Acreditando q, devido à péssima previsão meteorológica, minha única cia na trip se limitaria à do meu chato e insuportável ego, eis q incrivelmente a Carolzita decide integrar o “trio” neste bate-volta dominical. Dessa forma saltamos solitariamente por volta das 8:15hrs na pacata vila inglesa, q cruzamos imediatamente num piscar de olhos. Envolta em suas tradicionais brumas q cobriam o alto das serras do entorno, praticamente fomos os únicos a desembarcar do coletivo azul. Tb pudera, naquele dia cinzento permeado por fina garoa a vila nem sequer acordara e preferiu por ainda se manter no aconchego dos lençóis. Nem a Dna Francisca pruma boa prosa, nem o Bar da Zilda prum rápido desjejum, nenhum vira-lata a nos acompanhar, tds ainda dormiam.
Adentramos a passos largos na bucólica estrada do Taquarussu – após passar sob o portal do Pq Natural das Nascentes – já cientes q desta vez não a percorreríamos em quase td sua plenitude como das ocasiões anteriores. Tropeçamos na precária cancela-guarita vazias e deixamos a estrada pela ramificação da esquerda. “É, chegar cedo antes dos guardinhas tem suas vantagens..”, pensei. Vencer o portão de ferro fechando a continuidade da estrada não foi problema tendo em vista o enorme rombo no alambrado do seu interior. Pepino mesmo teria sido ter de convencer o habitual guardinha q ali fica prostrado a te deixar entrar ali sem guia ou monitor.
Com a “barra limpa” bastou simplesmente prosseguir estrada abaixo, sentido norte, descendo imperceptivelmente em meio a verdejante e densa mata. A via aparenta ser claramente uma estrada de manutenção. Enormes voçorocas de lírios-do-brejo ornam a beira do caminho, enqto a vegetação restante se completa com coloridos ipês e frondosos cedros. Depois de transpor novo alambrado barrando o caminho por outra abertura permitindo acesso, desembocamos num descampado sendo anunciado como “Núcleo de Interpretação Ambiental Tanque do Gustavo”, as 8:50hrs. Uma casa abandonada dividia espaço com vários bancos espalhados pelo bucólico lugar, alem de belos exemplares de goiabeiras, pau-cigarra e pau-de-leite. Mas o mais interessante era uma rústica e enorme fonte feita de pedras por onde escorria água cristalina, q por sua vez era canalizada por um simpático aqueoduto. Lendo as didáticas placas tomo conhecimento q td aquilo ali foi pra desviar o curso do Ribeirão Grande, de modo a criar um reservatório q por sua vez abastecia de água as maquinas do sistema funicular. Atualmente a água abastece a Parte Alta da Vila de Paranapiacaba.
Acompanhando o aqueduto logo caímos no tal “Tanque do Gustavo”, q nada mais é um enorme e belo lago artificial de coloração esverdeada, cercado de muito e muito verde. É preciso ter muito cuidado ao acompanhar o chão de pedra do aqueduto pois o mesmo é liso feito sabão, e em mais de uma ocasião ambos quase patinamos cinematograficamente não fossem os oportunos corrimãos de madeira dispostos no trajeto. Provavelmente de modo a evitar acidentes q o acesso ao lugar é proibido sem o devido acompanhamento. Em tempo, o nome do Tanque cujo foi atribuído em homenagem ao alemão Gustavo Hartmann, empreiteiro da SPR (São Paulo Railway) q construiu o reservatório.
Uma trilha bem batida bordeja o enorme lago e termina dando no alto de uma pequena cachu, por sua vez resultante do represamento do lago numa muretinha de concreto. A água despenca de uma altura aproximada de 4m e depois corre sinuosamente pra leste, de onde parte nova picada q aparenta acompanhar este novo curso do Ribeirão Grande. É o final da “Trilha da Pontinha”. Mas o acesso é novamente bloqueado por uma cerca e alambrado. No entanto, encolhendo bem a barriga e agachando um tanto é possível passar pelo lado do mesmo sem gdes dificuldades e descer cuidadosamente os visguentos azulejos até a base da cachu, ou seja, final da supracitada picada.
Daqui em diante não tem erro pois é só seguir a trilha rumo leste, inicialmente forrada por um charmoso calçamento de pedras, q ora se estreita ora se alarga. Durante td trajeto temos a cia do rio marulhando placidamente ao nosso lado, com trechos onde ele se mostra represado na forma de belos piscinões. Infelizmente o dia não está favorável e a fácil pernada sequer fez a gente suar de modo a desejar avidamente um tchibum, mas certamente se o sol e calor estivessem de rachar não ia dar outra. A trilha passa de uma margem á outra umas três vezes, mediante rústicas e pequenas pontes de madeira, q provavelmente nomeiam a vereda. Os mais corajosos podem alternar as margens através dos estreitos canos e tubulações de ferro q igualmente emparelham a trilha, ora enterrados ora expostos, principalmente nas travessias de rio, sob o olhar simpático da “Gatita”, a gata-marcajá símbolo do Pq pintada por td parte.
