Pelas Cachus do Ribeirão de Itu

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A &ldquo,Trilha das Cachus do Ribeirao de Itu&ldquo, é daqueles programas naturebas no litoral norte de SP q tds já fizeram alguma vez, exceto você. Localizado no Núcleo São Sebastião do PE Serra do Mar, o trajeto íngreme da picada compreende os 6km finais em meio à exuberante Mata Atlântica, encachoeirados e mais interessantes da conhecida &ldquo,Travessia Salesópolis-Boiçucanga&ldquo,, q por sua vez é uma vereda q acompanha o Ribeirão de Itu serra abaixo, unindo o planalto ao litoral. Entretanto, a &ldquo,Trilha das Cachus&ldquo, pode resultar tanto num passeio familiar de nível brando como numa trip mais perrengosa de dia inteiro para quem se dispuser a encarar as varias possibilidades de rotas q seu sinuoso e cristalino rio oferece.


“Vamos pra Boiçucanga dar um rolê pelo Ribeirão de Itu?”, foi a pergunta q o Nando me fez pelo telefone, por volta das 24hrs desta última sexta. Antes de mandá-lo “àquele lugar” por me tirar da cama, pensei com meus botões q essa seria uma boa oportunidade de reconhecimento de um lugar q sempre quis conhecer, mas q releguei pra ” depois” por algum motivo, ora por julgá-lo próximo ou turístico em demasia a pto de deixá-lo pra outra hora, afinal tá do lado de SP! Pois bem, essa era a deixa pra sanar tal lapso e tornar produtivo um sábado s/ qq programação, inclusive c/ promessas de bom tempo. Dessa forma o Nando safou-se de ouvir impropérios em favor de um arrastado e cordial “a que horas ce passa aqui?”.

Na manha sgte, após pegar seu amigo na zona leste, o Santiago, nos vimos rasgando o asfalto da Mogi-Bertioga rumo litoral. Contudo, mesmo saindo cedo alguns pequenos contratempos (mtas paradas, alguns perdidos e leve transito) nos atrasaram o suficiente a pto de só chegarmos em Boiçucanga as 11:30. O sol estava radiante e o calor, insuportável, tanto q as praias estavam lotadas. Mas o q me chamou a atenção foi q a sinalização pro inicio da trilha tava mto bem escancarada por emplacamentos por td cidade, o q fatalmente significava q os poços e piscinões estivessem bem “farofados”, naquele dia quente! Dane-se, fomos assim mesmo.

Acompanhando as placas fomos dar numa precária estradinha de terra, cruzamos o Ribeirão de Itu por sobre uma ponte de madeira e caímos noutro canto, apenas pra sermos informados q a trilha era antes da tal ponte. Voltamos td, mas ai o Nando resolveu cruzar o rio não pela ponte e sim em meio à correnteza(!?). Foi ai q o carro embicou na água até o fundo repleto de pedras e por pouco não ficamos ali presos, não fosse a perícia do motora em não deixar o veículo morrer naquela situação. No entanto, a manobra bastou pra q entrasse água dentro nos deixando ensopados já bem antes de iniciar a trilha. Frustrando tds os banhistas presentes q pararam pra ver a manobra ousada – e deviam torcer pra ficarmos atolados no rio – retomamos o caminho correto, ainda tremendo pelo susto passado.

Tomando o caminho correto, a “Estrada do Cascalho”, logo chegamos ao inicio da “picada”, basicamente continuação da estrada, mas com trafego de veículos proibido. Deixamos o carro no estacionamento do camping ao lado, o “Recanto do Papagaio”, e começamos a trilha oficialmente ao meio-dia, com o GPS indicando apenas 40m de altitude! Após placas informativas do trajeto, a pernada segue sem maiores dificuldades em nível e passa por uma pequena estação da Sabesp, basicamente acompanhando o rio durante td trajeto, q não tarda a ser cruzado logo a seguir, com água ate as canelas.

Do outro lado, a estrada dá lugar efetivamente a uma estreita picada q mergulha de vez mais na mata!&nbsp, Logo de cara ignoramos uma placa q surge à esquerda (“Primeira Queda”), q leva à cachu mais freqüentada da qual era possível ouvir intensa muvuca e q resolvemos deixar pro final. Algumas bifurcações surgem, mas basta manter-se sempre próximo do ribeirão, mas não tarda p/ declividade aumentar consideravelmente e a subida apertar, demandando inclusive uso das mãos em alguns trechos mais pirambeiros. Sempre bordejando a íngreme encosta à nossa direita e tendo audível o rugido do rio à esquerda, rapidamente ganhamos altitude e cruzamos com alguns poucos turistas combalidos no sentido contrário. O calor daquele horário era intenso e num piscar de olhos nos vemos ensopados de suor.

