"Não, eles não causaram o terremoto ficando pelados no cume. E não, não deveriam ter sido presos por causa disso. Mas o que dizer do grupo de turistas que tirou fotografias irreverentes no topo do Kinabalu na hora errada, poucos dias antes de um terremoto matar 18 dos 137 alpinistas que estavam na montanha? O que estas pessoas "bem de vida" para os padrões locais estavam fazendo naquele cume?
Eles estavam, de sua própria maneira, participando naquela que virou uma das mais perigosas e populares formas de auto-absorção de nossa geração. Em menos de 50 anos, o montanhismo deixou de ser privilégio de uns poucos misantropos e passou a ser uma indulgência bem difundida para pessoas que topam gastar quantias imensas em atos de egoísmo puro e simples.
Por que eles estavam ali? Pela única razão pela qual qualquer um consegue justificar estes atos, desde Sir Edmund Hillary e George Mallory até turistas de fim de semana: "Para poder dizer que eu fiz isto".
E a única pessoa interessada na sua escalada, mesmo que seja uma ascensão ao Everest que custou milhares de dólares, será você. Cumes de montanhas são como Ferraris vermelhas no cruzamento: impressionam apenas quem está dirigindo, e existem somente para isto.
Em um século de escalada, ninguém jamais conseguiu dizer uma boa razão para a prática.
Por duas décadas, escaladores e montanhistas tentaram justificar suas ações dizendo que era uma forma de exploração. Alguns dizem que é ciência ou esporte, porque requer algumas das mesmas habilidades, mas falta ao montanhismo o envolvimento humano de um esporte, ou o propósito de uma investigação científica.
No final das contas, a única razão pela qual as pessoas se jogam montanha acima são elas mesmas.
Existem muitas outras formas de esvaziar uma conta bancária. O problema com o montanhismo é que não se trata de uma idiotice que não faz mal a ninguém: a auto-gratificação tem muitas vezes um alto custo ambiental, humanitário e político.
O monte Kinabalu é para principiantes do egoísmmo: o governo de Bornéu permite escaladores a partir dos 10 anos, e houve vítimas de 12 anos de idade no terremoto recente.
O povo de Bornéu nunca gostou muito deste tipo de exploração da montanha, nem dos dejetos fedorentos deixados por ele, razão pela qual o ministro do turismo local jogou a culpa não em seu próprio departamento, que permite que os turistas subam a montanha, mas nos próprios turistas. Ele está metido em uma crise política.
É uma versão em miniatura do que o montanhismo vem fazendo desde seu começo. Quando Mallory tentou subir o Everest em 1924, não só deixou para trás sua mulher, filhos e carreira acadêmica, como pôs muitos Sherpas em perigo e causou um imenso dano político: o escândalo causado pela tentativa dividiu a política tibetana, o que enfraqueceu o país a ponto de a China dominar o controle do país. Deixar-se levar pelas próprias indulgências tem um preço caro.
A escritora Jan Morris, que esteve com Tenzing Norgay e Sir Edmund Hillary quando estes chegaram ao cume do Everest em 1953, recentemente declarou que o montanhismo deveria acabar: qualquer razão que ela tivesse visto para isto no começo já desapareceu. Após o recente terremoto no Nepal, ela escreveu: "O encanto acabou, comecei a sentir uma espécia de pena pelo Everest. Agora me lembra mais uma besta enorme, vestida para uma performance na TV ou no circo".
Ela agora recomenda que a montanha fique fechada para sempre, "deixada em paz em sua magnitude, longe dos seres humanos e para que nunca mais seja violada em nome da fama, lucro, rivalidades ou orgulhos nacionais".
Ou em nome do ego: chegamos a um ponto onde "porque está lá" já não é uma boa desculpa".