Illiniza Norte, fugindo de tempestades 2 vezes

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Desde que pensei em ir ao Equador em busca de montanhas, os Illinizas eram objetivos “pré-requisito” pra expedição. Como acabei ficando no Equador mais que o esperado pude pensar em fazer outras montanhas e pude tentar pelo menos o Norte, tentar…duas vezes.

O tempo no Equador este janeiro foi algo absolutamente incomum. Nevou no país e continua nevando como não nevava há pelo menos 35 anos. O Illiniza Norte, montanha fácil, não técnica de 5.125 metros, geralmente não custa mais que 2 horas para ter seu cume atingido desde o refúgio dos Illinizas que fica a 4.759 metros de altitude. Mas, para mim, não foi assim tão fácil e muito pelo contrário, a montanha tornou-se técnica e perigosa, com trechos bastante expostos onde um escorregão significaria morte certa.


Na minha primeira tentativa, contratei um transporte para as montanhas meio que sem querer. Já estava meio frustrado pelo insucesso no Cotopaxi e já com o psicológico pra baixo. Bundiei alguns dias por Quito sem fazer nada, bem, na verdade fiquei comendo e assistindo a TV, e ficando gripado!


De repente recebi uma mensagem do Boris, amigo do Summit Post e guia no Equador (eu e Boris somos pessoas de papéis importantes no SummitPost, ele é o membro equatoriano de maior renome e guia a maioria dos colegas que vão ao país, e eu sou o membro brasileiro de maior exposição no site, tendo construído dezenas de páginas de montanhas brasileiras, algumas andinas, e sou conhecido pelo apelido de “volcano man” por causa da minha paixão por vulcões e fotos que posto periodicamente deles), me disse que estaria guiando um americano bem inexperiente por lá, e que se eu quisesse transporte pra ir, esta seria a melhor opção pois poderia dividir o custo. Topei é claro.


Já não estava bem mas de qualquer maneira me preparei para uma ascensão alpina, preparei as 2 mochilas incluindo barraca (pretendia acampar), comida pra 3 noites e equipo de gelo, já que tentaria também o Illiniza Sur, montanha que divide o título de mais técnica do Equador junto do El Altar. Entretanto, já no carro tive minhas esperanças amarguradas. Para o Illiniza Sur eu precisaria de um parceiro, é perigoso demais ir em solitário já que esta montanha segura mais umidade que o Illiniza Norte, sempre tem nuvens e whiteouts, tem trechos em gelo de 75 graus, diversas gretas e etc, não queria ir sozinho, seria imprudente. Contava com o Boris para o dia da escalada e por isso até me propus a pagar sua diária pela escalada ao preço de 80 dólares. Mas, ele me disse que estaria guiando na trilha inca equatoriana e não poderia ser meu parceiro.


Já no carro, com o telefone à mão, ele ligou para cinco ou seis guias amigos até que conseguiu um disponível. Só tem um problema, o guia queria me cobrar duas diárias mais transporte e mais comida, o que chegava a um total de cerca de 250 dólares. Sem chance. Illiniza Sur foi por água abaixo…Fiquei mais deprê ainda. A situação piorou depois que, pouco antes de Machachi, o carro quebrou. Tivemos que parar na estrada e esperar um carro de um conhecido que chegaria e nos levaria o resto do trajeto. Parecia uma coisa, vários sinais indicativos de má sorte e eu não dei atenção…(risos).


Chegando na vila de Chaupi (3.200m) nos separamos, Brad (o cliente afeminado norte-americano) e o Boris ficariam em uma hospedaria comumente utilizada por escaladores para começar a investida pela madrugada seguinte. Eu segui sozinho com o carro substituo montanha acima. O trato era o carro me deixar no estacionamento dos Illinizas conhecido como “La Virgem” a mais ou menos 3.950 metros (há uma estatua da virgem lá) e de lá seguir pela trilha até o refúgio e fazer meu acampamento.


Dez minutos depois porém, a apenas 3.500 metros, o carro não conseguia mais avançar. O carro substituto não era um 4×4!!! Tudo por água abaixo…Esta distância adicional aumentava meu desnível de apenas 800 para 1250 metros verticais de aproximação, e mais cerca de 7kms só de estrada de terra até o início da trilha, e pra piorar a situação começou a chover forte. Com 2 mochilas e 25kg e uma gripe começando isso não era nada agradável, além do que, não foi por isso que paguei! Paguei por um 4×4 e transporte até lá em cima! Fiquei puto da vida, argumentei com o motorista que fez corpo mole e não quis avançar de jeito nenhum.