Ao atingir a cota dos 140m desembocamos na “Segunda Queda”, a da “Samabaiaçu”, onde um convidativo e enorme poção espalhava-se pelo sopé de uma bela cachu de quase 20m, pra depois suas águas cristalinas se afunilarem através de um imponente e fundo cânion! Alem disso, havia alguns poucos banhistas, mas o q me chamou mais a atenção foi a presença de 2 PM´s no local(!?), provavelmente pra garantir a segurança em virtude de algumas ocorrências de assaltos na região. Fizemos então uma breve parada pra descansar e nos refrescar na água, alem de colher boas infos com a Vera e Beatriz, duas simpáticas jovens monitoras do PE q ali faziam fiscalização da trilha.
Nos contaram tb das condições da continuidade da picada, rio acima: foram reticentes q a “Trav. Salesópolis-Boiçucanga” estava em desuso e q não havia mais procura dela nem por agências de ecoturismo em virtude da trilha estar fechada em vários ptos, esse descaso aliado às ultimas chuvas e deslizamentos q se encarregaram de obstruí-la ainda mais, tornando seu trajeto inicial inviável sem um bom facão. Ate uma corrida de aventura não pode ser realizada ali em função disso! Contudo, afirmaram q logo haveria um mutirão da prefeitura pra reabri-la de modo a q viesse novamente a ser palmilhada e mantida reaberta. Pois bem, como nossa idéia não era fazer a travessia e nem tínhamos condições disso (tempo escasso, sem equipo e resgate na volta) e sim apenas fazer um reconhecimento da área, resolvemos então confirmar ou não as infos das monitoras subindo o rio pela trilha ate onde desse e dali retornar. Perfeito.

Nos despedimos das moças e prosseguimos nossa empreitada. Dali realmente a subida aperta, sempre bordejando a trilha estreita da encosta íngreme da direita, alternando a ascensão em escalaminhada e subida simples por degraus irregulares de terra, rocha e raiz. Daqui em diante não encontramos mais ninguém justamente em função da adversidade do terreno. Mas logo de cara topamos com a “Terceira Queda” (ou “Poço das Serpentes”), à nossa esquerda, onde outra bela cachu formava outro poço mais revolto e isento de qq banhista. Após alguns cliques continuamos a pernada, sempre no mesmo compasso, isto é, subindo sempre forte! Eventualmente a picada nivelava qdo costeava um lado da serra menos abrupto, mas logo depois tornava a subir com gde declividade, sempre tendo o rio correndo ruidosamente ao nosso lado, ora encachoeirado ora afunilado por íngremes paredões em meio a diversos mini-poços.

Mas depois de um tempo a subida arrefece, com pouca variação de altitude e a picada passa a bordejar as margens florestadas do rio, q agora corre mansamente na horizontal, na cota dos 250m. Algumas bifurcações surgem, mas o bom senso sugere tomar a variante q simplesmente acompanhe o rio. A partir daqui q a trilha cruza o rio diversas vezes e continua na outra margem, demandando eventualmente nossa habilidade de equilibristas pra pular de pedra em pedra, pra surpresa dos inúmeros sapinhos q saltavam diante nossa presença. No entanto, na maioria das ocasiões não havia jeito de cruzar sem molhar os pés, geralmente com água até a coxa.
Trilha molhada é isso aí! Às vezes perdíamos o caminho, principalmente qdo esbarrávamos com enormes arvores tombadas ou muita mata caída, mas bastava farejá-la q logo ela ressurgia mais adiante ou na outra margem do rio, bem discreta. Este processo de “busca” repetiu-se à exaustão durante td tarde, sem maiores dificuldades. Os destaques deste trecho foram os vários poços e piscinas represados por pedras maiores, as pegadas de um gde felino num leito arenoso e o verde exuberante da mata ao nosso redor!

Um tempo depois a picada novamente ganhar suave declividade, num trecho onde o rio mostra-se repleto de curvas, serpenteando a mata serra acima. Aqui tb a picada tb apresenta-se mais confusa, onde tivemos alguma dificuldade de achar sua continuidade, mas ai simplesmente bastava ir pela margem menos íngreme e plana, evitando as encostas verticais, q logo a picada ressurgia ao nosso lado em meio à mata! Porem, de qq maneira íamos deixando marcações q nos fossem úteis na volta.

Sempre nesse ritmo inabalável e após a picada subir (e descer) um morro bem íngreme pra novamente acompanhar o rio pela sua margem esquerda, o manso riacho começa a apresentar varias ilhas de rocha/mata, dividindo-se em diversos braços de ambos lados. Aqui realmente encontrar a continuidade da picada foi um sufoco, e tivemos q nos separar pra achar a mesma. Mas pela facilidade, em tese, e horizontalidade do trajeto simplesmente íamos avançando deixando totens no caminho ate reencontrar vestígios da vereda, logo adiante.

