Nos Andes Brasileiros?

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Essa foi minha segunda visita ao Itatiaia, e cada vez que piso lá me surpreendo mais! Dessa vez não fui sozinho, tinha como companheiro Edson Vandeira que conheci pelo orkut. Foi a primeira vez que o vi pessoalmente.

Deixamos a Tietê às 23:30h de sexta-feira dia 14 de novembro rumo a Itanhandú, onde chegamos por volta de 04:00h. De lá vinte pratas em um táxi com um outro cara bêbado feito um gambá (bastante divertido pela noitada destilada) e ficamos na pracinha de Itamonte. Lá a opção foi óbvia, bivaque. Dormimos na praça mesmo de 04:45h até 05:45h. Acordei, recolhi o isolante e seguimos pro restaurante/ hotel do Nelson que possui o contato do Toninho Baiano. Ele chegou com a mesma prestatividade que me levou da outra vez, e subimos rumo ao Itatiaia a um custo de setenta reais.

Na entrada do Alsene descemos e continuamos a pé. Nos registramos e entramos no Parque exatamente às 08:00h, após bater um papo com um grupo de escoteiros e seus chefes que seguiriam para o Agulhas Negras (grupo de 13 ou 14 pessoas). Já na estrada tiramos várias fotos do “sapo flamenguinho”, animal típico do parque e que está em época de reprodução.

Sem muitos atrasos, seguimos trilha adentro. Como na sexta-feira a chuva fez seu papel a trilha estava muito encharcada. Muito mesmo, vários córregos se formaram pelas trilhas pra escoar a água para fora das montanhas. Imagino que a chuva deve ter sido forte!

Decidimos por começar nossas conquistas pela Pedra do Altar, que parecia ser a trilha mais longa, e para isso deveríamos estar de volta na portaria do parque às 13:00h pois a intenção era subir o Couto no mesmo dia! Montanha acima. Após a ponte pegamos a bifurcação para a esquerda conforme vários relatos e o próprio croqui do parque indica. Até certo ponto foi tranqüilo mas depois a trilha simplesmente desapareceu. Perdemos um bom tempo tentando encontrar a trilha e depois de uma certa frustração, decidimos atravessar um descampado após uma elevação de cerca de 2.500 metros pra chegar na base da montanha.

Não foi muito fácil…Muitas pedras grandes, vários charcos, formigueiros, alguns escorregões…Decidimos deixar as mochilas em uma pedra bem visível para fazer o cume da Pedra de ataque. Mais uns 25 ou 30 minutos e atingimos o cume da Pedra. Que visão privilegiada do Agulhas Negras! A 2.665 msnm no cume do 11° pico brasileiro, admiramos todos os ângulos possíveis…Conseguimos ver até a Pedra da Tartaruga! Tiramos algumas fotos mas sem muito proveito pois já era 10:50h e precisávamos estar na portaria em 2h e 10min. O tempo ficou apertado levando em consideração que por não encontrar a trilha correta levamos praticamente três horas completas pra atingir o cume. Começamos a desescalaminhada.

Logo no início da descida, por causa de um pouco de umidade na rocha escorreguei…Não foi grave mas suficiente pra cortar meu dedo e palma da mão. Foram vários minutos de sangramento intenso, mas que parou repentinamente facilitando a descida. Por isso coloquei a luva somente na mão ferida a fim de evitar maiores danos…

Fácil chegamos às mochilas, carregamos e descemos. Foi uma corrida contra o tempo…Descemos as pedras, atravessamos o descampado, vencemos a elevação e sem maiores problemas entramos na trilha retornando. No final o Edson sentiu o cansaço. Sorte que foi no final, quando já estávamos atravessando a represa ao lado do Rebouças.

Não sei ao certo o que pode ter causado o problema mas acredito que tenha sido a soma de circunstâncias. Alertei o Edson várias vezes que ele deve se hidratar mais na caminhada pois ele praticamente não bebe água! Isso não é bom. Desidratação pode deixar uma pessoa em maus lençóis. Quando chegamos no Rebouças era exatamente 12:40h. Se apertássemos o passo, chegaríamos sem problemas na portaria. Mas aí o Edson desabou em cãibras repetidas e assim ficou por 40 minutos!

Fiquei preocupado, tentei dobrar a perna dele mas só piorava a situação…Achei que seria prudente fazer com que ele se alimentasse e bebesse bastante água. Fogareiro e panela na mão, hora do almoço! Talharim com lingüiça calabresa, um banquete pra quem ficou a noite praticamente em claro (não dormimos nem um minuto na viagem até Itanhandú) e não bebeu nada na trilha. Ele tinha gatorade e foi isso. Insisti pra ele comer e beber até que depois de um bom tempo (já era quase 14:00h!) ele começou a melhorar e conseguiu ficar de pé. Fiquei aliviado pois já estava avaliando a possibilidade de ir até a portaria pedir auxílio médico.

Trocamos de mochilas e voltamos. Achei melhor pegar a dele que estava consideravelmente mais pesada que a minha e assim, lentamente e sem pressa, chegamos à portaria do parque onde descansamos por uns 15 minutos e depois descemos até o Alsene.