Mas a pernada de quase 1km não demora a sair da floresta fechada pra dar num terreno mais aberto. A trilha e calçamento cede lugar a um piso de madeira – provavelmente pra evitar pisar nos charcos – ate finalmente desembocar na Estrada de Paranapiacaba, ao norte da vila e repleta de jardins de hortênsias ornando a beirada. Um tiozinho da guarita ali disposta nos olha perplexo, como q pensando: “Ué, de onde ces saíram!?” Mas a gente trata de se pirulitar dali o mais rápido possivel, com a cara de paisagem q a ocasião requer, sem maiores delongas. Eram exatamente 9:50hrs e realmente a trilha foi facil demais. Não deu nem pra ao menos esquentar as turbinas. Tomara q o resto ao menos nos dê alguma emoção.
Andamos um tempo pela estrada ate retornar novamente à vila, as 10:15hrs, agora sim dando sinais de vida com garoa tendo dado trégua já a um bom tempo. A Zilda estava repleta de bikers tomando alguma coisa e Dna Francisca estava naquela sua pose básica e inconfundível, ou seja, debruçada na varanda de seu ateliê de artesanato apreciando o vai-vem daquele domingão. Numa rápida prosa com a simpática tiazinha nos confidencia o baixo movimento na vila, além de outros atrativos naturebas q somente ela conhece, como uma gruta enorme perdida no mato e uma tal Pedra Preta. Tento colher infos dela mas a velha senhora se mantém irredutível em manter esses locais como segredo particular. “É pra garantir a segurança de vcs pois é perigoso chegar lá..”, justifica ela. Sei.. Foi ai q percebi minha maquina fotográfica estar com problemas, e por isso passei a registrar o passeio com o celular. Porcamente, diga-se de passagem.
Pois bem, nos despedimos da folclórica tiazinha pra dar então inicio ao ultimo rolê proposto, o Poço Formoso. Rasgamos o interior do vilarejo sentido o pto de ônibus. Sim, o mesmo lugar pelo qual havíamos chegado ate ali. Afinal o caminho pro tal poço se dá através da tradicionalmente conhecida “Trilha do Rio Mogi”, aquela q desce ao rio ate Cubatão e cujo acesso está do lado do Mirante homônimo. De cara tropeçamos com um veículo dos guarda-florestais do Pq Est. Serra do Mar, uma placa (“Acesso restrito – Infração da lei sujeita a penalidade”) e uma fita obstruindo a entrada da trilha.
Com a neblina baixando rapidamente e o motora do veiculo dando atenção a outras pessoas, eu e a Carol – munidos do óleo-de-peroba necessario – nos pirulitamos trilha abaixo a passos largos, sorrateiramente. Afinal, aquela trilha conheço melhor q a palma da minha mão. Imediatamente reparo algumas diferenças na vereda desde a ultima vez q ali estivera, coisa de ano atrás; a proibição e o desuso favoreceram o aumento de mato invadindo a picada, e o comecinho dela esta tomado principalmente de vegetação espinhenta, da qual tivemos q nos desvencilhar mais de uma vez. Além disso, o caminho está bem erodido e há muitos trechos desbarrancados q podem gerar confusão a quem nunca andarilhou por ali. Mas pra quem já perambulou ate Cubatão o caminho não tem nenhum segredo.
E assim eu a Carolzita vamos perdendo altitude rapidamente, enxugando o mato no caminho, principalmente nos trechos mais abertos, onde enormes voçorocas de lírios-do-brejo invadem o caminho, nos obrigando a afastar seus úmidos caules com ambas as mãos de modo a saber onde estamos pisando. A primeira torre é deixada pra trás. A segunda tb. Na terceira é q está a pegada. Pois é, sempre passei batido pela terceira torre acreditando q a discreta trilha q sai da picada principal fosse apenas ate a base da mesma, numa espécie de mirante. Q nada, essa era a picada do Poço Formoso!
Dito e feito, tomamos a supracitada trilha q, após passar sob a torre, embicou forte vale abaixo, bem aberta e batida. A piramba q se seguiu foi vencida mediante degraus irregulares formados pelas raízes da vegetação ou nos segurando no arvoredo ao redor. A medida q perdemos altitude o som de água correndo farta cada vez mais próximo se faz sentir. Ate q, enfim, desembocamos nas margens do majestoso e belo Rio Mogi, as 11:40hrs, aqui quase próximo de suas nascentes. Já desci varias vezes o rio e imediatamente reconheci o lugar, marcado pela presença de mtas clareiras e vestígios de acampamento, pela alta declividade e por ser bem encachoeirado. Só bastava saber qual dos trocentos poços era o tal Formoso, e pra isso levei um folder q me ajudaria nesse aspecto.
Cruzamos a outra margem saltando as pedras, onde uma discreta trilha na encosta nos levou a um patamar mais abaixo. Foi ali q havia um piscinão maior q se destacava dos demais, em meio a enormes rochas. Peguei o folder pra conferência e bingo.. era ali! Claro q desta vez nos permitimos um breve e revigorante tchibum no belo poço represado ao sopé das pedras, assim como uma agradável hidro proporcionada pelas pequenas quedas das mesmas. Pra ser franco, eu q já percorri td esse rio por td sua extensão o poço era uma decepção se comparado a outros trocentos remansos com piscinas mto melhores, rio abaixo. A “Prainha do Mogi” e a “Pedra do Pulo”, por exemplo, apenas pra citar dois deles. Mas beleza, estava ali apenas cumprindo tabela, pois particularmente vir ate aqui valeu somente pra conhecer esta trilha q sequer sabia de sua existência.
