Escalando rápido

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Mostrarei aqui alguns procedimentos que podem tornar suas escaladas em paredes muito mais rápida e agradável. Rapidez pode significar: segurança, conforto, melhora da auto-estima e mais tempo disponível. Escalando rápido, paradoxalmente podemos ficar menos cansados, consumimos menos água e comida. No final do dia, a recompensa é maior. Enfim, aqui vão alguns conselhos.


Peso

A escolha é do escalador: escalar “preparado para tudo”, ou escalar rápido para sair da montanha o mais rápido possível? Vá comemorar na base, quando descer… Lembre-se que a maior parte dos acidentes ocorre durante a descida! O sujeito que sobe preparado para tudo leva um peso desnecessário, o que reduz muito a velocidade da ascensão. E quando dá “merda”, normalmente ele não tem o equipamento certo. E nesse tempo “perdido”, o tempo já virou, já choveu canivete, o cara já ficou ensopado, o telefone celular se afogou, a corda prendeu no rapel porque ficou molhada, pesada e embolada…&nbsp,

Quanto menos tempo passamos na parede, menos cansados ficamos devido à menor exposição ao sol, ao vento, ao calor e ao frio. Consumimos menos água, o que significa menos peso. Exemplo: para quem precisa de 5 ou 6 horas para escalar uma via no Pico Maior de Friburgo, necessita de 2 ou mais litros de água para não ficar com sede. Mas se a mesma pessoa for com um parceiro mais rápido e sem peso, e subir a mesma via em 2 horas, geralmente ela irá necessitar&nbsp, de menos de um litro de água! Concluindo este item, escalar com mochila cheia e se preparar para o pior, pode te deixar na maior roubada. O ideal é escalar leve e rápido… Se não der para subir porque você não tem “tudo” que precisa, não force a barra, desça!&nbsp, Quantos estúpidos já morreram escalando em nome do orgulho?!

Proteções

Apenas uma pequena porcentagem de escaladores sabe proteger corretamente uma enfiada de corda numa parede longa, no sentido de evitar atrito, e isso é fundamental para escalar com a corda leve. Mas para isso é preciso levar fitas longas e variadas, entre&nbsp, 30 e 80 cm de comprimento. Vejo escaladores experientes em vias esportivas colocar costuras curtas em lances que pedem fitas longas, e desperdiçar fitas longas onde não são necessárias. Obviamente isso compromete a velocidade da escalada por causa do atrito. Ou seja, a corda precisa ficar mais “reta” possível, para correr leve.

Peso da corda

É óbvio que quanto mais pesada a corda ficar em função do atrito, mais lento se escala. Em certas escaladas, mesmo colocando fitas longas, a mudança de ângulo do trajeto acaba atrapalhando. Ou seja, quando você sentir que a corda está pesada, páre onde der e puxe o segundo. Posteriormente, continue a partir desse ponto, mais leve e mais rápido. Acredite, ganha-se tempo com este procedimento. Não seja “fominha”, não tente esticar a corda pensando que vai ser mais rápido, neste caso, pode não ser!

Se a escalada for feita em simultâneo (os dois escalando ao mesmo tempo), o ideal é reduzir o comprimento da corda, para diminuir o peso. Reduza o comprimento de 60 para 30 ou 40 metros. Para isso, basta que o segundo se encorde no meio da corda, e deixe o restante solto. Não precisa enrolar a corda ou colocá-la dentro da mochila, isso vai apenas fazer você perder tempo. Atenção! Isso não é “escalar à francesa”, não sei de onde saiu isto. Se você disser para um francês que vai escalar à francesa, ele vai pensar que você o está zoando e ele pode te mandar para aquele lugar!&nbsp,&nbsp, &nbsp,

Rapel

Quando o guia chega na última parada (se não for ao cume), no momento em que ele dá segurança para o segundo, ele se desencorda e passa a corda pelo o olhal da proteção (chapa ou grampo). Na medida que a corda do participante é recolhida, a mesma desce através do olhal da proteção e a corda fica automaticamente preparada para o rapel. Assim que o participante chegar e se ancorar, o guia já pode começar a descida. O participante se desencorda e libera a corda quando o guia estiver descendo.