Mais um sinal negativo. Decidi voltar com ele até a hospedaria e passar a noite lá mesmo, subindo de ataque na madrugada. Mais custos, má sorte…


Chegando ao lodge entrei, consegui um quarto, contei ao Boris o acontecido e já arranjei carona pra madrugada. Passei o resto da noite assistindo TV e pensando na montanha, ainda puto.


O relógio despertou às 03:30h. Levantei, me vesti, peguei a mochila de ataque já pronta da noite anterior e desci pronto pro transporte. Comi alguma coisa de café da manhã incluso na diária do albergue, bom até, e me juntei ao grupo no carro, este sim 4×4, pra subirmos. Mesmo estando no carro e seguindo caminhando no mesmo lugar, não era neste momento cliente do Boris, só estávamos na mesma montanha ao mesmo tempo. Aliás, em nenhum momento cheguei a ser cliente dele.


Passamos pelo guarda parque, subimos mais, cruzamos o rio, a parte onde o motorista anterior desistiu e chegamos a 3.700 metros, só isso. Dali nem o nosso 4×4 (que depois constatei ser pura preguiça do motorista também) conseguiu passar. Então, sem cargueira caguei, toquei pra cima na escuridão sozinho. Estrada adentro…


Andei, andei, andei…Estrada longa e que a altitude quase não muda…Já era cerca de seis da manhã quando cheguei ao tal estacionamento La Virgem, e quando despontei lá seguido pelo Boris, seu cliente e mais um trio (guia e dois clientes, um israelense e um indiano), um outro 4×4 nos passou levando mais umas 5 pessoas. Porra!!! O carro chegou lá em cima e até passou do estacionamento chegando a marca dos 4000 metros! Vou te contar viu…Enfim…



Subindo pros Illinizas


Continuei andando. A gripe pesou, e minha vontade de fotografar ajudou, fui ultrapassado pelos grupos ficando meio que sozinho. Sem problemas, não tinha pressa, o tempo estava bom e estável. Andando calmamente e puto da vida com o Cotopaxi que estava límpido, tirei algumas fotos dele. De repente, senti um alien se movimentando na minha barriga, opa, merda a caminho! Parei atrás de uma pedra grande e deixei a criança nascer. O processo se repetiu mais uma vez alguns minutos mais tarde, loucura!!!


Continuei, agora bem mais atrás de todos os grupos, uns 200 metros. Não me abalei, segui feliz da vida como gostaria, com tempo limpo e Illinizas sorrindo pra mim. Quase não reconheci o Illiniza Norte em comparação com as fotos que olhei da montanha, estava coberta de neve, pintada de branco. Isso não era bom…simbora.


Em tempo, na subida da crista que leva ao refúgio, já a 4.350 metros, alcancei todos os outros e ainda ultrapassei um outro grupo, aquele que passou de 4×4 por nós andando. Ali o passo diminuiu, a crista é inclinada e demanda desgasto de energia…progresso lento já que tinha neve derretendo sobre detritos, uma pequena lama semi-congelada atrasava o progresso mais ainda….e desde a estrada fui caminhando nas botas boreal, pra não precisar trocar de bota lá em cima e ter que levar peso extra.


Por fim, depois de cerca de três horas e meia chegamos todos ao refúgio, onde uma pausa me aguardava para descanso e iniciar a subida da montanha. Até ali o desnível já tinha sido de 1050 metros. Parei por uns bons vinte minutos e segui adiante, logo depois de Boris, o outro guia e seus clientes, não queria ficar a frente de ninguém, queria subir sozinho.


Entretanto, com o passar do tempo, os caras se mostraram serem bastante divertidos, os clientes do outro guia amigo do Boris, o israelense e o indiano. Acabei colando com eles e batendo papos divertidos, desfrutando da montanha e da companhia agradável. O israelense tinha um gorro muito comédia e roupas bem coloridas, estava naturalmente fotogênico, mais parecendo um bozo andinista!


As horas passavam e logo logo algumas nuvens começaram a se aproximar, nada bom. O nível de neve em alguns pontos na montanha impressionava, no joelho. Nada bom! Vários sinais de merda juntos…além disso o calor, fazia 5 graus positivos o que derretia a neve fofa fresca da noite anterior e tornava tudo mais perigoso. O progresso foi lento, muito lento. Cheguei ao Paso de La Muerte (5.045m) as 10:30h, já tinha engarrafamento de um outro grupo guiado de seis pessoas, e um grupo menor de 3 pessoas levadas pelo Pedro, guia experiente de Quito e que acabou se tornando uma figura presente e cômica na minha vida durante a estada no país.