Após descansar e mastigar um lanche retornamos pelo mesmo caminho, as 12:50hrs, no exato momento em q o vale fechou-se por completo e a fina garoa retornava mais determinada q antes. O apito do trem nalgum canto da encosta do vale quebra subitamente a trilha sonora ate então, regada unicamente ao som relaxante do rio. Não sei pq, mas a volta pareceu ser mto mais rápida q a ida. Quiçá pela animada conversa q regou a ascensão ou quiçá pela ansiedade em ter obrigatoriamente de encarar outra vez com o guardinha na entrada da trilha. “Que seja o q Deus quiser..”, pensei, já preparando a vaselina pra “comida” q iria levar.
Dito e feito, bem q tentamos sair desapercebidos mas a cara de paisagem desta vez não bastou pra não nos chamarem a atenção, com rigor. “A placa ta bem clara e a fita reforça isso, e mesmo assim vcs infringiram uma lei expressa!” , ouvimos em tom de sermão dado com expressão pra lá de carrancuda. “Desta vez vcs passam, mas da próxima vamos autuá-los com processo por crime ambiental!” , emendou, quase alterado. Pois é, o pessoal ta fiscalizando e sendo duro mesmo. Portanto fica a dica de pensar duas vezes antes de arriscar descer a “Trilha do Mogi”.
Pra tentar minimizar nossa dose de culpa, procuramos conversar com o guardinha de modo a tentar entender os motivos de tal proibição, algo q nunca entrou na minha cabeça. Depois de mta conversa, enfim, a conclusão a q cheguei foi a mesma: o pessoal do pque prefere nivelar por baixo, arrolando td mundo como farinha do mesmo saco – farofeiros, maconheiros e trilheiros responsáveis – onde fica mais fácil proibir do q criar medidas diferenciadas. Cômodo demais até. Lembro q da última vez q estive ali buscavam parcerias pra resgatar a trilha de modo a q só se teria acesso a ela acompanhado de monitor ambiental.
Um ano se passou e continuava a mesma coisa. Ou seja, o tempo passa e a gente – responsável e q conhece a vereda melhor q os próprios guardas – é proibido de desfrutar do bem público por conta da morosidade de seus gestores. E mais: qdo for liberada a trilha, ainda haverá obrigatoriedade de guia!! Peralá, ne? O guardinha não tem culpa de nada pois apenas cumpre sua função, e se algo suceder a alguém na trilha termina sobrando pra ele. E lógico q este lado nos pudemos enxergar com mais clareza, o q nos fará repensar duas vezes antes de cometer alguma outra “molecagem” por ai. Mas q a gente fica puto, ô se fica.
Mas o melhor da conversa foi qdo tocamos no assunto de um conhecido nosso, o Minduim, falecido no final do ano passado sob circunstâncias ainda não mto claras na “Trilha do Mogi”. O guardinha teve acesso a algumas informações do pessoal da parte baixa e ele, por exemplo, não tem dúvidas do q foi do q “realmente aconteceu”, e q partilhou com a gente numa boa, cristalizando de vez apenas nossas suspeitas. Resumindo, a conversa com o guarda-florestal foi bastante produtiva.
A prosa so foi interrompida qdo a chuva resolveu cair de vez, nos obrigando a refugiar no pto de ônibus. Zarpamos as 14hrs pra logo depois nos vermos tomando cervejas e comendo salgados na Padoca Barcelona, enqto passávamos o tempo no aguardo da chuva torrencial q logo se sucedeu. A viagem no trem na volta a Sampa foi feita no mundo dos sonhos, e a pane no carro da Carol no meio de uma rua alagada na Raposo Tavares é digna de um relato exclusivo, dada a aventura q foi ficar quase ilhado no temporal q desabou domingo a noite. Mais “emoções” inimagináveis…
Ao chegar em casa, finalmente altas horas da noite, qual minha surpresa do problema da máquina fotográfica se localizar no surrado e imprestável cartão de memória, q sismou em dar seu último suspiro. Resultado: perdi td registro decente daquela pernada dominical mais movimentada q o previsto. Mas e daí? Sem problemas. O “Tanque do Gustavo”, a “Trilha da Pontinha” e o “Poço Formoso” não sairão dali, e continuarão sendo pretexto pra lá retornar não apenas uma, mas várias vezes. A proximidade com a vila e facilidade de acesso garantirão breve e pronto retorno. A dúvida somente fica por conta se esse retorno será com ou sem a cia de algum guia ou monitor ambiental, jogado goela abaixo, a contragosto. Independentemente disso, só assim pra mesmo num dia chuvoso não abrir da minha sagrada cota de mato. E ainda por cima, com mta “emoção”.
Texto e fotos de Jorge Soto
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