, é claro!
Fizemos a via em apenas quatro horas e meia. O Waldemar guiou 5 das 6 enfiadas de maneira magistral, rápido, preciso e objetivo e assim nem passei por apuros. Tenho certeza que se eu estivesse entrando na via à vista, teria passado por muitos venenos! Ele escala muito!