Todo mundo parado, juntando estes dois grupos, eu, o Boris e seu cliente, e o outro grupo do indiano e do israelense, éramos quase 20 no mesmo local, esperando o Boris e um outro guia tentarem abrir rota no meio da neve nos joelhos no paso de la muerte, uma pendente de uns 50 graus que deveria ser rochosa, repleta de neve fofa fresca, nada, nada bom.


Incrível como o tempo passa, e eu não queria desistir! Por isso esperei pra ver no que dava. Dez minutos, quinze, vinte, meia hora. O tempo já mudava radicalmente em proporções bíblicas, da água pro vinho. O indiano já não era mais engraçado e me enchia o saco reclamando de dor de cabeça. Nuvens nos cercaram e logo nos engoliram, já era quase meio dia quando o tempo fechou total e fomos assimilados por um whiteout e já com nevasca. Nesta hora eu que tinha uma bota melhor que a maioria estava lá, ajudando a abrir rota chutando neve na parte mais baixa do paso. Visibilidade baixa para cinco ou sete metros. Pensei comigo: Puta que pariu, vou embora daqui brother! Pareceu transmissão de pensamento, pois nesse exato momento o Boris conseguiu chegar ao outro lado e gritou para todos “melhor voltar, tá muito perigoso e a neve aqui está na minha cintura!”. Na mesma hora em que ele gritava isso em esforço pra ser ouvido, eu pedia passagem a um guia pra escalar de volta o paso e começar a descer pra salvar meu rabo da tempestade, a coisa estava preta!


Passei por ele, e quando olhei pra trás consegui ver a silhueta do Boris voltando pelo paso, apenas 8 ou 9 metros atrás de mim e era só uma figura fantasma. Pedi passagem pra mais gente e acabei me atrasando, a essa hora cagava pro cume, só queria descer porque a tempestade piorava gradativamente a cada minuto. Com medo e assustado por já ter perdido um amigo, guia experiente de Quito por causa de um raio na montanha, o Boris passou por mim quase correndo…..rs


Consegui passar por todo mundo e me adiantei na descida. Perdi todo mundo de vista. O Boris disse ao Brad (seu único cliente) “vamos descer muito rápido, se você não me acompanhar, é por sua conta pois pra baixo é mais rápido” e despistou o gringo de pé pequeno.


Os últimos por quem passei foram, pra minha surpresa, a lenda Equatoriana Santiago Quintero e um cliente italiano, ainda subindo! Que loucura! Bem, gastei uns 4 minutos me apresentando ao Santiago, o parabenizando pelo seu projeto (&nbsp,https://www.altamontanha.com.br/colunas.asp?NewsID=1207 )muito legal, e recebendo abraços para entregar ao Waldemar e ao Irivan Burda (enviei por e-mail faz umas duas semanas). Neste momento ouvi vozes, um guia com um casal basco (que mais tarde encontrei no Cotopaxi) se aproximavam. Quando olhei pra eles, notei uma coisa assustadora, os cabelos da mulher se levantaram e apontaram pro céu. Pensei “Fudeu, estou em zona de queda de raio!”, e escutei um trovão ensurdecedor. Olhei ao meu redor, a única opção que eu tinha pra fugir do alto da crista onde estava a aproximadamente 4.950 metros era descer em linha reta a face sul do Illiniza Norte quase em linha reta pra laguna verde, e foi o que fiz como ladrão fugindo da polícia!


Desci correndo a moraina nevada o mais rápido que pude, parando na metade do caminho pra descansar olhei à minha esquerda e pude ver de longe o Boris fazendo o mesmo, já quase lá embaixo. Rapaz, ele desceu de moto! Ahahahahah


Descendo o Illiniza Norte em péssimo tempo


Corri e corri e enquanto corria de vez em quando escutava um trovão perto e bem alto, em só três ou quatro minutos cheguei ao lado da laguna verde a 4.680 metros mais ou menos, dali virei mais tranquilo a esquerda sentido nordeste e comecei a caminhar pra chegar ao refúgio. Fazer isso me adicionou uns 800 metros de caminhada, mas pelo menos longe das partes mais altas. Caminhei rápido e logo cheguei ao refúgio. Lá encontrei o Boris que tinha chegado uns dez minutos antes de mim. Os outros chegaram somente cerca de 40 minutos depois, assustados e com frio. Do lado de fora a temperatura caíra pra –10 graus, uma queda de 15 graus celcius!