No final da descida, no momento que o primeiro chegou na parada, antes de mais nada ele já grita “LIVRE”, isso se o cara de cima não estiver prestando atenção. Imediatamente ele libera a corda para o segundo, que já vai estar com o aparelho pronto para colocar na corda. Em uma parede de 500 m estes procedimentos podem poupar mais de 30 minutos.

Comunicação

Um procedimento que vejo como sendo desnecessário é a comunicação exagerada na escalada, além de dar nos nervos dos outros escaladores e na fauna circundante, isso também&nbsp, reduz a velocidade da cordada.

– Tá pronto?
– Tô.
– Posso ir?
– Pode.
– Escalando hein!
– Tô segurando… Chegou na metade da corda!!
– Tá legal… AI MEU DEUS… SEGURAAAAAAAAAA
– Pode cair que estou seg… Já caiu?
– Vou continuar escalando… Cheguei, pode soltar a segurança!
– O quê? Não estou te ouvindo!
-Cheguei… Soltaaaaa!
– Segurança solta! Corda livre!
– Vou puxar!
-&nbsp, A corda “chegou”!
– OK, está seguro, pode subir!
– Espera um pouco, preciso colocar as sapatilhas, beber água, ir ao banheiro…
– Tá legal, mas não demora!
– Estou pronto, posso subir?
– Pode subir, estou dando segurança!
– Escalando!&nbsp, &nbsp,
– SEGURA QUE VOU CAIR!!
-&nbsp, Tô segurando!
– RETEZAAAAAA!
-Tô segurando!
– PORRAAAAA, CAI PRA C… PRESTA ATENÇÃO AI! &nbsp,
– O seu prego, não sabia que a corda estica? Ela é elástica!
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A comunicação entre dois escaladores eficientes pode ser muito simples e até desnecessária. Não é preciso todo esse diálogo, que é feito aos gritos, mesmo porque em certas escaladas de montanha, não se pode ouvir um ao outro. Obviamente os dois escaladores no exemplo escalam com muito medo. Se o segundo (segurança) cumpre o seu papel, ele precisa apenas ficar atento e não precisa dizer nada.

Assim que o guia chegar na parada, ele se prende e avisa imediatamente o participante com um OK indicado pelo o polegar. Se o participante está fora de vista, o sinal pode ser três puxões na corda. Logo depois, e sem perder tempo, recolhe a corda e já deixa na segurança do nó UIAA, ou aparelho. Durante essa operação o participante já deveria estar calçado e pronto para subir. Assim que a corda estiver esticada, o participante sabe que pode subir porque o guia já está dando segurança. Agora sim, o guia pode afrouxar as sapatilhas, beber água, etc., sem perder tempo e dando segurança ao mesmo tempo.

Quando o participante estiver mais ou menos 15 m abaixo, o guia coloca ou aperta as sapatilhas e já fica na posição de continuar, esperando apenas recolher o material do participante. Ou deixar que o segundo guie a próxima enfiada.&nbsp, Este procedimento em cada parada pode poupar até 10 minutos. Se a via tiver 500 m, poupa-se mais de uma hora!

Concluindo

Com esses procedimentos pode-se reduzir muito o tempo da escalada, e quanto maior a via, mais tempo poupado.&nbsp, E isso pode ser traduzido em segurança. Aliás, escalar rápido não significa subir correndo, como um doido, é possível fazer tudo isso com muita segurança.&nbsp,

Antonio Paulo Faria
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Sobre o autor

Antonio Paulo escala há tanto tempo que parece que já nasceu escalando... 30 anos. Até o presente, abriu mais de 200 vias no Brasil e em alguns outros países. Ele gosta de escalar de tudo: blocos, vias esportivas, vias longas em montanhas, vias alpinas... Mas não gosta de artificiais, segundo ele "me parecem mais engenharia que escalar propriamente". Além disso, ele também gosta de esquiar, principalmente esqui alpino no qual pratica desde 1996. A escalada influenciou tanto sua minha vida que resolveu estudar geografia e geologia. Antonio Paulo se tornou doutor em 1996 e ensina em universidades desde 1992. Ele escreveu sobre escalada para muitas revistas nacionais e internacionais, capítulos de livros e inclusive um livro. Ou seja, ele vive a escalada.

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