Resgate no Camapuan: Uma versão aprofundada dos fatos

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Os resgatados que foram evacuados do Morro Camapuan no último domingo contrataram uma agência de turismo para realizar o passeio. Presentes no local relatam o ocorrido.

Morro do Camapuan, na direita da foto.

Uma grande polêmica sobre um resgate por helicóptero neste final de semana no Morro do Camapuan, montanha de 1711 metros de altitude na Serra do Mar paranaense, movimentou os comentários das redes sociais nesta segunda feira.

Os comentários exprimem a indignação pela realização de um resgate por helicóptero que envolveu a mobilização de pessoas altamente capacitadas do Grupo Ostensivo de Socorro Tático (GOST), dos Bombeiros militares e o Batalhão de Operações Aéreas do Paraná, que em uma ação rápida evitou que o desfecho da história fosse mais grave.

A indignação se deu pelo fato de que têm ocorrido casos frequentes de resgates em montanhas do Paraná, e a maioria das causas desses resgates são a imprudência, imperícia e negligência dos resgatados, em situações que poderiam ser facilmente evitadas como preparação prévia e até contratação de um guia capacitado. Outro fato que ocasionou muitos comentários é que o Camapuan é uma montanha considerada fácil para os montanhistas, pois a trilha tem apenas 3 quilômetros de extensão e normalmente é percorrida em menos de 3 horas por pessoas que estão habituadas com a prática do montanhismo.

De acordo com os comentários deixados na rede, uma montanha bastante frequentada e considerada fácil não deveria ser palco de um resgate, ficando a impressão de que o caso do final de semana era apenas mais um ocasionado por excursionistas despreparados.

A indignação, no entanto, se agravou quando novos fatos iam sendo revelados, principalmente quando se soube que os resgatados eram clientes de uma agência de turismo que ofereceu o pernoite no Camapuan. O roteiro oferecido pela empresa custava R$50,00 pagos em dinheiro, e R$90,00 pagos no cartão de crédito, e oferecia, de acordo com a página de Facebook da empresa, “Guias Capacitados, Assistência/Kit Socorro, entrada na Chácara, fotos e adesivo Aventura“.

O montanhista Jonathan Bressan encontrou com o grupo ainda no sábado, às 14 horas na chácara da Bolinha, local de acesso à montanha. Segundo seu relato, ele achou estranho um grupo grande chegando tão tarde no local para fazer o pernoite, mas continuou seu planejamento e subiu a montanha, chegando no Camapuan às 17 horas. Minutos depois chegou no Tucum, local onde pernoitou na companhia de um amigo que já estava no local.

De acordo com Bressan, no grupo havia entre 10 e 15 pessoas. Ele relata que, pelas vestimentas, eles não eram montanhistas. As pessoas usavam roupas urbanas e levavam coisas penduradas por fora das mochilas.

De acordo com Jonathan, o grupo chegou na rampa do Camapuan por volta das 19:00, momento que percebeu um grande número de lanternas na região. Estava escuro e havia um pouco de neblina no momento. Ele viu o grupo chegar ao cume da montanha mais tarde e o movimento durante a noite, porém não foi até o local.

Ainda naquela tarde, 3 outros montanhistas chegaram ao Camapuan na intenção de ver o pôr do sol. Eles chegaram na fazenda de acesso às 16:30, e no caminho ultrapassaram todo o grupo da agência de turismo, que caminhavam lentamente. O grupo estava fragmentado, e neste momento não foi possível discernir se se tratava de um grupo comercial. Os 3 montanhistas chegaram a tempo para ver o pôr do sol e ainda cruzar com o grupo na volta.

Resgate no Camapuan. Fonte GOST

Foi então que o trio de montanhistas encontrou Vitor e Julia, próximos à “lajinha” (aproximadamente 50 metros acima), nitidamente mais lentos que o resto do grupo. Questionados sobre qual direção a dupla deveria tomar, uma vez que haviam ficado muito atrás, receberam breve explicação, à qual o casal agradeceu e mencionou que estavam mais lentos pelo fato de o rapaz ter sofrido uma torção no tornozelo. Um dos montanhistas pediu permissão para verificar a extensão da lesão e concluiu que, pela gravidade e pelas dores que a vítima sentia, seria mais prudente que retornassem.