No refúgio ficamos todos presos por quase uma hora esperando a tempestade amainar um pouco, e enquanto isso eu olhei pro indiano que chegou se arrastando, e se retorcia de dor de cabeça reclamando muito. Me aproximei e disse “Cara, vou te dar um analgésico que não vai resolver muito, mas não posso te dar mais de um pra que ele não esconda os problemas que estão rolando na sua cabeça, você precisa descer rápido.”


Felizmente, nesta hora olhei pra fora e começou a acalmar, e uma nova camada branca de neve pintou mais ainda o Norte. Todos se prepararam e começaram a descer e eu fui ao banheiro pra mais uma sessão de caganeira. Quando saí, já estavam na trilha. Peguei minhas tralhas e me adiantei e quem encontro a só uns 300 metros do refúgio? O indiano caminhando feito zumbi sozinho. “Onde está seu guia?” perguntei. Não obtive resposta. Ele caiu em seus joelhos, se inclinou pra frente e vomitou metade de seus órgãos. Não tinha mais dúvida, aquele cara estava com um edema cerebral começando! Se não fosse embora dali rápido poderia morrer.


O levantei, peguei sua mochila e disse “vou descer sua mochila mas não vou te esperar, é só pra aliviar seu peso, mas você precisa correr comigo, entendeu?”. Tonto e apático sacudiu a cabeça positivamente e pra minha surpresa, conseguiu me acompanhar. Desci rápido, correndo, e a nevasca se intensificou. E eu pensando “mas que merda, o que mais pode dar errado nessa porra???!!!!!”. Sem muita dificuldade descemos cerca de 400 metros verticais de desnível em só uns quinze minutos, ali devolvi a mochila pro indiano que já apresentava melhoras e me despedi. Mais apressado ainda continuei a descida até o perder de vista.


Mais abaixo alcancei o Boris e o Brad e um muleiro com sua mula descendo. Aproveitei pra fazer um vídeo reclamando da vida e seguir adiante.


Não parava de nevar!


O “grão” de neve.


Ainda sob nevasca atingimos a linha dos 4.200 metros, já mais próximos do estacionamento e de lá foi um pulo até chegar a La Virgem, com o tempo começando a melhorar.


Esta minha primeira tentativa foi um pouco traumática, muito perigosa e exposta, além de eu ter meio que vestido a carapuça de papa-léguas e descer da montanha correndo fugindo da tempestade e dos raios que com ela vieram, ainda ajudei o indiano nas beiras de um edema cerebral…traumático, traumático. Chegando a hospedaria passei no banheiro de novo, troquei de bota e roupa, paguei a conta e quando estava pronto pra entrar no carro quase uma hora depois, chegou o segundo carro com o israelense, o indiano e seu guia. Olha, acho que o indiano nem se lembrava do que aconteceu pois nem um obrigado eu ouvi, nada, ele mal olhou pra mim. Ainda estava meio abalado mas consideravelmente melhor. Entrei no carro e fui pra Quito.


Tentativa frustrada com retorno apressado a só 75 metros verticais do cume, fazer o que, as vezes a montanha diz não! (estou dizendo isso muitas vezes ultimamente).


Segunda tentativa


Já no final da viagem, andando feito um besta em Quito buscando transporte pro Corazon, esbarrei sem querer com o Gavin na rua, e na mesma hora ele me disse que estava afim de tentar o Illiniza Norte. Sem problemas respondi na hora. Meia hora depois estávamos acertando transporte em uma agência perto dali.


Na manhã seguinte partimos e dessa vez sim conseguimos chegar ao estacionamento La Virgem, o tempo parecia perfeito, sem problemas, e lenticulares insistiam em se formar sobre o Illiniza Sur, mas não me preocupei. O único problema era o horário. O ideal pra atacar os Illinizas saindo de Quito é chegar lá ainda na madrugada e começar a andar às cinco no máximo. Começamos a andar quase nove da manhã, errado mas parecia que correria tudo bem já que o tempo estava perfeito.


Caminhamos sozinhos o tempo todo já que as pessoas que tentariam a montanha sairiam cedo do pueblo ou sairiam do camping ao lado do refúgio, ou do próprio refúgio. Estaríamos em desvantagem enquanto muitos desceriam. Mas, vamos que vamos.