Já ouvi falar muito do Alsene, e muito mal! Porém, não posso reclamar de minha estada lá. Não vi nenhum absurdo…Estava completamente vazio, quando chegamos não havia ninguém lá e assim éramos os únicos a acampar. Escolhemos um local privilegiado, no final do terreno do camping, bem antes do platô que desce até a cachoeira. A vista era sensacional, e estaríamos isolados de qualquer grupo que chegasse. Deu certo.

Nova refeição e pronto, o cansaço me pegou. Apaguei! Dormi sem intervalos de 16:00h até 19:00h, quando acordei vi o Edson do lado de fora já recuperado tirando fotos de flores e paisagens. Batemos um papo e decidimos que era cedo pra jantar…O sono pegou dessa vez o Edson que literalmente “entrou em curto” no seu saco de dormir. Eu também dormi porém pouco, sono mais leve…Fiquei deitado ainda pensando sobre as possíveis paisagens do cume do Couto!

O Edson acordou quase meia noite, então sim fizemos uma janta típica de acampamento, macarrão com salaminho e queijo chedar! Que maravilha…O melhor cozinheiro que existe de fato é a fome!

Fomos dormir quase uma da manhã ficando programado acordar cedo (05:30h) pra desmontar o acampamento e subir o Couto, pois ficamos com receio de novas crises de cãibras nas pernas do Edson, e o Couto é conhecido por ser uma montanha fácil. Por isso desistimos do ataque ao cume do Prateleiras. Acordamos, seguimos o roteiro e subimos pro parque.

Pagamos novamente a entrada, pegamos informações e fomos. Logo da estrada a visão da Serra Fina já é bastante privilegiada! Céu limpo, fotos pra todo lado…

Chegamos na trilha e logo começamos. Fomos fácil e sem problemas, lentamente ganhando altitude e contornando a montanha onde fica a segunda antena. Mas novamente a trilha que era totalmente fácil nos pregou uma peça. Um pequeno trecho, pequeno mesmo de uns 6 ou 7 metros ficou encoberto pelo capim alto, ocultando assim a continuidade da trilha que atravessa o pequeno vale até as paredes com vias de escalada onde continua muito bem demarcada. Inacreditável! Retornamos, traçamos uma nova rota seguindo falsos totens e chegamos a linha final onde teríamos que literalmente atravessar um rio pra continuar! Não dava…Voltamos novamente até a bifurcação após perder inacreditáveis 60 minutos, onde eu decidi que teria de encontrar a trilha correta.

Entrei na mata afastando o mato alto e finalmente encontrei a trilha. Respeito é bom e a montanha gosta! Seguimos a trilha novamente e super rápido chegamos a segunda antena. No caminho tiramos muitas fotos…Passamos pela escalaminhada lateral pro cume e pronto. 10:37h estávamos no cume do 8° pico brasileiro a 2.680 msnm. Ali perdemos um bom tempo tirando fotos e conversando, além de apreciar a vista…Ficamos mais de uma hora no cume, iniciando a descida ao meio dia com sol apino, torrando o couro!

Na descida mais dezenas de fotos…Um besouro pequeno, flores, formações rochosas, e uma linda aranha que cruzou meu caminho (dou uma sorte tremenda com elas, já que adoro aranhas!). Se a descida fosse direta e sem fotos acho que levaríamos uns 40 minutos, mas levamos o dobro disso por causa das fotos. Só durante a descida do Couto tiramos mais de 100 fotos!

Chegamos na portaria do parque por volta de 13:30h e no Alsene às 14:00h. Bebemos uma coca-cola e esperamos a menina ligar pro Toninho pra descermos de volta pra Itamonte. Ele chegou tarde, 15:30h! Tínhamos exatamente 70 minutos pra chegar a Itanhandú e tentar pegar o ônibus pra SP de 16:40h. Toninho fez o possível e por oitenta reais nos deixou na rodoviária de Itanhandú apenas cinco minutos antes do ônibus sair. Tarde demais, sem vagas…

Isso exigia mudança de planos, a saída foi pegar um ônibus pra Cruzeiro pra tentar outro por lá. Deu certo! Chegamos em Cruzeiro no momento de saída de um ônibus pra São Paulo com vagas sobrando…Negociamos diretamente com o motorista e viemos embora…

Foi uma baita correria, um pouco cansativo, mas maravilhoso…As fotos comprovam isso e não deixam margem para dúvidas em relação à beleza do Parque Nacional do Itatiaia, ou por que não dizer “Andes Brasileiros”?

Custo total da investida: R$ 329,00!

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Sobre o autor

Parofes, Paulo Roberto Felipe Schmidt (In Memorian) era nascido no Rio, mas morava em São Paulo desde 2007, Historiador por formação. Praticava montanhismo há 8 anos e sua predileção é por montanhas nacionais e montanhas de altitude pouco visitadas, remotas e de difícil acesso. A maior experiência é em montanhas de 5000 metros a 6000 metros nos andes atacameños, norte do Chile, cuja ascensão é realizada por trekking de altitude. Dentre as conquistas pessoais se destaca a primeira escalada brasileira ao vulcão Aucanquilcha de 6.176 metros e a primeira escalada brasileira em solitário do vulcão ativo San Pedro de 6.145 metros, próximo a vila de Ollague. Também se destaca a escalada do vulcão Licancabur de 5.920 metros e vulcão Sairecabur de 6000 metros. Parofes nos deixou no dia 10 de maio de 2014.

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