Jalapão

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Durante cinco dias visitei terras e águas do Jalapão, e anos depois voltei por dois dias para percorrer sua borda sul. E retornei por mais quatro dias numa outra viagem. A região tem uma beleza seca e rude, que impressiona por seus grandes panoramas.

Jalapão

O Jalapão fica a leste de Palmas e sua porta de entrada é a vila de Ponte Alta, onde terminam os 150 km de asfalto. De lá, serão outro tanto em terra, a uma velocidade um tanto penosa, dada a presença de areões.

A menos que você vá ficar nesta vila ou tenha acordado muito cedo, programe o dia todo para a viagem ao seu destino. Além do calor, prepare-se para enfrentar as picadas dos insetos. Junto com um bom preparo físico, não deixe de levar muita paciência, para enfrentar os demorados percursos.

Mapa Geral do Jalapão, TO.

Existem quatro principais vilas na região: a maior delas é Ponte Alta, no limite sudoeste da área. Mas o coração da região fica em Mateiros, a 150 km de distância, que é também o centro do artesanato em capim dourado e seda de buriti. A norte e oeste de Mateiros estão São Félix e Novo Acordo.

Fora Ponte Alta, os acessos podem ser por Novo Acordo e Dianópolis (TO), Barreiras e Luiz Eduardo Magalhães (BA) – com distâncias entre 150 e 220 km, sempre por terra.

Um tour pelo Jalapão provavelmente resulta em 950 a 1.800 km. A população total da região não ultrapassa 36 mil pessoas, numa das menores densidades demográficas do Brasil, algo como 1 habitante/km².

Serra e Vereda no Jalapão, TO.

O Jalapão é uma região de transição para dois outros grandes biomas: a caatinga e a floresta amazônica. Ele é, de fato, uma região especial. Não tem propriamente uma beleza espetacular. Mas é impressionante por sua natureza vasta e rude.

Devido às grandes distâncias e à topografia plana, possui panoramas estáveis e até monótonos. Sobre seus solos arenosos viceja uma vegetação sofrida, pequena e esparsa, porém variada. O clima é quente e seco, com chuvas torrenciais infrequentes no verão e uma longa estação seca no inverno.

Dunas no Jalapão, Mateiros, TO (Fonte – Divulgação).

Os percursos são longos e árduos, o Jalapão não é uma região onde você possa praticar travessias a pé. Nele os deslocamentos exigem veículos apropriados, que rodam a 35-40 km/h. A sinalização é escassa e irregular, de acordo com o tradicional descaso dos órgãos ambientais.

A região é deserta, as vilas são distantes, pequenas e precárias. Prepare-se para rodar em média 50 km entre dois pontos de interesse. Portanto, não planeje mais de dois ou três em cada dia.

Embora de forma imprecisa, devido à inexistência de bons mapas, diz-se que o Jalapão ocupa 34 mil km, uma área inacreditável. É um retângulo inclinado, cujo lado maior corre no sentido nordeste, com 250 km por 140 km.

Rio Novo, Jalapão, Mateiros, TO.

Dentro deste retângulo, existem duas áreas enormes, o PN das Nascentes do Parnaíba (PI) e a Estação Ecológica (TO), além de quatro APAS e um PE – nenhuma delas desapropriada.

Existe um sistema de serras ou chapadões paralelos, que correm no sentido sul-norte, como acontece com os grandes rios da região, o Araguaia, o Tocantins e o Parnaíba.

A principal serra é a do Espírito Santo, que aparece impressionantemente retilínea por cerca de 30 km. Sua extremidade é belamente decorada pela forma cônica do Morro do Saca Trapo.

Serra do Espírito Santo, Jalapão, Mateiros, TO.

As outras serras são a da Jalapinha e do Porco, com altitude de 800 m. O ponto culminante está na Estação Ecológica, é o Morro do Fumo, com 1.100m e interessantes perfis em arenito. A altitude média é de 430m.

As encostas são recobertas por vegetação arbórea, em alguns casos sujeitas à erosão eólica. Este foi o processo formador das interessantes dunas do Jalapão, onde você poderá apreciar o magnífico pôr do sol.

Mas as maiores extensões são as áreas planas de cerrado, que lhe parecerão inicialmente repetitivas. Com o tempo, você perceberá que existem diferenças, desde o cerrado mais alto, úmido e verde de Mateiros até as formações mais fechadas e secas no rumo de Ponte Alta e os campos limpos entre essas duas áreas – onde o que parecem arbustos são na verdade árvores anãs.

Vereda de Buritis no Jalapão, TO.

Mas a visão mais cativante é a das veredas, que são várzeas repletas de buritis, com grandes aquíferos subterrâneos. Este panorama verdejante contrasta com o sofrido cerrado ao redor. Estranhamente, as veredas não estão em depressões, de forma que parecem um mosaico de fartura intercalado com a palha dos campos secos.

Todos os nossos felinos e demais mamíferos habitam a área, bem como todas as espécies de veados – junto com emas, patos, corujas, araras e muitos pássaros. Não será surpresa constatar que as águas e os animais estão escasseando, enquanto as dunas parecem aumentar.

A visitação tem se multiplicado – existem hoje 26 operadoras e mais de 90 guias no Jalapão. E foram agregadas muitas novas acomodações em Ponte Alta e em Mateiros. Mas, dez anos depois da primeira visita, os atrativos são exatamente os mesmos.

Cachoeira da Velha, Jalapão, Ponte Alta, TO (Fonte – Divulgação).

Já comentei sobre algumas das atrações do Jalapão, aquelas nas proximidades da Serra do Espírito Santo. As demais são basicamente quedas d´água, a principal das quais é a Cachoeira da Velha, com a forma de uma ferradura. Existem ainda maravilhosos fervedouros e praias fluviais nos Rios Novo, Sono e Soninho, propícios ao rafting.

Cachoeira da Formiga, Jalapão, Mateiros, TO (Fonte – Divulgação).

A história do Jalapão se resume ao tráfego dos tropeiros entre BA e GO e ao advento dos quilombolas fugitivos. Existem hoje oito comunidades quilombolas, todas pequenas, com 60 a 150 pessoas cada. Apesar de o Jalapão ser uma reserva, eles podem plantar e criar. Mas sua população não parece estar aumentando, talvez devido à atração de Palmas.

Fervedouro no Jalapão, Mateiros, TO (Fonte – Divulgação).

Concluindo, o Jalapão é muito distante, a infraestrutura é precária, as atrações são afastadas entre si, a natureza não tem uma beleza fácil e as extensões são um tanto uniformes – mas, mesmo assim, vale a pena visitar esse vasto, estranho e único deserto verdejante.

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Sobre o autor

Nasci no Rio, vivo em São Paulo, mas meu lugar é em Minas. Fui casado algumas vezes e quase nunca fiquei solteiro. Meus três filhos vieram do primeiro casamento. Estudei engenharia e depois administração, e percebi que nenhuma delas seria o meu destino. Mas esta segunda carreira trouxe boa recompensa, então não a abandonei. Até que um dia, resultado do acaso e da curiosidade, encontrei na natureza a minha vocação. E, nela, de início principalmente as montanhas. Hoje, elas são acompanhadas por um grande interesse pelos ambientes naturais. Então, acho que me transformei naquela figura antiga e genérica do naturalista.

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