Em pouco menos de três horas vencemos os 800 metros de desnível até o refúgio, paramos por uns dez minutos até nos arrumar com capacete e piolet à mão, e seguimos rumo ao cume.


Parecia tudo bem, avançamos calmamente desfrutando daquele tempo perfeito. Pessoas desciam do cume e normalmente eu perguntava como tinha sido, todos diziam o mesmo: “Com tanta neve a montanha está bastante técnica, mas diferente de duas semanas atrás, agora dá pra fazer cume!”. Me animei, seguimos.


Chegamos à crista da montanha a 4.950 metros, tudo já território conhecido pra mim, nada de novo. Então quase não tirei fotos ali. Chegamos ao meu ponto de desistência da vez anterior, sozinhos. Havia uma marca bem definida na neve pra desescalar o paso de la muerte e seguindo pra completar a travessia na pendente inclinada e exposta, continuamos sem titubear, mas com cuidado. Ultrapassamos o paso e o Gavin, dez anos mais novo e consideravelmente mais leve, seguiu cinco ou seis minutos à minha frente.


Nuvens começaram a se aproximar rapidamente, mas ainda não dei atenção achando que dessa vez a sorte estaria ao meu lado. Continuei a travessia já sem ver o Gavin, que entrou na canaleta pro cume. Ele deu sorte, logo assim que ele entrou um grupo de cinco pessoas começou a descer fazendo segurança. Quando terminei a travessia estava diretamente abaixo deles, rocha, gelo e neve desciam por causa das proteções e movimentação deles então não tive escolhe senão esperar.


Esperei, esperei e esperei. Não dava pra contornar sem corda, a inclinação chegava a 70° nas laterais, seria arriscado demais sem corda. Fiquei ali parado recebendo rajadas de pedaços de detritos sobre meu capacete. Esperei por 35 minutos. Gavin não descia e eu não podia subir. Nessa espera as nuvens se transformaram em uma tempestade, um whiteout me cercou e eu escutava já os primeiros trovões. “Mas que puta merda!” pensei, tudo de novo…


Avaliei ainda olhando pra cima e o grupo parecia não terminar nunca! Virei as costas e comecei a voltar, ainda sem ver o Gavin. Nossa, que raiva…Perdi o cume por isso, por causa da espera que tive que fazer. Voltamos rápido com medo dos raios que pararam momentaneamente, mas os ventos estavam fortes a essa hora e já nevava de novo.


O que dizer? Perdi o cume dessa vez por bobeira, por cinco minutos que eu deveria ter sido mais rápido, pelo grupo que não terminava nunca um trecho de só dez metros verticais, e pela nova tempestade que chegou. Terminei a situação escalando de volta o paso de la muerte na neve fresca, as vezes descendo junto com a neve que não aguentava meu peso. Quando eu olhava pra trás, via centenas de metros de queda quase vertical me aguardando, e eu não usava sequer uma corda. Só restou meu depoimento aborrecido no final das contas…


Meu depoimento depois de desistir pela segunda vez


Nove dias exatamente depois disso, no mesmo lugar onde eu esperei um polaco morreu por descer sem proteção, uma queda fatal. Sem chances de se salvar teve o pescoço quebrado, seu corpo foi removido dias depois.

Lamentável…


O Illiniza Norte já está disponível para consulta no Rumos:


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Notícia da morte do polaco na montanha:


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Abrazos

Parofes

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Sobre o autor

Parofes, Paulo Roberto Felipe Schmidt (In Memorian) era nascido no Rio, mas morava em São Paulo desde 2007, Historiador por formação. Praticava montanhismo há 8 anos e sua predileção é por montanhas nacionais e montanhas de altitude pouco visitadas, remotas e de difícil acesso. A maior experiência é em montanhas de 5000 metros a 6000 metros nos andes atacameños, norte do Chile, cuja ascensão é realizada por trekking de altitude. Dentre as conquistas pessoais se destaca a primeira escalada brasileira ao vulcão Aucanquilcha de 6.176 metros e a primeira escalada brasileira em solitário do vulcão ativo San Pedro de 6.145 metros, próximo a vila de Ollague. Também se destaca a escalada do vulcão Licancabur de 5.920 metros e vulcão Sairecabur de 6000 metros. Parofes nos deixou no dia 10 de maio de 2014.

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