Recentemente tenho notado muitas reclamações de montanhistas e escaladores conscientes sobre os excessos ocasionados por gente mal educada que não sabe usufruir as paisagens naturais sem causar destruição e ainda sem perturbar a paz alheia.
Esta minha percepção sobre o assunto me levou a redigir o artigo; Escalada: Esporte Proibido? Publicado aqui no Altamontanha. Neste artigo eu fiz uma reflexão sobre as atitudes de certas pessoas que levam autoridades a proibir o acesso à montanhas para escaladores e montanhistas e também a luta de gente consciente para a reabertura destes locais e outros que foram fechados por outros motivos.
As proibições é um dos reflexos da falta de educação dos brasileiros em áreas naturais. Na falta de dinheiro para uma política mais efetiva de conscientização e também de fiscalização, esta é a medida mais barata a ser tomada para supostamente proteger uma área que era para ser destinada não somente para a preservação, mas também para recreação que é o caso dos Parques.
Existem vários tipos de Unidades de Conservação, cada uma com um destino de uso diferente. As reservas, por exemplo, têm por finalidade a conservação da vida selvagem e são unidades não destinadas para o uso público, já os parques são UC´s que têm um destino preservacionista de uso sustentável, ou seja, você pode usufruir deles desde que não tenha impactos significativos. Os Parques são lugares onde é permitido um uso recreacional, ou seja, era para em seus planos de manejo estarem previstas atividades como caminhada, escalada, mergulho, camping. Tudo isso com uma infra-estrutura para promover o mínmo impacto.
Acontece que no Brasil o meio ambiente e a qualidade de vida, sem falar na educação do povo, está sempre em segundo plano. Os Parques não têm nem sequer plano de manejo, quanto menos uma infra-estrutura mínima ou pessoal para trabalhar e fiscalizar seu interior. Para piorar, sofremos de um problema crônico de má educação e assim, após anos em que as pessoas fazem uso predatório destas áreas, veio a degradação e a proibição. Por fim, podemos resumir que em nossos Parques tudo é proibido; a natureza é degradada e eles só dão prejuízo. Bem diferente, por exemplo, de parques em países mais desenvolvidos; onde os eles dão lucro, são preservados e tudo é permitido. Aliás nestes países as pessoas vão aos Parques para acampar, pedalar, escalar etc… Fazer tudo o que aqui não é permitido, o que demonstra que não são estas atividades que degradam o meio ambiente.
Acontece que existe uma mentalidade na cabeça da maioria das pessoas no Brasil de que ir para uma área natural é ir para um lugar onde não existem regras. No mato você pode se libertar da sociedade, ficar muito louco e curtir. Este tipo de gente é a que mais se vê nas montanhas, nas trilhas e nas cachoeiras do Brasil. Eles geralmente vão para estes locais para beber, fumar “um” e fazer coisas até piores. Tudo isso ouvindo música na altura que eles querem e jogando o lixo onde para eles é conveniente, no mato!
Nestes últimos três fins de semana estive engajado no curso de escalada básica do CPM, o Clube paranaense de montanhismo, por isso estive no morro do Anhangava, um tradicional campo escola de escalada de Curitiba e uma montanha muito próxima da cidade e por isso acessível.
Já fazia tempo que eu não gostava de freqüentar o Anhangava nos fins de semana por causa dos “Farofas” que é como os curitibanos chamam os mal educados. Neste último domingo presenciei algumas atitudes dessas pessoas que deu muita raiva. Assim entendi o porquê dos órgãos ambientais proibirem o acesso às montanhas.
Logo que cheguei no Anhangava, cruzei na trilha com três homens que usavam roupas camufladas do exército, coturno, luvas, como se fossem personagens de um filme do Rambo. Até aí tudo bem, moda é moda e o Farofa tem o direito de se vestir como bem entende. Mas enfim, o que me chamou a atenção, é que eles andavam com um baita rádio no ombro, como se fossem aqueles rappers americanos dos anos 80. Fazendo um barulhão por onde passavam.
Logo depois de cruzar com esta aberração, que ainda bem estavam indo embora, quase pisei num cocôzão humano, fresquinho, feito por alguém muito apressado que só teve o tempo, pelo jeito, de baixar as calças. Pior, o cara ainda deixou mais três pitolas montanha acima. Tomara que ele não tenha tido tempo de se limpar a bunda também!!!
Mal eu havia chegado na base das vias e já cruzo com mais uma galera subindo com um rádio à pilhas no ombro, pior, eram Escoteiros!!! Fico imaginando se um lobinho faz um negócio desses, o que estão ensinando estes Escoteiros? Lamentável isso acontecer com um grupo organizado que deveria zelar pela natureza.
Eu comecei a aula prática de escalada levando os alunos na via mais fácil do morro, a José Peón. Não demorou muito para subir um grupo com umas sete pessoas para escalar a via. Eram crianças, uma moça e uns rapazes que eram donos dos equipamentos. Como estávamos usando a via, eles desceram para escalar uma outra, a Levi´s que é um Top Rope fácil. Eles se estabelecem lá e logo começou a gritaria.