O trio de montanhistas prestou o primeiro atendimento, imobilizando o ferimento. Conduziram, com dificuldade, a vítima até a “lajinha”, e ali avaliaram que seria imprudente uma tentativa de descida. A lesão poderia ser agravada e outro acidente poderia ocorrer, gerando mais vítimas. Nesse momento acionaram o GOST, aproveitando o sinal de telefone disponível naquele local. O acionamento aconteceu às 19h, e o “Coelho” (oficial que sobe na frente dos demais a fim de avaliar a extensão das lesões e promover os primeiros procedimentos de socorro) chegou às 22h. O grupamento era formado por 8 pessoas, no total, e chegou prevendo uma evacuação de maca.

No entanto, como a evacuação por maca exige um grande número de pessoas, e tanto os bombeiros, quanto os montanhistas sabiam que seria necessário um esforço maior de pessoas para realizar o procedimento. Um dos montanhistas retornou ao cume, a pedido dos bombeiros, para solicitar ajuda, mas a maioria das pessoas presentes já estava em suas barracas e se considerou inapta para prestar auxílio. Foi preciso ser incisivo e interpelar os guias para que retornassem. Ambos desceram até a vítima, mas não tinham condições de ajudar. Mais dois amigos do casal os acompanharam, mas também não apresentavam condições de ajudar e precisaram ser acompanhados na descida até a fazenda, ainda de madrugada.

Ficou decidido, pelo avançado da hora e pela dificuldade de transportar a maca em poucas pessoas em terreno acidentado e com travessia de rios, que dois bombeiros pernoitariam com o casal, aproveitando a previsão de tempo bom para fazer a retirada da vítima de helicóptero já nas primeiras horas da manhã de domingo. De acordo com diversas fontes, nas 3 horas em que o trio de montanhistas passou junto à vítima, nenhum dos guias  retornou para verificar o que havia ocorrido. Foi esse pequeno grupo quem prestou o primeiro auxílio, abrindo mão do seu tempo e recursos para deixar o casal confortável para uma espera de 3 horas. A chegada dos bombeiros, e com eles mais recursos, permitiu que os efeitos da noite fossem minimizados e que nada mais grave acontecesse.

Às 6:15 da manhã, um oficial subiu até o acampamento no cume da montanha e percebeu que mais uma pessoa do grupo, uma mulher, estava em más condições físicas e não teria como descer caminhando. Devido a seu estado, tornou-se a segunda vítima a ser evacuada por helicóptero da montanha.

Vitor foi encaminhado ao Hospital Cajuru em Curitiba e foi diagnosticado com fratura no pé. Recebeu o tratamento devido e se recupera em casa. Julia, sua namorada, teve uma noite difícil e sofreu com o frio. Porém com muito esforço desceu à pé com o resto do grupo.

Vitima que foi evacuada de helicóptero no Camapuan.

Diante do levantado, questionamos a agência responsável pelo passeio, que respondeu por meio de assessoria jurídica que nos pediu para não divulgar o nome da empresa. A nota de esclarecimento encontra-se na íntegra abaixo:

Notas de Esclarecimento.

A referida empresa, responsável pela atividade de montanhismo no morro Camapuã, por meio de sua assessoria jurídica, lamenta profundamente o incidente ocorrido no segundo final de semana de Maio/2018 , e informa que já estão sendo tomadas as medidas necessárias para a elucidação dos fatos ocorridos, bem como, a identificação e apuração de possíveis responsabilidades técnicas dos guias. Reforça neste momento, seu compromisso com a segurança e pretende revisar as ações e definir novas medidas buscando prevenir ocorrências futuras, de forma a garantir a todos que se utilizam dos serviços, a execução das atividades contratadas e bem estar dos participantes.

Por fim, informa que não medirá esforços para prestar o apoio necessário aos envolvidos no incidente, estando a disposição dos mesmos, para uma resolução breve e efetiva do ocorrido.

Atenciosamente,

Lorena Lopes

Advocacia & Consultoria Jurídica

Nota da Redação

 

Entrevistamos 5 fontes, entre resgatistas, voluntários e uma vítima. O AltaMontanha não tem como objetivo emitir juízo do acontecimento e apenas publicou fatos relatados pelas fontes.

Os fatos aqui publicados foram relatados  e confirmados pelas fontes. Não publicamos fatos relatados por apenas um entrevistado, para não configurar parcialidade.

Acidentes podem acontecer com qualquer pessoa, independente de sua experiência. Devemos respeitar as vítimas, os profissionais que trabalham salvando vidas e aprender com casos de emergência afim de evitar sua repetição no futuro.

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Sobre o autor

Texto publicado pela própria redação do Portal.

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