Mas após perdê-la outra vez e começar a galgar os degraus íngremes da encosta esquerda do rio, percebemos q o caminho não era por ai, pois sentimos q nos afastávamos consideravelmente do mesmo. Descendo a pirambeira na raça em meio a mata de uma vez só, encontramos a picada logo abaixo, do lado do rio, assim como encontramos carrapatos colados na gente. Mas não demorou pra perder a picada novamente, pra variar. Ate ai já eram 15hrs e resolvemos fazer um pit-stop de descanso, lanche e tchibum às margens do ribeirão, num trecho q dispunha de uma bem-vinda hidro. Estávamos na cota dos 330m e quase 5km percorridos de trilha sinuosa, o pto mais alto dali, e após o relax continuamos brevemente pela margem direita, onde a picada estava escondida. Mas logo ela outra vez se perdia numa ilha rochosa.

É, a partir daqui a coisa tava realmente engrossando em dificuldade de “navegação”. O numero de desbarrancados, deslizamentos e mata caída em ambas margens era considerável, pois não encontramos mais a trilha. É, as monitoras tinham razão! Não q isso fosse empecilho pra travessia, pois a partir daqui o percurso era sempre na horizontal, sem declividade alguma, bastava ir cautelosamente pelo rio. Era apenas questão de tempo, só q não tínhamos equipo e logística p/ volta. Quem sabe na próxima retornemos pra travessia derradeira.. e munidos de um bom facão! Mas bastou um negrume cobrir o céu pra retificar nossa decisão de parar, descansar e retomar o caminho de volta, as 16hrs. Afinal, ninguém tava a fim de encarar uma súbita tromba d´água, comum na região.

Por incrível q pareça, a volta foi bem mais rápida, sem as dificuldades e perdidas da ida. Quiçá pelas marcações deixadas no caminho ou pelo senso de orientação afiado durante a ascensão, sei lá. O fato é q retornamos bem mais depressa e mto mais ágeis, com direito a quase pisar numa cobra d´água e parada pra tchibum no Poço Verde e no Poço dos Macacos, piscinões de respeito do rio. Ao descermos já verificarmos a exuberância da Mata Atlântica nesta região com mais atenção. Bromélias, lindas árvores, samambaias, etc., é um verdadeiro jardim. A ameaça de chuva havia sido apenas alarme falso, já q o tempo permaneceu nublado claro ate o final.

Na volta tomamos a bifurcação ignorada no inicio, aquela q nos levaria à “Primeira Queda”, q por sua vez é acessível após cruzar o rio e andar pela encosta inclinada esquerda do dito cujo. Chegamos na bela cachu as 18hrs, sem nenhuma muvuca ou farofa naquele horário! A “Primeira Queda” esta na cota dos 80m e é dividida, na verdade, em duas quedas: a Cachoeira Lisa, onde nos refrescamos a gosto, e outra cachu enorme, de 35m, logo acima. E ali ficamos um tempão, ate sermos enxotados pelo borrachudos, q naquele final de tarde endoideceram de vez!

Às 19hrs estávamos de volta ao estacionamento sob alguns respingos de chuva q se limitaram á apenas isso, respingos. Lá bebemoramos a pernadinha daquele dia já prevendo novos circuitos pela região, principalmente pelas trilhas q derivam e são transversais ao ribeirão. Conversamos com o pessoal do camping e pegamos infos úteis pra próxima empreitada, e zarpamos de Boiçucanga as 20hrs pra parar num McDonalds da Riviera em busca emergencial de carbohidratos pra sanar nossa fome de leão. E chegamos em Sampa somente por volta da meia-noite, cochilando a vontade, pra desgosto do infeliz motora.

E essa é a “Trilha das Cachus do Ribeirão de Itu”, q já fora antiga rota dos índios tupinambás e tupiniquins, pra depois virar rota comercial e de acesso dos primeiros colonizadores ao planalto, agora virou rota carimbada e cartão postal de Boiçucanga. Fora a tão famosa travessia até Salesópolis, o Ribeirão de Itu tem opções de passeios transversais diversos em td seu trajeto, principalmente ao alto dos morros q costeiam a picada principal, mirantes selvagens naturais e privilegiados. Até lá, é de se esperar q a trilha inteira seja de fato resgatada e devidamente roçada pelo pessoal do parque pra não cair no total esquecimento. Pois só assim mais e mais pés poderão consolidá-la e mantê-la firme e forte no decorrer do tempo. E uma parte da historia assim será preservada.

Texto de Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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