Os rapazes levaram as crianças para a montanha pela primeira vez e aquilo parecia cenas de recreio de pré-escola, pois a garotada aloprava muito, fazendo muito barulho e gritando muitíssimo, acabando com a paz das pessoas que escalavam no setor. Pior, foi ver eles montarem o top numa costura somente…
Mais tarde saímos da Peón e fomos para a Andorinhas, uma via também fácil que fica na Pedra do Almoço, um lugar de vista muito bonita, que fica por onde passa a trilha que vai para cume, por onde obrigatoriamente a Farofagem tinha que passar. Fiquei terminando a prática de escalada quando uma família se sentou na pedra e ficou olhando os alunos escalarem. Estava distraído e não notei que uma menina começou a “pixar” seu nome na pedra. Quando eu notei já era tarde, mas tive que repreendê-la na frente dos pais! Que não fizeram nada, pois acharam natural ela poder escrever o nome daquele jeito.
Mais tarde, um Farofa bêbado caiu da escadaria e quase arrastou com ele uma galera que vinha descendo. É por isso que não gosto mais de ir ao morro nos fins de semana. Podíamos contar nos dedos as pessoas que tinham ido para lá para escalar, fora o meu grupo, mais uns cinco ou seis com poucas pessoas. Infelizmente estas histórias estão se repetindo todos os fins de semana e não só no Anhangava, mas em vários lugares.
Como resolver este problema? As proibições impostas pelos órgãos ambientais já se mostraram ineficientes, pois este é um problema de educação, ou melhor, de falta dela.
Em alguns parques de montanhas, já vi os guarda parques exigirem do visitante uma comprovação de que eles têm capacidade técnica de usufruir aquele meio natural. Esta imposição somente qualifica a pessoa, não comprova se ela é bem ou mal educada, mas tem sido eficiente, pois os Farofas, em maioria não são gente que se importam com a montanha, nunca irão atrás um curso de escalada ou se comprometer com um clube, pois o uso da montanha para eles é em substituição de uma balada, ou seja, é só pra ficar louco mesmo!
É injusto para quem está começando, mas estes podem, se tiverem a intenção de se tornarem montanhistas, procurar um clube de montanha e regressar mais tarde naquele Parque. Aliás, uma das maneiras de comprovar se a pessoa tem capacidade de subir uma montanha, que os guardas faziam neste Parque, era perguntar se as pessoas participavam de um clube.
O problema é que muitos Parques não têm nem sequer uma portaria e nem funcionários, e também os clubes, infelizmente, estão às moscas, por causa do invidualismo das pessoas. Com os clubes vazios, eles têm pouco dinheiro e pouco poder político, o mesmo acontece com as federações. Se fossemos unidos poderíamos influenciar os órgãos ambientais e também trabalhar para mudar esta situação.
Ser montanhista não é somente subir montanhas. Existe todo um comportamento embutido nisso e é por isso que montanhismo é também uma cultura onde respeitar a natureza é regra básica. Uma das maneiras de se divulgar a cultura do montanhismo é através dos clubes e é por isso que eu faço parte do CPM, pois quero contribuir com a evolução da escalada e montanhismo, sem querer ter nada em troca.
É por isso que ministro palestras e dou o curso de escalada, de graça. Acho que minha experiência tem que servir para algo que não é somente inflar meu ego. Aliás é muito prazeroso estar fazendo estas coisas, conquistar novas amizades e respeito das pessoas.
Dentro do clube os mais experientes contribuem para a continuidade e divulgação da cultura da montanha. Dentro deste processo, além de estar formando gente que vai subir montanhas, está também educando pessoas para conviver nos meios naturais. Se o clube tem sócios, também tem força política para exigir que o governo cuide dos parques e também para que haja uma gestão eficiente deles. Em casos de proibições absurdas, podemos ter força para demonstrar que quem é do clube tem outra mentalidade e assim podemos ser diferenciados dos Farofas que de fato tem que ficar distante dos meios naturais.
Acontece que há muito preconceito em relação aos clubes e confesso que eu mesmo já tive. Em curtas palavras eu achava que quem era de clube era “Mané”! Depois vi que quem era Mané era eu, que ficava reclamando sozinho dos problemas das montanhas. Agora eu vejo como essa galera, tanto de clube, quanto de federação, dá o sangue para o desenvolvimento do montanhismo. Quando em fins de semana todo mundo está curtindo, eles estão fazendo multirão, contendo erosão de trilhas, combatendo incêndio florestal e negociando com os gestores dos parques melhores condições para a prática de nosso esporte.
Sozinhos nunca conseguiremos conquistar o tão sonhado acesso e a preservação dos lugares que tanto amamos. Se queremos realmente mudar o jogo daquilo que está acontecendo nas nossas montanhas, temos que nos unir. Procure um clube, seja voluntário, participe!
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